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Abordagem de distúrbios clínicos em pacientes geriátricos – Robert M Palmer MD MPH FACP

Última revisão: 04/06/2012

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Abordagem de distúrbios clínicos em pacientes geriátricos – Robert M. Palmer, MD, MPH, FACP

 

Robert M. Palmer, MD, MPH, FACP

Visiting Professor of Medicine, University of Pittsburgh, and Clinical Director, Geriatric Center, University of Pittsburgh Medical Center

 

 

Artigo original: Palmer RM. Management of common clinical disorders in geriatric patients. ACP Medicine. 2008;1-27.

[The original English language work has been published by DECKER INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2011 Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]

Tradução: Soraya Imon de Oliveira

Revisão técnica: Dr. Euclides Furtado de Albuquerque Cavalcanti

 

 

          O processo de envelhecimento predispõe os pacientes idosos a falha da homeostasia, desenvolvimento de doenças crônicas e perda da independência na execução das atividades do dia a dia (incapacitação funcional). Em consequência, esses pacientes frequentemente apresentam distúrbios clínicos que não se ajustam em categorias específicas e que muitas vezes são descritos como síndromes geriátricas.1 Estas condições comuns são similares em termos de prevalência a outras doenças crônicas entre idosos, além de apresentarem uma forte associação com a incapacidade funcional.2 Delirium e comprometimento cognitivo, úlceras de pressão, quedas e incontinência exemplificam as síndromes geriátricas comumente encontradas pelos médicos no cenário ambulatorial, hospitalar e nos estabelecimentos prestadores de assistência de longa duração. Outras condições clínicas observadas em pacientes idosos clinicamente doentes ou frágeis são perda de peso e desnutrição, tontura ou instabilidade, bem como os comprometimentos de visão e audição. Uma importante observação é o fato de que, apesar das diversas apresentações clínicas, muitas síndromes geriátricas compartilham fatores (de risco) predisponentes (p. ex., comprometimento cognitivo, imobilidade, comprometimento funcional) e sistemas orgânicos cruzados.1 Reconhecendo os fatores predisponentes a estas síndromes e as condições comuns, avaliando os pacientes que apresentam risco e implementando estratégias baseadas em evidências, tanto a incidência como a prevalência destas síndromes podem ser minimizadas pelos médicos.

 

Delirium

São causas comuns de disfunção cognitiva em pacientes idosos: delirium, demência e depressão. A demência e a depressão são discutidas em outros capítulos do livro [ver Abordagem de sintomas na medicina paliativa; Distúrbios cerebrovasculares; Encefalomielites anóxica, metabólica e tóxica; Doença de Alzheimer e demências; Dor; e O delirium, que consiste no declínio agudo da atenção e da função cognitiva, é uma causa comum e potencialmente evitável de resultados de saúde adversos.3 Pacientes idosos que desenvolvem delirium no hospital correm risco de apresentar no futuro declínio funcional (perda da independência na realização das atividades diárias), declínio cognitivo e mortalidade aumentada.3,4 O delirium também está associado a hospitalização prolongada, risco aumentado de internação em casa de repouso, declínio funcional persistente e complicações debilitantes (p. ex., quedas, lesão e imobilidade).3,4

Os aspectos clínicos do delirium causado por uma condição médica geral incluem: distúrbio da consciência (isto é, diminuição da consciência em relação ao ambiente) com redução da capacidade de focar, manter ou desviar a atenção; alteração cognitiva (p. ex., déficit de memória, desorientação, distúrbio de linguagem) ou distúrbio da percepção que não seja mais bem atribuído a uma demência preexistente, estabelecida ou em evolução; atividade psicomotora aumentada ou reduzida; desorganização do ciclo sono-vigília; distúrbio de início agudo (geralmente, em horas a dias) com flutuação no decorrer do dia; e evidência fornecida por história, exame físico ou achados laboratoriais de que o distúrbio é causado por uma condição médica geral etiologicamente relacionada.5,6 Apesar da importância do delirium e de sua ocorrência comum em pacientes idosos, essa condição por vezes continua sem ser identificada nem documentada nos registros médicos do paciente.3

 

Epidemiologia

Doença médica

O delirium é mais frequentemente identificado em pacientes hospitalizados, embora também seja comum observar este quadro em pacientes atendidos no departamento de emergências, estabelecimentos de prestação de assistência de longa duração e ambulatórios. Entre os pacientes com 70 anos de idade ou mais admitidos em unidades médicas agudas, o delirium está presente em 10 a 15% dos casos de admissão hospitalar e desenvolve-se em 10 a 15% dos pacientes durante a hospitalização.3 Os fatores de risco independentes para o desenvolvimento de delirium entre pacientes idosos durante a hospitalização incluem o uso de medicamentos psicoativos, doença severa, comprometimento cognitivo (demência), comprometimento visual e aumento na proporção de ureia/creatinina, que sugere desidratação.3,7 Os fatores precipitadores do delirium entre pacientes idosos hospitalizados são o uso de contenções físicas, a adição de mais de 3 medicamentos ao regime farmacológico do paciente, cateterização da bexiga e qualquer tipo de evento iatrogênico (p. ex., lesão não intencional).8 Os benzodiazepínicos, opiáceos (especialmente a meperidina) e medicações que exercem efeitos anticolinérgicos centrais, entre as quais a difenidramina, estão mais frequentemente associadas a incidência de delirium.9,10 O delirium ocorre em 70% dos pacientes idosos admitidos em unidades de terapia intensiva e é uma condição mais comumente observada em indivíduos que apresentam fatores de risco para desenvolvimento de demência no momento da admissão, receberam prescrição de benzodiazepínicos antes da admissão, possuem níveis séricos elevados de creatinina e baixo pH arterial.11 Tais achados estabelecem meios tanto para a identificação de pacientes de alto risco como para a prevenção da ocorrência de delirium, pela adoção de abordagens médicas, comportamentais e farmacológicas apropriadas.

 

Delirium pós-operatório

O delirium pós-operatório ocorre em 10 a 15% dos pacientes idosos submetidos a cirurgias gerais e em 30 a 60% dos pacientes idosos admitidos com fraturas de quadril ou submetidos a uma artroplastia de joelho.3,6 A incidência de delirium ou de outros comprometimentos cognitivos não está relacionada ao tipo de anestesia administrada, se geral ou epidural. Em um amplo estudo prospectivo, a disfunção cognitiva pós-operatória estava presente em 25,8% dos pacientes com 60 anos de idade ou mais decorrida 1 semana da cirurgia.12 Tanto a cirurgia como a anestesia constituem fatores contribuintes para o desenvolvimento de comprometimento cognitivo pós-operatório a curto e a longo prazos.13 Ainda há incertezas quanto aos fatores específicos que contribuem para o desenvolvimento de delirium pós-operatório. Entre os fatores de risco supostos para o desenvolvimento de delirium pós-operatório estão a polifarmácia, o uso de fármacos anticolinérgicos pré-operatórios, o comprometimento cognitivo e a idade avançada. Outros fatores que contribuem são a hipoxemia intraoperatória, a hipotensão perioperatória e complicações pós-operatórias.

Entre os pacientes de baixo risco que foram submetidos a cirurgias não cardíacas eletivas, 9% desenvolveram delirium que apresentou correlação independente com a idade de 70 anos ou mais, consumo de álcool autorrelatado, condição cognitiva precária, condição funcional precária, níveis séricos de sódio acentuadamente anormais durante o pré-operatório e cirurgia torácica.14 Nestes pacientes, o uso pós-operatório de meperidina e benzodiazepínicos aumentou o risco de desenvolvimento de delirium.

 

Fatores de risco e etiologia

Praticamente, qualquer estresse físico é capaz de precipitar delirium em pacientes idosos, sobretudo naqueles que apresentam fatores de alto risco [Tabela 1]. Em pacientes doentes, o delirium está mais comumente associado à ocorrência de infecções agudas, como pneumonia e urossepse; hipoxemia; hipotensão; e uso de medicamentos psicoativos. Estes últimos incluem numerosos agentes antiarrítmicos, antidepressivos tricíclicos, neurolépticos, medicações gastrintestinais e anti-histamínicos. Tais agentes, empregados em doses altas ou combinados em doses terapêuticas, podem induzir delirium. Antibióticos (p. ex., ciprofloxacina), analgésicos (p. ex., fármacos anti-inflamatórios não hormonais), opiáceos (p. ex., meperidina) e antagonistas de receptor H2 (p. ex., cimetidina) foram associados ao desenvolvimento de delirium.10 Outras causas importantes de delirium incluem a intoxicação por álcool ou drogas, além da abstinência e doença neurológica (p. ex., acidente vascular cerebral, tumor ou infecção).

 

Tabela 1. Prevenção e tratamento do delirium

Plano

Fatores predisponentes ou precipitadores

Intervenções

Prevenção

Medicações psicotrópicas: benzodiazepínicos, álcool, agentes anticolinérgicos, opiáceos

   Evitar ou suspender o uso de anti-histamínicos (p. ex., difenidramina) e benzodiazepínicos

   Atentar para uma possível abstinência do álcool

   Titular as doses de opiáceos para obter analgesia

   Promover o sono aplicando técnicas de relaxamento e mantendo os corredores silenciosos durante a noite

 

Demência ou comprometimento cognitivo preexistente: doença de Alzheimer, comprometimento cognitivo vascular, distúrbio depressivo significativo

   Orientação em relação a datas, lugar, prestadores de assistência e eventos vindouros

   Uso de medicamentos psicotrópicos de maneira judiciosa, para tratar sintomas específicos (p. ex., comportamento agressivo)

   Incentivar visitas de familiares ou cuidadores

   Fornecer aconselhamento de suporte e terapias comportamentais (p. ex., técnicas de relaxamento)

 

Desidratação: elevação na proporção ureia/creatinina, hipotensão, turgor da pele diminuído

   Prescrever líquidos e monitorar a ingesta e eliminação

   Uso de hidratação endovenosa se a ingesta oral for inadequada ou inviável

   Contar com o apoio da equipe de enfermagem para auxiliar o paciente a comer e beber

   Monitorar os eletrólicos básicos

 

Doença severa: febre alta, infecção, hipotensão

   Diagnosticar rapidamente a doença e seguir com terapia empírica (p. ex., antibióticos endovenosos para pneumonia adquirida na comunidade)

   Otimizar a condição hemodinâmica (garantir que a oxigenação e o débito cardíaco sejam adequados)

 

Comprometimento sensorial: visão, audição

   Utilizar auxílios visuais (p. ex., lentes corretivas, livros escritos com letras grandes, iluminação difusa)

   Utilizar auxílio auditivos (p. ex., dispositivos amplificadores portáteis, desimpactação do cerume); diminuir o ruído de fundo

 

Imobilidade/contenção física: ordens de repouso no leito, contenções mecânicas ou químicas

   Deambular ou realizar exercícios de cabeceira

   Obter consulta de fisioterapia para avaliação da marcha e realização de exercícios de fortalecimento

   Obter consulta de terapia ocupacional para avaliação funcional e uso de dispositivos adaptativos

 

Intervenções

Diretrizes sugeridas

Tratamento

Medicamentos: neurolépticos, ansiolíticos, opiáceos

   Usar judiciosamente os agentes neurolépticos para tratar sintomas psiquiátricos perturbadores (p. ex., alucinações, agressividade), caso não haja nenhuma estratégia não farmacológica viável ou efetiva

   Administrar 0,5 a 1 mg de haloperidol por via oral ou parenteral, a cada 6 a 8 horas, conforme a necessidade, mas sem exceder 3 mg/24 horas (doses maiores são justificadas quando há risco de o paciente romper com as terapias de suporte à vida)

   Administrar 0,5 a 1 mg de risperidona por via oral, em doses diárias divididas, quando a terapia neuroléptica prolongada for justificada

   Administrar 0,5 a 1 mg de lorazepam a cada 6 a 8 horas, por via oral ou parenteral, a pacientes sob tratamento com benzodiazepínicos ou em abstinência de álcool

   Controlar dores agudas com sulfato de morfina, administrado lentamente a baixas doses iniciais (p. ex., começar com 2 a 4 mg por via parenteral, a cada 3 horas); monitorar o alívio da dor com auxílio de escala análoga

   Evitar a meperidina

 

Assistência de enfermagem

   Manter o cuidador junto à cabeceira

   Aproximar o paciente da estação de enfermagem

   Implementar medidas preventivas

   Instruir o paciente e seus familiares acerca do delirium

 

Medidas ambientais

   Manter os corredores silenciosos

   Apagar as luzes à noite

   Promover atividades recreativas fora do quarto do paciente

   Minimizar a desordem nos quartos e corredores

 

Fisiopatologia

A fisiopatologia do delirium em pacientes idosos é complexa. Pacientes que apresentam fatores de risco para desenvolvimento de delirium são considerados vulneráveis, partindo-se da hipótese de que suas reservas (cerebrais) homeostáticas sejam limitadas. As principais hipóteses sobre a patogênese do delirium favorecem estresses físicos, inflamação e neurotransmissão alterada.3 Distúrbios funcionais globais estão associados a distúrbios de neurotransmissão (p. ex., acetilcolina, dopamina e serotonina). Exemplificando, a transmissão da acetilcolina deprimida secundária ao uso de fármacos anticolinérgicos que exercem efeitos centrais pode perturbar a cognição normal: pacientes com demência podem ser mais sensíveis aos efeitos cognitivos adversos das medicações anticolinérgicas. Em algumas condições, como na encefalopatia hepática, a ocorrência do delirium está correlacionada ao acúmulo de metabólitos tóxicos (p. ex., amônia). Distúrbios envolvendo a elaboração de citocinas, entre as quais a interleucina-1 (IL-1) e a IL-2, também foram associadas ao delirium. Estas citocinas também poderiam servir como biomarcadores séricos do delirium.15

 

Avaliação diagnóstica

Aspectos clínicos

O paciente com delirium apresenta alteração aguda do estado mental e aspectos clínicos de alteração da consciência, comprometimento cognitivo e flutuações de curso. O paciente apresenta capacidade reduzida de focalizar (ou seja, manter ou desviar) a atenção, que está associada a uma fala incoerente ou tangencial e a processos de raciocínio desorganizados ou erráticos. Os distúrbios da percepção, como as percepções equivocadas, ilusões ou enganos francos e alucinações, muitas vezes são acompanhados de aumento da atividade psicomotora. A maioria dos pacientes com delirium oscila entre os estados de hipo e hiperalerta. Entretanto, a maioria dos pacientes idosos com delirium apresenta uma conhecida confusão silenciosa, com flutuações de comportamento e do nível cognitivo ao longo do dia (p. ex., confusão aumentada à noite, referida como sundowning – fenômeno crepuscular).

Constatou-se que diversos instrumentos ou escalas fornecem razões de probabilidade significativas e apresentam uma especificidade razoável para o diagnóstico de casos de delirium.3 Dentre essas ferramentas, o método de avaliação da confusão é utilizado com maior frequência para estabelecer diagnósticos de delirium, sendo mais prático para uso de cabeceira.3 O diagnóstico de delirium estabelecido pelo método de avaliação da confusão requer: (1) a existência de uma desatenção que tem início agudo e curso flutuante; e (2) raciocínio desorganizado ou nível de consciência alterado, ou ambos [Tabela 2]. O método de avaliação da confusão foi adaptado para uso em casos de pacientes admitidos em unidades de terapia intensiva.16 Os testes objetivos de atenção, como o teste de evocação de dígitos (Digit Span), e os testes de cognição ajudam a dar suporte ao diagnóstico de delirium e fornecem informações basais úteis para comparações subsequentes. No teste digit span, os pacientes são solicitados a repetir uma lista de números tomados ao acaso, que são pronunciados em monotom a intervalos de 1 segundo. Pacientes com função cognitiva intacta repetem corretamente 5 ou mais destes números na ordem certa, enquanto os pacientes com delirium frequentemente repetem menos de 5 números.

 

Tabela 2. Método da avaliação da confusão para diagnóstico de delirium99*

Fator

Avaliação

1. Delirium de início agudo e curso flutuante

Indicado por uma resposta positiva às seguintes perguntas: Há alguma evidência de alteração aguda do estado mental do paciente? O comportamento anormal flutua durante o dia (parece ir e vir ou aumentar e diminuir de intensidade)?

2. Desatenção

Indicada por uma resposta positiva às seguintes perguntas: O paciente apresenta dificuldade para focar a atenção? O paciente apresenta dificuldade para acompanhar o que está sendo dito?

3. Raciocínio desorganizado

Indicado por uma resposta positiva às seguintes perguntas: O paciente raciocina de maneira desorganizada ou incoerente (conversação desconexa ou irrelevante, fluxo de ideias obscuro ou sem lógica, mudanças de assunto imprevisíveis)?

4. Nível de consciência alterado

Indicado por uma resposta diferente de “alerta” à seguinte pergunta: De uma forma geral, como você classificaria o nível de consciência desse paciente?

Normal = alerta

Hiperalerta = vigilante

Sonolento, facilmente despertado = letárgico

Difícil de despertar = estupor

Não é despertado = coma

*O diagnóstico de delirium requer a presença dos fatores 1 e 2 associados a um dos fatores 3 e 4 (3 ou 4).

 

Testes laboratoriais

A avaliação de um paciente com delirium concentra-se na busca das etiologias mais prováveis e na necessidade de tratar doenças que ameassem a vida. O agente precipitador do delirium com frequência é evidente, no entanto é necessário realizar um monitoramento cuidadoso para excluir outras causas ou condições contribuintes (p. ex., pneumonia acompanhada de hipoxemia, desequilíbrio eletrolítico e efeitos farmacológicos adversos). Uma imagem da cabeça obtida por tomografia raramente tem utilidade, a menos que o paciente apresente achados neurológicos focais. Como a infecção constitui um agente precipitador de delirium bastante frequente, realiza-se hemograma e painel bioquímico para todos os pacientes nos casos em que é impossível excluir uma possível infecção. Em casos seletos, justifica-se realizar culturas de sangue e urina, bem como radiografia torácica, eletrocardiograma, gasometria arterial, punção lombar, tomografia computadorizada (TC) de crânio e eletroencefalograma. Este último é mais útil para detecção de convulsões (p. ex., parcial-complexa) e para diferenciar o delirium de um caso de psicose.3 A punção lombar raramente é diagnóstica no caso de pacientes não imunocomprometidos ou sem sinais de um diagnóstico envolvendo o sistema nervoso central, como acidente vascular cerebral ou meningite.

 

Diagnóstico diferencial

Em muitos casos, o delirium é erroneamente diagnosticado como demência, depressão ou psicose funcional. Os aspectos clínicos do delirium e da demência podem se sobrepor, porém os achados de desatenção e nível de consciência alterado, bem como a duração dos sintomas, costumam permitir a distinção destes dois diagnósticos [Tabela 3]. A psicose causada por uma esquizofrenia de início tardio ou por uma depressão significativa não é caracterizada por comprometimento da atenção ou alteração do nível de consciência e flutuação do estado mental. Embora muitos pacientes deprimidos apresentem mal desempenho nos testes de cognição formais, eles podem estar alertas e atentos, além de não exibirem as flutuações de curso observadas no delirium. O paciente deprimido frequentemente se recusa a concluir o teste de estado mental ou fornece muitas respostas do tipo “Não sei”. Do mesmo modo, muitos pacientes ansiosos apresentam comprometimento da concentração e podem parecer desatentos, mas eles não apresentam a flutuação de curso e o nível alterado de consciência observados no delirium. Em geral, qualquer paciente com início agudo de comprometimento cognitivo deve ser considerado como alguém que tem delirium, a menos que se prove o contrário.

 

Tabela 3. Aspectos diferenciais do delirium e da demência

Aspecto

Delirium

Demência

Início

Rápido

Insidioso

Duração

Horas a dias (transiente)

Meses a anos (persistente)

Atenção

Diminuída (teste digit span = 4 palavras, distração, flutuação)

Geralmente, normal (demência leve a moderada)

Consciência

Sempre comprometida

Geralmente, normal

Alerta

Flutuante

Geralmente, normal

Estado consciente

Diminuído

Normal

Memória

Comprometida (variável)

Comprometida (a recente é mais afetada do que a remota)

Linguagem

Normal ou com nomeações incorretas

Afasia, anomia, parafasia

Percepção

Percepções equivocadas, ilusões, alucinações (comuns)

Geralmente, normal (ou com engano)

Atividade psicomotora

Aumentada, diminuída (variável)

Geralmente, normal

Ciclo sono-vigília

Rompido (invertido)

Normal ou fragmentado

 

Prevenção e tratamento

A prevenção e o tratamento do delirium requerem uma abordagem multifacetada, que inclua a identificação de fatores predisponentes, estratégias ambientais e assistência interdisciplinar, conforme resumido nas diretrizes para a prática (http://publications.nice.org.uk/delirium-cg103).

 

Protocolos dirigidos para fatores de risco

O delirium que surge em pacientes idosos com doenças médicas e risco de desenvolver o distúrbio muitas vezes pode ser prevenido [Tabela 1]. Em um estudo pareado controlado (atualmente conhecido como Hospital Elder Life Program – www.hospitalelderlifeprogram.org/public/public-main.php), pacientes com risco de desenvolver delirium foram identificados logo após a admissão hospitalar e receberam acompanhamento diário pelo método de avaliação da confusão.17 Uma série de protocolos dirigidos aos fatores de risco serviu para otimizar a função cognitiva (reorientação e atividades terapêuticas), prevenir a deprivação do sono (relaxamento e minimização do barulho), evitar a imobilidade (deambulação e exercícios), melhorar a visão (auxílios visuais e iluminação), melhorar a audição (dispositivos auditivos) e tratar a desidratação (repleção de volume). Nos 852 pacientes estudados, a incidência de delirium foi de 9,9% entre os indivíduos do grupo submetido à intervenção, e de 15% no grupo de indivíduos que receberam o tratamento habitual. O número total de dias e o número de episódios de delirium também foram significativamente reduzidos no grupo submetido à intervenção, mas nenhum efeito significativo foi observado em termos de severidade do delirium ou taxas de recorrência.

Uma revisão sistemática das intervenções empregadas em um estudo clínico randomizado para prevenção do delirium em pacientes hospitalizados incluiu 6 estudos.18 Todos eles foram conduzidos sob condições cirúrgicas. Um dos estudos teve poder suficiente para demonstrar a existência de uma diferença significativa entre o tratamento habitual e a intervenção. A prevenção do delirium pós-operatório em pacientes submetidos à cirurgia de quadril em decorrência de fraturas foi demonstrada apenas em 1 destes estudos, o qual, por sua vez, teve poder suficiente para detectar uma diferença entre a consulta geriátrica pró-ativa e o tratamento habitual. A consulta geriátrica acompanhada de recomendações dirigidas resultou em uma incidência de delirium igual a 32% entre os pacientes do grupo submetido à intervenção, e em uma incidência de delirium de 50% entre os pacientes que receberam terapia habitual (número necessário para tratar 5,6 pacientes para se prevenir 1 caso de delirium pós-operatório).19 As estratégias que parecem ser mais efetivas para reduzir os fatores de risco de desenvolvimento de delirium são: comunicação orientadora, atividades terapêuticas, mobilização precoce, abordagens não farmacológicas para sono e ansiedade, manutenção da nutrição e da hidratação e aprimoramento da visão e da audição com auxílio de dispositivos.17 Um estudo randomizado controlado com placebo, que avaliou o uso do haloperidol por pacientes submetidos à cirurgia de quadril, falhou em demonstrar a diminuição na incidência de delirium pós-operatório.20 No entanto, nesse estudo, a administração diária de 1,5 mg de haloperidol instituída 1 dia antes e por até 6 dias após a cirurgia diminuiu a severidade e a duração do delirium, estando associada a um menor número de dias de internação. O risco foi determinado pelo número de fatores de risco que se mostraram preditivos do desenvolvimento de delirium pós-operatório, incluindo alto grau de severidade da doença, comprometimento visual, comprometimento cognitivo basal e desidratação. Evitar esses fatores precipitadores também poderia resultar na prevenção do delirium (p. ex., hipnóticos sedativos, fármacos anticolinérgicos, complicações iatrogênicas, subnutrição ou desidratação, uso de contenções físicas e uso de sondas vesicais de demora).3

 

Maior socialização e modelos de tratamento do delirium

As intervenções de enfermagem e ambientais com frequência são úteis na abordagem do delirium: instalar o paciente em um quarto próximo à estação de enfermagem para proporcionar maior observação e socialização; visitas sociais com familiares, prestador de assistência ou cuidador contratado; evitar contenções físicas, que podem piorar a agitação; e promoção de ciclos de sono normais, controlando o barulho e apagando as luzes durante a noite. O estudo clínico randomizado de uma intervenção com múltiplos componentes destinada a pacientes idosos levou a um alívio mais rápido do delirium e diminuição do tempo de estadia institucional para pacientes submetidos à intervenção, comparativamente aos efeitos obtidos com o tratamento habitual.21 O grupo submetido à intervenção recebeu mais inibidores de colinesterase, antipsicóticos atípicos, protetores de quadril e fisioterapia, entre outras estratégias, do que o os indivíduos do grupo controle. Os pacientes com delirium muitas vezes são transferidos para cenários pós-agudos, uma vez que suas condições médicas ou cirúrgicas tenham se estabilizado. As intervenções iniciadas no hospital podem ser mantidas no cenário de assistência pós-aguda.22

 

Farmacoterapia

As intervenções farmacológicas frequentemente são justificadas em casos de pacientes para os quais há indicações específicas, incluindo delírios e alucinações incômodas, agressividade física e risco de causar danos a si mesmo ou a outras pessoas, além de desconforto ou angústia pessoal severa. As intervenções farmacológicas são empregadas com frequência quando é necessário evitar que o paciente interrompa a terapia médica, como no caso de pacientes gravemente enfermos. Entretanto, nenhum agente foi aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA) para uso específico no tratamento do delirium. Faltam estudos clínicos definitivos que abordem terapias farmacológicas para pacientes idosos com delirium. Como recomendação geral para pacientes com sintomas inconvenientes, o haloperidol é o fármaco de escolha habitual. Esse fármaco é administrado em doses de 0,5 a 1 mg, por via oral ou intramuscular, a intervalos de 6 a 8 horas. Doses mais altas ou a administração mais frequente (p. ex., a cada 30 minutos) podem ser necessárias para o controle da agitação nos casos que requerem intubação traqueal do paciente ou adoção de outros procedimentos de suporte à vida. Uma vez que a agitação tenha sido aliviada, as doses de haloperidol devem ser gradualmente diminuídas no decorrer de vários dias. Os efeitos adversos dos agentes neurolépticos incluem efeitos extrapiramidais, reações distônicas e torsade de pointes, que estão associados à administração de altas doses de haloperidol por via endovenosa. Os antipsicóticos atípicos podem ser dados por via oral e em baixas doses (p. ex., 0,5 mg de risperidona, 2 vezes/dia; 2,5 a 5 mg de olanzapina diariamente; e 12,5 a 25 mg de quetiapina, 2 vezes/dia).3 Estes agentes não são comprovadamente mais eficazes do que o haloperidol, estão associados a uma mortalidade maior entre pacientes com demência e apresentam eficácia duvidosa em comparação ao placebo.3,23

Para tratamento da abstinência do álcool ou do uso de benzodiazepínicos, ou da ansiedade severa e distúrbios do sono, o fármaco de escolha para pacientes idosos é o lorazepam (0,5 a 1 mg, por via oral ou parenteral, a cada 6 a 8 horas). Doses mais altas com frequência são necessárias para o tratamento da abstinência do álcool. Haloperidol e lorazepam, em casos emergenciais, também podem ser úteis na preparação dos pacientes para exames de neuroimagem ou quando é necessário instituir terapias invasivas ou de preservação da vida. Os efeitos colaterais dos benzodiazepínicos incluem agitação paradoxal, amnésia e quedas. Por esses efeitos colaterais, tais agentes não são recomendados para o tratamento de pacientes idosos. Dor severa acompanhada de agitação deve receber tratamento parenteral, à base de sulfato de morfina, com doses menores que a dose habitual para adultos (p. ex., 4 a 6 mg a cada 3 horas; com doses menores para pacientes bastante idosos ou fragilizados). Em geral, para prevenir o efeito neurológico de seu metabólito (normeperidina), recomenda-se evitar o uso de doses repetidas de meperidina.

 

Prognóstico

O tratamento da causa subjacente do delirium costuma resultar em uma melhora rápida do paciente, embora a resolução completa dos sintomas cognitivos possa demorar vários dias ou meses. Os déficits funcionais e cognitivos com frequência persistem após a liberação hospitalar. A persistência dos déficits cognitivos pode estar relacionada à existência de condições subjacentes, especialmente demência.

 

Incontinência urinária

A incontinência urinária – perda involuntária de urina severa o suficiente para constituir um problema social ou de saúde – é uma condição comum, onerosa e potencialmente incapacitante que jamais é uma consequência do envelhecimento normal. É sempre tratável e, na maioria das vezes, curável. A incontinência urinária representa uma fonte de constrangimento social para pacientes idosos, resulta em perda da autoestima e da independência física, e aumenta o risco de institucionalização do paciente. Muitos pacientes não relatam a incontinência aos médicos da assistência primária, ressaltando a importância do rastreamento que se deve fazer a cada 1 ou 2 anos, por meio de perguntas dirigidas aos pacientes sobre eles serem “incomodados” pelo vazamento de urina.

 

Epidemiologia

A prevalência da incontinência urinária foi estimada como sendo de até 30% em indivíduos que vivem em comunidade, e de até 50% em indivíduos institucionalizados. 24 A incontinência urinária é mais comum em mulheres do que em homens até os 80 anos de idade, quando as taxas se tornam similares. Apesar da publicação de diretrizes para estudo e tratamento da incontinência, trata-se de uma condição ainda subidentificada e subtratada pelos médicos. Na Medicare Health Outcomes Survey 2004, que estudou a incontinência urinária autorrelatada, constatou-se uma incidência em 6 meses igual a 37%. A incontinência estava fortemente associada a condições autorrelatadas mais precárias de saúde e funcionamento físico.25

 

Fatores de risco e etiologia

A incontinência urinária observada em pacientes idosos resulta de uma interação entre as alterações relacionadas à idade que ocorrem no trato geniturinário, condições de comorbidade, alteração cognitiva, comprometimento da mobilidade e barreiras do ambiente para se chegar ao banheiro. Uma bexiga hiperativa associada com o aparecimento de alterações na musculatura lisa da bexiga, hiperplasia prostática masculina, relaxamento ou prolapso da parede da bexiga feminina, efeitos colaterais de medicamentos e comprometimento cognitivo são os fatores predisponentes de incontinência urinária mais comumente observados em pacientes idosos. A impactação fecal e infecções no trato urinário (ITU) constituem causas comuns de incontinência aguda, que são resolvidas mediante tratamento adequado.

 

Fisiopatologia

A incontinência resulta de defeitos neurológicos ou anatômicos que interferem na micção normal. A bexiga urinária é responsável pelo armazenamento e eliminação da urina. Lesões que interferem na contração ou no esvaziamento da bexiga predispõem os pacientes à incontinência urinária. O armazenamento de urina ocorre quando a parede muscular da bexiga (detrusor) relaxa, enquanto a micção ocorre quando o detrusor da bexiga se contrai. O esvaziamento está sujeito ao controle parassimpático, enquanto o armazenamento da urina é controlado pela ação simpática. Para que a micção normal ocorra, o músculo detrusor da bexiga se contrai, há relaxamento do tônus do esfincter e a pressão uretral diminui.26 Lesões que interferem na contração e no esvaziamento da bexiga (p. ex., neuropatia sensorial) predispõem à incontinência. Contrações do músculo detrusor da bexiga que ocorrem diante de pequenos volumes de enchimento (instabilidade ou hiperatividade do detrusor da bexiga) podem ser encontradas em pacientes com lesões no sistema nervoso central (p. ex., acidente vascular cerebral) ou aumento da estimulação sensorial da bexiga, observáveis em casos de ITU, hiperplasia da próstata ou na presença de fatores psicológicos desencadeantes. A incompetência do esfincter uretral interno (p.ex., causada por relaxamento pélvico ou deficiência intrínseca do esfincter [DIE]) permite que a urina vaze a partir da bexiga (incontinência de esforço) toda vez que a pressão intra-abdominal exceder a resistência uretral. A perda da contratilidade do detrusor da bexiga (bexiga acontrátil) ou a obstrução da saída da bexiga podem resultar na distensão da bexiga e no vazamento de urina (incontinência por transbordamento), que é ou não acompanhada de uma sensação subjetiva de urgência para urinar. Em pacientes idosos, a incontinência está mais frequentemente associada à existência de comprometimentos funcionais, como ocorre no caso da bexiga hiperativa ou no vazamento decorrente de relaxamento pélvico: marcha lenta, cognição comprometida e barreiras ambientais fazem com que o paciente corra risco de não conseguir chegar ao banheiro a tempo para manter uma continência normal.

 

Avaliação diagnóstica

A incontinência pode se manifestar como uma condição aguda (transiente) ou crônica (estabelecida). O tipo clínico e a causa mais provável da incontinência urinária podem ser determinados com a obtenção de uma história médica e realização de exame físico, alguns exames laboratoriais e procedimentos de consultório simples.

 

Aspectos clínicos

Incontinência aguda. A incontinência aguda em geral apresenta início repentino e está associada a uma doença aguda (p. ex., infecção ou delirium) ou a um evento iatrogênico (p. ex., polifarmácia ou restrição da mobilidade) que é potencialmente reversível.27 A ITU constitui a causa mais comumente identificada de incontinência transiente entre pacientes idosos atendidos em ambulatório. Entre os pacientes hospitalizados, delirium ou confusão aguda, infusões excessivas de líquidos endovenosos e distúrbios metabólicos, como a hiperglicemia com glicosúria, predispõem à incontinência. A incontinência urinária aguda também está associada a comprometimentos funcionais, como incapacidade de chegar ao banheiro de forma suficientemente rápida ou inconsciência da necessidade de urinar (p. ex., em pacientes com demência ou confusão aguda). Apesar da distinção comum entre as causas agudas e crônicas da incontinência, com frequência é difícil distinguir esses dois tipos causais, que muitas vezes compartilham aspectos patofisiológicos similares.

 

Incontinência estabelecida. Pacientes idosos podem apresentar quatro tipos diferentes de incontinência urinária estabelecida: por esforço, de urgência, transbordamento e funcional [Tabela 4]. A incontinência urinária com frequência é causada por uma combinação de dois ou mais subtipos de incontinência e, nesse caso, recebe a classificação de incontinência mista. Mais uma vez, um componente funcional (p. ex., marcha lenta) pode contribuir para o episódio da incontinência.

 

Tabela 4. Tipos, características e tratamentos da incontinência urinária

Tipos

Características

Tratamentos

Não farmacológico

Farmacológico

Precauções

 

Esforço

Associado à hipermotilidade uretral ou DIE; vazamento de urina com o aumento da pressão intra-abdominal resultante de tosse, espirros ou esforço físico; vazamento contínuo em caso de DIE

Comportamental: exercícios para a musculatura pélvica (contração repetitiva dos músculos pélvicos), idas programadas ao banheiro (urinar a intervalos definidos), treinamento da bexiga (interromper a micção, evitar esforços excessivos)

Cirúrgico: suspensão do colo da bexiga, para hipermotilidade uretral; tipoia vaginal ou injeções (de colágeno) periuretrais para detecção de DIE

Estrogênios e agonistas alfa-adrenérgicos não são recomendados

Estrogênios orais aumentam o risco de desenvolvimento de câncer de endométrio, elevação da pressão arterial e trombose venosa

Agonistas alfa-adrenérgicos podem aumentar os risco de acidente vascular cerebral, hipertensão, dor de cabeça e taquicardia

 

Urgência

Urgência e frequência urinária (volumes pequenos a moderados); bexiga hiperativa, decorrente de instabilidade do músculo detrusor da bexiga

Treinamento da bexiga (esvaziamento programado ou induzido), reabilitação da musculatura pélvica (contração e relaxamento dos músculos pélvicos), biofeedback (diminuição da intensidade das contrações não inibidas)

Anticolinérgicos/relaxantes da bexiga

      2,5 a 5 mg de oxibutinina, 3 x/dia (ou uma única dose à noite, em casos de noctúria e urgência)

      5 a 10 mg de oxibutinina DE, por dia

      1 a 2 mg de tolterodina, 2 x/dia (ou uma única dose à noite, em casos de noctúria e urgência)

      2 a 4 mg de tolterodina AP, por dia

      5 a 10 mg de solifenacina por dia.

      20 mg de trospium por dia, para pacientes = 75 anos de idade ou que apresentem comprometimento renal; ou 2 x/dia nos demais casos

      7,5 a 15 mg de darifenacina por dia

Os efeitos colaterais comuns são: boca seca, constipação e visão turva; potencial risco de aumento da pressão intraocular, delirium e taquiarritmias

 

Transbordamento

Associada a uma bexiga acontrátil ou à obstrução da saída da bexiga (HBP, estreitamento ou constrição do colo da bexiga); distensão da bexiga, acompanhada de gotejamento frequente ou constante, com ou sem urgência

Cateterismo vesical intermitente ou contínuo para uma bexiga acontrátil

Alívio cirúrgico de obstrução uretral (prostatectomia)

Tentativas de retreinamento da bexiga e idas programadas ao banheiro podem ser feitas após a retenção urinária aguda

Agonista colinérgico:

10 a 30 mg de betanecol, 3 x/dia (iniciar com baixas doses).

Antagonistas alfa-1-adrenérgicos:

      1 a 5 mg de terazosina, à noite

      1 a 4 mg de doxazosina, à noite

      0,4 a 0,8 mg de tamsulosina, à noite

Agonistas colinérgicos devem ser utilizados de maneira judiciosa para tratamento da bexiga acontrátil; o betanecol pode exacerbar bradicardia, hipotensão, broncoconstrição e úlceras pépticas

Antagonistas alfa-1-adrenérgicos são empregados para tratamento de casos de obstrução leve da saída da bexiga causados pela HBP. Os possíveis efeitos colaterais são hipotensão postural, fadiga e disfunção sexual

 

Funcional

Associada à incapacidade ou indisposição para fazer a toalete (incapacitação física, barreiras ambientais ou doença psiquiátrica)

Comportamental: toalete programada e esvaziamento da bexiga induzido; toalete assistida, comadre ou urinol; dispositivos auxiliares para deambulação e toalete (bengalas, andadores, corrimão, barras de segurar); suspender as contenções físicas; aumentar os exercícios

Médico: coxins absorventes e vestuário; cateteres internos para pacientes severamente debilitados

Mudar os tratamentos (diminuir as doses de diuréticos e vasodilatadores)

Tratar a depressão

Tratar a doença de Parkinson

Minimizar o uso de fármacos que pioram o comprometimento funcional (p. ex., neurolépticos que produzem efeitos colaterais extrapiramidais e vasodilatadores causadores de hipotensão postural)

 

AP = ação prolongada. DE = duração estendida. DIE = deficiência intrínseca do esfincter. HBP = hiperplasia benigna da próstata.

 

É comum pacientes idosos apresentarem incontinência mista (por urgência e estresse) e comprometimentos funcionais que precipitam a incontinência. Os tratamentos não devem ser iniciados antes da conclusão de uma avaliação básica que exclua possíveis causas reversíveis de incontinência aguda e incontinência por transbordamento. Muitos pacientes fragilizados apresentam hiperatividade do detrusor da bexiga acompanhada de comprometimento da contratilidade, com urgência urinária e esvaziamento de pequenos volumes.

 

História médica

A história médica, essencial ao diagnóstico, inclui uma descrição do início, duração e características da incontinência; sintomas mais significativos; frequência, momento e quantidade de episódios; e fatores precipitadores da incontinência, como a relação da incontinência com exercício, cirurgia anterior ou surgimento de doenças agudas. Em homens, os sintomas relacionados ao prostatismo devem ser descobertos (isto é, noctúria, disúria, hesitação ou fluxo diminuído). Os hábitos intestinais (p. ex., constipação ou impactação) e a ingesta de líquidos devem ser observados. A elaboração de um registro por escrito ou diário miccional com os episódios de incontinência mantido por 7 dias (ou um registro de continência para residentes de casas de repouso) fornece uma medida confiável da frequência dos episódios de incontinência, bem como indícios que comprovam a etiologia e o grau de severidade da incontinência urinária. Nas mulheres, um simples questionário permite distinguir as incontinências de urgência e de esforço.28 As razões de probabilidade são ao menos 2 a 3 vezes maiores quando a mulher relata padrões de vazamento consistentes com uma incontinência objetivamente definida como incontinência de esforço ou incontinência de urgência. O vazamento que ocorre com maior frequência durante a prática de atividades físicas é mais provavelmente devido a uma incontinência de esforço. O vazamento que ocorre mais frequentemente com urgência de esvaziar a bexiga tem mais chances de ser incontinência de urgência ou predominantemente por urgência. Por fim, o vazamento que ocorre mediante prática de atividade física e é acompanhado de sensação de urgência é mais provavelmente um caso de incontinência mista. Fatores predisponentes passíveis de minimização com intervenções terapêuticas são investigados, como uma marcha lenta que é melhorada com fisioterapia.

 

Exame físico

O exame físico enfoca as condições que afetam a função geniturinária. O exame abdominal procura massas abdominais que sejam causadas por distensão abdominal ou impactação fecal. O exame retal avalia os pacientes quanto à impactação fecal, presença de massas no reto e, nos homens, quanto a anormalidades da próstata. O exame pélvico avalia as mulheres quanto à existência de prolapso de órgão pélvico, atrofia genital e anomalias uretrais. O exame neuromuscular identifica pacientes com comprometimento da mobilidade ou doenças envolvendo o sistema nervoso central que predisponham à incontinência urinária (p. ex., doença de Parkinson ou demência). A integridade da raiz sacral é avaliada por meio do exame do tônus do esfincter anal, reflexo anal (anal wink) e sensação perineal. Nas mulheres, o teste do esforço é uma das manobras mais indicadas capazes de ajudar a distinguir o tipo de incontinência.29 No teste do esforço, a paciente fica em posição de supinação ou em pé e é solicitada a tossir ou realizar uma manobra de Valsalva. A ocorrência de vazamento durante o teste do esforço é consistente com incontinência de esforço. O teste da ponta Q envolve a introdução de um cotonete de algodão lubrificado na uretra da paciente em posição de litotomia. A hipermobilidade uretral (a ponta Q eleva-se acima da horizontal) observada durante a manobra de Valsalva sugere que a incontinência é causada pelo esforço. O teste da fralda (pad test) envolve a utilização contínua de fraldas de continência e a pesagem dessas fraldas antes e após o uso, durante determinado período. Este teste ajuda a determinar se o indivíduo apresenta incontinência.29 Estes testes especiais podem ajudar a aumentar ou diminuir a probabilidade de incontinência de esforço, contudo o componente mais útil da avaliação para detecção de incontinência de urgência é a obtenção de uma história de perda de urina associada à urgência urinária com uma razão de probabilidade igual a 4,2.29

 

Testes laboratoriais

A avaliação laboratorial de um paciente idoso com incontinência é regida pelo tipo clínico, frequência e significado da incontinência. Pacientes com incontinência urinária aguda associada uma ITU devem receber, primeiro, tratamento antibiótico, antes de serem submetidos a avaliações urodinâmicas adicionais. Embora muitos pacientes com incontinência estabelecida apresentem bacteriúria assintomática, inexistem evidências de que o tratamento da infecção leve à resolução da incontinência.30 Uma urinálise irá sugerir a existência de infecção, possível inflamação ou necessidade de avaliações diagnósticas adicionais para excluir a existência de tumor ou cálculos (p. ex., se o paciente apresentar hematúria ou piúria). Em pacientes com incontinência estabelecida, os exames de sangue devem medir a função renal, eletrólitos, glicemia e cálcio sérico, pois todos esses parâmetros ajudarão a excluir possíveis condições poliúricas como causas da incontinência.

O teste de cabeceira mais útil para avaliação da função do trato urinário inferior consiste na determinação da urina residual pós-esvaziamento (RPE). A quantificação acurada da RPE é mais frequentemente obtida por meio da cateterização direta da bexiga urinária, após o paciente tentar realizar um esvaziamento completo. A ultrassonografia pélvica e a varredura da bexiga com dispositivo portátil são considerados métodos alternativos seguros e acurados para estimar a RPE. Uma RPE inferior a 50 mL de urina é considerada normal. Uma RPE acima de 150 a 200 mL é considerada anormal até mesmo para pacientes idosos e aponta a necessidade de se realizarem avaliações urológicas adicionais ou se repetir a quantificação da RPE. Se a RPE for muito alta (p. ex., acima de 300 mL), torna-se necessário realizar checagens adicionais da função renal. Em homens, uma alta RPE implica obstrução da saída da bexiga. Todavia, em homens e mulheres fragilizados, outras causas comuns são a subatividade do detrusor da bexiga ou a hiperatividade acompanhada de comprometimento da contratilidade.31 Nestes pacientes, o esvaziamento da bexiga é prolongado ou incompleto, e a RPE pode estar elevada, sugerindo um caso de obstrução da saída da bexiga – um problema improvável em mulheres. Quando a causa de incontinência não é evidente, considera-se a realização de estudos urodinâmicos adicionais por especialistas em urologia (a terminologia de urodinâmica está disponível em: www.sghurol.demon.co.uk/urod/ics.htm). A cistometria ambulatorial consegue determinar a capacidade de enchimento da bexiga, a complacência e a contratilidade do detrusor da bexiga, bem como a RPE. Talvez seja necessário realizar uma avaliação urodinâmica detalhada completa para determinar a causa e o tratamento mais adequados para a incontinência, em particular antes da instituição de tratamentos cirúrgicos para essa condição. Os estudos de urodinâmica são essenciais para se estabelecer um diagnóstico definitivo de obstrução urinária ou hiperatividade do detrusor da bexiga acompanhada de comprometimento da contratilidade, bem como para determinar o tipo de incontinência de esforço. Para a maioria dos pacientes idosos, testes de cabeceira simples e questionários conduzem às causas mais prováveis da incontinência.

 

Tratamento

Para mulheres atendidas em ambulatório, o tratamento da incontinência urinária envolve intervenções comportamentais, tratamento de comorbidade, intervenções no estilo de vida e tratamento farmacológico da incontinência de urgência.32 As estratégias empregadas para tratar a incontinência urinária também incluem a instrução do paciente e do prestador de assistência, o aprimoramento da mobilidade, procedimentos cirúrgicos e a instalação de cateter e suprimentos para incontinência [Tabela 4]. O início agudo da incontinência deve ser avaliado e tratado sem demora. ITU, retenção urinária aguda, impactação fecal e efeitos adversos de medicamentos (p. ex., diuréticos) devem ser excluídos. Após a avaliação diagnóstica inicial, a maioria dos pacientes deve ser tratada com base no tipo mais provável de incontinência. Esta abordagem empírica conduz ao tratamento bem-sucedido de um amplo percentual de pacientes com incontinência.

 

Incontinência de esforço

Terapias comportamentais (p. ex., biofeedback anorretal, que ajuda os pacientes a identificarem os músculos do assoalho pélvico para poderem relaxá-los de maneira seletiva), treinamento da bexiga e exercícios para a musculatura pélvica são formas de tratamento de primeira linha efetivas para mulheres que apresentam incontinência de esforço comprovada.32 O biofeedback também reduz os sintomas psicológicos e as despesas associadas à incontinência de urgência.33 A prática diária de exercícios para o assoalho pélvico fortalece os músculos perivaginais e periuretrais voluntários, aumenta a pressão uretral e inibe o vazamento urinário. Uma revisão sistemática de 96 estudos controlados de mulheres com incontinência urinária revelou que o treinamento da musculatura do assoalho pélvico aliado ao treinamento da bexiga promoveu a resolução da incontinência, em comparação com o tratamento habitual (diferença de risco agrupada igual a 0,13).34 Admite-se que a prática de exercícios para a musculatura do assoalho pélvico aumenta a resistência uretral ao intensificar a força e a resistência dos músculos periuretral e perivaginal, bem como ao melhorar a sustentação anatômica do colo da bexiga e da uretra proximal. Os pacientes podem receber instruções para realizar o treinamento da bexiga durante as idas ao consultório (ver www.geronet.ucla.edu/centers/acove/patient_education/Bladder_Retraining.doc).

Os exercícios para a musculatura pélvica consistem no tensionamento dos músculos perivaginais e do esfincter anal, como se a pessoa estivesse tentando controlar a micção ou a defecação, ao mesmo tempo em que aplica uma contração mínima no abdome, nas nádegas ou nos músculos internos da coxa. Tipicamente, os exercícios para o assoalho pélvico são realizados a intervalos de 10 segundos, várias vezes ao dia, durante um período de pelo menos 8 semanas –mais frequentemente por tempo indefinido. Outra técnica utilizada para exercitar os músculos pélvicos consiste em interromper o esvaziamento a meio jato, contraindo o esfincter urinário ao mesmo tempo em que os demais músculos permanecem relaxados. A efetividade desses exercícios depende da adesão do paciente e talvez demore várias semanas para que os benefícios sejam notados. Nos casos brandos de incontinência de esforço, a elevação da uretra com auxílio de um pessário de espuma costuma ser o bastante. Os medicamentos exercem um papel modesto no tratamento da incontinência de esforço e não são recomendados para mulheres idosas.

As opções de tratamento cirúrgico para casos de hipermobilidade uretral incluem a ressuspensão do colo da bexiga (colpossuspensão) ou a implantação de tipoias (slings) pubovaginais.35 A colpossuspensão envolve a produção de uma incisão cirúrgica e o levantamento dos tecidos pélvicos localizados atrás dos ossos púbicos anteriores. Hoje em dia, é comum realizar-se uma abordagem abdominal empregando laparoscopia como técnica minimamente invasiva associada a baixa morbidade. As tipoias vaginais suburetrais utilizam uma fáscia ou uma malha de polipropileno e atualmente constituem a abordagem-padrão das cirurgias corretivas de incontinência de esforço em mulheres.29 O procedimento da fita vaginal livre de tensão é considerado o mais bem estabelecido tipo de tipoia cirúrgica. Taxas de cura da ordem de 80 a 90% são relatadas, contudo a efetividade a longo prazo para pacientes idosos é mais incerta.35 As tipoias vaginais e injeções periuretrais de colágeno constituem os tratamentos de escolha para pacientes com DIE. A melhora ou resolução da incontinência é relatada para até 90% das mulheres, após a realização do procedimento. Entretanto, uma revisão sistemática revelou que os estudos conduzidos até o momento são relativamente pequenos e apresentam intervalos de confiança amplos em torno das estimativas de ponto, que dão margem a incertezas quanto ao agente ideal e à frequência das injeções.36

Em homens idosos, a incontinência de esforço é geralmente causada por uma DIE resultante de um traumatismo na área da saída da bexiga, que muitas vezes é secundária à prostatectomia. A incontinência de esforço pode ser tratada com injeções periuretrais ou por meio da instalação de um esfincter artificial. As taxas de sucesso do tratamento à base de colágeno são menos impressionantes nos homens do que nas mulheres. No entanto, taxas de continência bastante altas foram descritas em homens implantados com esfincteres artificiais (em especial, os modelos de esfincter com manguito duplo) para tratamento da incontinência pós-prostatectomia.33

 

Incontinência de urgência

Mulheres idosas com instabilidade de detrusor da bexiga e incontinência de urgência frequentemente respondem a terapias comportamentais, como o treinamento da bexiga (isto é, uma combinação de instrução do paciente, esvaziamento programado, técnicas de supressão da urgência e exercícios para a musculatura pélvica).29 Foi demonstrado que o biofeedback funciona bem para mulheres mais jovens e cognitivamente intactas. Acredita-se que o treinamento da bexiga melhore a inibição cortical sobre o funcionamento do trato urinário inferior, de modo que esse método tem sido o de escolha no tratamento da incontinência de urgência. Pacientes com comprometimento cognitivo também são beneficiados pelo treinamento da bexiga com toalete programada (p. ex., a intervalos de 2 horas no início e progredindo para intervalos de 3 a 4 horas) e pelo esvaziamento induzido, em que o prestador de assistência faz a toalete. Entretanto, esta abordagem não é interessante em termos de custo-benefício e requer um grau considerável de comprometimento por parte dos prestadores de assistência, que nem sempre pode ser conseguido.

 

Medicações antimuscarínicas

As medicações antimuscarínicas (anticolinérgicas) são efetivas na redução da frequência da bexiga hiperativa e da incontinência de urgência.34,35 Os agentes mais bem estabelecidos para o tratamento são a oxibutinina e a tolterodina. A oxibutinina possui ação de curta duração e costuma produzir efeitos colaterais anticolinérgicos significativos (constipação, boca seca e exacerbação do glaucoma). Uma preparação da oxibutinina de ação prolongada aumenta a complacência e reduz a incidência de efeitos colaterais anticolinérgicos.34 A tolterodina é disponibilizada em ambas as formas, de ação de curta duração e de ação prolongada.35 Em mulheres com bexiga hiperativa, a comparação direta das preparações de liberação estendida de oxibutidina e tolterodina revelou a ocorrência de diminuições similares do número de episódios de incontinência, com apenas diferenças mínimas em termos de efeitos colaterais.36 Agentes antimuscarínicos mais novos parecem apresentar maior seletividade para o subtipo M3 dos receptores do músculo detrusor da bexiga, em comparação aos agentes mais antigos. Talvez essa propriedade reduza os riscos de desenvolvimento de efeitos anticolinérgicos sobre o sistema nervoso central. Embora faltem estudos comparativos definitivos, estudos pequenos demonstraram que a oxibutinina produz efeitos colaterais sutis, porém significativamente maiores do aqueles produzidos pelos agentes mais modernos, como a darifenacina.37 Todos esses agentes antimuscarínicos estão associados ao risco de produção de efeitos colaterais significativos, em especial boca seca e constipação. Uma preocupação em particular diz respeito ao risco de esses compostos produzirem interações fármaco-fármaco relacionadas às interações envolvendo o citocromo P-450 (o trospium constitui a exceção) ou interações com inibidores de colinesterase (p. ex., donepezil) utilizados no tratamento da doença de Alzheimer. Devido aos efeitos colaterais anticolinérgicos, estes agentes devem ser utilizados com cautela (se forem utilizados) e em doses menores que as geralmente administradas em pacientes com comprometimento cognitivo.

As intervenções no estilo de vida, comportamentais e ambientais com frequência são inefetivas para o tratamento da incontinência de urgência. A redução da ingesta de líquidos durante a noite para evitar a urgência noturna, a execução da toalete antes e após sair de casa para comparecer a um compromisso e o atraso de uma dose de diurético de alça até a volta para casa ou até pouco antes da toalete são alguns exemplos simples de como prevenir um episódio de incontinência. Os dispositivos que permitem o esvaziamento continente, entre os quais o urinol e a comadre, podem ajudar o paciente fisicamente comprometido a alcançar a continência. Outros dispositivos auxiliares para esses pacientes são bengalas, andadores ou cadeiras de rodas, no caso de pacientes com comprometimento de deambulação ou quando a cadeira assento sanitário é muito alta. Contenções físicas ou químicas devem ser evitadas para pacientes vulneráveis, pois prejudicam sua habilidade de realizar a toalete ou de utilizar algum aparelho capacitador. Pacientes com incontinência intratável são beneficiados pelo uso de roupas íntimas absorventes, fralda para adultos e dispositivos de coleta externa.

 

Incontinência combinada de esforço e de urgência

Como as formas mistas de incontinência urinária são comuns em mulheres, as pacientes podem ser beneficiadas por alterações no estilo de vida, terapias comportamentais e medicações. Em uma revisão sistemática, constatou-se que o treinamento da bexiga, a prática de exercícios para a musculatura pélvica realizada em casa e as terapias à base de agentes antimuscarínicos isoladamente ou em combinação são efetivos para o tratamento da incontinência mista.34 Em contraste, antagonistas adrenérgicos e estrogênios transdérmicos ou vaginais não foram consistentemente efetivos.34 O biofeedback mostrou-se efetivo em estudos de curta duração envolvendo mulheres não fragilizadas, contudo seus benefícios a longo prazo permanecem desconhecidos.38 O uso de um esquema de toalete também pode ser efetivo quando combinado a abordagens comportamentais e farmacológicas. As pacientes devem ser incentivadas a urinar a intervalos regulares e antes da prática de esforço físico. Assim como no tratamento da incontinência de esforço, cones vaginais, dispositivos eletrônicos, pessários ou dispositivos de elevação (p. ex., procedimentos de tipoia cirúrgica) podem ser úteis para casos individuais de pacientes com incontinência mista, ainda que sua efetividade a longo prazo não esteja estabelecida.39

 

Incontinência por transbordamento

A incontinência por transbordamento ocorre quando há obstrução da saída da bexiga ou se a bexiga estiver subativa (acontrátil). A retenção urinária aguda é causa comum de incontinência por transbordamento entre pacientes idosos hospitalizados. Com frequência, é precipitada por medicamentos (p. ex., fármacos anticolinérgicos que reduzem a contratilidade do detrusor da bexiga), anestesia ou manipulação uretral, e pode ser tratada via cateterização uretral intermitente até que o evento precipitador agudo seja eliminado. A causa mais comum de obstrução da saída da bexiga em homens é a hiperplasia da próstata, enquanto as causas menos comuns são carcinomas e estreitamentos da uretra. Pacientes com incontinência urinária resultante de obstrução da saída da bexiga necessitam de correção cirúrgica ou de cateterização intermitente. Uma avaliação urológica é indicada para homens com incontinência por transbordamento. Ocasionalmente, homens com hiperplasia de próstata respondem aos antagonistas alfa-adrenérgicos e, como resultado, pode haver redução do tônus do esfincter interno. Nas mulheres, a incontinência por transbordamento ocorre como complicação de cirurgias anti-incontinência ou do prolapso severo de um órgão. Uma bexiga subativa ou acontrátil pode ser secundária a doenças neurológicas, como a neuropatia diabética, lesão da medula espinhal e subatividade idiopática do detrusor da bexiga.

A autocateterização intermitente é ideal para pacientes com bexiga atônica ou neurogênica. Na maioria das vezes, a sondagem vesical de demora é reservada para pacientes com retenção urinária crônica que não pode ser corrigida por cirurgia ou com medicamentos, nem tratada via cateterização intermitente, com frequência devido ao desconforto ou a uma doença terminal.38 Cateteres externos (preservativo) para homens são utilizados de maneira seletiva, pois muitas vezes falham e podem levar ao desenvolvimento de infecção cutânea ou ITU.

 

Incontinência funcional

Pacientes com doenças neuropsiquiátricas podem apresentar incontinência funcional na ausência de doença da bexiga. Pacientes imobilizados podem apresentar incontinência quando ficam incapacitados de ir ao banheiro em decorrência de uma doença física, contenções ou barreiras ambientais. Se a retenção urinária por transbordamento tiver sido excluída, o tratamento de pacientes com incontinência funcional pode ser feito por meio de exercícios, esquemas de toalete e dispositivos auxiliares que ampliam a habilidade de realizar a toalete.

 

Incontinência fecal

A incontinência fecal consiste na passagem descontrolada de material fecal, de maneira contínua ou recorrente, por um período mínimo de 1 mês. As formas aguda e crônica de incontinência fecal são comumente observadas entre pacientes idosos que apresentam condições de comorbidade e muitas vezes representam um problema incapacitante e socialmente constrangedor. Apesar de seus efeitos adversos sobre os pacientes, a incontinência fecal por vezes é ignorada por pacientes idosos e pelos médicos.

 

Epidemiologia

A prevalência de incontinência fecal aumenta com a idade. Entre as pessoas que residem em comunidade, a prevalência da incontinência fecal na população de mulheres chega a ser de 15% entre as mulheres idosas. Na população masculina, essa prevalência é de 10%.40 A prevalência é de aproximadamente 50% entre os pacientes sob assistência de longa duração.41 A incontinência fecal está fortemente associada à incontinência urinária e à constipação (ou seja, a evacuação infrequente de fezes duras ou difíceis de eliminar).

 

Fatores de risco e etiologia

A incontinência fecal é mais frequentemente um resultado da impactação fecal causada pela constipação ou por uma disfunção dos esfincteres anorretais internos ou externos.42 Os fatores que contribuem para o risco de incontinência fecal são a desorganização da integridade muscular, a diminuição da complacência ou da sensibilidade retal, o declínio da função mental e a perda da motilidade física.43 As causas comuns de constipação incluem uma dieta pobre em fibras e líquidos, desidratação, imobilidade e medicamentos.44

 

Fisiopatologia

O processo de defecação normal requer a integridade da musculatura esquelética e estriada envolvida na função do esfincter anal, além de consciência cognitiva e capacidade de ir ao banheiro, bem como funcionamento normal dos nervos e músculos do assoalho pélvico.43 Uma ruptura de qualquer uma dessas conexões predispõe à incontinência. Os fatores fisiológicos que comumente contribuem para a incontinência são: traumatismo retal, lesão do nervo pudendo, neuropatias autonômicas, prolapso retal, dietas hiperosmolares e impactação fecal.44 Esta última é observada com mais frequência nos cólons distal ou retossigmoide. Muco e líquidos são secretados próximo ao local onde ocorre impactação e vazam ao redor da massa ou são evacuados por meio de desimpactação terapêutica. A incontinência fecal pode ser classificada como “passiva”, “de urgência” ou “vazamento fecal”. Pacientes com incontinência passiva queixam-se do vazamento inconsciente de pequenas quantidades de fezes líquidas ou sólidas. Esses pacientes podem não perceber o vazamento até sentirem a umidade, o prurido ou até notarem manchas nas roupas de baixo. A incontinência passiva muitas vezes se manifesta em mulheres idosas que tiveram múltiplos partos normais ou que sofreram traumatismo obstétrico com consequente perda do tônus do esfincter externo. A incontinência passiva também pode resultar de condições de “transbordamento”, ou seja, vazamento de fezes líquidas subsequente à obstrução por um câncer ou à impactação fecal. Pacientes com incontinência de urgência apresentam uma urgência frequente em defecar, que é acompanhada da evacuação de pequenas quantidades de fezes liquefeitas com ou sem muco ou sangue. A incontinência de urgência em geral implica na perda da complacência retal que, por sua vez, ocorre em casos de colite inflamatória, infecciosa ou induzida por radioterapia. Pacientes com constipação crônica e confinados ao leito podem desenvolver úlceras retais estercorais, com consequente perda da complacência retal.43 As medicações, em especial os opiáceos e agentes anticolinérgicos, são causas comuns de constipação, impactação e incontinência. A incontinência fecal aguda pode ser observada em estados diarreicos, enquanto a incontinência intermitente muitas vezes é observada em pacientes com demência, delirium, desnervação do assoalho pélvico ou que usam laxantes em excesso.44 Pacientes com vazamento fecal queixam-se do vazamento de fezes subsequente à movimentação intestinal que, a não ser por isso, seria normal. Isso geralmente sugere que o indivíduo apresenta evacuação incompleta e falta de sensibilidade retal.

 

Avaliação diagnóstica

História médica e exame físico

A avaliação da incontinência fecal inclui uma cuidadosa revisão da condição das funções cognitivas do paciente, bem como de suas funções anorretal e neurológica, além de um exame retal. A existência de sensibilidade abdominal, distensão abdominal ou distensão gasosa pode apontar impactação fecal. Um exame retal cuidadoso começa pela inspeção visual em busca de irritações cutâneas, presença de material fecal, prolapso retal ou hemorroidas em prolapso. O exame digital permite determinar o tônus dos esfincteres interno e externo. Em alguns casos, o exame retal pode detectar defeitos estruturais (p. ex., massa retal) que podem estar contribuindo para uma incontinência de fluxo contínuo. A presença de fezes duras na abóbada retal pode sugerir impactação fecal. Entretanto, um exame retal negativo não exclui a possibilidade de impactação fecal proximal.43 No caso de pacientes hospitalizados ou institucionalizados, o diagnóstico de impactação fecal é sugerido pela eliminação de fezes aquosas contendo muco. Esta suspeita é confirmada pelo exame retal, que geralmente revela a presença de fezes firmes ou endurecidas na ampola, muitas vezes associadas a um reto dilatado. Diante de impactações mais altas, as fezes podem ser palpáveis durante o exame abdominal ou sua presença é confirmada pela radiografia abdominal. A avaliação do estado mental identifica pacientes com demência ou delirium, que perderam a capacidade de ir ao banheiro sozinho. A ausência do tônus no esfincter anal ou do reflexo anal pode sugerir um caso de desnervação do nervo pudendo (S2-4), resultante de uma lesão local ou na medula espinhal. Os exames retais e abdominais também ajudam a identificar doenças inflamatórias ou tumores como causas de incontinência.

 

Testes laboratoriais

É útil obter uma radiografia abdominal quando há suspeita de impactação fecal. O início agudo da incontinência passiva deve conduzir à imediata obtenção de imagens da coluna espinhal, a fim de excluir uma possível compressão de medula. No caso de alguns pacientes seletos, porém raramente entre pacientes frágeis ou confinados ao leito, um diagnóstico preciso pode ser sugerido por rigorosa avaliação estrutural e funcional do esfincter anal acompanhada de manometria anorretal, ultrassonografia anal, defecografia, estudos de latência do nervo pudendo ou análise de imagem de ressonância magnética.42,43

 

Prevenção e tratamento

O tratamento da impactação fecal inclui a realização de desimpactação, lavagem intestinal modificação dos fatores de risco e instituição de um regime de manutenção efetivo [Tabela 5]. A desimpactação pode ser realizada manualmente ou por enemas, durante 2 a 3 dias. Após a desimpactação, uma solução de lavagem intestinal deve ser administrada pela boca com o intuito de desimpactar o cólon proximal. O polietilenoglicol é relativamente seguro e efetivo para uso na limpeza do cólon. Volumes de 1 a 2 L podem ser suficientes para o tratamento da impactação fecal. O uso de soluções contendo eletrólitos, como citrato de magnésio e Fleet Phospho-Soda®, deve ser evitado para pacientes com doença renal ou cardíaca subjacente. Após a desimpactação do cólon, procura-se prevenir a recorrência da impactação pela modificação dos fatores de risco, que inclui aumentar a mobilização, garantir hidratação e nutrição adequadas e minimizar o uso de medicações que provoquem constipação. A ritualização dos hábitos intestinais também pode melhorar a incidência da impactação em pacientes com demência. Embora seja contraindicada para casos de impactação aguda, a suplementação com fibras pode ser útil após a desimpactação, para regular os hábitos intestinais e prevenir a constipação. Alguns pacientes necessitam de manutenção com lavagens intestinais semanais utilizando agentes osmóticos.43 O papel da dieta na prevenção da impactação é incerto e por vezes não reduz a necessidade de lavagens de cólon para prevenir a impactação. O uso intermitente de supositórios de glicerina ou bisacodil é justificado para os casos em que o retardo da saída do retossigmoide ou a dificuldade de evacuação de fezes amolecidas representam as principais preocupações. Pacientes incapazes de reter um supositório podem ser tratados com enemas periódicos ou soluções hiperosmolares, como polietileno glicol ou lactulose.

 

Tabela 5. Incontinência fecal: prevenção e tratamento

Plano

Intervenção

Exemplo

Prevenção da constipação

Atividade física

Exercícios aeróbicos (p. ex., caminhada, exercícios aeróbicos na água)

Dieta rica em fibras (8 a 12 g/dia)* (para induzir efeitos de aumento do volume e alterar a ecologia microbiana) acrescida da ingesta de líquidos

Vegetais ricos em fibras, suplementos à base de farelo de cereais; suplementos à base de fibras solúveis: metilcelulose, psílio, guar

Laxantes (quando as fibras são ineficazes ou não toleradas)

Polietileno glicol ou lactulose (agentes hiperosmolares); laxantes irritantes (para pacientes que não toleram agentes osmolares): bisacodil, sene; enemas (para pacientes com disfunção de cólon)

Evitar o uso de medicamentos que causem constipação ou usá-los de maneira judiciosa

Agentes anticolinérgicos: antiespasmódicos, fármacos antiparkinsonianos, antidepressivos tricíclicos, neurolépticos, suplementação de ferro, opiáceos, bloqueadores de canais de cálcio (verapamil)

Tratamento da incontinência fecal

Tratamento da impactação fecal

Enemas: salina, água, fosfato de sódio, óleo mineral; irrigação de cólon; dieta rica em fibras (após a desimpactação); laxantes hiperosmolares orais

Tratamento de colite (p. ex., em consequência de radioterapia, enteropatia inflamatória)

Médico: suplementos à base de fibras solúveis, opioides (p. ex., loperamida)

Modificação do comportamento

Biofeedback (pacientes motivados e com capacidade cognitiva intacta), esquema de toalete para pacientes com comprometimento físico ou cognitivo

Tratamento de anomalias anatômicas

Reparo cirúrgico de prolapso retal ou do esfincter anal

*Evitar o consumo de fibras até a resolução da impactação fecal.

Com frequência, é necessário adotar uma combinação de fibras, agentes hiperosmolares e enemas periódicos para prevenir a impactação em pacientes acamados e naqueles com disfunção de cólon crônica (p. ex., uso de laxante, doença diverticular).

 

Quedas e distúrbios da marcha

Quedas acidentais – definidas como ir involuntariamente de encontro ao solo, piso ou outros níveis mais baixos – são causas comuns e potencialmente evitáveis de morbidade e mortalidade entre idosos. Estão bem estabelecidos os fatores de risco e a efetividade das intervenções multifatoriais cuidadosamente dirigidas aos pacientes idosos para prevenção de quedas recorrentes.45

 

Epidemiologia

A cada ano, quedas não intencionais ocorrem em cerca de 30% dos indivíduos da comunidade com mais de 65 anos de idade e em aproximadamente 50% dos indivíduos com 80 anos de idade ou mais. Cerca da metade dos indivíduos vitimados por quedas sofreram múltiplas quedas. As quedas são responsáveis pela aquisição de lesões graves, que incluem fraturas de quadril e traumatismo de partes moles, e com frequência levam os idosos a perderem a independência funcional e a passarem a temer novas quedas. As lesões não intencionais, mais comumente atribuídas às quedas, constituem a 7ª causa mais frequente de morte entre idosos. Em 2003, quase 14.000 indivíduos com idade igual ou superior a 65 anos morreram em consequência de quedas nos Estados Unidos.46 Cerca de 5% das quedas ocorridas na população de idosos da comunidade resultam em fratura. Uma queda aumenta as chances de hospitalização, internação em casa de repouso e morte. Aproximadamente metade dos casos de queda envolvendo pacientes idosos resultam na produção de lesões em partes moles, como contusões, lacerações e abrasões. As complicações menos comuns são os hematomas subdurais e as fraturas cervicais. A maioria das fraturas de quadril que ocorrem em idosos resulta de quedas. Mais da metade dos sobreviventes de fraturas de quadril são encaminhados para casas de repouso, onde permanecem por pelo menos 1 ano em 50% dos casos. Após uma fratura de quadril, menos de 30% dos pacientes recuperam o nível de funcionamento físico que apresentavam antes da lesão. Os problemas relacionados a anomalias da marcha afetam 20 a 40% dos indivíduos com idade igual ou acima de 65 anos e 40 a 50% daqueles com 85 anos de idade ou mais.47

 

Fatores (de risco) predisponentes

Os fatores de risco intrínsecos incluem o enfraquecimento do membros inferiores, força preênsil diminuída, déficits de marcha e equilíbrio, desempenho comprometido das atividades do dia a dia, comprometimento visual, comprometimento cognitivo e depressão.45 Os fatores extrínsecos incluem o uso de 4 ou mais fármacos prescritos e a existência de obstáculos ambientais, como má iluminação, tapetes soltos e ausência de equipamento de segurança no banheiro.45 Os fatores de risco para o desenvolvimento de fraturas de quadril incluem baixa densidade mineral óssea, uso de benzodiazepínicos (p. ex., diazepam), comprometimento visual, diminuição da mobilidade e da independência física, além de disfunção cognitiva. Cerca de 1/3 das vítimas de queda desenvolvem medo de cair, o que, por si só, é preditivo de um risco aumentado de problemas de equilíbrio e marcha, declínio das habilidades de cuidar de si mesmo e risco aumentado de quedas.

Em uma revisão sistemática sobre os fatores de risco de quedas, pacientes que haviam sofrido uma queda no ano anterior apresentaram maiores chances de sofrer novas quedas, com uma razão de probabilidade na faixa de 2,3 a 2,8.48 Os preditores mais consistentes de futuras quedas são as anomalias clinicamente detectáveis de equilíbrio ou de marcha, com uma razão de probabilidade na faixa de 1,7 a 2,4.48 Nesta revisão, o comprometimento visual, as medicações, o comprometimento da execução das atividades diárias e o comprometimento cognitivo não foram considerados fatores preditivos de queda consistentes. As medicações associadas às quedas incluem, mais notavelmente, aquelas que causam hipotensão (p. ex., diuréticos de alça, vasodilatadores ou antagonistas adrenérgicos) e aquelas dotadas de propriedades psicotrópicas (p. ex., antidepressivos e agentes sedativos-hipnóticos). Em revisões sistemáticas, a associação mais consistente entre medicações e quedas envolve os agentes antidepressivos, entre os quais os inibidores da recaptação seletiva de serotonina e os antidepressivos tricíclicos, bem como os benzodiazepínicos, com razões de probabilidade para quedas acima de 2. Razões de probabilidade menores são encontradas para a maioria das outras classes de medicamentos.49

 

Etiologia

A manutenção do equilíbrio e da marcha normal requer a integração bem-sucedida entre os sistemas sensorial (aferente), nervoso central (cérebro e medula espinhal) e musculoesquelético. Uma perturbação afetando a entrada de informações sensoriais (p. ex., neuropatia periférica), o funcionamento do sistema nervoso central (p. ex., demência) ou a função motora (p. ex., artrite ou fraqueza muscular) predispõe o paciente idoso à queda. O processo de envelhecimento também pode predispor à queda ao aumentar a oscilação postural e reduzir os reflexos adaptativos. Os limites da estabilidade postural parecem diminuir com o avanço da idade. Quedas acidentais passam a ocorrer como resultado da combinação dos perigos ambientais com o aumento da suscetibilidade a quedas associado ao envelhecimento ou a doenças. Acidentes, escorregões simples e tropeções são os agentes precipitadores de queda mais comuns na população de idosos da comunidade e geralmente estão associados à existência de perigos ambientais. No caso dos pacientes que vivem em casas de repouso, todavia, os fatores ambientais constituem a causa imediata mais comum de quedas, seguidos do enfraquecimento, de distúrbios da marcha ou do equilíbrio, de episódios de queda súbita, tontura ou vertigem e de confusão. Causas menos comuns de queda são a hipotensão postural, síncope [veja 1: I Abordagem do paciente cardiovascular], doença aguda (p. ex., infecção) e medicamentos. Comprometimentos da marcha acompanhados de quedas estão associados ao enfraquecimento dos membros inferiores consequente ao descondicionamento, acidente vascular cerebral, doença cardiovascular (p. ex., arritmias) e doença neurológica (p. ex., doença de Parkinson). Tontura, vertigem, delirium, hipotensão postural, distúrbios visuais, consumo de bebidas alcoólicas e medicamentos (p. ex., agentes psicotrópicos) constituem outras causas de queda.

 

Fisiopatologia

Como já se disse, a manutenção do equilíbrio e da marcha normal requer a integração bem-sucedida entre os sistemas sensorial (aferente), nervoso central (cérebro e medula espinhal) e musculoesquelético. Uma perturbação afetando a entrada de informações sensoriais (p. ex., neuropatia periférica), o funcionamento do sistema nervoso central (p. ex., demência) ou a função motora (p. ex., artrite ou fraqueza muscular) predispõe o paciente idoso à queda. O processo de envelhecimento também pode predispor à queda ao aumentar a oscilação postural e reduzir os reflexos adaptativos. Os limites da estabilidade postural parecem diminuir com o avanço da idade. Entretanto, certas alterações da marcha, como diminuição da velocidade da caminhada, diminuição do comprimento da passada e uso prolongado de suporte duplo, que, muitas vezes são atribuídas ao processo de envelhecimento, frequentemente representam adaptações do paciente ao medo de cair.

 

Rastreamento

Ao menos uma vez por ano, recomenda-se perguntar ao paciente idoso se ele(a) sofreu alguma queda. Considerando as elevadas probabilidades, recomenda-se perguntar ao paciente sobre as possíveis quedas acidentais sofridas no ano anterior. A pergunta deve ser simples, como: “Você sofreu alguma queda no ano passado?”48 Para o paciente que não sofreu nenhuma queda, pode-se perguntar se ele(a) possui problemas de equilíbrio ou marcha. Uma breve observação do equilíbrio e da marcha também permite identificar pacientes idosos que apresentam risco de cair. Um teste cronometrado de levantar-e-ir (get-up-and-go test)constitui uma medida válida e prática para avaliar o equilíbrio e a marcha. Nesse teste, o(a) paciente é solicitado(a) a se levantar a partir de uma cadeira que possua descanso para os braços, caminhar por 3 metros, virar-se, voltar até a cadeira e sentar-se. Idosos que apresentam risco de sofrer quedas podem demorar mais de 20 segundos para concluir essa tarefa. Durante o teste, o paciente pode ser observado para detecção de instabilidade postural, fraqueza de membros inferiores, diminuição da altura do passo, aumento da oscilação lateral, variabilidade da passada e ataxia. Pacientes que apresentam resultado positivo na triagem para detecção do risco de quedas podem ser submetidos a uma avaliação diagnóstica mais detalhada.

 

Avaliação diagnóstica

As causas de queda podem ser identificadas com a obtenção de uma história médica dirigida, exame físico e alguns exames laboratoriais. Uma revisão dos fatores de risco, incluindo as ameaças ambientais, medicamentos e estudo da visão, estado mental, equilíbrio e marcha ajuda na seleção em meio à miríade de possíveis causas de queda.45 Uma revisão das circunstâncias em torno da queda, incluindo os sintomas apresentados pelo paciente antes e após o evento, fornece indícios das causas prováveis. Exemplificando, a vertigem pode preceder um evento de perda de equilíbrio e queda, enquanto a perda da consciência que precede uma queda é sugestiva do diagnóstico de síncope [Tabela 6]. A avaliação diagnóstica adicional baseia-se nas circunstâncias diagnósticas em torno da queda e na consideração das causas mais prováveis. Nem sempre se justifica realizar uma extensa avaliação diagnóstica em casos de queda não associada à síncope. Entretanto, na avaliação emergencial de um idoso vítima de queda, uma história de traumatismo na cabeça ou o achado de déficits neurológicos focais sustentam a necessidade de um procedimento de neuroimagem, como uma tomografia de crânio, para excluir a possibilidade de lesão estrutural e hematoma subdural. Alguns exames laboratoriais úteis são o hemograma (para excluir anemia), um painel bioquímico (para avaliar os eletrólitos e a função renal) e, no caso de pacientes fragilizados (p. ex., residentes de casas de repouso), a quantificação dos níveis de vitamina D. A deficiência de vitamina D é comum em muitos idosos e está associada ao risco aumentado de quedas.50

 

Prevenção e tratamento

Intervenções multicomponentes

As intervenções mais consistentemente efetivas na prevenção de quedas recorrentes foram dirigidas aos fatores de risco intrínsecos e extrínsecos [Tabela 6].45 Os componentes bem-sucedidos das intervenções utilizadas nos estudos clínicos incluem a revisão e modificação das medicações, treinamento de equilíbrio e marcha, exercícios de fortalecimento muscular, melhora da hipotensão postural, modificações das ameaças domésticas e tratamentos médicos e cardiovasculares específicos.45 A efetividade das intervenções multicomponentes foi demonstrada pela primeira vez em um estudo clínico que envolveu a participação de residentes de comunidade com idade igual ou superior a 70 anos que apresentavam fatores de risco para quedas: indivíduos submetidos a intervenções que incluíram ajuste de medicações, orientação comportamental e um programa de exercícios (p. ex., exercícios de equilíbrio, treinamento de marcha e exercícios de resistência de baixa intensidade) sofreram menor número de quedas no ano seguinte, em comparação aos indivíduos do grupo controle.51 Uma metanálise sustenta a efetividade das intervenções multicomponentes na prevenção de quedas.52 Existem evidências mais fracas de uma redução da incidência de quedas e fraturas em hospitais e casas de repouso.53 Nas revisões sistemáticas de pacientes hospitalizados, as intervenções multicomponentes produziram diminuição de 18% nas taxas de incidência. As intervenções isoladas não proporcionaram nenhum benefício observável. Notavelmente, nem todos os estudos clínicos baseados na comunidade foram positivos com intervenções de baixa intensidade, incluindo as recomendações dirigidas aos médicos. Os encaminhamentos para fisioterapeutas ou outros profissionais da saúde isoladamente não diminuíram a incidência de quedas entre os idosos que viviam na comunidade.54 Estes resultados conflitantes implicam no fato de que, para as intervenções multicomponentes serem bem-sucedidas, os médicos precisam incentivar os pacientes a participarem das terapias, a continuá-las depois que tiverem se submetido ao treinamento de força e aos exercícios de equilíbrio, bem como a monitorarem de maneira conjunta sua participação e progresso em visitas subsequentes ao consultório. A educação do paciente faz parte da visita e é reforçada pelas informações prontamente disponibilizadas a eles (www.cdc.gov/ncipc/duip/preventadultfalls.htm). Os pacientes também devem receber aconselhamento sobre segurança doméstica para prevenção de quedas (www.pbs.org/hometime/house/safety/safeslip.htm). Existem algumas evidências animadoras provenientes de um estudo de base populacional de que a disseminação das evidências sobre a prevenção às quedas, aliada a intervenções para modificação da prática clínica, pode diminuir a ocorrência de lesões decorrentes de queda entre idosos.55 As intervenções incentivaram os clínicos da assistência primária e os membros das equipes envolvidas na prestação de assistência doméstica, reabilitação ambulatorial e centros para idosos a adotarem avaliações de risco e estratégias efetivas para a prevenção de quedas (p. ex., redução da medicação e treinamento de equilíbrio e marcha). Assim, os médicos são aconselhados a identificar os programas de prevenção a quedas existentes nas comunidades onde atuam, que sejam dirigidos à redução da incidência de quedas lesivas na população de idosos.

 

Tabela 6. Intervenções para diminuir o risco de quedas

Fatores de risco

Intervenções

Medicamentos

      Uso de = 4 medicamentos

      Consumo de álcool

      Uso de qualquer benzodiazepínico ou outro agente sedativo-hipnótico

      Vasodilatadores (arteriais e venosos)

     Revisar as medicações e diminuir, afunilar ou suspender o uso de álcool e agentes psicotrópicos (benzodiazepínicos e sedativos-hipnóticos)

     Adotar terapia não farmacológica para distúrbios do sono (restrição do sono, acabar com os cochilos durante o dia, instituir a prática de exercícios aeróbicos de manhã cedo, utilizar técnicas de relaxamento, como música e massagem)

     Adotar alternativas ao uso de vasodilatadores (betabloqueadores e bloqueadores de canais de cálcio)

Hipotensão postural

      Queda da pressão sistólica = 20 mm Hg

      Tontura postural ou vertigem

     Alterar a dosagem das medicações (p. ex., diuréticos de alça, vasodilatadores, antagonistas adrenérgicos)

     Em situação de síncope ou pré-síncope, considerar work-up para investigação do sistema nervoso autônomo ou de causas hemodinâmicas

     Havendo acúmulo venoso nas pernas, experimentar uso de bombas para perna, repleção de sal, elevação da perna ou meias de compressão graduada

Enfraquecimento dos membros inferiores

     Diminuição generalizada da força dos músculos quadríceps, flexores ou extensores do joelho

     Descondicionamento resultante de doença recente, hospitalização ou imobilidade

     Exercícios resistidos de baixa intensidade (faixas, canos, molas ou pesos) sob supervisão do terapeuta

     Exercícios aeróbios (caminhada, ciclismo ou exercícios aquáticos)

Deficiência de vitamina D

Suplementação com 800 UI/dia de vitamina D

Comprometimento do equilíbrio/marcha

     Instabilidade postural

     Incapacidade de realizar transferências seguras para a banheira ou de realizar a toalete

     Marcha antálgica

     Medo de cair

     Consulta ao fisioterapeuta para avaliação da marcha

     Prescrição de dispositivos auxiliares (bengalas, andadores)

     Treinamento das habilidades de transferência

     Treinamento da marcha e exercícios para equilíbrio (p. ex., tai chi)

     Analgésicos para alívio da dor

     Alterações ambientais (assentos de privada altos, cômodas, barras de segurar e corrimãos)

Comprometimentos sensoriais

     Audição

     Visão

         Dispositivos auxiliares auditivos (microfones com ajuste de cabeça, diminuição do barulho de fundo)

         Dispositivos auxiliares visuais (lentes corretivas, melhorar a iluminação do quarto)

Ameaças ambientais

     Superfícies irregulares

     Tapetes desgastados

     Fios elétricos soltos

     Iluminação fraca

     Degraus ou escadarias irregulares

     Consulta ao terapeuta ocupacional (visita doméstica, avaliação da segurança)

     Iluminação difusa dos quartos

     Instalação de corrimãos e barras de segurar

     Revestir pisos escorregadios

     Instalar rampas

     Reposicionar os móveis

     Remover tapetes e fios elétricos desgastados

 

Intervenções de componente único

Exercícios de tai chi. Os exercícios de tai chi aumentam o equilíbrio e a consciência corporal e, ao serem combinados ao treinamento de equilíbrio, também podem diminuir a taxa de quedas. Um estudo randomizado, em que exercícios de tai chi foram praticados ao longo de 15 semanas por 200 indivíduos com 70 anos de idade ou mais, detectou redução de 47% na incidência de quedas após 4 meses de seguimento.56 Um programa de tai chi com duração de 6 meses, em que os exercícios eram praticados 3 vezes/semana, quando comparado à prática de exercícios de alongamento isolados, mostrou-se efetivo na diminuição de 50% do número de quedas, do risco de quedas e do medo de cair, além de ter melhorado o equilíbrio funcional e o desempenho físico de indivíduos fisicamente inativos com idade igual ou acima de 70 anos.57 As aulas de tai chi são amplamente oferecidas nas comunidades urbanas. Existem livros e vídeos para idosos disponíveis no mercado. Assim como as demais intervenções voltadas para a prevenção de quedas, não foi demonstrado que o tai chi é efetivo em casos de pacientes com comprometimento cognitivo.

 

Exercícios de resistência. Estudos clínicos demonstraram a efetividade dos exercícios de resistência, tanto de baixa intensidade como de intensidade progressivamente alta, na promoção da melhora da força nos membros inferiores de pacientes idosos. Faixas, canos, molas e aparelhos de carga têm sido utilizados sob supervisão do terapeuta em vários estudos. Entretanto, a efetividade dos exercícios de resistência progressiva sobre o equilíbrio ou a incidência de quedas como intervenção única ainda não foi estabelecida em revisões sistemáticas.58

 

Suplementação com vitamina D

A suplementação com 800 UI/dia de vitamina D diminui o risco de quedas e fraturas na população idosa.50,59 A dose ou preparação ideal de vitamina D ainda precisa ser estabelecida, contudo, segundo as revisões sistemáticas já realizadas, uma dose de 800 UI/dia é mais efetiva do uma dose de 400 UI/dia na prevenção de fraturas.59 Casas de repouso cujos residentes receberam 800 UI/dia de vitamina D apresentaram números menores de vítimas de queda e taxas mais baixas de incidência de quedas, em comparação com idosos tratados com doses menores de suplementação.60

 

Prevenção de fraturas de quadril causadas por quedas

Estudos iniciais constataram que o uso de protetores de quadril diminuiu o risco de fraturas de quadril entre residentes de casas de repouso.61 Estudos mais recentes, todavia, colocaram em dúvida a efetividade dos protetores de quadril na prevenção das fraturas de quadril.62 Não há evidências de que esses dispositivos evitem quedas. A incerteza com relação aos benefícios proporcionados pelo uso dos protetores de quadril reflete, em parte, o baixo nível de aderência ao uso desses dispositivos, bem como as diferenças de eficácia apresentadas pelas diversas marcas comerciais disponíveis no mercado.62

 

Abordagem clínica recomendada para tratamento da queda

Os médicos clínicos que avaliam pacientes idosos com história de quedas devem iniciar a abordagem com uma discussão sobre as circunstâncias em que as quedas aconteceram e determinar se estavam ou não associadas à síncope. Se as quedas não apresentaram associação com eventos de síncope, a etapa seguinte consiste em revisar a medicação do paciente, realizar um teste de mobilidade (p. ex., levantar-e-ir cronometrado) e avaliar os músculos e articulações do paciente (especialmente os joelhos, quadril e tornozelos) quanto à amplitude de movimentos, força e estabilidade. Se as causas das quedas forem obscuras e os episódios de queda tiverem ocorrido em casa, o clínico deve considerar uma solicitação de avaliação da segurança doméstica feita por um terapeuta ocupacional. No caso de pacientes com enfraquecimento dos membros inferiores, recomenda-se o encaminhamento do paciente a um fisioterapeuta para avaliação da marcha, fortalecimento da musculatura dos membros e prática de exercícios de equilíbrio. O encaminhamento deve ser acompanhado de uma solicitação de avaliação da marcha e de exercícios de resistência de baixa intensidade para os membros inferiores, incluindo os extensores do quadril e do joelho. O clínico deve, ainda, tratar as condições de comorbidade que aumentam o risco de quedas com lesões, notavelmente a osteoporose, intoxicação farmacológica e peso abaixo do indicado. Pacientes idosos devem receber uma prescrição de suplementação adequada de cálcio e vitamina D. Qualquer plano de tratamento deve ser reforçado nas visitas subsequentes ao consultório. Em qualquer cenário, pacientes idosos são incentivados a se movimentarem tanto quanto possível, a fim de diminuir o risco de quedas por descondicionamento.

 

Úlceras de pressão

Uma úlcera de pressão consiste em uma lesão localizada na pele e/ou tecido subjacente, em geral sobre uma proeminência óssea, como resultado de pressão ou de uma combinação de pressão e cisalhamento e/ou atrito.63 Uma úlcera de pressão ocorre diante da compressão de tecido mole entre uma proeminência óssea e a superfície externa durante um período contínuo. O National Pressure Ulcer Advisory Panel redefiniu as úlceras de pressão e os estágios de uma úlcera de pressão, incluindo os quatro estágios originais e mais dois estágios adicionais, de lesão tecidual profunda e úlceras de pressão não passíveis de estadiamento (www.npuap.org/pr2.htm):

 

      Estágio I: pele intacta apresentando vermelhidão que não clareia (persistente) em uma área localizada, em geral sobre uma proeminência óssea.

      Estágio II: perda parcial da espessura da derme, que se manifesta como uma úlcera aberta e rasa, com um leito de ferida avermelhado e sem crosta.

      Estágio III: perda de toda a espessura tecidual (extensão para dentro dos tecidos subcutâneos até a fáscia profunda, com ou sem escavação).

      Estágio IV: perda de toda a espessura tecidual, com exposição de osso, tendão ou músculo.

 

A lesão tecidual profunda aparece como uma área localizada de pele descolorada e intacta, de tonalidade marrom ou púrpura, ou como uma bolha cheia de sangue, sendo causada pelo dano ao tecido mole subjacente por ação de pressão e/ou cisalhamento. Uma úlcera não passível de estadiamento consiste na perda de toda a espessura tecidual, em que a base da úlcera é coberta por uma crosta (amarela, marrom-claro, cinza, verde ou marrom) formada no leito da ferida (www.npuap.org/pr2.htm). Essas úlceras não podem ser estadiadas antes da remoção de uma quantidade de crosta e/ou escara que seja suficiente para expor a base da ferida.

As úlceras de pressão resultam em substancial morbidade, aumento das despesas com assistência de saúde e diminuição da qualidade de vida para pacientes idosos.64 São comuns em pacientes imobilizados, e sua incidência aumenta com o envelhecimento. As úlceras em estágio inicial podem ser identificadas e tratadas de maneira agressiva, a fim de se prevenir sua evolução para os estágios mais graves.

 

Epidemiologia

As taxas de incidência foram estimadas em 0,4 a 38% nos hospitais, 2,2 a 23,9% na assistência de longa duração e 0 a 17% na assistência doméstica. Em idosos, as úlceras de pressão também foram associadas a taxas de mortalidade aumentadas.65 Cerca de 80% das úlceras de pressão observadas em residentes de casas de repouso se desenvolvem sobre a região do sacro ou do cóccix, quadril (trocanter femoral), ísquio e calcanhares.

 

Fatores de risco e etiologia

A maioria dos estudos prospectivos sobre úlceras de pressão de estágios II, III ou IV em pacientes hospitalizados implicou o comprometimento da mobilidade, incontinência, subnutrição e comprometimento da consciência como fatores de risco significativos para o desenvolvimento de úlceras de pressão. No caso de pacientes hospitalizados confinados ao leito ou à cadeira de rodas, os fatores de risco incluem hipoalbuminemia, incontinência fecal e fraturas. Em geral, o comprometimento da mobilidade constitui o fator de risco mais importante para o desenvolvimento de úlceras de pressão. As condições médicas que interferem na perfusão vascular da pele e dos tecidos adjacentes, como doença arterial periférica, diabetes melito, insuficiência renal e desnutrição, contribuem para o risco de desenvolvimento de úlceras de pressão, bem como para a má cicatrização das feridas.66

 

Fisiopatologia

Como se observa em outras síndromes geriátricas, tanto fatores intrínsecos (predisponentes) como extrínsecos estão envolvidos na fisiopatologia das úlceras de pressão de maneira complexa.66 A imobilidade, quando atribuível a catástrofes neurológicas, traumatismo com lesão de medula óssea ou fratura de quadril, predispõe ao desenvolvimento de úlceras de pressão. Quatro fatores extrínsecos foram implicados na patogênese das úlceras de pressão: pressão, forças de cisalhamento, atrito e umidade. A ação contínua da pressão sobre áreas de proeminência óssea (p. ex., por mais de 2 horas) ou de uma pressão intensa de duração ainda menor resulta em dano isquêmico aos músculos e tecidos subcutâneos.67 As forças de cisalhamento são forças tangenciais que diminuem a quantidade de pressão requerida para causar danos à epiderme. As forças de cisalhamento ocorrem, por exemplo, diante da mudança da posição do paciente no leito, com o paciente sendo arrastado sobre os lençóis subjacentes. Exposições repetitivas à pressão causam necrose cutânea pela ação de pressões menos intensas. A perda de tecido subcutâneo também diminui o limiar de ruptura da pele em decorrência da ação da pressão. O atrito constitui a força que resulta em abrasão da pele quando, por exemplo, um paciente é arrastado sobre os lençóis no leito. A umidade secundária à incontinência ou à transpiração pode resultar em maceração da pele, predispondo ao desenvolvimento de úlceras de pressão. O envelhecimento da pele predispõe ao desenvolvimento de úlceras de pressão: a pele torna-se mais suscetível à ação das forças de cisalhamento, é menos vascularizada e, em pacientes desnutridos, apresenta menos gordura subcutânea. Além disso, pacientes cujo estado cognitivo esteja comprometido, pacentes deprimidos ou com lesão de medula espinhal são propensos à imobilização ou incapazes de relatar sintomas de dor e desconforto, e isso consequentemente atrasa a detecção da úlcera.

 

Avaliação diagnóstica

Embora as úlceras em estágio I não sejam ulcerações verdadeiras, sua identificação e tratamento precoces são críticos para evitar a progressão para os estágios II, III ou IV. Um estudo clínico de pacientes hospitalizados demonstrou que a progressão das úlceras de pressão em estágio I para estágios mais altos pode ser prevenida pelo atraso na instituição das medidas preventivas intensivas, e não pela instituição imediata dessas medidas em todos os pacientes de risco.68 Este estudo ressalta o valor de um exame de pele cuidadoso da região situada sobre proeminências ósseas, em pacientes com doença aguda e naqueles com alto risco, para a detecção dos sinais iniciais de lesão por pressão. Muitas vezes, uma lesão de espessura total se manifesta com o aparecimento de uma escara, que deve ser removida para possibilitar o estadiamento. Os locais onde mais comumente surgem úlceras de pressão em pacientes idosos incluem a escápula, crista ilíaca, sacro, ísquio, trocanter, maléolo lateral, calcanhar e borda lateral do pé.67 As úlceras de pressão muitas frequentemente se manifestam como bolhas cutâneas, que evoluem para uma franca ulceração com exsudação ou placa de escara ao longo de vários dias. A úlcera representa a ponta de um iceberg, uma vez que a lesão isquêmica se estende por uma área em expansão triangular, descendo para o tecido subcutâneo. Clinicamente, a lesão é identificada como úlcera de estágio III quando a lesão se estende sob a derme e envolve estruturas fasciais musculares. As úlceras de pressão de estágio IV podem apresentar escavação e fístulas. As fístulas presentes nas lesões de estágio IV podem ser identificadas pela sondagem da borda da úlcera. As úlceras de pressão também se tornam colonizadas por bactérias, e isso resulta em celulite ou bacteremia, especialmente em pacientes debilitados ou imunocomprometidos. O estadiamento deve incluir a documentação da largura, comprimento e profundidade da úlcera, bem como o grau de formação de escara, edema, exsudação e vermelhidão registrados ao longo de uma série de exames da úlcera. Existem instrumentos válidos que podem ajudar a documentar a cicatrização da úlcera.65

 

Prevenção e tratamento

As estratégias preventivas para úlceras de pressão incluem o reconhecimento dos fatores de risco, a diminuição dos efeitos da pressão e a avaliação do estado nutricional, bem como evitar a permanência excessiva no leito e preservar a integridade da pele. Pacientes que apresentam risco de desenvolver uma úlcera podem ser identificados utilizando-se as escalas de Norton ou Braden. Estas escalas relacionam o risco de desenvolvimento de úlcera de pressão ao comprometimento da percepção sensorial, umidade aumentada da pele, atividade física diminuída, imobilidade, desnutrição e forças de cisalhamento e atrito.65 Embora essas escalas sejam amplamente empregadas, uma revisão sistemática mostra que não foi comprovado que tais escalas levam à redução da incidência das úlceras de pressão, ressaltando a necessidade de se manter vigilante na avaliação de todos os pacientes que apresentam risco.69 Os princípios do tratamento incluem: avaliação do grau de severidade da ferida; redução da pressão, atrito e forças de cisalhamento; otimização dos cuidados com a ferida; remoção de debris necróticos; tratamento da contaminação bacteriana; e correção dos déficits nutricionais.60 Para todos os estágios de úlceras de pressão, o primeiro passo consiste na minimização da pressão. Os princípios do tratamento de úlceras de estágio I aplicam-se a todos os pacientes com úlceras de estágios II, III ou IV [Tabela 7]. Para úlceras de estágios II, III ou IV, o tecido necrosado é eliminado por desbridamento médico ou cirúrgico.67 O tecido necrótico constitui uma barreira à epitelização e serve como nicho para infecção.

A prevenção e o tratamento das úlceras de pressão de pacientes hospitalizados e residentes de casas de repouso representam medidas da qualidade de assistência. Uma revisão sistemática de 59 estudos clínicos randomizados de estratégias para redução da incidência das úlceras de pressão em vários cenários descobriu a existência de numerosas limitações metodológicas. A melhor evidência disso é que as superfícies de apoio, o reposicionamento do paciente, a otimização do estado nutricional e a umidificação da pele na região sacral constituem estratégias adequadas para prevenir o desenvolvimento das úlceras de pressão.70 Um estudo multicêntrico envolvendo hospitais localizados nos Estados Unidos identificou 6 processos de assistência para prevenção de úlceras de pressão em pacientes sob risco: avaliação diária da pele; uso de dispositivo redutor de pressão; registro do fato de estar sob risco; reposicionamento durante no mínimo 2 horas; início de consultoria nutricional para pacientes que apresentam fatores de risco nutricionais; e estadiamento da úlcera de pressão.71

 

Cuidados com a ferida

As estratégias de tratameno de feridas incluem curativos, técnicas de desbridamento, antibióticos e antissépticos, além de estratégias físicas para aliviar a pressão [Tabela 7]. Os curativos oclusivos melhoram a cicatrização de úlceras em estágio II. Um curativo proporciona a manutenção de um ambiente úmido na ferida. Existem diversos curativos disponibilizados para uso, que apresentam vantagens e desvantagens, bem como algumas diferenças em termos dos efeitos produzidos sobre a cicatrização da ferida.65 Curativos que não sejam à base de gaze, embora geralmente sejam mais caros (p. ex., salina), proporcionam trocas menos frequentes, taxas de cicatrização maias rápidas e taxas diminuídas de infecção. Os curativo de gaze do tipo wet-to-dry (aplicados umedecidos em salina e deixados secar antes de serem removidos) desbridam as úlceras e não são aplicados sobre úlceras que apresentam tecido de granulação satisfatório.66 As categorias de curativos incluem: membranas transparentes, hidrocoloides, hidrogéis, alginatos e espumas.66 Os curativos de uma destas categorias podem ser utilizados no tratamento de úlceras de pressão de estágio II e, com exceção das membranas, também podem ser empregados no tratamento de úlceras de estágios III e IV. Os hidrocoloides também são úteis para o tratamento de feridas que contêm drenagem leve a intensa.65 Os alginatos consistem em hidrocoloides que são aplicados na pele durante 3 a 5 dias, mas podem causar maceração cutânea por reterem líquidos e não devem ser aplicados em feridas infeccionadas. Os hidrogéis são utilizados com curativos de gaze, permanecem úmidos por mais tempo do que os curativos de gaze umedecidos em salina e não são aplicados sobre a pele macerada. Curativos contendo alginato são utilizados com mais frequência para úlceras de estágio III, são altamente absorventes e não são aplicados sobre feridas secas.66 As espumas são utilizadas no tratamento de úlceras que contêm quantidade baixa a moderada de exsudação, são bastante absorventes e não são aplicados em feridas secas. A maioria das úlceras de pressão de estágios I e II é curada dentro de 60 dias, com as terapias ótimas usuais.

 

Tabela 7. Estágios e tratamentos usuais para úlceras de pressão

Estágio

Apresentação

Tratamento habitual

I

Eritema que não clareia presente na pele intacta; lesão que anuncia a ulceração da pele

Reduzir a pressão sobre a úlcera e a proeminência óssea; reposicionar pacientes confinados ao leito, que apresentem úlcera na região sacral, isquial ou nas costas (p. ex., de um lado para o outro, em 30o), pelo menos a cada 2 horas. No caso de pacientes confinados à cadeira de rodas, utilizar dispositivo redutor de pressão (p. ex., espuma, gel ou ar) e fazer o reposicionamento a cada 1 hora; tratar a pele ressecada utilizando hidratantes (p. ex., cremes, loções, pomadas ou lubrificantes); proteger a pele contra a umidade; manter o posicionamento correto e utilizar técnicas adequadas para transferir e virar o paciente; fornecer suporte nutricional; aplicar curativo de membrana de poliuretano semipermeável (trocas semanais) em úlceras sem drenagem

II

Perda parcial da espessura da pele, envolvendo a epiderme, a derme ou ambas; a úlcera é superficial e se manifesta clinicamente como abrasão, bolha ou cratera rasa

Desbridar tecidos desvitalizados

Desbridamento médico: limpar a ferida com salina; utilizar curativos de gaze umedecida em salina, membrana fina de polímeros ou hidrocoloide. Curativos de hidrocoloide devem ser trocados a cada 3 a 5 dias. Aumentar a mobilidade do paciente

Desbridamento cirúrgico: utilizar bisturi se a escara ou a celulite avançada forem evidentes; utilizar colchões de espuma grossa ou colchões de ar como superfície de apoio

III

Perda de toda a espessura da pele, envolvendo dano ou necrose de tecido subcutâneo, podendo se estender para baixo, e não através da fáscia subjacente. A úlcera apresenta-se clinicamente como uma cratera rasa com ou sem escavação do tecido adjacente

Intervenções para úlceras de estágio II, com exceção das membranas

Médicas: usar hidrogel, hidrocoloide, espumas ou alginato, compressas de gaze umedecidas (salina), desbridamento enzimático (úlceras não infeccionadas) ou antibióticos tópicos (caso a exsudação ou a não cicatrização persista após 2 semanas ou mais de tratamento ótimo) durante 2 semanas (cobertura gram-negativa, gram-positiva, anaeróbica)

Cirúrgica: desbridar escaras amplas e tecido desvitalizado; utilizar leito de ar fluidizado ou leito com baixa perda de ar (em caso de úlceras profundas, amplas e múltiplas) como superfície de apoio

IV

Perda de toda a espessura da pele com extensiva destruição, necrose tecidual ou dano ao músculo, osso ou estruturas de sustentação (p. ex., tendão ou cápsula articular)

Médico: alginatos, hidrogéis e compressas de gaze; antibióticos sistêmicos para bacteremia, sepse, celulite avançada ou osteomielite. Suspeitar de osteomielite em casos de paciente em que a terapia da úlcera falhe, quando o paciente apresentar temperatura alta e contagens de leucócitos sanguíneos elevadas, ou diante de varreduras ósseas anormais

Cirúrgico: criar retalhos miocutâneos (após o desbridamento) de úlceras amplas (largas); usar enxertos de pele de espessura parcial

 

As técnicas de desbridamento usuais são: mecânica, cirúrgica, enzimática e autolítica. As técnicas mecânicas incluem curativos wet-to-dry, utilizadas para remoção de tecidos desvitalizados, hidroterapia e dextranômero. As técnicas cirúrgicas de desbridamento envolvem o uso de bisturi ou tesouras para remoção dos tecidos mortos. O desbridamento enzimático emprega enzimas proteolíticas, enzimas fibrinolíticas e colagenases.66 As técnicas autolíticas incluem os curativos oclusivos, como os hidrocoloides. Úlceras com drenagem apresentando mau cheiro, tepidez, eritema circundante e falha em melhorar provavelmente estão infeccionadas. Uma tentativa de 2 semanas com uso de antibióticos tópicos, como a sulfadiazina de prata, pode ser considerado para limpeza de úlceras de pressão que não se curam ou que continuam a produzir exsudação decorridas 2 a 4 semanas de tratamento ótimo. Recomenda-se não utilizar povidona-iodo, dada a toxicidade desse composto para os fibroblastos. Uma vez que a úlcera esteja limpa e ocorra formação de epitélio, pode ser mantido um ambiente úmido na ferida. O uso de curativos de hidrocoloide ou géis deve ser continuado até o aparecimento da pele sadia. É comum úlceras de estágios III e IV demorarem a cicatrizar ou serem refratárias às terapias médicas usuais. A cirurgia é considerada em casos de úlceras de espessura total. Entretanto, a taxa de recorrência das úlceras é bastante alta após a realização de cirurgias. Estas são precedidas pelo tratamento de infecções e repleção nutricional.67 A meta da nutrição consiste em recuperar o equilíbrio de nitrogênio para intensificar a cicatrização da ferida. Como estes pacientes muitas vezes se encontram em estado catabólico, torna-se necessário ingerir quantidades de proteína e calorias maiores que o habitual para promover a cicatrização e obter resultados satisfatórios com a cirurgia.67 Em um estudo de coorte retrospectivo envolvendo 95 estabelecimentos de assistência de longa duração e um total de 992 residentes com úlceras de pressão de estágios II a IV, observou-se maior redução das úlceras nos residentes tratados com curativos umedecidos do que naqueles que receberam curativos secos e alimentação entérica.72

 

Alívio da pressão

A fisioterapia e o reposicionamento do paciente são combinados ao uso de superfícies de apoio para minimizar a pressão. O alívio da pressão pode contribuir para a prevenção e tratamento das úlceras de pressão por meio de dois métodos principais: (1) uso de uma superfície de apoio adaptada para distribuir o peso corporal sobre uma área ampla; e (2) uso de uma superfície de apoio intermitente, na qual células infláveis são alternadamente infladas e desinfladas. O tratamento das úlceras de pressão também requer a diminuição da pressão exercida sobre a pele danificada. Superfícies de apoio especiais destinadas à redistribuição da pressão (p. ex., leitos, colchões e almofadas) são amplamente utilizadas. Produtos fabricados com ar ou espuma podem ser úteis, no entanto alguns pacientes requerem o uso de leitos especializados, como leito de ar fluidizado ou leito com baixa perda de ar. Os leitos de ar fluidizado contêm microesferas de vidro cerâmico. O ar pressurizado aquecido é forçado a atravessar as microesferas, fazendo-as assumir as características de um líquido. Os pacientes flutuam sobre as microesferas, e a pressão sob as proeminências é diminuída. Os leitos com baixa perda de ar consistem em amplas almofadas de tecido, que são constantemente infladas com ar. As almofadas dos leitos com baixa perda de ar são ajustadas para o estrado dos leitos hospitalares, que são mais práticos para a realização das transferências de pacientes. O uso destes leitos deve ser considerado em casos de pacientes com úlceras de pressão (estágios III ou IV) de espessura total ou com múltiplas úlceras amplas; quando um indivíduo apresenta menos de 2 superfícies sem de úlceras de pressão; ou quando um paciente apresenta ulcerações recorrentes e que não cicatrizam com o uso de um dispositivo redutor de pressão estática.73

 

Desnutrição e perda de peso

Epidemiologia

Nos Estados Unidos, a desnutrição proteico-calórica – também conhecida como subnutrição proteico-energética – é mais comum em pessoas de idade bastante avançada e em idosos doentes.74,75 Até 55% dos idosos hospitalizados estão subnutridos no momento da admissão. No cenário da assistência de longa duração, a desnutrição foi identificada em 50% dos residentes e constitui um fator preditivo independente de mortalidade subsequente. O estado nutricional precário e a desnutrição proteico-calórica foram associados a imunidade alterada, comprometimento da cicatrização da ferida, declínio do estado funcional, maior utilização dos recursos de assistência de saúde e mortalidade aumentada. As deficiências de micronutrientes também são comuns nesta população. Perda de peso equivalente a 5% ou mais do peso corporal habitual no mês anterior, ou perda equivalente a 10% nos últimos 6 meses estão associadas a uma maior morbidade e mortalidade. Estudos de base populacional, como National Health and Nutrition Examination Surveys,74 constataram que 50% dos homens e mulheres norte-americanos com idades de 65 a 74 anos haviam perdido pelo menos 5% do peso corporal durante um período de 10 anos de seguimento, sendo que 26% das mulheres e 14% dos homens haviam perdido ao menos 15% do peso corporal durante esse intervalo. O padrão de alteração do peso ao longo da vida de um indivíduo é caracterizado por um aumento gradual de peso, que atinge o pico na 4ª ou 5ª década da vida e é seguido por um período de estabilidade que se estende da 6ª à 7ª década da vida.75

 

Fatores de risco e etiologia

Os distúrbios nutricionais observados em pacientes idosos podem ser causados por numerosos fatores intrínsecos e extrínsecos. Muitas doenças agudas e crônicas predispõem os pacientes idosos à desnutrição. Entre esses fatores estão o hipertireoidismo, diabetes melito, câncer, doenças de má absorção, doença cardiovascular, doença renal, doença pulmonar obstrutiva crônica e condições associadas a níveis aumentados de fator de necrose tumoral ou caquexina (p. ex., inflamação crônica). A demência é causa comum de subnutrição e de perda de peso inexplicável. Uma causa menos frequente de perda de peso e anorexia são as medicações (p. ex., digoxina, alguns antidepressivos). Além disso, a disgeusia pode ser causada por medicamentos (p. ex., anti-histamínicos, inibidores da enzima conversora de angiotensina, levodopa, lítio), deficiência de zinco e alterações nos sentidos de olfato e paladar em decorrência do envelhecimento fisiológico. A enteropatia inflamatória, insuficiência pancreática e enteropatia por glúten podem acarretar má absorção. Outros fatores contribuintes para a desnutrição incluem dentição oral precária, dentaduras mal ajustadas, boca seca, incapacidade funcional e comprometimento visual. Os distúrbios endócrinos (p. ex., tireotoxicose ou diabetes melito não controlado) são causas menos comuns. A autonegligência e o abuso do idoso, em casos de pacientes idosos vulneráveis, devem ser sempre considerados diante de uma perda de peso inexplicável.

Estudos sobre perda de peso involuntária sugerem que a depressão, o comprometimento cognitivo (demência), distúrbios gastrintestinais (úlcera péptica ou distúrbios de motilidade) e câncer constituem as causas mais comuns. Frequentemente, uma inflamação causada por infecções e estados catabólicos contribui para a perda de peso e a hipoalbuminemia, entre outros marcadores séricos de doença crônica.75

Fatores psicossociais contribuem para o risco de nutrição inadequada em idosos. Muitos pacientes de idade avançada vivem de renda fixa, possuem acesso limitado aos alimentos (isolamento social), têm pouco conhecimento sobre nutrição ou dependem de outras pessoas (cuidadores ou instituições) que lhes preparam as refeições. Esses pacientes também podem sofrer de depressão, luto, demência ou alcoolismo. A habilidade de comprar alimentos ou preparar refeições é comprometida pela diminuição da força e pelo comprometimento da mobilidade.

 

Patogênese

Durante a meia-idade, há um aumento da massa corporal e do percentual de gordura do corpo, tanto em homens como em mulheres. A partir dos 70 anos de idade, observa-se um declínio da massa magra (sarcopenia) e da gordura corporais. O envelhecimento normal está associado a muitas alterações fisiológicas que exercem um impacto significativo sobre a nutrição, notavelmente sobre os sistemas gastrintestinal, sensorial, hormonal, renal e musculoesquelético. A complexa interação entre estas alterações fisiológicas, doenças crônicas e fatores psicossociais e ambientais determina a saúde nutricional geral do indivíduo de idade avançada.

 

Sarcopenia

As alterações relevantes associadas ao envelhecimento normal são uma diminuição da massa magra corporal (tanto esquelética como visceral), da densidade óssea e do conteúdo de água corporal, bem como um aumento da gordura corporal total. Dos 25 aos 75 anos de idade, a massa magra corporal sofre um declínio de 19% nos homens e de 12% nas mulheres, provavelmente devido à inatividade e à diminuição da síntese proteica. A sarcopenia, ou desgaste da musculatura esquelética, resulta de uma constelação de fatores, tais como alterações biológicas associadas ao envelhecimento, inatividade, desnutrição proteico-calórica e doenças catabólicas (p. ex., insuficiência cardíaca congestiva, doença pulmonar obstrutiva crônica, câncer e hipertireoidismo). Em ambos, idosos fragilizados e idosos sadios, o único tipo de fibras musculares que sofre atrofia são as fibras de contração rápida. Esta atrofia seletiva das fibras de tipo II sugere que a sarcopenia é causada pelo desuso e implica um potencial de prevenção. A sarcopenia, que resulta de um processo fisiológico, precisa ser diferenciada da caquexia, que consiste na perda de gordura e músculos associada a doenças crônicas (p. ex., malignidades).75

 

Anorexia e envelhecimento

A anorexia do envelhecimento representa um conceito fisiológico que explica a diminuição da ingesta nutricional em indivíduos de idade avançada. Pode ser considerada uma síndrome de consumo nutricional inadequado. A anorexia do envelhecimento é causada por uma combinação de fatores que interferem na regulação normal do apetite e no consumo de alimentos.76 A discriminação olfativa diminuída, a percepção alterada do paladar e a xerostomia diminuem o sabor dos alimentos, e isso desestimula o consumo de uma ingesta calórica total adequada. O esvaziamento gástrico anormal, o relaxamento adaptativo diminuído e a diminuição da secreção de ácido gástrico causada provavelmente por uma gastrite atrófica podem interferir na absorção de vitamina B12 e ferro, resultando em deficiências de micronutrientes.

 

Avaliação diagnóstica

Aspectos clínicos

Os principais indicadores de um estado nutricional precário incluem: perda de peso significativa ao longo do tempo (= 10% do peso corporal em 6 meses ou perda de peso involuntária); peso significativamente reduzido em relação à altura (p. ex., um índice de massa corporal = 18,5 kg/m2); níveis séricos de albumina abaixo de 3,5 g/dL; mudança para a condição de dependente na execução das atividades do dia a dia (p. ex., tomar banho e se vestir); ingesta alimentar continuamente inadequada (p. ex., consumo excessivo de bebidas alcoólicas ou desequilíbrio dietético); redução da circunferência na parte média do braço a valores abaixo do décimo percentil da circunferência ideal; diminuição da espessura das dobras cutâneas na região do tríceps a valores abaixo do décimo percentil da espessura ideal; e existência de distúrbios relacionados à nutrição (p. ex., osteoporose, deficiência de vitamina B12 ou deficiência de folato).

 

Testes laboratoriais

Os níveis séricos de albumina geralmente são indicadores mais confiáveis, ainda que inespecíficos, de desnutrição crônica. Níveis de albumina abaixo de 3,5 g/dL, detecção de uma anemia normocítica inexplicável e níveis séricos de colesterol baixos demais (< 160 mg/dL) são compatíveis com um diagnóstico de desnutrição proteico-calórica. Níveis séricos diminuídos de transferrina e pré-albumina e uma contagem total de linfócitos baixa também sugerem desnutrição proteico-calórica.

 

Prevenção e tratamento

Para pacientes idosos saudáveis, recomenda-se uma dieta bem equilibrada, que inclua quantidades adequadas de calorias, proteínas e aminoácidos essenciais, ácidos graxos essenciais, fibras e carboidratos complexos, bem como quantidades suficientes de minerais e vitaminas. Diretrizes de alimentação saudável podem ser utilizadas como guia geral para aconselhamento de pacientes sobre uma dieta equilibrada (www.nal.usda.gov/fnic). Pacientes com doenças crônicas, que apresentam perda de peso consequente a uma doença ou cirurgia ou cuja dieta seja desequilibrada, são aconselhados a tomar suplementos multivitamínicos e minerais diariamente. Nestes casos, recomenda-se a suplementação de cálcio para garantir o consumo diário de pelos menos 1 g de cálcio elementar, aliada à suplementação com vitamina D. Para o tratamento de pacientes com doenças crônicas, a instrução do paciente e de seus familiares e prestadores de assistência constitui uma etapa importante na prevenção da desnutrição. Os pacientes devem usufruir das vantagens proporcionadas pelos programas nutricionais disponíveis na comunidade, como o Meals on Wheels (www.projectmeal.org) e os serviços nutricionais do Title III. O encaminhamento do paciente a um consultório especializado na área de envelhecimento poderá ajudar o paciente a ter acesso a estes serviços.

Pacientes que apresentam fatores de risco sociais, físicos e psicológicos para o desenvolvimento de desnutrição podem ser prontamente identificados com auxílio de instrumentos de varredura e por meio de um exame físico direcionado. A avaliação global subjetiva (AGS), uma medida validada do estado nutricional baseada nos achados da história médica e do exame físico, classifica com acurácia os pacientes em: severamente desnutridos, moderadamente nutridos ou bem nutridos. A AGS combina elementos da história nutricional do paciente (perda de peso nos últimos 6 meses) e exame físico (p. ex., desgaste muscular) para gerar uma impressão válida e subjetiva de seu estado nutricional (www.jacn.org/content/19/5/570.full). Quando combinada a uma revisão dos indicadores bioquímicos de estado nutricional, esta informação deve dirigir o processo de avaliação adicional e tratamento da desnutrição proteico-calórica.

 

Dieta equilibrada e suplementação nutricional

Recomenda-se a prescrição de uma dieta bem equilibrada, com alimentos com alta densidade calórica, aliada à suplementação de vitaminas e minerais. Os suplementos nutricionais enlatados comercializados, que contêm 250 a 350 calorias de uma fórmula nutricionalmente equilibrada, são indicados como suplementação para serem consumidos entre as refeições (p. ex., no meio da manhã e no meio da tarde) por pacientes idosos subnutridos. Uma metanálise de 55 estudos analisou o papel dos suplementos nutricionais.77 Os suplementos orais podem melhorar o estado nutricional e parecem reduzir a mortalidade e a incidência de complicações para pacientes idosos subnutridos hospitalizados. Nenhum benefício foi observado no caso de pacientes idosos vivendo em suas casas nem para indivíduos sadios.77 As intervenções disponíveis incluem refeições e lanches frequentes, intensificação do sabor dos alimentos preferidos, suplementos proteico-calóricos, multivitamínicos, estimulantes do apetite e nutrição entérica e parenteral [Tabela 8]. Apesar de sua efetividade, os suplementos nutricionais entéricos ou orais são frequentemente subutilizados por pacientes hospitalizados. Um estudo de coorte prospectivo constatou que 20% dos pacientes idosos, no cenário hospitalar, apresentavam uma ingesta diária de nutrientes inferior a 50% de suas necessidades energéticas de manutenção calculadas. Estes pacientes muitas vezes possuíam ordens de NPO (nada pela boca, ou nada por via oral), e suplementos enlatados eram servidos com frequência, porém não eram consumidos pelos pacientes.78

 

Tabela 8. Suporte nutricional

Via

Características do paciente

Intervenção nutricional

Oral

Alerta, deglutição normal, desnutrição leve a moderada

Dieta rica em calorias e proteínas; alimentos com elevada densidade calórica (elevado teor de gordura); suplementos nutricionais entre as refeições

Líquidos endovenosos

Doença aguda, ingesta líquida por via oral diminuída, incapaz de deglutir

Solução de glicose com eletrólitos por = 48 horas, como fonte nutricional única

Entérica

Disfagia orofaríngea, disfunção cognitiva, doença crítica (p. ex., sob intubação) ou desnutrição severa; capacidade de retomar a alimentação oral em poucas semanas (ou o uso cíclico)

Alimentação via tubo nasoentérico (contínua ou cíclica) com soluções de alimentação entérica sem lactose (soluções normocalóricas ou soluções normocalóricas ricas em nitrogênio)

Nutrição parenteral periférica

Vias oral e nasoentérica temporariamente contraindicadas (p. ex., pancreatite aguda, obstrução intestinal)

Infusão endovenosa periférica com solução isotônica de glicose-eletrólito-lipídios

Nutrição parenteral total

Desnutrição severa; obstrução do intestino delgado; via entérica contraindicada

Cateter endovenoso central (p. ex., na veia subclávia): infusão de soluções de alta caloria, hipertônicas e balanceadas (proteínas, carboidratos e aminoácidos)

Gastrostomia endoscópica percutânea

Desnutrição severa aliada à disfagia orofaríngea contraindica a alimentação oral (p. ex., acidente vascular cerebral ou demência avançada) por tempo prolongado (p. ex., = 2 meses) ou indefinidamente*

Soluções entéricas: isotônicas ou hipertônicas (limitadas por diarreia; fórmulas com conteúdo de nitrogênio normal ou alto)

*Pacientes com demência severa foram excluídos.

 

Suporte Nutricional

A ingesta de uma dieta rica em calorias é recomendada para adultos doentes (isto é, 25 a 30 kcal/kg/dia para mulheres; 30 a 35 kcal/kg/dia para homens). Quantidades ainda maiores de caloria podem ser necessárias em casos de indivíduos severamente desnutridos ou catabólicos.76 O suporte nutricional (ou seja, alimentação não oral) é uma alternativa considerada quando a prevenção ou tratamento da desnutrição proteico-calórica resultará na melhora do prognóstico ou da qualidade de vida, e se os requisitos nutricionais não puderem ser atendidos pelos suplementos e alimentos ingeridos por via oral [Tabela 8].75 Se o trato gastrintestinal estiver funcional, a nutrição entérica (via tubo nasogástrico ou nasoentérico) é preferível à nutrição parenteral. A instalação de gastrostomia percutânea é indicada quando houver previsão de uso prolongado (semanas a meses) do tubo de alimentação ou para conforto do paciente. A nutrição parenteral total (alimentação endovenosa) é essencial à sobrevivência de pacientes que ficam incapacitados de se alimentar por período prolongado e que não sejam candidatos ao suporte entérico (p. ex., devido à obstrução intestinal). Entretanto, as alimentações via tubo de gastrostomia não são recomendadas para pacientes com demência severa, considerando a ausência de dados demonstrando que a alimentação via tubo melhora os resultados clínicos desses pacientes. Pacientes com doença aguda, delirium ou demência apresentam risco aumentado de desenvolver disfagia orofaríngea e pneumonia por aspiração. Uma avaliação da deglutição pode ajudar a aumentar a segurança e o sucesso da alimentação oral. Estes pacientes não devem receber alimentação por via oral antes de terem estabelecida a capacidade de engolir de maneira segura. Caso seja viável, a alimentação entérica constitui a via preferida. O teste da ingesta de 90 mL de água permite detectar o risco de aspiração durante a avaliação clínica de cabeceira da deglutição feita em pacientes idosos que possivelmente apresentariam risco de desenvolver disfagia orofaríngea.79 Nesse teste, os pacientes devem beber 90 mL de água sem interrupção. A falha no teste também inclui a incapacidade de beber o volume todo, tossir ou sufocar 1 minuto após a conclusão, ou, ainda, a observação de qualidade vocal rouca após a ingesta. Considerando os fatores específicos ao paciente capazes de comprometer a retomada de uma ingesta oral segura, um resultado satisfatório no teste da ingesta de 90 mL de água autoriza a alimentação oral.

 

Correção das deficiências nutricionais

As deficiências nutricionais específicas resultam de desequilíbrio dietético, doença crônica ou medicamentos. Os exemplos mais comumente reconhecidos são as deficiências de vitamina B12 (cobalamina), cálcio e ferro. A deficiência de cobalamina pode ocorrer na ausência dos achados neurológicos ou hematológicos clássicos, de anemia perniciosa. Níveis séricos baixos de cobalamina acompanhados de níveis séricos elevados de ácido metilmalônico sustentam o diagnóstico de deficiência de vitamina B12. A deficiência dietética de cálcio é comum em mulheres idosas. A suplementação dietética com frequência é necessária para manter um consumo diário de 1,2 a 1,5 g de cálcio elementar. A suplementação com 800 UI/dia de vitamina D é frequentemente recomendada para o tratamento de pacientes idosos que carecem de exposição ao sol ou que apresentam evidências de osteoporose ou osteomalácia. A deficiência de ferro é mais comum entre idosos, devido às causas internas ou externas a longo prazo de perda de sangue. Em indivíduos de idade avançada com níveis séricos elevados de hemocisteína (implicando deficiência de ácido fólico), a suplementação com 800 mcg/dia de ácido fólico por um período de 3 anos foi associada a uma melhor função cognitiva do que aquela observada em indivíduos tratados com placebo.80 A suplementação com ácido fólico também revelou declínio na audição das frequências da fala associado ao envelhecimento.81 Estes estudos sugerem que os pacientes com risco de desenvolver deficiência de ácido fólico (perda de peso significativa, dieta de má qualidade) sejam tratados com suplementação de ácido fólico.

 

Comprometimento sensorial

As perdas auditivas e visuais representam os comprometimentos sensoriais mais comuns e significativos entre idosos. Contudo, esses comprometimentos frequentemente não são identificados, porque os médicos muitas vezes não realizam avaliações para detectá-los. Os comprometimentos sensoriais exercem efeitos adversos sobre o funcionamento físico, cognitivo e social. Em idosos que vivem na comunidade, o humor e as relações sociais são particularmente afetados pelo comprometimento visual, e o desempenho na execução das atividades do dia a dia é fortemente diminuído pelo comprometimento da audição.

 

Comprometimento da audição

Epidemiologia

A perda da audição afeta cerca de 25 a 40% da população com idade de 65 anos ou mais. A prevalência aumenta com o avanço da idade, sendo de 40 a 66% em pacientes com mais de 75 anos de idade e de 80% em pacientes com mais de 85 anos.82 Perdas significativas de audição foram descritas em 70 a 90% dos residentes de casas de repouso. A perda da audição está associada à disfunção emocional e social, incluindo depressão e isolamento social.82

 

Etiologia

A perda da audição é classificada como sensorioneural, condutiva ou mista. A perda auditiva sensorioneural é causada por doenças cocleares ou retrococleares e caracteriza-se pela diminuição dos limiares de condução aérea e óssea. A presbiacusia constitui a causa mais comum de perda auditiva sensorioneural entre pacientes idosos. Entre as causas mais comuns estão: impactação do cerume ou de corpos estranhos, perfuração da membrana timpânica, otite média, otosclerose, colesteatoma, tumor ou desarticulação da cadeia ossicular atribuível ao traumatismo.83 Outras causas incluem ototoxicidade associada a medicações (p. ex., aminoglicosídeos e agentes quimioterápicos), infecções envolvendo o VIII nervo craniano e lesão causada por eventos vasculares ou tumores no VIII nervo craniano. A presbiacusia constitui uma causa bilateral e simétrica de perda auditiva a altas frequências, sobretudo acima de 2.000 Hz, e está associada ao comprometimento da discriminação da fala e recorrência ao volume alto. A presbiacusia surge na meia-idade e causa perda gradual e bilateral da audição. As alterações mais graves ocorrem ao nível da orelha interna, que é responsável pela sensibilidade, sons, compreensão da fala e manutenção do equilíbrio. Os sinais e sintomas de presbiacusia incluem uma história de perda progressiva da audição de alta frequência e a dificuldade de compreender a fala, especialmente em ambientes barulhentos. A causa da presbiacusia é obscura. A degeneração das células pilosas no órgão de Corti acarreta perda auditiva sensorioneural. Pacientes com presbiacusia tipicamente apresentam dificuldade para filtrar ruídos de fundo, e isso dificulta bastante a audição em circunstâncias sociais comuns.83 A presbiacusia também está associada a um distúrbio de processamento auditivo, que torna a compreensão da fala ainda mais difícil do que seria previsto com base na perda da sensibilidade auditiva periférica.

A perda auditiva mista envolve elementos condutivos e sensorioneurais da perda da audição. A perda auditiva condutiva ocorre quando há comprometimento da transmissão do som para a orelha interna. Lesões envolvendo a orelha externa ou a orelha média podem causar perda auditiva condutiva. Tipicamente, os limiares de condução óssea são melhores do que os limiares de condução aérea. As causas mais comuns de perda da audição são a impactação do cerume e a otosclerose, enquanto as causas menos comuns são tumores e distúrbios degenerativos (p. ex., doença de Meniere), traumatismo, vasculite e distúrbios hemorrágicos.

 

Avaliação diagnóstica

O comprometimento da audição pode se tornar evidente durante uma conversação casual com o paciente. Uma simples pergunta – “Você tem algum problema de audição?” – pode levar à detecção da perda auditiva.83 Pacientes com comprometimento auditivo devem ser examinados, primeiro, quanto à existência de impactação de cerume. Um questionário baseado em autorrelatos da audição identificou 6 fatores independentes de perda da audição em pacientes com 55 a 74 anos de idade. Tais fatores são: (1) idade igual ou superior a 70 anos; (2) sexo masculino; (3) grau de instrução elevado; (4) ter procurado um médico por causa de surdez ou perda da audição; (5) incapacidade de ouvir um sussurro através de um recinto; e (6) incapacidade de ouvir a voz normal através de um recinto.84 Várias medidas do comprometimento auditivo tomadas no consultório são úteis para os clínicos. O teste da voz sussurrada pode ser realizado solicitando-se ao paciente para repetir uma pequena lista de números ou letras sussurrados por um examinador posicionado 60 cm atrás dele, ao mesmo tempo que se oclui o canal auditivo externo da orelha que não está sendo testada no paciente.83 Uma abordagem mais quantitativa consiste em usar um otoscópio manual com audiômetro acoplado. Esse dispositivo apresenta alta sensibilidade e especificidade, mas é caro e requer certa habilidade para ser utilizado de forma correta. Suas características de acurácia diagnóstica são similares àquelas do teste da voz sussurrada.83 Pacientes com perda auditiva devem ser submetidos a uma avaliação audiológica formal. Essa avaliação inclui uma audiometria de tom puro para registrar a perda de decibéis ao longo das faixas de frequência e para determinar se a perda é sensorioneural ou mista.

 

Tratamento

O tratamento da perda auditiva pode ser cirúrgico, médico ou reabilitativo. A instrução do paciente é importante em qualquer abordagem. O tratamento da presbiacusia envolve o encaminhamento a especialistas para aconselhamento com relação às estratégias de audição, suporte emocional proporcionado pelos familiares e profissionais de assistência de saúde e uso de dispositivos auditivos auxiliares ou diversos tipos de aparelhos auxiliadores da escuta . Os casos de perda auditiva são encaminhados aos fonoaudiólogos, otorrinolaringologistas ou a ambos. Os fonoaudiólogos são especializados na realização de testes de audição, uso de dispositivos auxiliadores da escuta (p. ex., amplificadores de telefone, sistema de infravermelho, conversadores de bolso e alertas visuais/táteis de campainhas, telefone e alarmes de fumaça), bem como seleção e ajuste de dispositivos auxiliares auditivos.82 As abordagens cirúrgicas são indicadas para pacientes com lesões obstrutivas crônicas no canal auditivo externo e causas médicas de perda auditiva condutiva. A estapedectomia constitui a intervenção cirúrgica mais comum para casos de otosclerose. Os implantes cocleares são valiosos para pacientes com surdez sensorioneural profunda, para os quais é inviável um dispositivo auditivo auxiliar convencional.85 A introdução de uma modificação nos tratamentos médicos pode ser indicada para pacientes com perda auditiva sensorioneural. Avaliações seriadas da audição são úteis para pacientes que recebem doses altas de fármacos potencialmente ototóxicos (p. ex., fármacos anticâncer e doses altas de diuréticos de alça).

A maioria dos pacientes com doença sensorioneural ou doença coclear será beneficiada pela reabilitação auricular. Esta inclui modalidades de tratamento como dispositivos auditivos auxiliares, treinamento auditivo e treinamento em leitura labial. Os dispositivos auditivos continuam sendo o tratamento habitual para pacientes com perda auditiva sensorioneural (www.asha.org/public/hearing/treatment). Existe uma variedade de aparelhos disponíveis, entre os quais dispositivos auditivos auxiliares programáveis e circuitos de amplificação que reduzem as distorções. Os dispositivos auditivos podem ser totalmente ajustados ao canal auditivo externo, fixados sobre o lobo auricular do paciente ou colocados atrás da orelha.82 Os aparelhos auxiliadores da escuta são sistemas de escuta de televisores, dispositivos de alerta, amplificadores de telefone, sistemas de amplificação de área ampla e sistemas de microfone remotos. Estes últimos, acompanhados de um suporte de fixação à cabeça, podem ser adquiridos em lojas de equipamentos de rádios. São econômicos, práticos e capazes de melhorar a comunicação até mesmo com os pacientes mais severamente comprometidos

Para melhorar a comunicação com o paciente que apresenta comprometimento auditivo, recomenda-se tentar atrair diretamente a atenção do ouvinte para fornecer pistas visuais, reduzir o ruído de fundo, utilizar expressões faciais e gestos, falar lenta e claramente, utilizar um tom de voz apenas um pouco mais alto do que o normal e sem gritar, reformular as mensagens caso o ouvinte não as entenda e não apenas repetir o que se disse, alertar o ouvinte sobre as alterações de assunto e não se virar nem se afastar enquanto estiver falando.

 

Comprometimento visual

As alterações da visão associadas à idade, em especial a presbiopia ou hipermetropia, são causas comuns de comprometimento visual. Outras alterações importantes que afetam a visão incluem a diminuição da dilatação da pupila, que contribui para o desenvolvimento de uma visão noturna precária; a descoloração das lentes do cristalino; e as alterações no humor vítreo, que podem levar ao aparecimento de pontos no campo visual. Com o envelhecimento normal e o erro refrativo, poucas alterações são observadas em termos de acuidade visual que não sejam passíveis de correção ou compensação com relativa facilidade. As principais causas de comprometimento da visão associadas à visão precária ou cegueira (isto é, visão pior que 20/20 em um ou em ambos os olhos com correção) incluem catarata, glaucoma, degeneração macular e retinopatia diabética [veja 9: I Diabetes melito de tipo 1]. Foi constatado que o comprometimento visual funcional aumenta de menos de 10%, em indivíduos com 71 a 74 anos de idade, para 40%, em indivíduos com idade igual ou acima de 90 anos. As diferenças raciais refletem-se nos padrões de perda visual, com os brancos sendo mais propensos ao desenvolvimento de degeneração macular associada à idade (DMAI), enquanto os afro-americanos são mais propensos ao desenvolvimento de glaucoma de ângulo aberto primário. Os afro-americanos apresentam prevalência 2 vezes maior de cegueira e comprometimento visual do que os brancos, sendo que inexistem diferenças de prevalência de acordo com o sexo.

 

Catarata

A catarata consiste na opacidade ou turvamento das lentes do cristalino, podendo afetar a acuidade visual, a sensibilidade ao contraste e a percepção da luz. As cataratas senis são frequentemente classificadas como corticais, subescapulares ou nucleares. Embora a prevalência da opacificação das lentes aumente com o envelhecimento para cerca de 100% entre os idosos com mais de 90 anos de idade, o comprometimento funcional ocorre em apenas metade daqueles que possuem catarata. As cataratas corticais ou cuneiformes manifestam-se como raios, flocos ou cunhas de opacidade em torno do núcleo; as cataratas corticais apresentam progressão lenta e eventualmente podem envolver todo o córtex das lentes; as cataratas subcapsulares são mais comuns em pacientes jovens e estão associadas ao uso de corticosteroides. Aparecem com frequência sob a forma de grânulos e cristais irregulares de várias cores. As cataratas nucleares são as mais comuns em pacientes idosos brancos e surgem como descolorações amareladas ou marrons, que apresentam associação com miopia crescente e deterioração da visão.

 

Fatores de risco e etiologia. Os possíveis fatores de risco para desenvolvimento de catarata incluem a exposição à radiação ultravioleta do tipo B, história de diabetes melito, consumo de bebidas alcoólicas, tabagismo, dieta deficiente em vitaminas e uso de corticosteroides. A prevalência da catarata associada à idade aumenta de menos de 5%, em pacientes com idade inferior a 65 anos, para 46%, em pacientes com 75 a 85 anos. Foi demonstrado que o tabagismo representa um importante fator de risco independente para o desenvolvimento de catarata associada à idade. Em um estudo de coorte prospectivo envolvendo quase 21.000 médicos sem catarata no momento basal, o risco relativo de desenvolvimento de catarata associada à idade foi igual a 36% entre os homens que jamais haviam sido fumantes. O abandono do tabagismo pareceu diminuir o risco de desenvolvimento de catarata principalmente limitando o dano às lentes associado à dose total.

 

Avaliação diagnóstica. Os sintomas iniciais de uma catarata incluem ofuscamento e sensibilidade precária ao contraste. A sensibilidade ao contraste consiste na capacidade de discernir variações sutis de sombra. É possível testá-la utilizando figuras que apresentam variações de contraste, iluminação e frequência espacial.86 O ofuscamento é causado pelo excesso de refração dos raios luminosos que penetram nas lentes turvas, sendo mais problemático diante da luz solar brilhante ou ao dirigir durante a noite. A diminuída sensibilidade ao contraste se manifesta como dificuldade para distinguir objetos de campo sob condições de baixa iluminação. A acuidade visual para distâncias curtas (de perto) está mais frequentemente diminuída na catarata subcapsular posterior, sendo comum os pacientes reclamarem do ofuscamento incapacitante que se manifesta durante o dia. Pacientes com catarata cortical queixam-se de ofuscamento com a aproximação dos faróis enquanto dirigem à noite. Uma catarata esclerótica nuclear afeta a visão a longas distâncias (de longe) mais significativamente do que a visão a curtas distâncias. As cataratas nuclear e cortical apresentam características diferentes durante o exame. A catarata nuclear pode permanecer invisível contra o reflexo vermelho, até se tornar uma catarata razoavelmente madura. Quando isso ocorre, a catarata, então, se mostra como uma névoa central mal definida. A catarata cortical é tipicamente composta de opacidades radialmente orientadas, agudamente definidas e em forma de raio de roda.

 

Tratamento. As cataratas sintomáticas são tratadas cirurgicamente. A decisão sobre a necessidade de realizar uma cirurgia de catarata é tomada com base no provável grau de comprometimento visual que deverá ocorrer e em seu impacto sobre a qualidade de vida, em oposição aos riscos e custo do procedimento. Uma catarata é considerada clinicamente significativa quando promove diminuição da acuidade visual ou da função que interfira no desempenho do paciente na execução das atividades do dia a dia.86 Motoristas de idade avançada que possuem catarata apresentam risco aumentado de se envolverem em acidentes de carro, se comparados aos motoristas sem catarata. Motoristas que se submetem à cirurgia de catarata, em comparação com aqueles que preferem não se submeterem ao tratamento cirúrgico, conseguem reduzir em 50% o risco de envolvimento em acidentes de veículos motores. A maioria das cirurgias de catarata realizadas nos Estados Unidos utiliza anestesia regional ou local sob condições ambulatoriais. A cirurgia de catarata extracapsular com implantação de um implante de lentes na câmara posterior constitui o procedimento mais comumente realizado, no entanto a facoemulsificação por microinfusão está se tornando cada vez mais amplamente utilizada. Esse procedimento permite ao cirurgião operar através de feridas menores, com complicações potencialmente menos numerosas relacionadas a cicatrização ou infecção.87 Cerca de 95% dos pacientes com outra comorbidade ocular que se submetem à extração da catarata obtêm uma acuidade visual de 20/40 ou melhor.

 

Glaucoma

O glaucoma – lesão característica do nervo óptico e perda do campo visual – constitui uma neuropatia óptica progressiva crônica, caracterizada pela escavação da cabeça do nervo óptico e pela perda do campo visual na porção média periférica. Existem duas classificações anatômicas do glaucoma, conforme o ângulo da câmara anterior seja aberto ou estreito. O glaucoma de ângulo aberto, que é o mais comum, constitui uma doença crônica primária; o glaucoma de ângulo fechado, que é o menos frequente, é geralmente uma doença aguda.

 

Fatores de risco e etiologia. Considera-se que o principal fator de risco para o desenvolvimento do glaucoma de ângulo aberto seja a elevação da pressão intraocular acima dos 21 mmHg considerados estatisticamente normais. A elevada pressão intraocular tem origem na resistência aumentada à drenagem do humor aquoso através da malha trabecular. Entretanto, em muitos pacientes com glaucoma essa pressão está normal, e a doença é caracterizada por pressões inferiores a 21 mmHg. Os fatores de risco putativos para o desenvolvimento de glaucoma de ângulo aberto são a elevada pressão intraocular, ascendência afro-americana, história familiar positiva, miopia e, possivelmente, diabetes e hipertensão sistêmica.

Os glaucomas de ângulo fechado resultam da obstrução do fluxo do humor aquoso a partir da câmara posterior e através da pupila, para dentro da câmara anterior e através dos poros do canal de Schlemm. A produção do humor aquoso continua, resultando na formação de pressões intraoculares bastante elevadas. A principal característica do glaucoma de ângulo fechado é um bloqueio pupilar relativo com abaulamento da face da íris para a frente, com consequente obstrução do fluxo de humor aquoso no ângulo da câmara. Um glaucoma de ângulo fechado agudo pode ser precipitado pelo uso de colírios dilatadores e por uma emergência médica. Em contraste, um glaucoma de ângulo aberto constitui uma doença insidiosa que, na maioria das vezes, é descoberta durante os exames de rotina.

 

Avaliação diagnóstica. Os sintomas do glaucoma incluem a visão de um halo em torno das luzes e a sensação de diminuição da visão sob baixos níveis de iluminação. O glaucoma é frequentemente assintomático, sendo detectado apenas durante o exame oftalmológico. A menos que receba atenção clínica, o glaucoma causa perda progressiva do campo visual e, eventualmente, leva à cegueira. O diagnóstico de glaucoma baseia-se em um exame ocular que inclua tonometria, gonioscopia (que examina o ângulo da câmara anterior), inspeção do disco óptico e da camada de fibras nervosas, e teste do campo visual. Com a lesão ao nervo óptico, há o aparecimento de uma escavação em forma de cálice no disco óptico, com aumento da proporção escavação/disco e disfunção visual no campo médio periférico da visão. À medida que a doença progride, a deterioração das funções visuais centrais, incluindo a acuidade, torna-se evidente. A pressão intraocular é medida por meio da determinação da força necessária para achatar a córnea central (aplanação). A tonometria de aplanação pode ser realizada com auxílio de um medidor óptico ou de um calibrador de esforço elétrico.

 

Tratamento. O tratamento do glaucoma envolve abordagens médica e cirúrgica. Tanto a diminuição da quantidade de humor aquoso produzido pelo corpo ciliar como o aumento de seu fluxo de saída através da malha trabecular, pela via uveoscleral ou através de um caminho cirurgicamente criado, podem reduzir a pressão intraocular.87 Os tratamentos médicos são dirigidos para a fisiologia da pressão intraocular. As membranas celulares das células epiteliais ciliares não pigmentadas contêm beta e alfa-adrenorreceptores, anidrase carbônica e adenosinatrifosfatases (ATPases) ativadas por sódio e potássio. Por meio da estimulação ou inibição dessas enzimas ou receptores, o transporte ativo de humor aquoso através da barreira aquosa-sanguínea pode ser modulado para minimizar a pressão intraocular.

Os colírios de uso tópico constituem o tratamento médico mais comum do glaucoma de ângulo aberto. Os agentes diminuem a produção de humor aquoso ou aumentam seu fluxo de saída e absorção. As opções terapêuticas incluem o uso de inibidores da anidrase carbônica de uso tópico (p. ex., brinzolamida), bloqueadores beta-adrenérgicos (p. ex., timolol, betaxolol), agonistas alfa-2-adrenérgicos (p. ex., brimonidina) e análogos de prostaglandina (p. ex., latanoprost e bimatoprost).88

O objetivo do tratamento médico consiste em obter uma pressão-alvo na qual a progressão dos defeitos de campo visual seja interrompida. A combinação destas terapias pode ser tentada se o tratamento isolado com um dos agentes falhar em reduzir ou manter as pressões-alvo, ou se houver progressão dos defeitos de campo visual.

A terapia cirúrgica para casos de glaucoma inclui iridectomia, para intensificar o fluxo de humor aquoso no tratamento do glaucoma de ângulo fechado, e terapia com laser de argônio para tratamento do glaucoma de ângulo aberto, com o objetivo de melhorar o fluxo de saída através da malha trabecular. Costuma-se reservar a cirurgia para glaucoma a pacientes nos quais as pressões-alvo não podem ser alcançadas com terapia médica ou a laser. Taxas de sucesso satisfatórias foram descritas para a trabeculectomia a laser de argônio, no entanto esse tratamento frequentemente implica necessidade de realização de cirurgias adicionais. Apesar dos contínuos avanços das cirurgias a laser e incisionais, a terapia médica continua sendo a terapia primária para redução da pressão intraocular. A terapia médica inicial com análogos da prostaglandina atualmente é favorecida em relação à utilização de betabloqueadores tópicos como fármaco de escolha. A trabeculoplastia a laser, utilizando fotocoagulação a laser (argônio e diodo) ou fotodisrupção a laser (frequência duplicada Nd: YAG), é reservada aos pacientes que não apresentam melhora com a terapia médica. A trabeculoplastia a laser inicial pode se mostrar tão efetiva quanto a terapia médica inicial.89

 

Degeneração macular associada à idade (DMAI)

A DMAI é um distúrbio degenerativo da mácula. A DMAI inicial é uma condição subclínica que pode ser diagnosticada por fundoscopia. Conforme evolui, a DMAI pode acarretar piora repentina e distorção da visão central, ou escotomia, que progride rapidamente, no decorrer de semanas ou meses, até que o processo de cicatrização seja concluído e não haja mais perda de visão (cegueira legal), a DMAI compromete a visão central requerida para leitura, condução de carro, reconhecimento facial e execução de todas as tarefas visuais finas. A perda insidiosa da visão central resulta nos sintomas iniciais de diminuição da percepção visual e da sensibilidade visual à luz, bem como na progressão gradual para cegueira legal, apesar da preservação da visão periférica.

 

Fatores de risco e etiologia. Em estudos de base populacional, o consumo de uma dieta com alto teor de antioxidantes está associado a um risco diminuído de DMAI. Em um destes estudos, que envolveu quase 6.000 idosos acompanhados por cerca de 10 anos, a ingesta dietética de altas concentrações de vitamina E e zinco estava associada a um risco menor de desenvolvimento de DMAI.90 Entretanto, uma revisão sistemática de estudos clínicos de suplementação com antioxidantes e minerais concluiu que não há evidências atuais de que os suplementos previnam a DMAI em pessoas assintomáticas.91 Estudos de coorte também sugerem que o tabagismo aumenta o risco de desenvolvimento de DMAI.

 

Avaliação diagnóstica. A DMAI é acentuada pela existência de anormalidades na área macular. Tais anormalidades incluem drusas moles; depósitos amarelo-esbranquiçados de material extracelular contendo debris, externamente ao epitélio pigmentar da retina; e hiper ou hipopigmentação (ou ambas) do epitélio pigmentar da retina. A soltura por neurocirurgia, hemorragias na retina e cicatrização retinal resultam gradativamente na diminuição da função visual dos fotorreceptores na visão central.92 A maculopatia tardia inclui a DMAI seca e a DMAI neovascular. A forma seca da DMAI é mais comum e acompanha a atrofia do epitélio pigmentar da retina. A DMAI neovascular (“úmida” ou exsudativa) é caracterizada por uma neovascularização coroidal com vazamento vascular para dentro dos espaços sub-retinais.92

 

Tratamento. Não existe nenhum tratamento efetivo para a forma seca da DMAI. Estudos clínicos, no entanto, constataram que a fotocoagulação a laser das formas exsudativas de DMAI resulta na diminuição da taxa de perdas de visão severas, além de preservar a sensibilidade ao contraste.87 A terapia fotodinâmica com verteporfina retarda ou previne a perda da visão durante pelo menos 1 ano de seguimento em pacientes com lesões predominantemente neovasculares clássicas.87 A terapia fotodinâmica com verteporfina ou ranibizumab diminui a severidade da DMAI e o comprometimento visual. O ranibizumab, que é administrado mensalmente via injeção intravítrea, apresentou eficácia superior à da verteporfina em pacientes com neovascularização predominantemente coroidal clássica associada à DMAI.93 Para identificar pacientes que possam ser beneficiados pela terapia a laser ou pela terapia fotodinâmica, o monitoramento doméstico dos sintomas de escotoma ou visão distorcida é realizado com auxílio de uma tela Amsler. As distorções na percepção das linhas constituem um sinal de piora dos sintomas da DMAI e indicam a necessidade de o paciente procurar atenção médica.

O tratamento da DMAI com suplementação de oxidantes por via oral pode mostrar-se efetivo para subgrupos de pacientes não fumantes que apresentem: (1) extensivas drusas de tamanho intermediário e atrofia geográfica não central em um ou em ambos os olhos; ou (2) DMAI avançada ou perda da visão unilateral causada pela DMAI. Todavia, outros estudos clínicos não mostraram os benefícios proporcionados pela suplementação no que se refere à progressão da DMAI.94 Apesar destes achados, a prática corrente consiste em prescrever vitaminas antioxidantes e minerais para pacientes com DMAI.

 

Doenças iatrogênicas

A doença iatrogênica resulta de um procedimento diagnóstico ou intervenção terapêutica que não seja consequência natural da doença do paciente. Inclui as complicações da terapia farmacológica e dos procedimentos diagnósticos ou terapêuticos, infecções nosocomiais, traumatismo e distúrbios de líquidos e eletrólitos.95

 

Polifarmácia

A causa documentada mais comum de doenças iatrogênicas são as reações farmacológicas adversas, geralmente associadas à polifarmácia. Os efeitos adversos dos fármacos são mais propensos a ocorrer em pacientes idosos, devido às alterações do metabolismo farmacológico associadas à idade, à existência de múltiplas comorbidades, e ao uso de polifarmácia. A incidência de reações farmacológicas adversas aumenta com o avanço da idade e com o número de doenças crônicas que necessitam de terapia farmacológica. Em muitos casos, a polifarmácia está associada à prescrição de medicações potencialmente inadequadas.96 Medicamentos ou classes de medicamentos específicos que em geral deveriam ser evitados por indivíduos com 65 anos de idade ou mais são identificados como inefetivos ou impõem um risco alto desnecessário a pacientes idosos, sendo que existem alternativas mais seguras disponíveis.96 Uma parte considerável desses agentes são psicotrópicos e anticolinérgicos (www.fmda.org/beers.pdf). O uso concomitante de várias medicações aumenta o risco de haver interações fármaco-fármaco e efeitos adversos. Exemplos de toxicidade e interações entre fármacos que resultam em hospitalização são a hipoglicemia associada ao uso de gliburida (um agente hipoglicêmico oral), toxicidade da digoxina relacionada ao uso de claritromicina e hipercalemia em pacientes tratados com inibidores da enzima conversora de angiotensina.97

 

Alterações do metabolismo farmacológico associadas à idade

Numerosas medicações deveriam ser utilizadas com especial cuidado por pacientes idosos, devido às alterações associadas à idade que ocorrem na farmacocinética (distribuição) e farmacodinâmica (efeitos em tecidos-alvo) desses compostos. Embora a absorção do fármaco não seja diminuída em idosos saudáveis, essa absorção pode estar diminuída em estados doentios (p. ex., má absorção) ou quando é feita a administração concomitante de agentes que diminuem a absorção de certos medicamentos (p. ex., antiácidos). A distribuição de fármacos sofre alterações com o envelhecimento, essencialmente por causa das alterações ocorridas na constituição corporal, que levam à diminuição do conteúdo total de água e massa magra do corpo e ao relativo aumento da gordura corporal. Em consequência, os fármacos hidrossolúveis atingem concentrações séricas mais altas, enquanto os fármacos lipossolúveis passam a apresentar maior tempo de meia-vida para eliminação. Esta alteração é especialmente importante no que se refere aos fármacos que são lipossolúveis e atravessam a barreira hematocefálica (p. ex., diazepam). Embora os níveis séricos de proteínas não sejam significativamente afetados pelo envelhecimento, muitos pacientes idosos apresentam níveis séricos diminuídos de albumina que resultam de doença aguda ou crônica, ou de desnutrição. Em consequência, o deslocamento de um fármaco por outro composto que se ligue à albumina com alta afinidade aumenta a distribuição do fármaco deslocado para o sítio-alvo e, assim, aumenta o risco de haver reação adversa. Exemplificando, pode haver sangramento (anticoagulação excessiva) quando pacientes tratados com varfarina recebem agentes como as sulfas ou a fenitoína.

Diminuição do fluxo sanguíneo hepático com o envelhecimento habitual resulta na diminuição do metabolismo de fármacos que sofrem alto grau de extração de primeira passagem (p. ex., propranolol). O envelhecimento e as doenças afetam o metabolismo hepático de fase I, o sistema da oxidase de função mista de enzimas microssomais. Os metabólitos ativos dos fármacos que passam pelo metabolismo de fase I podem prolongar os efeitos da medicação parental (p. ex., diazepam). O metabolismo de fase II, em que ocorre a conjugação dos fármacos, não é significativamente afetado pelo envelhecimento. Em consequência, a eliminação dos agentes que passam pela fase II do metabolismo não é afetada pelo envelhecimento normal.

A eliminação farmacológica é influenciada, sobretudo, pela função renal . A diminuição da função renal que ocorre com o avanço da idade e resulta na diminuição da depuração da creatinina necessita de menores doses de manutenção dos fármacos excretados por via renal, em pacientes idosos. Todavia, os níveis séricos de creatinina poderiam subestimar a função renal em pacientes frágeis. A insuficiência renal é mascarada e, como resultado, ocorre reação adversa a partir dos fármacos excretados por via renal.98

O efeito do envelhecimento sobre a responsividade do órgão-alvo à medicação está menos estabelecido. Contudo, a diminuída sensibilidade dos receptores beta-adrenérgicos e a aumentada sensibilidade aos opiáceos foram bem descritas. Muitos pacientes idosos também são mais suscetíveis aos efeitos adversos dos fármacos anticolinérgicos, notavelmente constipação, boca seca e delirium.

 

Avaliação diagnóstica

Devido aos efeitos imprevisíveis do envelhecimento sobre o metabolismo dos fármacos, os médicos devem suspeitar da ocorrência de reações adversas sempre que se observar qualquer sintoma novo. Do mesmo modo, deve-se considerar a determinação dos níveis sanguíneos das medicações que apresentam janelas terapêuticas estreitas (p. ex., aminoglicosídeos).

 

Prevenção e tratamento

A prevenção de doenças iatrogênicas associadas à prescrição de fármacos inadequados começa pela compreensão do uso racional dos medicamentos no tratamento de pacientes idosos. Em geral, a prescrição da menor quantidade de fármacos possível na menor dosagem necessária constitui a abordagem racional para prevenção de doenças iatrogênicas associadas à medicação. Sugestões simples para evitar efeitos colaterais incluem: conhecer bem alguns medicamentos pertencentes a cada uma das classes farmacológicas; considerar as alterações associadas à idade envolvendo a distribuição do fármaco e a sensibilidade tecidual; e utilizar doses inferiores às doses-padrão, quando as doses terapêuticas forem incertas. Ao se prescrever uma nova medicação para um paciente idoso, uma abordagem prática a ser considerada consiste em determinar se o fármaco:

 

      é lipo ou hidrossolúvel;

      liga-se com alta afinidade à albumina;

      é metabolizado pelas enzimas microssomais P-450 (e atua como substrato, indutor ou inibidor);

      é excretado por via renal (usar doses de manutenção menores para pacientes idosos e para aqueles com insuficiência renal).

 

Erros médicos

O erro médico, sendo um conceito correlato, é definido como a falha de uma ação planejada em ser concluída conforme se pretendia ou o uso de um plano incorreto para alcançar um objetivo.95 Em muitas ocasiões, esses erros envolvem uma prescrição farmacológica errônea que, às vezes, causa morbidade ou mortalidade ao paciente. A maioria dos erros médicos resulta de erros de sistema em hospitais (www.ahrq.gov/qual/errorsix.htm). Alterações em sistemas inteiros dentro dos hospitais, como o uso de sistemas computadorizados de informação médica e outros sistemas de suporte, são recomendadas para diminuir da taxa de erros.

 

Infecção nosocomial

Os patógenos nosocomiais são transmitidos principalmente pelo contato com o pessoal do hospital ou da casa de repouso. Infecções do trato urinário, da pele (intravascular) e dos pulmões e feridas são exemplos comuns de infecção nosocomial. No que se refere aos pacientes idosos, uma preocupação crescente consiste nas infecções por cepas resistentes de bacilos gram-negativos , Staphylococcus aureus meticilina-resistentes e enterococos resistentes à vancomicina. As ITU resistentes ocorrem comumente após sondagem vesical de demora por tempo prolongado.

 

Fatores de risco e etiologia

Os fatores que promovem a pneumonia nosocominal incluem aspiração gástrica, disseminação de patógenos através das mãos mal higienizadas de médicos e enfermeiros, disseminação fecal-oral de patógenos e contaminação cruzada a partir de outros pacientes. Pacientes com debilidade física, pacientes hospitalizados por tempo prolongado e pacientes expostos a antibióticos de amplo espectro apresentam, todos, risco de contrair infecções nosocomiais.

Os enterococos resistentes à vancomicina são provavelmente transmitidos de um paciente a outro pelo contato com as mãos não higienizadas de funcionários da assistência de saúde, equipamento médico contaminado ou superfícies ambientais (p. ex., trilhos de leito ou manguitos de medição da pressão arterial). A pneumonia nosocomial resulta da colonização dos tratos respiratório superior e gastrintestinal e ocorre com mais frequência em pacientes criticamente adoecidos e naqueles que dependem de ventilação.

 

Prevenção e tratamento

A infecção nosocomial pode ser prevenida por meio de: lavagem das mãos e da limpeza ou proteção dos equipamentos médicos (p. ex., estetoscópios) entre contatos com diferentes pacientes; uso de luvas e jalecos durante a execução de procedimentos invasivos ou contato com feridas e membranas mucosas; uso de técnicas assépticas ao inserir ou trocar cateteres urinários; isolamento de pacientes infectados; elevação da cabeça do paciente (para amenizar o risco de aspiração); substituição de antibióticos de amplo espectro por antibióticos de espectro estreito, tendo como base os relatos de sensibilidade bacteriana; e limitação do uso de cateteres urinários (www.cdc.gov/ncidod/dhqp/healthDis.html). As terapias antimicrobianas profiláticas e a substituição de cateteres de rotina não são práticas recomendadas.

 

O autor faz parte da divisão de oradores da Pfizer, Inc. Os fármacos haloperidol, risperidona, quetiapina e olanzapina, discutidos neste capítulo, não tiveram o uso aprovado pelo FDA para tratamento do delirium.

 

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