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Aumento no risco de câncer com Bloqueadores do Receptor de Angiotensina

Autor:

Elisabetta Sachsida Colombo

Especialista em Clínica Médica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP)

Última revisão: 01/08/2010

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Aumento no risco de câncer com Bloqueadores do Receptor de Angiotensina

 

Bloqueadores do Receptor de Angiotensina e Risco de Câncer: Uma Meta-Análise


Fator de impacto da revista (The Lancet): 30.758

 

Contexto Clínico

            O primeiro bloqueador do receptor de angiotensina (BRA), o losartan, foi aprovado para uso clínico em 1995. Desde então uma série de novos fármacos foram estudados (2). Alguns estudos experimentais sugerem que o sistema renina-angiotensina-aldosterona estaria implicado com a regulação da proliferação celular, angiogênese e progressão tumoral (3, 4). Os trials que estudaram os efeitos dos BRA salientaram seus efeitos sobre a função renal e cardiovascular, no entanto, não detalharam informações sobre a incidência de tumores mediante seu uso na prática clínica (5, 6, 7). Dessa forma foi proposta a realização dessa meta-análise, que reuniu estudos controlados e randomizados com o objetivo de averiguar o efeito dos BRA sobre a incidência de câncer, além de determinar se os BRA afetariam a ocorrência de determinados cânceres ou a mortalidade geral por neoplasia.

 

O Estudo

Foram incluídos ensaios clínicos prospectivos, randomizados, cegos e controlados que tratassem sobre o uso dos BRAs, selecionados através de  buscas sistemáticas através das bases Medline, Scopus, Cochrane e o website da FDA. Foram selecionados estudos publicados em inglês até novembro de 2009, com seguimento superior a 12 meses e com n superior a 100 pacientes. Estudos em que todos os subgrupos receberam apenas BRA foram excluídos. Sessenta estudos preencheram tais critérios de inclusão, sendo que nove estudos forneceram informações relevantes para esta meta-análise (LIFE, ONTARGET, TRANSCEND, PROFESS, CHARM-Overall, TROPHY, VAL-HEFT, OPTIMAAL, VALIANT). Ainda assim os abstracts dos estudos menores foram rastreados para termos de relevância, mas não revelaram informações adicionais.

Os dados dos estudos foram extraídos independentemente por dois investigadores. As informações extraídas foram incidência de cânceres, ocorrência de determinados tumores sólidos, mortalidade por câncer, morte por IAM, outras causas de morte, antecedente de neoplasia, duração do estudo, adesão medicamentosa, desistências dos estudos e dados sócio-demográficos outros. A meta-análise incluiu somente pacientes sem história prévia de câncer.

Foram empregados testes estatísticos para estimar o viés de publicação bem como a heterogeneidade estatística entre os estudos. Riscos relativos foram calculados para o número de pacientes e incidência de câncer em cada grupo. Também foi calculado o “número necessário para causar dano – NNH, do inglês number needed to harm” relacionado ao uso de BRA.

 

Resultados

            Não houve grandes diferenças quanto às características demográficas, história de câncer ou tabagismo entre os pacientes dos estudos. A adesão aos BRA foi de 77% a 85%, com desistências e perdas de seguimento comparáveis nos grupos tratamento e controle para cada estudo incluído. Não houve viés de publicação evidenciado pelos testes estatísticos.

Todos os estudos revelaram um maior risco para incidência de câncer quando da utilização de BRA em comparação com os grupos controle:

 

  • 7,2% X 6% pacientes, I²=0%, RR metanalítico de 1,08, IC 95%, p= 0,016
  •  

    Quando as análises ficaram limitadas aos estudos cujos dados para incidência de câncer foram coletados mais rigorosamente, também se observou um aumento do RR para neoplasia quando da utilização dos BRAs em comparação aos controles.

    A incidência de neoplasias esteve mais relacionada ao uso de IECA e BRA concomitantes em comparação aos controles que só usaram IECA. Observou-se ainda uma predominância na incidência de câncer pulmonar em todos os estudos, principalmente no LIFE trial.

    Em cinco trials estudados observou-se um aumento da incidência de câncer de próstata no grupo que usou BRA, contudo, isso não foi significativo na meta-análise (1,7% X 1,3%, RR 1,15, p=0,076) . Outras neoplasias exceto pulmão, próstata e mama não diferiram quanto à incidência nos grupos que fizeram uso de BRA e controle. Não houve diferença significativa no número de mortes por câncer entre pacientes randomizados para uso de BRA e controles durante o seguimento. Não houve viés de sobrevivência observado assim como também não houve alteração do risco para IAM no grupo randomizado para BRA. O NNH foi de 143 pacientes que deveriam ser tratados por pelo menos 4 anos com BRA para o diagnóstico de uma neoplasia nova (IC 95%).

    A maioria dos pacientes que compuseram o espaço amostral dessa meta-análise recebeu telmisartan. Quando as análises se restringem a essa droga, o aumento da incidência de neoplasias assume uma significância estatística limítrofe. O risco do aumento na incidência de qualquer neoplasia para o uso de losartan não foi significativo, mas esta droga esteve relacionada com aumento de neoplasia pulmonar. Observou-se, também, um aumento da ocorrência de neoplasias fatais quando do uso do candesartan.

     

    Aplicação para prática clínica

    Esta meta-análise mostrou que o uso de BRA está relacionado a um aumento moderado na incidência de neoplasias, de acordo com as informações até então disponíveis na literatura. Como esta meta-análise agregou apenas estudos controlados e randomizados, isso a torna bastante relevante. Os autores defendem a idéia de que este aumento moderado da incidência de neoplasias pode assumir um grande impacto populacional, de acordo com a variedade da exposição desses pacientes.

    No entanto, não é possível afirmar com precisão o risco concernente à administração de cada droga. Não se sabe com certeza se outros fármacos (valsartan, irbesartan, olmesartan, eprosartan) estariam relacionados com aumento da incidência de neoplasia.

    Nesta análise o aumento da incidência de neoplasias não significou um aumento da mortalidade, até porque se tratam de doenças de progressão insidiosa, e talvez o tempo de seguimento fosse insuficiente para afirmar mais a respeito (3 anos em média). Vale ressaltar que os estudos elencados não foram desenhados para estudar neoplasia como desfecho, e que a realização dos diagnósticos de câncer não foi padronizada nesses estudos. Devemos lembrar que possivelmente há um viés de publicação, uma vez que, com freqüência, nos registros do FDA não existem informações sobre incidência de neoplasias dentre outros dados dos pacientes usuários de BRA.

    Finalmente, meta-análises não são mais adequadas do que estudos randomizados e prospectivos para o estudo de um desfecho de interesse, no entanto, podem sugerir novas abordagens e idéias para que tais trabalhos sejam postos em prática. Muito provavelmente novos estudos experimentais esclarecerão mais sobre a fisiopatologia da oncogênese vinculada à administração de BRA, sendo que estudos de coorte seriam necessários para esclarecer o real impacto clínico da sua administração. Até que novos estudos esclareçam o papel dos BRAs na oncogênese, é opinião destes editores que este é mais um motivo para ponderar o uso dos BRA como primeira opção no tratamento da hipertensão arterial sistêmica. Já sugerir a substituição da medicação em pacientes que estão utilizando esta medicação com bom controle pressórico provavelmente seria prematuro, aconselharíamos aguardar novas informações de outros estudos antes de sugerir esta abordagem

     

    Bibliografia

    1.    Sipahi I, Debanne SM et al. Angiotensin-receptor blockade and risk of cancer:meta-analysis of randomised controlled trials. Lancet Oncology.  Published Online June 14, 2010

    2.    Schaefer KL, Porter JA. Angiotensin II receptor antagonists: the prototype losartan. Ann Pharmacother;. 1996 Jun;30(6):625-36.

    3.    Deshayes F, Nahmias C. Angiotensin receptors: a new role in cancer? Trends Endocrinol Metab 2005; 16: 293–99.

    4.    Soto-Pantoja DR, Menon J, Gallagher PE, Tallant EA. Angiotensin inhibits tumor angiogenesis in human  lung cancer xenografts with a reduction in vascular endothelial growth factor. Mol Cancer Ther 2009; 8: 1676–83.

    5.    Chobanian AV, Bakris GL, Black HR, et al. The seventh report of the Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure: the JNC 7 report. JAMA 2003; 289: 2560–72.

    6.    Hunt SA, Abraham WT, Chin MH, et al. ACC/AHA 2005 guideline update for the diagnosis and management of chronic heart failure in the adult: a report of the American College of Cardiology/ American Heart Association task force on practice guidelines (writing committee to update the 2001 guidelines for the evaluation and management of heart failure): developed in collaboration with the American College of Chest Physicians and the International Society for Heart and Lung Transplantation: endorsed by the Heart Rhythm Society. Circulation 2005; 112: e154–235.

    7.    Standards of medical care in diabetes—2009. Diabetes Care 2009;32 (suppl 1): S13–61.

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