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Dulaglutida e Desfechos Cardiovasculares em Diabetes Tipo 2

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 16/01/2020

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Contexto Clínico

 

A diabetes melitotipo 2 continua sendo um importante fator de risco cardiovascular, sendoresponsável por um aumento de 1,5 a 2 vezes no risco de morte ou eventoscardiovasculares. Nos últimos anos, o uso de análogos do GLP-1 e inibidores do SGLT-2foi associado à redução de eventos cardiovasculares. A dulaglutida é um análogodo GLP-1 aprovado para o tratamento de diabetes melito em muitos países, que écapaz de reduzir a concentração sérica de glicose, pressão arterial, peso ealbuminúria. Além disso, as evidências mais atuais sugerem que essa medicaçãotambém tem efeitos cardiovasculares benéficos, de forma similar aos outrosanálogos do GLP-1.

Neste contexto, oREWIND trial foi desenhado para avaliar se a adição de dulaglutida ao esquemade tratamento de pacientes com diabetes melito tipo 2 de meia idade, ou maisvelhos, poderia reduzir de forma segura a incidência de efeitos adversoscardiovasculares quando comparado ao placebo.

 

O Estudo

 

O estudo REWINDfoi um ensaio clínico, randomizado, duplo-cego, multicêntrico e placebocontrolado. Foram incluídos pacientes com 50 anos de idade ou mais, comdiabetes melito tipo 2, com hemoglobina glicada (HbA1c) de 9,5% ou menos, IMCde 23Kg/m², que estivessem em uso de dois ou mais hipoglicemiantes orais, comou sem uso de insulina basal, e que tivessem alto risco cardiovascular.

Os principaiscritérios de exclusão foram uma taxa de filtração glomerular (TFG) de 15mL/min/1,73m²,história de câncer nos últimos 5 anos, história de hipoglicemia grave nos últimos5 anos, expectativa de vida de menos de 1 ano, evento coronariano oucerebrovascular nos últimos 2 meses ou um procedimento de revascularizaçãoplanejado.

Os pacientes selecionadosforam submetidos a um período de run-in simples-cego com uso de placebopor 3 semanas, sendo incluídos os pacientes com 100% de aderência às injeçõessemanais. Durante esse período, os pacientes que estavam em uso de inibidoresde DPP-4 ou análogos de GLP-1 tiveram suas medicações suspensas. Todas asoutras medicações para controle do diabetes melito foram continuadas.

Os pacientes quecompletaram o período de run-in foram randomizados para receber injeçõessubcutâneas semanais de 1,5mg de dulaglutida ou placebo. Adicionalmente, osinvestigadores do estudo foram orientados a promover mudanças de estilo de vidae manejar os níveis glicêmicos dos pacientes de acordo com as recomendações dasdiretrizes de tratamento locais, sendo permitido o uso de insulina ou hipoglicemiantesorais, à exceção de outros análogos do GLP-1 ou pramlintide.

O desfechoprimário de eficácia foi um composto de infarto agudo do miocárdio (IAM) nãofatal, acidente vascular cerebral (AVC) não fatal e morte por causascardiovasculares ou desconhecidas. O desfecho secundário de eficácia foi um combinadode eventos microvasculares, composto por retinopatia diabética, doença renal,admissão hospitalar por angina instável, componentes individuais do desfecho primário,morte por todas as causas ou insuficiência cardíaca com necessidade deinternação hospitalar ou consulta urgente para modificação de terapia.

Os desfechos desegurança incluíram interrupção da medicação do estudo, pancreatite aguda,câncer, hiperplasia de células C, reações de hipersensibilidade, taquicardiasupraventricular, distúrbios de condução cardíaca, hipoglicemia grave oueventos hepáticos, gastrintestinais, renais ou urinários graves. A análiseestatística foi feita pela estratégia de intenção de tratar, com inclusão de todosos desfechos ocorridos após a randomização.

Uma análiseinterina para superioridade foi feita após a ocorrência de 756 desfechosprimários, sendo optado por dar seguimento ao estudo, que foi concluídoconforme planejado. O valor de p para a análise final de superioridadedo desfecho primário foi corrigido em virtude da análise interina, com nívelcrítico de significância ajustado para 0,0467. O efeito da intervenção emdiferentes subgrupos predeterminados também foi avaliado. O estudo foifinanciado pela Eli Lilly and Company.

Foram incluídos10.917 pacientes no estudo REWIND. Desses, 1.016 foram excluídos no período de run-in,com posterior randomização dos 9.901 pacientes remanescentes. A idade média dospacientes foi de 66,2 anos, com predominância do sexo masculino (53,7%). Dentreos pacientes incluídos, 31,5% tinham história de doenças cardiovasculares e22,2% tinham uma TFG menor que 60mL/min/1,73m².

A mediana deduração da diabetes melito foi de 9,5 anos. Dos pacientes, 81% estavam em usode inibidores da enzima conversora de angiotensina (Ieca) ou antagonistas dosreceptores da angiotensina II (BRA), 66% estavam em uso de estatinas e 54%usavam antiplaquetários. A HbA1c mediana foi de 7,2%, sendo que 81% estavam emuso de metformina, 46% de sulfonilureias e 24% de insulina. O tempo deseguimento mediano foi 5,4 anos.

Houve reduçãosignificativa do desfecho primário composto de eficácia, que ocorreu em 12% dosparticipantes no grupo dulaglutida e 13,4% no grupo placebo (HR: 0,88/IC 95%, 0,79?0,99/p= 0,026/NNT = 72). Na análise dos componentes do desfecho primário, observou-seredução significativa de AVC não fatal no grupo dulaglutida em relação aoplacebo (HR: 0,76/IC 95%, 0,61?0,95/p = 0,017).

A incidência dodesfecho secundário composto microvascular também foi significativamente menorno grupo dulaglutida em relação ao placebo (HR: 0,87/IC 95%, 0,79?0,95), reduçãoesta que foi determinada, em grande parte, pela menor ocorrência do desfechocomposto renal no grupo dulaglutida. Os participantes no grupo dulaglutida tambémobtiveram maior redução de HbA1c (0,61%), peso (1,46Kg), IMC (0,53Kg/m²),pressão arterial sistólica (1,7mmHg) e diastólica (0,49mmHg) em relação aosvalores basais dos pacientes do grupo placebo. A ocorrência dos eventosadversos de interesse especial não diferiu significativamente entre os grupos dulaglutidae placebo.

 

Aplicação Prática

 

O estudo REWIND concluiuque a adição de dulaglutida à terapia medicamentosa de pacientes com diabetesmelito tipo 2 reduziu significativamente a ocorrência do desfechocardiovascular composto ao longo de 5 anos. Os autores sugerem que adulaglutida poderia ser adicionada ao tratamento de pessoas com diabetes melitoe fatores de risco cardiovasculares adicionais para reduzir a glicemia sérica,minimizar hipoglicemia e reduzir peso, pressão arterial e eventoscardiovasculares.

Contudo, éimportante observar que a magnitude da redução do risco cardiovascular pode tersido superestimada pelo uso de um período de run-in com uso de placebopara exclusão de pacientes não aderentes, sendo possível que o benefício realda medicação na população real seja menor que o observado. Isso também seaplica às modestas reduções de peso, IMC, pressão arterial e LDL observadas.

Há mais de umadécada, o U.S. Food and Drug Administration (FDA) recomenda que ensaiosclínicos de novas medicações para o tratamento de diabetes melito demonstremque estas não estão associadas ao aumento inaceitável do risco cardiovascular. Opresente estudo corrobora as evidências atuais de que os análogos do GLP-1 sãomedicações seguras do ponto de vista cardiovascular e eficazes para o controleglicêmico de pacientes com diabetes melito, tendo o benefício adicional de reduzirdesfechos cardiovasculares, peso, pressão arterial, IMC e LDL.

Atualmente, aAmerican Diabetes Association (ADA) recomenda o uso de análogos de GLP-1 ouinibidores do SGLT-2 com benefício cardiovascular demonstrado como parte doesquema terapêutico de pacientes com doença cardiovascular estabelecida. Assim,o REWIND Trial adiciona a dulaglutida como uma opção de análogo de GLP-1 paratratamento desses pacientes, sendo particularmente útil naqueles que tambémapresentam sobrepeso ou obesidade.

 

Bibliografia

 

1. Gerstein,HC et al. Dulaglutideand cardiovascular outcomes in type 2 diabetes (REWIND): a double-blind,randomised placebo-controlled trial. Lancet 2019; 394: 121?30. Disponível em:http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(19)31149-3

2. FDA. Guidancefor Industry Diabetes Mellitus ? Evaluating Cardiovascular Risk in NewAntidiabetic Therapies to Treat Type 2 Diabetes. 2008.Disponível em: https:/www.fda.gov/media/71297/download

3. AmericanDiabetes Association. 9. Pharmacologic approaches to glycemic treatment: Standards of MedicalCare in Diabetesd2019. Diabetes Care 2019;42(Suppl.1):S90?S102

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