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Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica DPOC

Autores:

Bruno Guedes Baldi

Especialista em Pneumologia pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP).

Alberto Cukier

Doutor e Livre Docente em Pneumologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Diretor do Serviço de Pneumologia - Incor/HC - FMUSP.
Linha de pesquisa com ênfase em pesquisa clínica em Doenças Pulmonares Obstrutivas.

Última revisão: 21/03/2010

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INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES

Caracteriza-se por limitação crônica ao fluxo aéreo que não é totalmente reversível, sendo frequentemente progressiva e associada a uma resposta inflamatória anormal dos pulmões à inalação de partículas ou gases nocivos.

Geralmente é uma doença progressiva, observando-se piora da função pulmonar ao longo do tempo, mesmo que o indivíduo não se exponha mais aos fatores de risco e que utilize o melhor tratamento disponível, podendo determinar limitações na realização de atividades diárias e impacto psicossocial negativo.

Não determina apenas alterações respiratórias, mas também efeitos sistêmicos adversos, como baixo índice de massa corpórea e repercussões sobre a musculatura esquelética, principalmente nos pacientes com doença em estágio mais avançado.

É atualmente a 4ª maior causa de morte no mundo, sendo a 6ª no Brasil. Além disso, dados nacionais a identificam como a 5ª maior causa de internamento no sistema público de saúde, com uma prevalência estimada de 6% nos indivíduos acima de 40 anos de idade.

 

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

A doença costuma se originar a partir da interação de fatores ambientais e do hospedeiro (Tabela 1). Os fatores do hospedeiro que favorecem o desenvolvimento de DPOC são alterações genéticas, cuja principal representante é a deficiência de alfa-1-antitripsina, presença de hiper-responsividade brônquica, desnutrição, prematuridade e redução do crescimento pulmonar durante a gestação e a infância.

Tabagismo é o principal fator de risco ambiental e geral, podendo ocorrer com qualquer tipo de fumo, e o risco é maior com o aumento progressivo do consumo. Entretanto, entre diferentes tabagistas com a mesma carga de consumo, apenas alguns desenvolvem a doença, sugerindo que não só a carga, mas também fatores genéticos relacionados, modificam o risco. Outros fatores ambientais de risco são a exposição a poeira ocupacional (indústrias de borracha, plásticos, couro, têxtil, moagem de grãos, produtos alimentícios, entre outros segmentos de produção), irritantes químicos e poluição extra e intradomiciliar (aquecedores e fogão de lenha), além da ocorrência de infecções respiratórias graves na infância.

 

Tabela 1: Fatores de risco do hospedeiro e ambientais

Hospedeiro

Ambientais

Genético (deficiência de alfa-1-antitripsina)

Tabagismo

Hiper-responsividade brônquica

Poeira ocupacional

Crescimento pulmonar reduzido

Infecções respiratórias graves na infância

Desnutrição

Irritantes químicos

Prematuridade

Poluição do ar intra e extradomiciliar

 

Na DPOC, ocorre inflamação crônica das vias aéreas centrais e periféricas, parênquima e vasos pulmonares em resposta à inalação de partículas e gases nocivos, com acúmulo principalmente de macrófagos, neutrófilos e linfócitos T (sobretudo CD8). Essas células inflamatórias, quando ativadas, liberam vários mediadores (leucotrieno B4, interleucina 8, fator de necrose tumoral alfa, entre outros), que são capazes de lesar estruturas pulmonares e manter a inflamação neutrofílica.

Nas vias aéreas centrais, ocorre infiltração de células inflamatórias no epitélio, hipertrofia e hiperplasia de glândulas mucosas com hipersecreção de muco e redução do número de cílios. Nas vias aéreas periféricas (menores que 2 mm de diâmetro), ocorrem ciclos repetidos de lesão e reparo de suas paredes, promovendo remodelamento estrutural por meio da deposição de colágeno e formação de tecido cicatricial, o que reduz o lúmen e leva à obstrução fixa.

O principal mecanismo para a destruição do parênquima pulmonar, em geral envolvendo inicialmente as regiões superiores e, com o avançar da doença, todo o pulmão, inclusive com destruição do leito capilar pulmonar, é o desequilíbrio entre proteinases e antiproteinases (desencadeado por fatores genéticos ou por ação de células e mediadores inflamatórios). Estresse oxidativo também é um fator contributivo.

Na vasculatura pulmonar, ocorre espessamento da íntima, seguido por hipertrofia da musculatura lisa e infiltração de células inflamatórias e colágeno na parede dos vasos, o que ocorre precocemente na história natural da doença.

As alterações descritas determinam hipersecreção de muco e disfunção ciliar, que determinam tosse e expectoração crônica. Limitação ao fluxo aéreo, mais bem avaliada pela espirometria, é um ponto fundamental no diagnóstico da doença, ocorrendo por obstrução fixa, com aumento da resistência nas vias aéreas. Em quadros mais avançados, ocorre redução da capacidade pulmonar para trocas gasosas, produzindo hipoxemia e, posteriormente hipercapnia, em função de obstrução das vias aéreas periféricas, destruição do parênquima e alterações vasculares. Hipertensão pulmonar, que é a principal complicação cardiovascular da doença, e cor pulmonale em geral se desenvolvem tardiamente e pioram o prognóstico.

 

ACHADOS CLÍNICOS

Um paciente típico de DPOC apresenta inicialmente tosse e expectoração crônicas, que costumam preceder em muitos anos o desenvolvimento de limitação ao fluxo aéreo. A tosse ocorre primeiramente de modo intermitente e, a seguir, passa a acontecer durante todo o dia. A seguir, o indivíduo passa a desenvolver dispneia, sintoma que, na maioria das vezes, o leva a procurar atendimento médico, ocorrendo progressivamente aos esforços e até durante o repouso, de modo persistente, determinando limitação funcional, piora da qualidade de vida e pior prognóstico. Também pode se queixar de sibilância e sensação de opressão torácica.

O exame físico na maioria dos casos se apresenta normal ou pouco alterado. Os achados de tórax enfisematoso (com aumento do diâmetro anteroposterior), redução da mobilidade pulmonar, hipersonoridade à percussão, frêmito toracovocal e murmúrio vesicular difusamente diminuído são encontrados em geral quando a função pulmonar já está bastante comprometida. Pode-se observar expiração prolongada e estertores finos durante toda a inspiração. Com o progredir da doença, desenvolve-se cor pulmonale, podendo-se identificar turgência jugular, hepatomegalia e edema de membros inferiores, além de segunda bulha cardíaca em foco pulmonar hiperfonética, sugestiva de hipertensão pulmonar.

 

EXAMES COMPLEMENTARES

O diagnóstico é baseado numa história de exposição aos fatores de risco associado à presença de limitação ao fluxo aéreo que não é totalmente reversível, com ou sem sintomas. Nesse contexto, a espirometria é fundamental, devendo ser realizada preferencialmente na fase estável da doença, onde a relação VEF1/CVF (sendo VEF1 o volume expiratório forçado no primeiro segundo e CVF a capacidade vital forçada) menor que 70% confirma a presença de limitação ao fluxo aéreo. O VEF1 após broncodilatação, quando analisado isoladamente, é utilizado na determinação do estágio da doença. Um pico de fluxo reduzido é consistente com DPOC, mas tem pouca especificidade, pois pode ser causado por outras doenças pulmonares e por mau desempenho na realização da manobra. Existe uma relação imperfeita entre o grau de limitação ao fluxo aéreo e a presença de sintomas, de modo que a espirometria deveria ser realizada em todo indivíduo com exposição aos fatores de risco, mesmo sem sintomas.

A espirometria é muito importante na classificação da doença (Tabela 2), que tem implicações terapêuticas e prognósticas.

 

Tabela 2: Classificação da doença

Estágio

Definição

0 (em risco)

Espirometria normal; sintomas crônicos (tosse e expectoração)

1 (DPOC leve)

VEF1/CVF < 70%; VEF1 pós-BD ³ 80% normal previsto; com ou sem sintomas crônicos

2 (DPOC moderada)

VEF1/CVF < 70%; VEF1 pós-BD ³ 50% e < 80% normal previsto; com ou sem sintomas crônicos

3 (DPOC grave)

VEF1/CVF < 70%; VEF1 pós-BD ³ 30% e < 50% normal previsto; com ou sem sintomas crônicos

4 (DPOC muito grave)

VEF1/CVF < 70%; VEF1 pós-BD < 30% ou VEF1 pós-BD < 50% normal previsto + insuficiência respiratória crônica (PaO2 < 60 mmHg em ar ambiente e ao nível do mar)

Fonte: baseada no Global Strategy for the Diagnosis, Management and Prevention of Chronic Obstructive Pulmonary Disease – GOLD.

 

Teste de reversibilidade ao broncodilatador pode ser positivo na DPOC, sendo importante para classificação e orientação do tratamento.

Gasometria arterial está indicada em todo indivíduo que apresentar, em ar ambiente, saturação periférica de oxigênio menor que 90% à oximetria de pulso, que deve ser realizada periodicamente e sempre que houver exacerbação.

Radiografia de tórax raramente é diagnóstica, mas deve ser solicitada rotineiramente e, semelhante ao exame físico, os achados sugestivos só ocorrem na doença avançada. Nessa fase, pode-se evidenciar hipertransparência dos campos pulmonares, pobreza da trama broncovascular que se acentua do hilo para a periferia, rebaixamento e retificação dos hemidiafragmas, alargamento dos espaços intercostais e silhueta cardíaca menor e verticalizada. Em perfil (Figura 1), mais dados são fornecidos quanto à posição do diafragma e aumento do espaço aéreo retroesternal (maior que 2,5 cm) e do diâmetro anteroposterior do tórax podem ser evidenciados (Figura 2). Outra observação é a pouca modificação da posição do diafragma ao se comparar a radiografia em inspiração e em expiração. O seu grande benefício é no diagnóstico diferencial, principalmente para afastar neoplasia pulmonar.

 

Figura 1: Radiografia de tórax em perfil em paciente com DPOC.

 

 

 

Figura 2: Radiografia de tórax PA em paciente com DPOC.

 

 

 

Tomografia computadorizada de tórax deve ser realizada nas situações de dúvida diagnóstica ou quando um procedimento cirúrgico, como cirurgia redutora de volume ou bulectomia, estiver sendo programado (Figura 3).

 

Figura 3: Áreas enfisematosas bilaterais e bolhas mais proeminentes em pulmão direito.

 

 

 

Dosagem de alfa-1-antitripsina está recomendada nos casos de enfisema pulmonar diagnosticado antes dos 45 anos de idade, quando não há fator de risco conhecido para DPOC, quando o enfisema predomina em região basal, associado ou não a bronquiectasias, ou quando há história familiar da doença.

As determinações da capacidade pulmonar total (CPT), da capacidade residual funcional (CRF), do volume residual (VR) e da capacidade de difusão do monóxido de carbono (DLCO) permitem uma melhor avaliação dos pacientes com DPOC, podendo-se evidenciar aumento da CPT, do VR e da CRF e redução da DLCO.

Eletrocardiograma e ecocardiograma devem ser realizados nos casos em que houver suspeita de hipertensão pulmonar e cor pulmonale.

 

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Asma é o principal diagnóstico diferencial. Tem início geralmente em idade precoce (muitas vezes na infância), com sintomas predominantemente noturnos ou no início da manhã, com variação acentuada do quadro clínico. Observa-se associação com rinite, eczema e/ou atopia, além de história familiar de asma. A limitação ao fluxo aéreo em geral é bastante reversível e difere ainda pelo processo inflamatório (predomínio de eosinófilos, mastócitos e linfócitos T CD4) e pela resposta ao tratamento com corticoide inalatório (são geralmente francamente responsivos).

Na insuficiência cardíaca congestiva (ICC), podem-se observar estertores crepitantes em bases à ausculta, presença de terceira e/ou quarta bulha patológicas, além de outros achados sugestivos. Fatores de risco como hipertensão arterial sistêmica e doença arterial coronariana podem ser identificados. Radiografia de tórax demonstra aumento da área cardíaca e sinais de congestão pulmonar podem ser evidenciados. Nessa doença, os testes de função pulmonar geralmente evidenciam restrição volumétrica e não limitação ao fluxo aéreo; eletrocardiograma e ecocardiograma devem ser solicitados.

Nos casos de bronquiectasias, em geral há expectoração copiosa crônica, presença de crepitações e roncos à ausculta, podendo ocorrer baqueteamento digital e infecções respiratórias de repetição. A tomografia computadorizada de tórax é o exame padrão-ouro, demonstrando dilatação e espessamento da parede brônquica.

Na tuberculose, o quadro clínico é variado, mas deve-se ter atenção a esse diagnóstico quando há sintomas respiratórios subagudos ou crônicos associado a febre, emagrecimento e sudorese noturna, principalmente no Brasil, onde o acometimento pulmonar por essa micobactéria é bastante frequente. A confirmação diagnóstica em geral é realizada pela positividade do micro-organismo em secreção respiratória (exame direto ou cultura).

A bronquiolite obliterativa ou constritiva é bem menos prevalente e deve ser considerada nos casos de dispneia de progressão mais acelerada, em pacientes com alguma condição de risco para tal, como artrite reumatoide, exposição ocupacional compatível ou antecedente de tabagismo. Radiografia de tórax pode ser normal ou evidenciar hiperinsuflação pulmonar. Espirometria evidencia distúrbio ventilatório obstrutivo, em geral sem resposta à broncodilatação. VR, CRF e DLCO estão geralmente reduzidos, com CPT aumentada. Tomografia computadorizada de tórax é muito importante, podendo-se identificar espessamento da parede e dilatação bronquiolar, áreas de aprisionamento aéreo à expiração (padrão em mosaico) e nódulos centrolobulares.

 

Tabela 3: Diagnóstico diferencial

Causas

Testes diagnósticos

Asma

Espirometria

Teste de reversibilidade ao broncodilatador

Dosagem de IgE total e específica

Teste cutâneo para alérgenos

Insuficiência cardíaca congestiva (ICC)

Radiografia de tórax

Eletrocardiograma

Ecocardiograma

Bronquiectasias

Radiografia de tórax

Tomografia computadorizada de tórax

Tuberculose

Pesquisa em secreção respiratória (exame direto – BAAR e/ ou cultura)

Radiografia de tórax

Tomografia computadorizada de tórax

Bronquiolite

Espirometria

VR, CRF, CPT, DLCO

Radiografia de tórax

Tomografia computadorizada de tórax

 

TRATAMENTO

A estratégia para manejo do DPOC estável deve ser baseada numa avaliação individualizada da gravidade da doença e na resposta aos vários tratamentos. Deve haver aumento progressivo da utilização das modalidades disponíveis, de acordo com a gravidade, que é baseada na intensidade dos sintomas e da limitação ao fluxo aéreo, na frequência e na gravidade das exacerbações, nas complicações, na presença de insuficiência respiratória e de comorbidades e no estado geral do paciente. O tratamento depende também do nível educacional do paciente, das condições socioculturais, da adesão ao esquema recomendado e da disponibilidade dos medicamentos.

Os principais objetivos do tratamento são:

 

      evitar a progressão da doença;

      aliviar os sintomas;

      aumentar a tolerância ao exercício;

      evitar e tratar complicações;

      evitar e tratar exacerbações;

      reduzir mortalidade.

 

Manejo do DPOC Estável (Tabela 4)

Tabela 4: Manejo da DPOC estável, de acordo com estágio

Estágio

Tratamento proposto

0 (em risco)

Evitar exposição aos fatores de risco

Vacina anti-influenza

1 (DPOC leve)

Semelhante ao estágio 0 +

Broncodilatador de curta duração (agonista beta-adrenérgico e/ou brometo de ipratrópio) conforme a necessidade

2 (DPOC moderada)

Semelhante ao estágio 1 +

Broncodilatador de longa duração (agonista beta-adrenérgico e/ou brometo de tiotrópio)

Reabilitação pulmonar

3 (DPOC severa)

Semelhante ao estágio 2 +

Corticoide inalatório (VEF1 < 50% previsto pós-BD, com 2 ou mais exacerbações no último ano)

Xantina de longa duração se persistência dos sintomas

4 (DPOC muito severa)

Semelhante ao estágio 4 +

Oxigenoterapia (se insuficiência respiratória crônica)

Considerar tratamento cirúrgico (bulectomia, cirurgia redutora de volume pulmonar ou transplante pulmonar)

 

Redução dos Fatores de Risco

Reduzir exposição ao tabagismo (ativo e/ou passivo), às substâncias ocupacionais e químicas potencialmente relacionadas e aos poluentes intra e extradomiciliares.

Redução do tabagismo é a medida isolada mais efetiva para reduzir o risco de DPOC e sua progressão, além de propiciar redução do número de exacerbações da doença. É a única medida que reduz o declínio funcional acelerado da DPOC, de modo que, em tabagistas, o ritmo de redução de VEF1 é de 60 mL/ano, enquanto em ex-tabagistas é de 30 mL/ano. Para atingir esse objetivo, deve-se realizar aconselhamento, terapia cognitivo-comportamental individualizada ou em grupo e tratamento farmacológico por meio de reposição de nicotina (adesivo transdérmico e/ou goma de mascar) e da utilização de antidepressivos (bupropiona ou nortriptilina). Utilização de medicamentos está indicada para os indivíduos que fumam 20 ou mais cigarros por dia, para os que fumam o primeiro cigarro em até 30 minutos após acordar e um total de 10 ou mais ao dia, e para os que tentaram e não conseguiram cessação após terapia cognitivo-comportamental.

 

Broncodilatadores (Tabela 5)

Nenhuma das medicações disponíveis é capaz de modificar o declínio da função pulmonar e a mortalidade, porém podem reduzir os sintomas, as exacerbações e complicações.

Os broncodilatadores têm papel central no alívio sintomático, sendo administrados preferencialmente por via inalatória, conforme a necessidade ou de modo regular. Essa via determina menor frequência de efeitos adversos, porém maior atenção deve ser dispensada na técnica para administração do fármaco. Os mais utilizados são os agonistas beta-adrenérgicos e os anticolinérgicos, isolados ou associados, sendo a escolha baseada na disponibilidade e na resposta individual em termos de alívio de sintomas e efeitos adversos. Inicialmente, deve ser utilizado um agonista beta-adrenérgico ou um anticolinérgico e a combinação destes deve ser considerada nos casos em que não houver resposta a um deles isoladamente. Os de longa duração são mais efetivos e convenientes, porém são mais caros.

Não existe consenso quanto ao tipo de broncodilatador para início de tratamento, mas metilxantinas devem ser utilizadas como terceira opção, após ausência de resposta à combinação de agonista beta-adrenérgico e anticolinérigco, pois têm efeito brondilatador inferior e maior potencial de toxicidade. Deve-se monitorar seu nível sérico e a ocorrência de efeitos adversos.

 

Tabela 5: Principais apresentações de broncodilatadores disponíves

Droga

Dispositivo inalatório (mcg)

Solução para nebulização (mg/mL)

Oral

Injetável

Duração de ação (h)

Agonistas beta-adrenérgicos

Curta ação

Fenoterol

100 a 200 (N)

5

2,5 mg (C); 0,25 a 0,5 mg/ml (L)

 

4 a 6

Salbutamol

100 (N)

5

2,4 mg (C); 0,4 mg/ml (L)

0,5 mg/mL

4 a 6

Terbutalina

500 (pó)

10

2,5 mg (C); 0,3 mg/mL (L)

0,5 mg/mL

4 a 6

Longa ação

Formoterol

6 a 12 (N e pó)

 

 

 

12

Salmeterol

25 a 50 (N e pó)

 

 

 

12

Anticolinérgicos

Curta ação

Brometo de ipratrópio

20 (N)

0,25

 

 

6 a 8

Longa ação

Brometo de tiotrópio

18 (pó)

 

 

 

24

Associação agonista beta-adrenérgico e anticolinérgico

Fenoterol/Ipratrópio

100/40 (N)

 

 

 

6 a 8

Salbutamol/ipratrópio

 

 

 

 

6 a 8

Metilxantinas

Aminofilina

 

 

100 a 200 mg (C)

24 mg/mL

4 a 6

Teofilina

 

 

100, 200, 300 g (C)

 

12

Bamifilina

 

 

300 e 600 mg (C)

 

12

Associação agonista beta-adrenérgico e corticoide inalatório

Formoterol / budesonida

6/100, 200 (pó)

12/200, 400 (pó)

 

 

 

 

Salmeterol/fluticasona

50/100, 250, 500 (pó)

25/50, 125, 250 (N)

 

 

 

 

C: comprimido; G: gotas; N: nebulizador dosimetrado; L: líquido.

 

Corticoides Inalatórios

Estão indicados nos portadores de DPOC com VEF1 inferior a 50% do normal previsto após broncodilatação, associada a duas ou mais exacerbações com necessidade de antibiótico ou corticoide oral no último ano.

 

Vacina Anti-Influenza

Deve ser administrada anualmente no outono.

 

Vacina Antipneumocócica

Apesar de sua eficácia não estar confirmada em DPOC, considerar sua utilização a cada 5 anos.

 

Reabilitação Pulmonar

Pacientes em todos os estágios da DPOC se beneficiam em algum grau de reabilitação pulmonar, principalmente a partir do estágio moderado. Proporciona redução do número de exacerbações, de hospitalizações e de dias de internamento, melhora a sensação de dispneia, a qualidade de vida e a capacidade de realizar exercícios. O tempo mínimo para reabilitação é de 8 semanas, porém os benefícios tendem a ser reduzidos progressivamente nos 18 meses seguintes após sua interrupção.

 

Oxigenoterapia

A administração de oxigênio a longo prazo por mais de 15 horas/dia, incluindo as 12 horas noturnas, aumenta a sobrevida de pacientes com insuficiência respiratória crônica. As indicações são:

 

      PaO2 £ 55 mmHg ou SaO2 £ 88%, com ou sem hipercapnia;

      PaO2 entre 55 e 60 mmHg ou SaO2 entre 88 e 90%, se houver evidência de hipertensão pulmonar, edema periférico sugestivo de cor pulmonale e/ou policitemia (hematócrito acima de 55%).

 

A decisão sobre o uso de oxigênio deve ser baseada no valor de PaO2 ou SaO2 com o indivíduo acordado e em repouso. A titulação dos fluxos deve ser realizada com o oxímetro de pulso durante repouso, exercício e sono, até que se obtenha saturação de pulso da oxiemoglobina maior ou igual a 90% (SpO2 ³ 90%). O período de oxigenoterapia domiciliar deve incluir as 12 horas noturnas, pois a hipoxemia durante a vigília se acentua durante o sono. Recomenda-se a adição de 1 L/min de oxigênio durante a noite, em relação à prescrição durante o dia, e aumento do fluxo de oxigênio aos esforços em pacientes que já o utilizam em repouso e sua administração naqueles que só reduzem a saturação durante as atividades físicas, de acordo com necessidades específicas. Durante viagens aéreas, aumentar o fluxo em 1 a 2 L/min em relação ao repouso.

A prescrição deve incluir a fonte de oxigênio suplementar (gás ou líquido), o sistema de liberação (cilindros, concentradores ou oxigênio líquido), a duração e o fluxo ao repouso, durante exercício e sono.

 

Tratamento Cirúrgico

Cirurgia Redutora de Volume Pulmonar

Está indicada nos portadores de enfisema predominante em lobos superiores, principalmente nos que apresentam baixa capacidade de exercício após programa de reabilitação pulmonar.

 

Bulectomia

Em pacientes cuidadosamente selecionados, esse procedimento é efetivo para reduzir a dispneia e melhorar a função pulmonar ao permitir a reexpansão de uma região pulmonar comprimida pela presença de bolhas.

 

Transplante Pulmonar

Está indicado nos casos de VEF1 < 35% do normal previsto após broncodilatação, PaO2 < 60 mmHg, PaCo2 > 50 mmHg e hipertensão pulmonar secundária, sem outras alternativas clínicas ou cirúrgicas, sem comorbidades, com menos de 65 anos de idade, com boa condição psicossocial e familiar e boa motivação para viver.

 

Tratamento do Cor Pulmonale Crônico e da Hipertensão Pulmonar

A medida mais eficaz é a oxigenoterapia. Diuréticos devem ser utilizados se houver edema, tomando-se o cuidado para não reduzir o débito cardíaco e a perfusão renal e para não aumentar a viscosidade sanguínea. Em geral, digitálicos e vasodilatadores não são eficazes. Pode-se realizar flebotomia se houver hematócrito acima de 55% e cor pulmonale não controlado com outras medidas.

 

Manejo das Exacerbações

Consiste na piora sustentada da condição clínica do paciente, quando comparada ao período estável, não sendo relacionada à variação diária que ele apresenta, de início agudo e que necessita de mudança na medicação habitual, com aumento considerável do custo socioeconômico. A causa mais frequente é a infecção respiratória, que, na maioria das vezes, não apresenta as características sugestivas como febre, leucocitose e alterações radiológicas, que, dessa forma, não são imprescindíveis para o início da antibioticoterapia. A principal característica da infecção, em geral restrita à mucosa brônquica, é uma alteração no aspecto e/ou na quantidade de expectoração, que se torna purulenta, associada ao aumento da dispneia. Dentre as causas infecciosas, as bactérias representam 2/3 e os vírus, 1/3 dos casos. Os principais agentes etiológicos são Haemophilus influenzae, Streptococcus pneumoniae, Moraxella Catarrhalis e os vírus respiratórios. A gravidade da DPOC é um dado que pode sugerir a possível etiologia, de modo que indivíduos com VEF1 menor que 50% do normal previsto têm maior chance de sofrer exacerbação por Haemophilus influenzae ou Pseudomonas aeruginosa. Pneumonia, insuficiência cardíaca, pneumotórax, derrame pleural, embolia pulmonar, arritmia cardíaca e infarto agudo do miocárdio são outras causas de exacerbação, porém, em cerca de 1/3 dos casos, o fator desencadeante não é identificado.

 

Exames Solicitados durante a Suspeita de Exacerbação

1.    Testes de função pulmonar: é difícil realizá-los durante a exacerbação, porém pico de fluxo expiratório menor que 100 mL/min e/ou VEF1 menor que 1 L podem ser indícios de quadro grave.

2.    Gasometria arterial: PaO2 menor que 60 mmHg e/ou SatO2 menor que 90% (em ar ambiente) indicam insuficiência respiratória. PaO2 menor que 50 mmHg, PaCO2 maior que 70 mmHg e pH menor que 7,30 indicam maior gravidade do quadro.

3.    Radiografia de tórax: sua maior utilidade é para o diagnóstico diferencial.

4.    Eletrocardiograma: para avaliar a presença de hipertrofia de ventrículo direito, arritmias e episódios isquêmicos agudos.

5.    Cultura do escarro e antibiograma: só devem ser realizados quando não houver resposta completa ao tratamento instituído.

 

Principais Objetivos no Tratamento da Exacerbação

1.    Tratar quadros infecciosos, tromboembolismo pulmonar, síndrome coronariana aguda, arritmias e insuficiência cardíaca congestiva.

2.    Melhorar a oxigenação para manter a saturação de pulso da oxiemoglobina entre 90 e 92%.

3.    Reduzir a resistência das vias aéreas com o uso de broncodilatadores, corticoides sistêmicos e fisioterapia respiratória.

4.    Nutrição adequada.

5.    Ventilação não invasiva ou invasiva, quando indicadas.

 

Tratamento Domiciliar das Exacerbações

1.    Broncodilatador inalatório: deve-se aumentar a dose e/ou a frequência do agonista beta-adrenérgico de curta duração e, se necessário, acrescentar brometo de ipratrópio.

2.    Corticoides sistêmicos: prednisona na dose de 40 mg por 10 dias (ou equivalente) deve ser utilizada.

3.    Antibióticos: (Tabela 6): estão indicados quando houver piora da dispneia e a expectoração aumentar de volume e se tornar purulenta.

 

Tabela 6: Tratamento antibiótico ambulatorial recomendado

Grupo

Patógenos mais frequentes

Tratamento recomendado

DPOC com VEF1 > 50% e sem fatores de risco

H. influenzae, M. catarrhalis, S. pneumoniae, C. pneumoniae, M. pneumoniae

Betalactâmico + inibidor de betalactamase; cefuroxima; azitromicina/claritromicina

DPOC com VEF1 > 50% e com fatores de risco

H. influenzae, M. catrrhalis, S. pneumoniae resistente à penicilina

Os anteriores mais moxifloxacino / gatifloxacino / levofloxacino; telitromicina

DPOC com VEF1 entre 35 e 50%

H. influenzae, M. catrrhalis, S. pneumoniae resistente à penicilina, Gram-negativos entéricos

Moxifloxacino / gatifloxacino / levofloxacino; telitromicina; betalactâmico + inibidor de betalactamase

DPOC com VEF1 < 35%

H. influenzae, S. pneumoniae resistente à penicilina, Gram-negativos entéricos, P. aeruginosa

Moxifloxacino / gatifloxacino / levofloxacino; ciprofloxacina se suspeita de P. aeruginosa; betalactâmico + inibidor de betalactamase (se alergia às quinolonas)

 

Tratamento Hospitalar das Exacerbações

As indicações para tratamento em nível hospitalar são:

 

      insuficiência respiratória aguda grave (aumento acentuado da dispneia; distúrbios de conduta ou hipersonolência; incapacidade para se alimentar, dormir ou deambular);

      aparecimento de cianose e edema periférico;

      hipoxemia refratária; hipercapnia com acidose;

      tromboembolismo pulmonar, pneumonia, pneumotórax ou arritmias;

      insuficiência cardíaca descompensada ou descompensação de outra condição associada, como diabetes;

      ausência de condição socioeconômica para realização de tratamento ambulatorial;

      situações de dúvida diagnóstica;

      ausência de resposta ao tratamento inicial.

 

As indicações de admissão imediata em UTI são:

 

      dispneia intensa que não responde ao tratamento inicial;

      confusão, letargia, coma;

      hipoxemia persistente ou em piora progressiva (PaO2 < 40 mmHg) e/ou hipercapnia persistente ou em piora progressiva (PaCO2 > 60 mmHg) e/ou acidose respiratória persistente ou em piora progressiva, apesar da suplementação de oxigênio e de ventilação não invasiva com pressão positiva.

 

1.    Oxigenoterapia

Para manter saturação de pulso da oxiemoglobina entre 90 e 92% e PaO2 entre 60 e 65 mmHg, sem retenção de CO2 ou acidose. A melhor fonte é a máscara de Venturi.

 

2.    Broncodilatadores

O esquema mais adequado é a utilização de agonista beta-adrenérgico inalatório de curta duração, inicialmente a cada 20 minutos até 3 doses e, em seguida, a cada 4 horas, associado à brometo de ipratrópio a cada 4 horas, até estabilização. Em quadros mais graves, considerar a associação de metilxantina oral ou endovenosa, controlando-se seu nível sérico e a ocorrência de efeitos adversos.

 

3.    Corticoides sistêmicos

Hidrocortisona ou metilprednisolona endovenosa por até 72 horas, seguida de prednisona (ou equivalente) por via oral, completando-se 10 a 14 dias.

 

4.    Antibióticos

Mesmas considerações para o manejo domiciliar.

 

5.    Ventilação mecânica não invasiva com pressão positiva (VNIPP)

Suas indicações são:

      dispneia moderada a grave, com utilização de musculatura acessória e movimento abdominal paradoxal;

      pH sérico entre 7,25 e 7,35 e hipercapnia (PaCO2 > 45 mmHg);

      frequência respiratória entre 25 e 35 por minuto.

 

Proporciona elevação do pH, redução da PaCO2, do grau de dispneia, do tempo de hospitalização, da mortalidade, da necessidade de entubação traqueal e da ocorrência de pneumonia associada à ventilação mecânica.

 

6.    Ventilação mecânica invasiva

Suas indicações são:

      frequência respiratória acima de 35 por minuto;

      hipoxemia grave(PaO2 < 40 mmHg);

      acidose grave (pH < 7,25) e hipercapnia grave (PaCO2 > 60 mmHg);

      parada respiratória;

      alteração do nível de consciência (sonolência, letargia, coma);

      instabilidade hemodinâmica;

      falha ou contraindicação à VNIPP (alto risco de aspiração; paciente pouco cooperativo; cirurgia recente facial ou gastroesofágica; trauma craniofacial)

 

7.    Fisioterapia respiratória

Indicada para os pacientes com atelectasia lobar e/ou com eliminação de escarro superior a 25 mL/dia, sendo realizada por meio de percussão torácica manual ou mecânica, drenagem postural e métodos para estimular tosse. Deve ser avaliada individualmente.

 

8.    Suporte clínico em geral

Reposição volêmica, nutrição adequada, heparinização profilática, principalmente em pacientes imobilizados, policitêmicos ou desidratados, outras medidas conforme a necessidade.

 

TÓPICOS IMPORTANTES

      É uma condição bastante frequente no Brasil e no mundo, com previsão de aumento da prevalência e da mortalidade para os próximos anos.

      São necessários estudos longitudinais para avaliar o curso da DPOC em várias populações expostas a diferentes fatores de risco, para avaliar como fatores genéticos interagem com fatores ambientais no surgimento e progressão da doença, o que poderia explicar, por exemplo, porque alguns fumantes desenvolvem DPOC, enquanto outros não, apesar de expostos a uma mesma carga tabágica.

      O diagnóstico é habitualmente baseado na exposição aos fatores de risco associado a alterações sugestivas à espirometria, independentemente da presença de sintomas.

      Outros exames complementares têm importância somente para diagnóstico diferencial e para planejamento terapêutico.

      A medida terapêutica mais importante é a cessação do tabagismo.

      Outras modalidades de tratamento incluem o uso de broncodilatadores, corticoides, metilxantinas, oxigenoterapia, reabilitação pulmonar e procedimentos cirúrgicos, além de métodos ventilatórios, de acordo com a indicação e com a fase em que a doença se encontra (estabilidade ou exacerbação).

      É necessária maior compreensão sobre os mecanismos celulares e moleculares de inflamação no DPOC estável e durante as exacerbações, para que novas modalidades terapêuticas sejam desenvolvidas, visto que nenhuma das drogas utilizadas atualmente é capaz de evitar a progressão da doença.

 

ALGORITMOS

Algoritmo 1: Diagnóstico e manejo da doença estável.

 

 

Algoritmo 2: Manejo das exacerbações.

 

 

BIBLIOGRAFIA

Adaptado, com autorização, do livro Clínica Médica: dos Sinais e Sintomas ao Diagnóstico e Tratamento. Barueri: Manole, 2007.

1.    II Consenso Brasileiro de DPOC. Jornal Brasileiro de Pneumologia (Publicação oficial da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia) 2004; 30(supl 5):S1-S42.

2.     Global Strategy for the Diagnosis, Management and Prevention of Chronic Obstructive Pulmonary Disease (GOLD) – Executive Summary – UpDated 2004: NHLBI/WHO; 1-31.

3.    British Thoracic Society. Guidelines of chronic obstructive pulmonary disease. Thorax 1997; 52(Suppl):S1-S28.

4.    Sin DD, McAlister FA, Anthonisen NR. Contemporary management of chronic obstructive Pulmonary Disease (Scientific Review). JAMA 2003; 290(17):2301-12.

5.    Calverley PMA, Malker P. Chronic obstructive pulmonary disease. Lancet 2003; 362:1053-61.

6.    Sutherland ER, Cherniack RM. Management of chronic obstructive pulmonary disease. N Engl J Med 350:2689-97.

7.    Stoller JK. Acute exacerbations of chronic obstructive pulmonary disease. N Engl J Med 346(13):988-94.

8.    National Emphysema Treatment Trial Research Group. A randomized trial comparing lung volume reduction surgery with medical therapy for severe emphysema. N Engl J Med 2003; 348:2059-73.

 

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