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Hemocromatose Hereditária

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 11/09/2015

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A Hemocromatose hereditária (HH) é a doença genética mais comum na população caucasiana. Embora sua distribuição geográfica seja mundial, é concentrada em indivíduos de origem europeia do Norte, particularmente de ascendência nórdica, ocorrendo com uma prevalência perto de 1 para 200 pessoas. A predisposição genética e o aumento inadequado da absorção de ferro na dieta pode levar ao desenvolvimento progressivo das complicações da cirrose, do câncer hepatocelular, da diabetes e das doenças cardíacas. A doença é causada principalmente por mutações genéticas no gene HFE. O defeito genético descrito mais comum é uma mutação G para A missense (C282Y) que conduz à substituição de tirosina por cisteína na posição de aminoácido 282 do produto de proteína do gene HFE localizado no braço curto do cromossomo 6 (6p). Outra mutação (H63D) na qual o ácido aspártico é substituído por histidina na posição 63 também tem sido associada como um fator, em alguns casos de hemocromatose. Na maior parte dos estudos até a data à mutação, C282Y/C282Y em homozigose foi encontrada em mais de 90% dos pacientes com hemocromatose, enquanto a heterozigosidade composta (C282Y/H63D) representa de 3% a 5% dos casos.

Um estudo populacional de grande porte mostrou que mutação do gene HFE C282Y tinha saturação de transferrina elevada em todos os casos (acurácia preditiva 100% positiva). No entanto, a plena expressão clínica da doença ocorreu em 58% desses homozigotos.

 

Fisiopatologia

O ferro é normalmente perdido no suor e pelo trato gastrointestinal na velocidade de 1 mg ao dia, as mulheres ainda perdem ferro via menstruação, para compensar estas perdas são equilibradas com a absorção de 10-20% do ferro da dieta. A Hemocromatose hereditária é caracterizada pela absorção de ferro, o que leva a progressivo acúmulo do ferro, que ocorre em órgãos-alvo causando lesões.

 

Manifestações Clínicas

O quadro clínico da Hemocromatose hereditária evolui em uma série de estágios que começam com o acúmulo clinicamente insignificante de ferro (0-20 anos de idade, com 0-5 g de parênquima de armazenamento de ferro). Posteriormente, a doença evolui para uma fase de sobrecarga de ferro sem doença (cerca de 20-40 anos de idade, 10-20 g de armazenamento de ferro no parênquima), que se não tratado, pode evoluir para um estágio de sobrecarga de ferro com lesão de órgão (geralmente mais de 40 anos de idade e mais de 20 g de armazenamento de ferro do parênquima).

As manifestações clínicas de acúmulo de ferro incluem doenças hepáticas, hiperpigmentação cutânea, diabetes mellitus, artropatia, impotência sexual em homens e aumento da área cardíaca podendo cursar com insuficiência cardíaca com ou sem defeitos de condução. Um estudo com 250 casos encontrou as seguintes alterações nos pacientes:

 

-Alterações da função hepática em 75% dos casos;

-Fraqueza e letargia em 74% dos casos;

-Hiperpigmentação cutânea em 70% dos casos;

-Diabetes Mellitus em 48% dos casos;

-Artralgia em 44% dos casos;

-Impotência sexual masculina em 45% dos casos;

-Anormalidades eletrocardiográficas em 31% dos casos.

 

Os pacientes com hemocromatose e cirrose apresentam as manifestações habituais de doença hepática e suas complicações, como hepatomegalia, aumento de enzimas hepáticas e eventualmente desenvolvimento de fibrose o????????falamaçerro nos hepate \de fibrosentes alteraçadados com a necessidade de entubaçC monitorizaç pseudomonas irntra-latee cirrose, e suas complicações como varizes esofágicas.

O depósito anormal de ferro nos hepatócitos por si só não causa inflamação, mas se outra condição ocorre, como esteatose hepática, álcool ou outra condição pode predispor as alterações e levar ao aumento de enzimas hepáticas.

O grau de sobrecarga de ferro tem um impacto direto sobre a expectativa de vida no paciente com HH. As principais causas de morte são cirrose descompensada, carcinoma hepatocelular (HCC), diabetes mellitus e cardiomiopatia. Estas ocorrem com uma frequência de 10 a 119 vezes maior do que o esperado em uma população equivalente em idade e sexo sem HH. Sobrevida foi normal em doentes com HH nos quais o tratamento foi iniciado antes do desenvolvimento de cirrose ou de diabetes, confirmando a importância do diagnóstico precoce e tratamento.

 

Diagnóstico

Qualquer estratégia para o diagnóstico deve identificar os casos antes de se tornarem clinicamente relevantes. O diagnóstico de hemocromatose é baseado na documentação do aumento das reservas de ferro, ou seja, o aumento da concentração de ferro hepático associado a elevados níveis de ferritina no soro. O diagnóstico de HH pode ser ainda realizado genotipicamente pela ocorrência familiar de sobrecarga de ferro associada à mutação genética C282Y ou C282Y/H63D heterozigotos. 

A maioria dos pacientes com HH são agora identificados enquanto ainda assintomáticos e sem evidência de fibrose hepática ou cirrose em fase em que existe um tratamento efetivo que pode prevenir o aparecimento de doença hepática e outras complicações. As estratégias de rastreamento de diagnóstico devem visar grupos de risco como aqueles com envolvimento de órgãos suspeito, uma história familiar de HH, e aqueles com detecção de alterações bioquímicas ou radiológicas sugestivas da possibilidade de sobrecarga de ferro, um rastreamento da população em geral sem estas situações não é recomendado.

 

São consideradas populações em que se deve rastrear o diagnóstico de hemocromatose as seguintes:

 

SINTOMÁTICOS

-Pacientes sintomáticos de doença hepática ou de qualquer outra doença que possa ser causada por sobrecarga de ferro.

-Manifestações inexplicáveis de doença hepática ou pacientes com doença hepática e achados de sobrecarga de ferro.

-Diabetes mellitus tipo 2, em particular com hepatomegalia, aumento de enzimas hepáticas, doença cardíaca atípica ou de início precoce, disfunção sexual de início precoce,  artropatia atípica.

 

ASSINTOMÁTICOS

-Parentes de primeiro grau de um caso confirmado de HH com marcadores séricos de ferro anormais descobertos durante exames de rotina.

-Os indivíduos com elevação inexplicada de enzimas hepáticas ou a descoberta fortuita de hepatomegalia assintomática ou detecção radiológica de fígado com atenuação aumentada em tomografia.

 

Felizmente, o exame sorológico bioquímico com os marcadores de ferro indiretos é capaz de identificar a maioria dos casos de sobrecarga de ferro de risco que permite intervenção antes dos danos em tecidos se tornarem irreversíveis. Portanto, estas orientações irão enfatizar o objetivo fundamental da detecção de HH antes da lesão de órgão ocorrer.

O rastreamento em familiares é realizado via transferrina e ferritina para caracterizar a presença de sobrecarga de ferro, além de teste de mutação para o gene HFE.

O diagnóstico de sobrecarga de ferro é realizado quando a saturação de transferrina é acima de 45% e ferritina acima de 200 mcg/L, em pacientes com valores de transferrina abaixo de 45% o diagnóstico pode ser descartado. Em pacientes com estes valores e mutação homozigótica C282Y, o tratamento está indicado, se os valores de ferritina forem maiores que 1000 mcg/L ou as enzimas hepáticas forem elevadas é indicado antes de iniciar o tratamento realizar biopsia hepática para avaliar o grau de doença hepática. Em pacientes em que a saturação de transferrina e ferritina forem elevadas com a mutação C282Y/H63D, ou outras mutações, deve-se excluir outras causas de hepatopatias verificando a concentração intrahepática de ferro e realizando biopsia hepática diagnóstica.

Ao identificar pacientes em risco, o tratamento para prevenção da doença é a flebotomia repetida para evitar as complicações da sobrecarga de ferro. Devido ao fato de o tratamento ser eficaz e simples, estudos randomizados e controlados de outras terapias ou observação não foram realizados.

O desenvolvimento de lesões hepáticas em pacientes com HH está relacionado com o acúmulo progressivo de ferro hepático. A concentração hepática de ferro aumenta com a idade, na maioria dos homozigotos. Em doentes com HH com idade superior a 40 anos, a concentração hepática de ferro provavelmente excede 10.000 gramas de peso e a biópsia hepática pode mostrar fibrose ou cirrose. A ressalva de que concentração hepática de ferro aumenta com a idade levou ao conceito de índice de ferro hepático. Um índice de ferro hepático (HII) superior a 1,9 mol/g por ano de vida foi encontrado para distinguir de forma eficaz hemocromatose homozigotos de heterozigotos e pacientes com doença hepática induzida pelo álcool. No entanto, a taxa de acúmulo de ferro é sujeita a variações e podem ocorrer exceções entre 8 e 50%.                                  

Outros marcadores indiretos de reservas de ferro, tais como ferro sérico ou ferritina, carecem de especificidade quando usados isoladamente. O ferro sérico tem valores preditivos positivos e negativos para HH de 61% e 87%, respectivamente, em comparação com 74% e 93% para saturação de transferrina. A ferritina também é inespecífica particularmente em face das condições inflamatórias, como hepatite crônica C, doença hepática induzida pelo álcool e doenças neoplásicas. No entanto, um nível de ferritina sérica em combinação com a saturação de transferrina tem um valor preditivo negativo de 97% e excede a precisão de qualquer um dos testes indiretos isolados. Um nível de ferritina sérica >1,000 ng / mL é preditor do grau de fibrose hepática (cirrose).

Aos pacientes que não são susceptíveis de lesão hepática significativa pode ser oferecida flebotomia terapêutica sem a necessidade de uma biopsia hepática. Isto inclui indivíduos com menos de 40 anos de idade que não têm nenhuma evidência clínica de doença hepática (alanina transaminase levantada, hepatomegalia, etc.) e cuja ferritina sérica for inferior a 1.000 ng / mL. Os maiores valores de ferritina sérica estão associados com um aumento da probabilidade de fibrose hepática significativa ou cirrose, por este motivo recomendada a biopsia. Por outro lado, a biopsia hepática deve ser oferecida para documentar o grau de fibrose em todos os homozigotos que estão sobre a idade de 40 anos ou a aqueles que têm um nível de alanina transaminase sérica elevada, que têm evidência clínica de doença hepática, ou têm uma ferritina sérica superior a 1.000 mcg/L. Nestes pacientes, o maior preditor da presença de cirrose são valores de ferritina acima de 1000 mcg/L sendo a cirrose rara em pacientes com valores de ferritina abaixo deste ponto de corte.

A biopsia hepática pode mostrar a concentração de ferro hepática, que ciostuma ser 10 vezes, ou mais, maior em pacientes com HH, mas sua utilidade não se limita a isto, pois pode avaliar ainda a presença de fibrose ou cirrose. Os níveis das transaminases séricas podem ser úteis na identificação de doença hepática crônica, mas falta valor de precisão negativa. Metade dos pacientes cirróticos tem transaminases. A sobrevida em doentes com HH sem cirrose é semelhante à população controle normal, enquanto aqueles com cirrose têm aumento de mortalidade. Cirrose e suas complicações, como câncer hepatocelular particularmente, são responsáveis por três quartos das mortes relacionadas com HH. Assim, vigilância para hepatocarcinoma é recomendada nestes pacientes. 

 

Tratamento de Hemocromatose

É significativa a evidência de que a instituição da terapia com flebotomia antes do desenvolvimento de cirrose e diabetes reduz de forma expressiva a morbidade e a mortalidade de HH. Portanto, a identificação precoce e o tratamento preventivo das pessoas em risco são necessários. Este tratamento inclui indivíduos assintomáticos com mutação homozigótica para HH e marcadores de sobrecarga de ferro, bem como outros com evidência de níveis potencialmente tóxicos de ferro hepático. Em pacientes sintomáticos, tratamento também é defendido, pois pode diminuir a lesão em órgãos-alvo. Certos achados clínicos podem ser melhorados por flebotomia (mal-estar, fadiga, pigmentação da pele, necessidade de insulina no diabetes, dor abdominal-), enquanto que outras características são menos sensíveis à remoção de ferro (artropatia, hipogonadismo, cirrose). As complicações da cirrose, especialmente hepatocarcinoma (HCC), com risco de vida continuam a ser uma ameaça para a sobrevivência, mesmo após flebotomia adequada. O HCC é responsável por cerca de 30% de todas as mortes em HH, enquanto outras complicações da cirrose contam para um adicional de 20%. A observação de que HCC é extremamente rara em não cirrótico.

O tratamento de sobrecarga de ferro em pacientes com HH pode ser sumarizado abaixo:

 

Tratamento da hemocromatose

-Uma flebotomia (remoção de 500 mL de sangue) semanalmente ou quinzenalmente. Deve-se verificar o hematócrito antes de cada flebotomia; não permitindo o hematócrito cair por mais do que 20% do nível prévio;

-Verificar o nível de ferritina sérica a cada 10-12 flebotomias;

-Deve-se interromper a flebotomia frequente quando ferritina sérica cai abaixo de 50 ng/ ml. A flebotomia será continuada em intervalos maiores com objetivo de manter a ferritina entre 25 e 50 mcg /L;

-Devem-se evitar os suplementos de vitamina C.

 

Uma situação que necessita ser discutida é a sobrecarga de ferro secundária devido à diseritropoiese, como por múltiplas transfusões. Quando indicado deferoxamine (Desferal) na dose de 20-40 mg/kg de peso corporal por dia, deve-se considerar a biópsia hepática para acompanhamento para verificar a adequação da remoção de ferro. Os suplementos de vitamina C alteram o metabolismo de ferro piorando a sobrecarga e, portanto devem ser evitados.

A base do tratamento para HH permanece a flebotomia. Uma unidade de sangue (igual à cerca de 250 mg de ferro, dependendo do hematócrito) deve ser removida uma vez ou duas vezes por semana, conforme tolerado, o objetivo é reduzir em até 2 a 3 anos os estoques de ferro até o ponto final desejado, que é um pouco abaixo da deficiência de ferro. Portanto, o alvo é ferritina sérica de 50 mcg/L. Níveis inferiores a 25 ng/mL indicam deficiência de ferro e necessitam de uma interrupção temporária de novas flebotomias.

Arritmias cardíacas e miocardiopatia são as causas mais comuns de morte súbita em estados de sobrecarga de ferro. Uma vez que o risco destas complicações pode aumentar durante a rápida mobilização de ferro, certas precauções são importantes. Doses farmacológicas de vitamina C aceleram a mobilização de ferro a um nível que pode saturar transferrina circulante, o que resulta potencialmente num aumento de atividade do pró-oxidante e dos radicais livres. Portanto, a suplementação de vitamina C deve ser evitada por pacientes submetidos phlebot à flebotomia.

A cirrose não reverte com a remoção de ferro e o desenvolvimento de doença hepática descompensada é uma indicação de transplante hepático. No entanto, a sobrevida dos pacientes transplantados HH é menor do que naqueles transplantados por outras causas de doença hepática.

Todos os pacientes com HH que têm evidências de sobrecarga de ferro devem ser fortemente encorajados a submeterem-se ao tratamento com flebotomias regulares até os estoques de ferro estarem esgotados. Estas devem ser continuadas por toda a vida, avaliando a frequência da terapia de manutenção no nível de ferritina sérica.

 

Referências

1- Bacon BR, Adams PC, Kowdley KV, et al. Diagnosis and management of hemochromatosis: 2011 practice guideline by the American Association for the Study of Liver Diseases. Hepatology 2011; 54:328.

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