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obesidade

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 24/06/2016

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A obesidade é definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como acúmulo excessivo de gordura que possa representar um risco para saúde. É uma doença crônica e multifatorial e de grande importância. Nos últimos 50 anos, a obesidade tornou-se um problema de saúde pública internacional que afeta a qualidade de vida, aumenta o risco de doença e aumenta os custos de cuidados de saúde em países em todas as partes do mundo. A mensuração da obesidade é realizada através do índice de massa corporal (IMC; peso em kg / altura em m2), que tem uma boa correlação com gordura corporal. O IMC tem a vantagem da simplicidade em estudos epidemiológicos, mas ele tem deficiências porque não faz distinção entre a gordura e a massa corporal magra. A tabela 1 sumariza os resultados do IMC e sua relação com a obesidade.

 

Tabela 1: Diagnóstico de obesidade baseado no IMC

 

 

 

Em crianças, o diagnóstico é feito pelo percentil do IMC. Crianças com percentil maior ou igual a 95 apresentam obesidade; e de 85 até 95, sobrepeso. Estudos observacionais realizados nos Estados Unidos e em outros países mostram crescentes números de obesos também na população infantil e em adolescentes, além do aumento na incidência das doenças relacionadas à obesidade nessa faixa etária, como diabetes tipo 2, dislipidemia, esteato-hepatite não alcoólica, apneia do sono, entre outras.

Em relação à saúde, se sabe que a obesidade localizada na região abdominal, que representa a gordura visceral, apresenta correlação maior com complicações como DM tipo 2, HAS e doença cardiovascular. Assim, outras medidas complementares ao IMC devem ser avaliadas,  incluindo a circunferência abdominal, já que refletem diretamente na gordura visceral. Valores acima de 102 cm em homens e 88 cm em mulheres são associados a maior risco metabólico e cardiovascular. O médico deve levar em consideração a etnia ao avaliar a circunferência abdominal, além das medidas de adiposidade central, pressão arterial, glicose e lípides (HDL e triglicéridos).

O tratamento da obesidade é caro e seus custos sobem proporcionalmente com o aumento do IMC. A obesidade tem uma natureza multifatorial resultante de fatores genéticos, fisiológicos, comportamentais, sócioculturais e fatores ambientais que levam a um desequilíbrio entre consumo e gasto energético durante um período de tempo prolongado. A importância do sono, alterações endócrinas, alimentos, cessação do tabagismo, ganho de peso associado a alguns medicamentos, idade avançada dos pais no nascimento, e efeitos intrauterinos têm sido relatados e descritos como contribuintes para a epidemia de obesidade. A obesidade diminui o tempo de vida e afeta a função de muitos sistemas e órgãos aumentando a morbidade e a mortalidade de muitas doenças como diabetes, doença renal crônica, doenças gastrointestinais e doenças cardiovasculares. 

 

Epidemiologia

A prevalência de obesidade no mundo é crescente envolvendo cerca de 35% da população norte-americana com mais de 70% com sobrepeso. No Brasil, dados sugerem que aproximadamente 50% da população apresenta excesso de peso. Dados internacionais sugerem que a prevalência na população adulta no mundo é de 37 a 38%. A crescente prevalência da obesidade em todo o mundo exige que estratégias preventivas sejam realizadas para diminuir os futuros custos de saúde e criação de estratégias que diminuam a velocidade da epidemia de obesidade. Devido às complicações associadas é recomendado o rastreamento de obesidade com o IMC em todos os adultos, com recomendações de perda de peso e outras baseadas no perfil de riscos cardiovasculares.

 

Fisiopatologia

O peso corporal é mantido por um complexo sistema que envolve principalmente o hipotálamo, o tecido adiposo e o trato gastrointestinal com fatores e variações genéticas responsáveis por 30-70% do excesso de pacientes com obesidade. Em alguns casos, a obesidade é relacionada com mutações gênicas únicas, mas em sua maior parte, é uma doença poligênica, com forte influência ambiental com pelo menos 50 alterações gênicas correlacionadas com o aparecimento de obesidade.

O tecido adiposo é onde a energia é armazenada. Quando a ingesta calórica diária é igual ao gasto energético (em número de calorias), a reserva de energia do corpo é mantida constante, e não há variação do peso corporal. Por outro lado, quando a ingesta excede o gasto, o excedente é transformado em triglicérides e armazenado nos adipócitos. Na vida adulta, o número de adipócitos é constante, portanto o ganho de peso se dá através do aumento de volume das células adiposas. Nas crianças, pode haver multiplicação dos adipócitos, aumentando a capacidade de reserva; por isso 80% das crianças obesas acabam evoluindo com obesidade na vida adulta. As células adiposas secretam várias substâncias, dentre elas a leptina. Quanto maior a quantidade de tecido adiposo, maiores os níveis plasmáticos de leptina. A leptina liga-se a receptores no hipotálamo, onde induz diminuição do apetite e aumento do gasto calórico; portanto, funciona como um sinalizador dos estoques de energia. Humanos obesos costumam apresentar altos níveis de leptina, indicando uma possível resistência hipotalâmica a essa substância.

O trato gastrointestinal produz várias substâncias que ajudam a regular o peso corporal. Na situação de jejum, o estômago secreta a ghrelina, que age no hipotálamo estimulando o apetite e a busca por alimento. Após a refeição, caem os níveis de ghrelina e aumentam os níveis de colecistocinina, peptídeo YY e peptídeo glucagon-like 1 (GLP-1), entre outros, que inibem o apetite e aumentam o gasto energético. A ação nessas substâncias tem, portanto, o potencial de ajudar a controlar o ganho de peso ou a induzir perda de peso.

O hipotálamo é o centro da regulação do peso corporal; é onde são recebidos e integrados os sinais vindos da periferia e emitidos sinais químicos e nervosos que ajudam a regular a fome e o gasto energético basal. Existem dois sistemas antagônicos no hipotálamo um com neurônios que secretam a pró-ópio-melanocortina (POMC), bem como o hormônio estimulador da melanina (alfa-MSH), que são estimuladas pela leptina e levam ao aumento do gasto energético e à diminuição do apetite; correspondem à via catabólica; e os neurônios que secretam o neuropeptídeo e são estimulados pela ghrelina e inibidos pela leptina levam à redução do gasto energético e ao aumento do apetite; correspondem à via anabólica.

O equilíbrio entre a ingesta e o gasto energético é muito delicado, portanto pequenas flutuações num desses componentes podem levar a uma variação importante do peso ao longo do tempo. Nas últimas décadas, com a industrialização e a urbanização, os indivíduos assumiram trabalhos mais sedentários e novas atividades de lazer (televisão, computador etc.) com baixo gasto calórico, com importante redução do gasto energético diário. Nunca houve tantas opções de alimentos densamente calóricos, com alto conteúdo de gorduras e alto índice glicêmico, que caracteristicamente são fáceis de comer enquanto se trabalha, se descansa, se desloca no automóvel ou se realiza praticamente qualquer atividade da rotina diária. Além disso, eles são baratos, prontos para consumo e livremente disponíveis para a população.  Como são ricos em gordura e açúcar, tendem a agradar ao paladar, especialmente dos mais jovens. Todos esses fatores fazem com que exista uma tendência em se consumir mais alimentos do que seria necessário.  O aumento da ingesta energética associado à diminuição do gasto calórico resulta em balanço energético positivo, que será estocado principalmente na forma de triglicérides no tecido adiposo. Características genéticas também influenciam o aparecimento de obesidade. Isso se explica ao fato de que, na pré-história (antes do advento da agricultura e da pecuária), as pessoas que tinham maior facilidade para engordar e menor gasto energético basal conseguiam sobreviver melhor aos períodos de escassez alimentar. Com isso é possível que tenha ocorrido uma pressão evolutiva no sentido de selecionar indivíduos com maior facilidade para ganhar peso.

Alterações no gene FTO no cromossomo 16 predispõem ao aparecimento da DM tipo 2 e ao aumento do IMC, embora com mecanismos incertos. Algumas doenças genéticas como a síndrome de Prader-Willi e de Bardet-Biedl são associadas com a obesidade. Causas de obesidade monogênica incluem os defeitos no gene agouti e no gene leptina, e no receptor do gene da leptina.

O excesso de peso pode ainda ser facilitado por alterações hormonais. O hipotireoidismo, por exemplo, pode lentificar o metabolismo, resultando em menor gasto energético de repouso, consumo de oxigênio e a utilização de substratos. É descrito aumento dos níveis de T3 em obesos, mas esse pode ser um efeito da ingesta calórica aumentada, principalmente carboidratos. Quando o balanço energético tende a se tornar negativo, existe um aumento relativo da conversão de T4 em rT3, com menor formação de T3, hipoteticamente em uma tentativa de diminuir a taxa metabólica e conservar energia. Outras deficiências hormonais também podem ser associadas com diminuição da atividade metabólica, como ocorre no pan-hipopituitarismo. É bem conhecida a relação entre hipogonadismo e déficit de hormônio de crescimento (GH) com obesidade central ou abdominal. Esses pacientes também tendem a ter o perfil lipídico mais aterogênico e com maior risco cardiovascular. De qualquer forma, essas alterações são relativamente incomuns em pacientes com obesidade, de forma que em pacientes sem alterações sugestivas de alteração hormonal não têm indicação de investigação hormonal extensa.

O excesso hormonal também pode levar ao aumento de peso. O exemplo mais típico é o hipercortisolismo, que tipicamente leva ao depósito de gordura truncal com os membros de aparência afinada pelo consumo muscular. Essa condição pode se acompanhar de face pletórica e arredondada, hirsutismo com alopécia frontal, fraqueza muscular tipicamente proximal, fragilidade capilar, fraturas vertebrais, hipocalemia, hipertensão arterial e diabetes mellitus. Essas características podem estar associadas ao hipercortisolismo e devem ser investigadas. A acromegalia, por sua vez, não se associa fortemente com a obesidade, mas o excesso de peso pode ser uma queixa desses pacientes.

Em mulheres, a obesidade é característica comum da síndrome dos ovários policísticos com cerca de 50% das mulheres com a síndrome sendo obesas. A fisiopatologia é multifatorial e envolve redução da sensibilidade à insulina com hiperinsulinemia, anovulação crônica, aumento da pulsatilidade do LH e da síntese de andrógenos ovarianos e adrenais e redução dos níveis circulantes da SHBG, com consequente aumento da fração livre dos andrógenos. A resistência à ação da insulina das mulheres na síndrome dos ovários policísticos pode se manifestar com intolerância à glicose e diabetes mellitus, conferindo risco aumentado para doença cardiovascular.

 

Complicações

A obesidade é associada ao aumento da mortalidade por todas as causas, assim como a doença cardiovascular, com uma expectativa de seis anos a menos de vida comparada a controles não obesos. Em pacientes obesos a prevalência de colesterol total > 240 mg/dl é de 17%, o que representou uma importante queda na última década, mas ainda significativo. HAS ocorre em 15% dos pacientes obesos e tabagismo é concomitante em 26% dos casos e todos esses fatores aumentam em muito o risco cardiovascular da obesidade.

Diabetes mellitus do tipo 2 em 80% dos casos é relacionada com a obesidade. Outras doenças associadas incluem gota, doença coronária, insuficiência cardíaca, demência, doença hepatobiliar, tumores gastrointestinais, osteoartrite, apneia do sono e outras doenças.

O estudo Woscops, que é um estudo de prevenção primária de doença coronariana em pacientes de risco relativamente elevados à presença de síndrome metabólica, implicava em risco 1,7 vezes maior de eventos cardiovasculares, o que demonstra a importância de reconhecer a síndrome em nossos pacientes.

A obesidade também está relacionada com doenças respiratórias, restrição ventilatória ocorre devido ao aumento da pressão sobre a parede torácica, diminuindo a complacência ventilatória e aumentando o trabalho respiratório. Cronicamente pode haver hipoventilação e maior tolerância à hipercapnia, hipóxia ou ambos. Uma descrição clássica desse fenômeno é a síndrome de Pickwick, uma forma grave da síndrome de hipoventilação relacionada à obesidade, que envolve obesidade grave, irregularidade ventilatória, sonolência, cianose, policitemia e insuficiência ventricular direita.

Outra condição bastante prevalente entre obesos é a síndrome da apneia/hipopneia do sono, quando ocorrem  dificuldades ventilatórias apesar de esforços inspiratórios presentes, devido à obstrução parcial ou completa das vias aéreas altas. Nessas situações, a hipóxia e hipercapnia resultantes desencadeiam uma importante descarga adrenérgica com consequentes picos hipertensivos e maior risco de desenvolver hipertensão arterial sistêmica crônica e aumento do risco de arritmias ventriculares e morte súbita. Como o sono é interrompido frequentemente, o paciente não experimenta as fases mais profundas do sono, com queixa de sonolência diurna, que pode diminuir drasticamente sua qualidade de vida e até mesmo limitar atividades laborais. A circunferência de pescoço é frequentemente aumentada e valores maiores do que 40 cm implicam em alta probabilidade de desenvolver apneia do sono, deve-se considerar a realização de polissonografia em pacientes com sonolência diurna e alteração da circunferência do pescoço.

A obesidade também está relacionada com alterações da função hepática, inclusive a mais importante delas a esteatose hepática não alcoólica (NAFLD). Manifestações incluem hepatomegalia, fibrose e cirrose hepáticas. Embora as aminotransferases sejam as enzimas mais frequentemente alteradas nessa situação, elas não se correlacionam com a gravidade da alteração histológica, eventualmente o paciente pode evoluir com cirrose avançada; a perda de peso rápida também é associada com o aparecimento de cirrose hepática. A cirrose hepática é a segunda maior causa de morte nesses pacientes, após as doenças cardiovasculares, com risco relativo sete vezes maior do que o da população de mesmas características demográficas. Outra complicação associada é o aumento de cálculos biliares. 

 

Tratamento

A perda de peso é associada com diminuição de morbidade e mortalidade. No estudo Diabetes Prevention Program, uma perda de peso de 7% do peso corporal, foi associado com redução de velocidade de evolução para DM tipo 2 e intolerância à glicose.  A pedra angular para o tratamento de um paciente com obesidade é uma mudança de estilo de vida abrangente com intervenção em múltiplos fatores.

São candidatos a tratamento:

 

-IMC entre 20-25 Kg/m2, mas com fatores de risco cardiovascular ou com ganho de peso > 10 Kg desde os 18 anos de idade.

-IMC entre 25-29,9 Kg/m2 sem fatores de risco cardiovasculares. Nesse caso, aconselhamento sobre dieta e atividade física são recomendados.

-IMC entre 25-29,9 Kg/m2 com fatores de risco cardiovasculares ou IMC > 35 Kg/m2, nesses casos além das medidas em relação à dieta, atividade física e mudanças de hábitos, pode-se recomendar terapia farmacológica.

-Pacientes com IMC > 35 Kg/m2, principalmente se com fatores de risco cardiovascular, nesses casos a terapia deve ser agressiva incluindo cirurgia, se necessário.

 

As intervenções recomendadas incluem modificação do estilo de vida ou treinamento comportamental, mudança na dieta para reduzir o consumo de energia e um aumento na atividade física. As evidências que apoiam a eficácia da intervenção estilo de vida ou de modificação comportamental vêm de dois grandes estudos clínicos randomizados: o estudo AHEAD e o Diabetes Prevention Program. Três variáveis, incluindo o número de sessões de terapia comportamental, número de substitutos usados na refeição e os minutos semanais de atividade física  foram associados à perda de peso em 1, 4 e 8 anos. Uma revisão sistemática mostrou que, se são realizadas pelo menos 14 sessões (em grupo ou individuais) em mais de seis meses com o tratamento contínuo durante um ano, a média de perda de peso relatada era de 8 kg. Embora isso possa parecer pequeno, se traduz em melhoras clinicamente significativas na pressão arterial, triglicerídes, HDL e controle glicêmico e redução do risco de progressão para diabetes do tipo 2. Com base nesses e outros resultados, a US Task Force recomendou que os indivíduos com obesidade e fatores de risco de doença cardiovascular devem ser encaminhados para modificação do estilo de vida, e o US Center for Medicare e Medicaid Services promove políticas para reembolsar os fornecedores para a terapia comportamental intensiva para o paciente com obesidade no Reino Unido, o Instituto Nacional de Saúde e Assistência Excellence recomenda intervenções intensivas progressivamente em função do grau de sobrepeso e obesidade e presença de comorbidades.

A taxa inicial de perda de peso no primeiro e segundo mês previu a perda de peso em 4 e 8 anos, no estudo AHEAD. Os dados sugerem que maiores perdas de peso precoce são benéficas.

A maioria das dietas está  associada com perda de peso. A dieta deve ter menos energia do que é necessário para manutenção do peso diário e ser uma dieta que seja possível o paciente aderir e possivelmente proporcionar outros benefícios para a saúde. A redução da energia por 500 kcal / dia abaixo da dieta usuakl ou usando uma dieta com 1200-1500 kcal / dia para mulheres ou 1500-1800 kcal / dia para homens (acrescida de 300 kcal / dia para cada sexo, se peso superior a 150 kg) é uma recomendação dietética adequada. Além de reduzir calorias, algumas dietas podem ter outros benefícios apara saúde. Alguns acreditam que possa ter uma dieta em que se chega a seu peso ideal e permita que você coma o quanto quiser, só com a necessidade de comer os alimentos certos. Essa crença tem estimulado muitos estudos que se concentraram em diferentes quantidades de dieta de gordura, proteína ou carboidratos. As dietas com baixo teor de gordura, carboidrato ou proteína de alto ou baixo índice glicêmico foram comparados em meta-análises. Um dos maiores estudos com 811 pacientes, o estudo LIBRAS não relatou nenhuma diferença na perda de peso em seis meses ou dois anos entre diferentes tipos de dieta. Uma meta-analise comparando dietas de baixo carboidrato contra dietas de baixa gordura mostrou que dietas pobres em carboidrato são pelo menos tão eficazes quanto a dietas de baixa gordura em reduzir o peso e melhorar os fatores de risco metabólicos. Outra revisão sistemática também não mostrou diferenças de resultados. Assim, o melhor conselho é fornecer frações de dieta de baixa caloria e que tenham benefício potencial para saúde.

Uma opção que parece ser de maior benefício é o uso da dieta mediterrânea. Em uma meta-analise de nove estudos com 1.178 pacientes, as dietas de estilo mediterrâneo foram associadas com uma diminuição significativa no peso corporal e IMC e reduções na hemoglobina A1c, glicose plasmática em jejum e insulina em jejum. Além do efeito sobre o peso corporal, uma versão desse padrão alimentar pode reduzir o risco de doença cardiovascular.

Um estudo sobre dietas com índice glicêmico baixo não mostrou efeito significativo das dietas sobre a resistência à insulina ou marcadores de doença cardiovascular. Uma meta-análise de 14 estudos, no entanto levantou preocupações. Embora proteína C reativa e insulina em jejum se beneficiem com a dieta com baixo índice glicêmico, houve uma perda significativa de massa livre de gordura, levando a se ter cuidado ao recomendar o uso de dietas de baixo índice glicêmico para perda de peso.

Muitas dietas de baixa caloria ou dietas de muito baixa caloria, definidas como tendo 200 e 800 kcal / dia, podem proporcionar um menor consumo de energia que pode resultar em perda mais rápida da gordura corporal e peso. Alguns estudos têm mostrado que tal abordagem pode rapidamente normalizar a glicose no sangue e outros fatores de risco em pessoas com diabetes do tipo 2. No entanto, sugere-se que, embora a perda de peso inicial seja mais rápida com essas dietas, mudança de peso após um ano ou mais não diferem muito de abordagens abrangentes ou multicomponentes e não se recomenda seu uso rotineiro. Acredita-se que para perda de 1 Kg se deve obter um déficit calórico de aproximadamente 5.000-7.000 calorias, assim em pacientes estáveis em seu peso, uma dieta com 600 calorias a menos do que a ingestão habitual levaria a perda de 1 Kg em cerca de dez dias, após algum tempo, entretanto o organismo se readapta e a velocidade de perda de peso diminui.

 O aumento da atividade física é essencial para o manejo da obesidade. As recomendações nos EUA e diretrizes do Reino Unido geralmente prescrevem gradual aumento da atividade física aeróbica (como caminhada rápida) para atingir uma meta de mais de 150 min / semana (igual a > 30 min / dia, durante pelo menos cinco dias por semana). Isso tem benefícios para a saúde em geral que são independentes da perda de peso, e a atividade física particularmente tem efeito na manutenção da perda de peso, embora sua influência na perda do peso seja significativamente menor do que a dieta. Uma meta-análise mostrou que a atividade física foi associada com uma perda adicional de peso. Há evidencia de que é necessária uma atividade física em maior quantidade (30-45 min / dia) para prevenir a obesidade e a longo prazo a manutenção do peso em pessoas que perderam peso, 60-90 min / dia é necessário, mas nesse caso deve-se ter supervisão adequada. O tipo de atividade física (por exemplo, aeróbica vs resistência ou alta intensidade vs baixa intensidade) não parece afetar a perda de peso global, mas como a atividade mais intensiva produz perda de peso semelhante com um período de tempo reduzido, isso pode ser preferível a alguns; parece conveniente recomendar programas que sejam aceitáveis para diferentes pacientes. O tipo de atividade física deve seguir os gostos do paciente, de preferência sendo facilmente disponível e que não prescinda de companhia para ser realizada. Grandes estudos demonstraram que indivíduos que obtêm sucesso na perda ponderal sustentada tendem a ser aqueles que se exercitam mais de uma hora por dia.

A terapia farmacológica para o tratamento obesidade inicia-se por verificar se as medicações que os pacientes utilizam são associadas a ganho de peso. Assim, se os pacientes apresentam diabetes mellitus, por exemplo, a preferência pelo uso da metformina, que é associada com uma discreta perda de peso é preferível ao uso de sulfonilureias, que estão associadas ao aumento de peso. Sempre que possível, os pacientes com obesidade devem evitar medicamentos associados com o ganho de peso e usar medicamentos neutros para o peso ou aquelas associadas com a perda de peso. As indicações para a adição de farmacoterapia a uma estratégia de perda de peso são a história de fracasso para conseguir a perda de peso clinicamente significativa (> 5% do peso corporal total) e para sustentar o peso perdido, para os pacientes que apresentam IMC >=27 kg / m2 com uma ou mais comorbidades ou um IMC> 30 kg / m2, com ou sem efeitos metabólicos associados. Ao decidir por seu uso, em primeiro lugar deve-se garantir que foram realizadas as mudanças de estilo de vida necessárias. Deve-se estar familiarizado com as medicações e seus efeitos adversos e a menos que a perda de peso clinicamente significativa ocorra após 3 a 4 meses (geralmente definida como a perda de mais do que 4-5% do peso corporal total, em doentes sem diabetes, e em pacientes com obesidade e diabetes, perda de mais de 3% de peso corporal total pode ser considerado satisfatório), um novo plano de tratamento deve ser implementado. Nenhuma medicação é eficaz em todos os pacientes, assim como nem todo paciente é adequado para todos os medicamentos.

As medicações anorexígenas como fempreporex, anfepramona a manzidol chegaram a ser proibidos no Brasil pela Anvisa até 2014. Esses agentes agem estimulando fortemente o apetite e aumentando o gasto energético basal. Produzem perda de peso significativa (9 a 17kg em 12 semanas), mas possuem muitos efeitos colaterais, relacionados à estimulação adrenérgica:  incluindo aumento da pressão arterial, taquicardia, insônia, agitação, boca seca, obstipação e delírios, e devem ser usados por tempo limitado (poucos meses) devido ao potencial de dependência. Por essa razão não são mais utilizados na Europa e Estados Unidos. São contraindicados para pacientes cardiopatas, hipertensos mal controlados (PA>180/110 mmHg, com apneia do sono ou com transtornos psiquiátricos. Alguns autores sugerem que o Mazindol pode ser discretamente mais eficaz, com perdas de até 13% do peso inicial em estudos controlados em médio prazo (até um ano). Quando indicado seu uso deve iniciar-se com doses pequenas e divididas, com aumento progressivo da dose, devendo ser descontinuada se sintomas psiquiátricos ocorrerem. A tabela abaixo sumariza as principais medicações usadas para esse fim.

 

Nome científico

Nome comercial

Dose inicial

Dose usual

Fempreporex

Desobesi

12,5-25 mg ao dia

25-50 mg ao dia divididas em 1 ou 2 vezes ao dia.

Anfepramona

Dualid, hipofagin, inibex

25-50 mg ao dia

50-150 mg ao dia dividida em 2 vezes ao dia.

Mazindol

Fagolipo

1 mg ao dia 

1-4 mg ao dia, dividida em 2 doses diárias.

 

A Fentermina é uma droga simpatomimética com propriedades estimulantes cardíacas. Ela só foi pesquisada em estudos de curta duração e é uma substância controlada nos EUA e não disponível no Brasil. Tem o potencial de abuso e pequeno risco de hipertensão pulmonar, tornando a sua utilização para o manejo de uma doença crônica pouco adequada.

O orlistat é um inibidor de lipase pancreática que bloqueia a absorção de 30% da gordura ingerida quando dieta de pelo menos 30% de gorduras. Ele está disponível na maior parte dos países no mundo inteiro. O orlistat é um dos medicamentos mais seguros nessa categoria e está aprovado para utilização em adolescentes. Além disso, um estudo de quatro anos de duração mostrou a sua segurança e a eficácia a longo prazo e mostrou que ele reduz o desenvolvimento de diabetes mellitus em pessoas com pré-diabetes. No entanto, os efeitos gastrointestinais limitam a sua aceitação pelos pacientes. A dose recomendada é de 120 mg antes das três principais refeições, doses maiores que 360 mg ao dia não parecem trazer benefícios adicionais.

A sibutramina bloqueia a recaptação de noradrenalina e serotonina no SNC,induzindo a perda de pelo menos 5% do peso em cerca de 80% dos usuários, com perda média de 6 a 10 Kg em um ano. Tem ação principalmente sobre a saciedade, reduzindo o tamanho das refeições. Também pode produzir taquicardia, hipertensão arterial, sudorese, boca seca e obstipação, mas em menor grau do que os anorexígenos. Deve-se iniciar com dose de 10 mg ao dia, podendo chegar a 10-30 mg. 

Desde 2012, quatro medicamentos chegaram ao mercado nos EUA para tratamento da obesidade. O lorcaserin, uma combinação de fentermina / topiramato de liberação prolongada, uma combinação de naltrexona de liberação prolongada com bupropiona e o liraglutide.

O lorcaserin é um receptor específico agonista da serotonina. A medicação é notável pela sua tolerabilidade e baixa taxa de eventos adversos. A medicação mostrou em estudos com mais de 5.000 pacientes um aumento discreto da incidência de valvopatias. O fármaco não deve ser utilizado com inibidores da monoamina oxidase por causa do risco de síndrome serotoninégica. Não tem sido estudada com inibidores da recaptação da serotonina, inibidores da recaptação de serotonina, norepinefrina ou outras drogas serotoninérgicas devendo-se ter cuidado com a associação com essas medicações.

A combinação de fentermina e topiramato como uma formulação de liberação prolongada utiliza doses mais baixas de ambos os fármacos (7,5 mg de fentermina e 46 mg de topiramato ) do que normalmente são prescritas quando uma ou outra droga é usada isoladamente. Esse medicamento está associado com maior perda de peso média do que outros medicamentos disponíveis. O topiramato é associado a efeitos tóxicos fetais (fissuras orais) e um teste de gravidez antes do início da terapia mensalmente é recomendado para mulheres em idade fértil. Os efeitos colaterais mais comuns incluem parestesias, tonturas, insônia, constipação e boca seca.  Um efeito colateral raro de topiramato é miopia aguda com glaucoma, já que o medicamento é contraindicado em pacientes com glaucoma. A combinação de fentermina e topiramato de liberação prolongada também é contraindicada em hipertireoidismo e no prazo de 14 dias de tratamento com inibidores da monoamina oxidase. Outros raros efeitos colaterais incluem litíase renal (associados com topiramato) e aumento da frequência cardíaca (associada à fentermina).

A combinação de naltrexona SR / bupropiona SR foi aprovada nos EUA em 2012 e na União Europeia em 2015. A bupropiona é um inibidor da recaptação de dopamina e norepinefrina. A naltrexona, um antagonista opiáceo, tem efeito mínimo sobre a perda de peso quando usado isoladamente. A naltrexona pode bloquear os efeitos inibidores de receptores opioides ativados pela ß-endorfina lançada no hipotálamo que estimula a alimentação. Efeitos adversos incluem aumento da pressão arterial e, portanto, a combinação só deve ser prescrita a pacientes com hipertensão controlada (pressão arterial do paciente deve ser monitorizada durante as primeiras semanas de terapia). Apesar desses sinais, não parece ocorrer aumento de eventos cardiovasculares.

O liraglutide é um agonista de GLP-1 com uma homologia de 97% ao GLP-1. Tem sido usada para o tratamento de diabetes em doses de até 1,8 mg, administrada por injeção, atualmente é aprovada nos EUA e na União Europeia para perda de peso, na dose de 3 mg. Náusea tem sido uma das principais queixas de pacientes com o uso injetável dessa droga e uma dose escalonada lenta ao longo de cinco semanas é prescrita. Há também um pequeno, mas significativo aumento na frequência cardíaca e na pressão arterial, mas que tende a desaparecer com seu uso. Os agonistas de GLP-1 estão associados com tumores de células C da tiroide em animais, mas isso não foi demonstrado em humanos. O liraglutide não deve ser prescrito nos pacientes com a família ou história pessoal de câncer medular da tiroide ou neoplasia endócrina múltipla. Pancreatite aguda, doença da vesícula biliar e hipoglicemia em diabéticos são situações que podem ocorrer.

A cirurgia bariátrica para tratamento da obesidade tornou-se rapidamente disseminada como uma opção de tratamento para a obesidade grave, sobretudo desde o advento de procedimentos laparoscópicos de menor risco, com cerca de meio milhão de procedimentos realizados em todo o mundo em 2013. Suas indicações têm sido ampliadas e antes eram apenas indicadas para IMC > 40 Kg/m2 ou IMC > 35 Kg/m2 com comorbidades cardiovasculares, mas está agora aprovada para IMC > 30 kg/m2 se comorbidades ou fatores de risco cardiovascular significativos como diabetes do tipo 2. Uma série de procedimentos já estão bem estabelecidos, que resultam em diferentes graus de perda de peso; cada procedimento tem seus próprios riscos e benefícios que precisam ser considerados com cuidado em cada paciente. Antes da indicação do procedimento, é muito importante garantir que o paciente esteja motivado e compreenda os riscos e benefícios do procedimento.

 

Tabela:  Indicações para Tratamento

          Cirúrgico da obesidade

Paciente motivado e com compreensão das implicações do procedimento

IMC > 40 mg/kg2

IMC > 30 mg/kg2 associado a comorbidades

(diabetes, apneia do sono, artropatia...)

Risco cirúrgico aceitável

Falha nas tentativas prévias não cirúrgicas

 

Estudos de longo prazo de resultados após a cirurgia bariátrica têm geralmente mostrado resultados favoráveis. Um estudo sueco acompanhou 2.000 pacientes por até 20 anos após a cirurgia, incluindo gastroplastia, banda gástrica e bypass gástrico em Y de Roux feito por técnicas abertas, que já foram substituídos por laparoscopia. Uma redução de 24% na mortalidade foi relatada, principalmente por causa da redução do risco de infarto do miocárdio e câncer (em mulheres), em comparação com um grupo controle observacional. Muitas outras comorbidades, como diabetes tipo 2 e apneia do sono também apresentaram melhora, e os pacientes relataram melhoras consistentes na qualidade de vida. Melhoras particularmente impressionantes e rápidas no controle da glicose foram observadas em pacientes com diabetes tipo 2, especialmente após bypass gástrico, sugerindo que parte da melhora metabólica é independente da perda de peso. Estudos  clínicos randomizados que comparam o tratamento médico para diabetes tipo 2 mostram consistentemente maiores melhoras no controle da glicose e outros fatores de risco do que no grupo observacional. Técnicas cirúrgicas também sugerem que o risco futuro de complicações microvasculares associada à diabetes e complicações macrovasculares são também reduzidas. Isso levou ao conceito de cirurgia metabólica e revisão das orientações e recomendações para reduzir limites para considerar a cirurgia em pessoas com diabetes tipo 2, especialmente de início recente, para incluir pacientes com um IMC entre 30 kg / m2 e 35 kg / m2 e considerar outros critérios além do IMC ao considerar a cirurgia. Embora a mortalidade seja baixa para a cirurgia laparoscópica moderna, as taxas de reoperação para as complicações cirúrgicas são elevadas, em particular para a banda gástrica. Alguns pacientes têm dificuldade de se adaptar às mudanças profundas na quantidade e tipo de alimentos que podem comer, uma vez que eles tiveram a terapia de procedimento e de substituição ao longo da vida e monitoramento é necessário para deficiência de vitaminas e minerais nutricionais, especialmente após a cirurgixa disabsortiva. Síndrome de dumping,  refluxo gastroesofágico e hipoglicemia podem ocorrer e são de difícil manejo. Recuperação de peso também pode ser um problema substancial, e uma segunda cirurgia apresenta maiores riscos e nenhuma garantia de sucesso; há um foco crescente em programas de estilo de vida após cirurgia bariátrica para reduzir o risco de aumento de peso .

Entre os procedimentos indicados, o bypass gástrico em Y de Roux é um dos mais eficazes combinando restrição do volume gástrico com disabsorção e hoje é o procedimento mais realizado para obesidade. A gastrectomia em sleeve ou banda é o segundo procedimento mais realizado e nele é removida a grande curvatura do estômago, criando-se um estômago tubular de menor volume. Outras técnicas incluem a banda gástrica e cirurgias muito disabsortivas como a derivação bilio-pancreática de Scopinaro, que hoje é raramente indicada.

Uma controvérsia em relação ao tratamento é se existem pessoas que são obesas e metabolicamente saudáveis com níveis altos de colesterol HDL e sem diabetes mellitus e outros fatores de risco cardiovasculares. Indivíduos com obesidade metabolicamente saudável podem não melhorar os seus fatores de risco cardiometabólicos significativamente após intervenções de perda de peso e podem, portanto, não beneficiar-se na mesma medida que os pacientes que são obesos com comorbidades metabólicas. A controvérsia também existe quanto ao fato de os indivíduos identificados como obesos metabolicamente saudáveis serem realmente saudáveis, especialmente porque não existe uma concordância geral sobre os critérios para definir aqueles com obesidade saudável metabolicamente. Além disso, ainda há controvérsia quanto ao fato de a obesidade saudável metabólica poder ser considerada um fenótipo estabelecido ou se representa uma etapa transitória para os problemas de saúde com envelhecimento, com níveis comportamentais e com fatores ambientais. De qualquer forma, a obesidade é associada com outras complicações como insuficiência cardíaca e artropatias que ocorrem mesmo em pacientes metabolicamente saudáveis.

 

Referências

Bray GA, Ryan DH, Wilding JP. Management of obesity. Lancet 2016 published online.

 

Jensen MD, Ryan DH, Apovian CM, et al. 2013 AHA/ACC/TOS guideline for the management of overweight and obesity in adults: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines and The Obesity Society. Circulation 2014; 129:S102.

 

The Practical Guide: Identification, Evaluation, and Treatment of Overweight and Obesity in Adults. http://www.nhlbi.nih.gov/guidelines/obesity/prctgd_c.pdf acessado em 22/02/2016.

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