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Colite neutropênica

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 08/09/2016

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A colite neutropênica, também denominada de colite necrotizante, síndrome ileocecal e tiflite neutropênica, é uma síndrome maldefinida e caracterizada por febre e dor abdominal em pacientes com neutropenia. A condição é ameaçadora à vida e pode envolver vários segmentos do intestino e não apenas a região ileocecal. O termo mais apropriado atualmente é enterocolite neutropênica.

Sua incidência é variável, sendo relatada em 6,5% dos adultos com neutropenia grave definida por neutrófilos menores do que 500 células/mm3. Embora outros estudos tenham resultados diferentes, um estudo em pacientes com neutropenia grave com mais de 16 anos encontrou incidência de 3,5%. Por outro lado, a doença foi descrita classicamente em crianças - em um estudo em crianças submetidas à autópsia, a incidência relatada foi de 46,5%.

 

Fisiopatologia

Ainda pouco entendida, parece envolver combinação de fatores, como dano da mucosa pela quimioterapia ou neutropenia importante, que permitem invasão bacteriana do trato gastrointestinal com disfunção, edema, inflamação, ulceração, necrose transmural e possivelmente perfuração em casos com evolução desfavorável. A predileção pela região cecal é possivelmente relacionada a sua distensibilidade e a vascularização diminuída em relação ao restante do intestino.

Os pacientes evoluem com espessamento da parede intestinal, com aparecimento de úlceras confluentes no intestino, perda de camada mucosa, edema intramural, hemorragia e necrose de parede intestinal.

Os patógenos envolvidos incluem bacilos gram-negativos, cocos gram-positivos, anaeróbios e fungos. Entre eles são isolados Pseudomonas aeroginosa, Escherichia coli, Klebsiella, Streptoccos viridans, enterococos, bacterioids, clostridium e cândida sp.

 

Manifestações

Os pacientes apresentam condições predisponentes como leucemia mieloide aguda, mieloma múltiplo, anemia aplásica, SIDA e neutropenia cíclica ou induzida por droga imunossupressora. A presença de mucosite aumenta em cerca de 30 vezes o risco de desenvolver colite neutropênica, quando esta mucosite é extensa o aumento de risco é da ordem de 50 vezes. Outro fator de risco importante identificado nos estudos é a realização de quimioterapia nas últimas 2 semanas, pois amenta o risco de lesão mucosa com quebra de barreira. Existem ainda casos raros  secundários à infecção por clostridium perfringens do tipo A, descritos em adultos imunocompetentes.

O diagnóstico deve ser considerado em qualquer paciente com neutropenia grave com febre e dor abdominal, principalmente em quadrante inferior direito quando ocorre após 3 semanas após quimioterapia. Outros sintomas incluem náuseas que são descritas em cerca de 75% dos pacientes, vômitos descritos em 67% dos casos, distensão abdominal e diarreia que pode ser aquosa ou sanguinolenta. Podem ocorrer calafrios e bacteremia é frequente, sendo a Pseudomonas o agente mais comumente isolado, porém E.coli, Klebsiella, S.aureus e estreptococos são também frequentes. Candidemia é descrita em até 15% destes pacientes, sendo eventualmente encontrada fungemia por outros agentes. Quando o paciente apresenta sinais de peritonismo, como descompressão brusca dolorosa, ou evolui com choque deve-se suspeitar de perfuração intestinal. Presença de estomatite ou faringite associados, por sua vez, sugerem a presença de mucosite disseminada.

Um dos diagnósticos diferenciais é apendicite, um dos fatores que auxilia no diagnóstico diferencial é a presença de hemorragia intestinal, que sugere o diagnóstico de colite neutropênica. Mesmo com antibioticoterapia apropriada, os pacientes podem permanecer febris até a resolução da neutropenia.

 

Exames Complementares

O diagnóstico é usualmente realizado por achados de imagem, seja por tomografia computadorizada (TC) ou por ultrassonografia, em pacientes com risco da doença. A TC usualmente revela espessamento de parede e edema intramural que pode ser acompanhado de espessamento de parede, podendo ainda ter como achados acompanhantes a presença de líquido paracólico, ar livre ou pneumatose intestinal. O critério utilizado para definir espessamento da parede é espessura de no mínimo 4mm, quando esta espessura ultrapassa 10mm fica caracterizado um quadro de maior gravidade, com mortalidade em algumas séries se aproximando de 60%. A tomografia é considerada o padrão-ouro para o diagnóstico, pois apresenta uma taxa de falsos-positivos de apenas 15% comparada a 23% da ultrassonografia. Outra vantagem da TC é a possibilidade de avaliar diagnósticos diferenciais como colite pseudomembranosa, apendicite, entre outros. Deve-se ressaltar que exames de imagem com enema baritado devem ser evitados devido ao risco de perfuração intestinal.

Pesquisa de toxinas para clostridum dificile e culturas de fezes e hemoculturas são recomendadas em todos os pacientes.

 

Manejo

O tratamento consiste em repouso intestinal, mantendo o paciente inicialmente em jejum, hidratação endovenosa e colocação de sonda nasogátrica. Além destas medidas deve-se prontamente iniciar antibioticoterapia de amplo espectro e se necessário introdução de nutrição parenteral. Deve-se ressaltar que alguns estudos questionam o benefício da sondagem nasogástrica e nutrição parenteral.

Esquemas iniciais de antibioticoterapia incluem o uso de piperacilina/tazobactan 4,5 g EV a cada 6 horas como monoterapia ou terapia combinada com cefalosporina com ação antipseudomônica como ceftazidima ou cefepime ( 2 g EV a cada 8 horas) combinado ao uso de metronidazol 500 mg EV a cada 8 horas, a antibioticoterapia idealmente deve ser adaptada conforme as características locais.  A candidemia é uma complicação descrita com certa frequência, assim em paciente com febre mantida após 72 horas de esquema antibiótico pode-se indicar o uso de antifúngicos. Para pacientes com manutenção dos sintomas, a terapia pode ser escalonada para uso de carbapenêmicos e se ocorrer instabilidade hemodinâmica a cobertura com vancomicina é recomendada, em geral o escalonamento da terapia é indicado apenas em pacientes com instabilidade clínica e se possível deve ser baseado em resultados de exames de culturas.

O uso de G/CSF e outras medicações para reverter a neutropenia é uma possibilidade, pois a correção da neutropenia auxilia a cura das lesões intestinais.

Avaliação cirúrgica é recomendável, mas a maioria dos pacientes não necessita de intervenção, indicações cirúrgicas são sangramento intestinal incontrolável, isquemia intestinal e perfuração.

Algumas medidas profiláticas são propostas, a substituição o da adriamicina por daunorrubicina em esquemas de tratamento para leucemias é uma delas, pois a adriamicina tem um risco maior de causar mucosite e complicações. Alguns autores recomendam o uso de quinolonas profilaticamente e ainda existe a possibilidade de utilização dos queratinócitos para prevenir mucosite, devemos, entretanto, acrescentar que não existem evidências científicas suficientes na literatura para recomendar esta última medida.

 

Referências

1-Zuckerman TS et al. How I treat hematologic emergencies in adults with acute leukemia. Blood 2012. 2012 120: 1993-2002.

 

2- Nesher L, Rolston KV. Neutropenic enterocolitis, a growing concern in the era of widespread use of aggressive chemotherapy. Clin Infect Dis 2013; 56:711.

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