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Doença de Chron

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 01/11/2016

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Doença de crohn

 

A doença inflamatória intestinal (DII) é a denominação genérica correspondente a qualquer processo inflamatório envolvendo o trato gastrointestinal, seja ele agudo ou crônico. Pode ser representada por causas conhecidas, como infecções virais, bacterianas (Salmonella, Shiguella, Yersinia), por protozoários, isquemia, radiação ou idiopáticas, como doença de Crohn, retocolite ulcerativa inespecífica, “pouchitis”, doença de Behçet, enterocolite eosinofílica, colite linfocítica e colágena.

A doença de Crohn (DC) e a retocolite ulcerativa (RCUI) são os dois principais componentes da doença inflamatória intestinal. A doença de Crohn é uma doença inflamatória recidivante e de etiologia desconhecida, que afeta principalmente o trato gastrointestinal e que muitas vezes apresenta-se com dor abdominal e febre.  Os sinais clínicos são obstrução intestinal ou diarreia com passagem de sangue ou muco, ou ambos. Em cerca de 80% dos casos ocorre envolvimento do intestino delgado e em 50% das vezes ocorrem tanto ileíte como colite, em cerca de 20% dos casos a doença é limitada ao cólon e doença perianal ocorre em um terço dos casos.

A sua incidência e prevalência estão aumentando em todos os grupos étnicos, e por causa da natureza sistêmica da doença, a doença de Crohn diz respeito a um grupo cada vez mais diversificado de manifestações clínicas.

 

Causas e fisiopatologia

 

Estudos de concordância em gêmeos no Norte da Europa foram os primeiros indicadores de um componente genético na doença de Crohn. Estes dados foram confirmados em outros países. Além disso, a prevalência em judeus Ashkenazi é maior do que em qualquer outro grupo étnico e ascendência judaica é um fator de risco independente para a doença. Estudos genômicos com associação ampla e computadorizada (metanálises  identificaram e confirmaram 71 locis de susceptibilidade para a doença de Crohn em 17 cromossomos até agora). A identificação de locis de susceptibilidade tem melhorado nossa compreensão das causas da doença, fornecendo pistas importantes sobre as vias cruciais e alterações do sistema imune intestinal. De qualquer forma, o componente genético não parece explicar completamente a doença.

Além da genética, várias explicações alternativas, principalmente relacionadas ao estilo de vida, são possíveis. A importância do meio ambiente é sugerida pelo aumento das taxas de incidência em grupos étnicos anteriormente menos afetados, como os asiáticos e hispânicos e imigrantes de regiões de baixa incidência que se deslocam para áreas com uma tradicionalmente elevada incidência da doença.

Fatores ambientais, assim como mais eventos adversos de vida, menos mulheres que amamentam, famílias menores, a melhora da higiene doméstica e saneamento básico, a adoção de um estilo de vida sedentário, exposição à poluição do ar, consumo de uma dieta ocidental com alimentos contendo quantidades excessivas de açúcar e gorduras poliinsaturadas e aumento do uso de tabaco são fatores que podem estar implicados no aparecimento da doença de Crohn (mesmo durante a infância), sendo entre estes o tabagismo o mais bem estudado. O tabagismo precoce aumenta significativamente o risco de desenvolver a doença.

A doença de Crohn frequentemente ocorre após a gastrenterite infecciosa, com aumento do número de bactérias da flora intestinal intramucosa. Assim, seguem os esforços para identificar um agente infeccioso causador da continuação da doença. A desordem assemelha-se com condições como ileítes granulomatosas infecciosas incluindo a tuberculose intestinal e a doença de Johne, uma zoonose causada por Mycobacterium paratuberculosis avium, que induz respostas imunes semelhantes à doença de Crohn. As micobactérias foram identificadas em tecidos e no sangue de pacientes adultos e pediátricos (início precoce) com doença de Crohn e eles continuam a ser um importante diagnóstico diferencial. Pesquisas com animais sugerem que as infecções virais podem facilitar o desenvolvimento da doença. Uma metanálise  confirmou um risco substancial de desenvolvimento de doença de Crohn após apendicectomia, este achado provavelmente resulta de problemas de diagnóstico em pacientes com doença de Crohn incipiente.

 

Manifestações clínicas

 

As manifestações clínicas são mais variáveis do que na retocolite ulcerativa e os pacientes podem ter os sintomas por muitos anos antes do diagnóstico. Manifestações características são fadiga, diarreia prolongada com dor abdominal, perda de peso, febre, com ou sem sangramento.

É importante verificar como é o início dos sintomas; se a diarreia ocorre com a presença de sangue ou muco, ou ambos, se ocorre diarreia noturna, se existe história de viagens e história dietética. Outros dados relevantes incluem infecções intestinais recentes, como uso de anti-inflamatórios nãoesteroidais , se o paciente realizou ou não apendicectomia, tabagismo ativo ou passivo, história familiar de doença inflamatória intestinal ou a doença de Crohn e gastroenterite recente.

No exame físico é importante avaliar a frequência cardíaca, a pressão arterial, o peso, a altura, o índice de massa corporal, o exame abdominal, a inspeção perianal para presença de fístulas, o exame digital retal e procurar sintomas extraintestinais (olhos, pele, articulações e músculos).

A dor abdominal nestes pacientes em cólica é comum, independente da distribuição anatômica da doença, devido à natureza transmural da doença com presença de estenoses no intestino pelo processo fibrótico. Pacientes com doença acometendo íleo distal costumam ter dor em quadrante inferior direito. A diarreia é a forma  mais comum de apresentação, mas flutua em intensidade frequentemente e nem sempre é inflamatória, podendo ocorrer por esteatorreia ou má-absorção de sais biliares. Sangramento microscópico ocorre na grande maioria dos casos, mas sangramento profuso e macroscópico é menos frequente do que na RCUI.

A infecção transmural que ocorre nestes pacientes predispõe ao aparecimento de fístulas, com um risco em 10 anos de 33% e em 20 anos de 50% de desenvolver fístulas. As fístulas enteroentéricas podem ser assintomáticas ou se apresentarem como massa palpável. As fístulas enterovesicais se apresentam com infecção urinária recorrente, frequentemente polimicrobianas e com pneumatúria. As fístulas retroperitoneais podem levar à obstrução urinária, nas fístulas enterovaginais podemos ter saída de fezes pela vagina e em fístulas enterocutâneas os conteúdos intestinais podem ser eliminados pelas fezes. Os pacientes podem ainda apresentar com flegmões de massas inflamatórias no exame físico, principalmente em quadrante inferior direito do abdome. Cálculos biliares também são mais frequentes nestes pacientes.

Os pacientes podem ainda apresentar manifestações extraintestinais que incluem fadiga e menos frequentemente febre, outras manifestações sistêmicas incluem:

-artrite: envolvendo principalmente as grandes articulações em cerca de 20% dos doentes sem destruição sinovial, sendo a manifestação extraintestinal mais comum. Artrite axial como sacroiliítes, ou espondilite anquilosante, também pode ocorrer. Um espondiloartropatia ou espondilite anquilosante indiferenciada pode ser a manifestação de apresentação da DC.

-manifestações oculares ocorrem em cerca de 5% dos pacientes incluem uveíte, irite e episclerite.

-acometimento de pele pode ocorrer em aproximadamente 10%  dos pacientes e inclui eritema nodoso e pioderma gangrenoso. Raramente, o envolvimento vulvar da DC pode se manifestar como dor, edema, eritema e ulceração.

-colangite esclerosante primária: ocorre em cerca de 5% dos pacientes com uma elevação na concentração da fosfatase alcalina sérica ou gama-glutamil transferase.

-amiloidose secundária é muito rara, mas pode levar à insuficiência renal e acometimento de outros órgãos.

-tromboembolismo venoso e arterial resultante da hipercoagulabilidade pode ocorrer.

-a perda óssea e a osteoporose podem ocorrer relacionadas ao uso de glicocorticoides e deficiência de vitamina D e absorção de cálcio.

-deficiência de Vitamina B12.

-envolvimento pulmonar com manifestações que incluem bronquiectasias, bronquite crônica, doença pulmonar intersticial, bronquiolite obliterante com pneumonia em organização (BOOP), sarcoidose, nódulos pulmonares necrobióticos, pneumonites eosifnofílicas, serosite e embolia pulmonar.

 

 

Exames laboratoriais

 

Os exames indicados incluem eletrólitos, função renal com dosagem de ureia e creatinina, hemograma completo com diferencial, velocidade de hemossedimentação (VHS), testes de função hepática, bilirrubina, transferrina, ferritina, vitamina B12, ácido fólico e urina 1.

Provas inflamatórias como a proteína C-reativa e a calprotectina fecal podem auxiliar a avaliação de atividade da doença e são particularmente úteis em exacerbações. A poteína C-reativa costuma estar mais elevada na DC em comparação com a RCUI e ajuda a diferenciar as duas patologias.

Exames de fezes com coproculturas e pesquisa de toxina para Clostridium difficile podem ajudar a descartar outras causas de diarreia crônica.

O diagnóstico definitivo é histológico. O estudo histológico por colonoscopia é realizado com pelo menos duas amostras de biopsia a partir de pelo menos cinco segmentos, incluindo o íleo, assim colonoscopia com entubação de íleo terminal é o exame ideal para diagnosticar doença ileal. O achado de infiltrado inflamatório de células (linfócitos, células plasmáticas) com irregularidades na cripta, ulcerações focais e granulomas são sugestivos da doença.

A alternância de segmentos normais do intestino com áreas alteradas é característica da doença. A colonoscopia frequentemente mostra que o processo poupa o reto e tem inflamação ileal significativa, assim como úlceras e fissuras perianais, estenoses, fístulas. Uma endoscopia digestiva alta com biopsias pode ser indicada quando ocorrem sintomas no trato gastrointestinal superior.

Estudos de imagem incluem a  enterografia ou tomografia computadorizada com enteróclise. A ressonância magnética de articulações pode ser realizada se manifestações extraintestinais são suspeitas (por história ou exame físico). O exame ainda permite verificação de fístulas ou abscessos em caso de suspeita pela história ou exame físico). A enteroclise se distingue de enterografia pela necessidade de aplicar contraste luminal através de um tubo entérico. A TC com enteróclise oferece a mais alta resolução espacial e substituiu a fluoroscopia do intestino nos principais centros. É muito sensível, pode mostrar inflamação perdida por outras técnicas, pode detectar complicações como obstrução, fístulas e abscessos, e pode até mesmo ter melhor relação custo/benefício. Sua principal desvantagem é a exposição elevada de radiação.

A cápsula endoscópica sem fios é um outro modo de avaliação do íleo terminal se exames de imagem ou colonoscopia não conseguem avaliar adequadamente o íleo, embora a demonstração de eficácia deste exame após ileoscopias e enterografias negativas não seja demonstrada, mas pode substituir a ileoscopia como primeiro exame.

O ultrassom abdominal com contraste é uma técnica de imagem prontamente disponível, não invasiva, com uma sensibilidade geral e especificidade que são semelhantes às da RM e da TC. Estudos prospectivos têm demonstrado utilidade para o diagnóstico inicial, a avaliação da atividade da doença, a detecção de fístulas, as estenoses e abscessos, e correlação significativa com a histologia, os achados laboratoriais, índices de atividade da doença e achados endoscópicos. Ultrassonografia transretal e ultrassom endoscópico podem ajudar a avaliar as complicações perianais.

A colangiopancreatografia por ressonância magnética deve ser relizada se colangite esclerosante primária é suspeitada. A colangiopancreatografia retrógrada endoscópica com dilatação com balão e a amostragem da bile para realizar citologia são necessárias para avaliar alterações como estenose da via biliar, como verificado na colangite esclerosante primária.

Avaliação de especialistas de outras áreas, como reumatologia, dermatologia, oftalmologia, urologia, ginecologia e obstetrícia (quando fístulas retovaginais são suspeitas) é indicada em pacientes com sintomas extraintestinais estabelecidos ou com suspeita de complicações específicas.

 

Diagnóstico Diferencial

 

A doença de Crohn é um diagnóstico clínico que integra história e achados de exame físico com dados objetivos de exames de imagem e laboratoriais, incluindo histopatologia, e não devem ser baseados nem excluídos com qualquer variável isoladamente. Diagnósticos diferenciais não infecciosos incluem a síndrome do intestino irritável e a doença de Behçet, diagnósticos infecciosos que incluem infecções por Yersinia ou enterovírus que simulam a doença de Crohn precisam ser considerados com particular atenção para as doenças endêmicas como a tuberculose.

Anticorpos anti-saccaromyces cerevisae podem ser positivos e associados à DC, assim como os anticorpos anti-ANCA costumam ser positivos na RCUI.

 

Manejo

 

 

Cerca de 50% dos pacientes adultos com doença de Crohn têm uma complicação intestinal dentro de 20 anos após o diagnóstico. Apenas 10% dos pacientes têm remissão clínica prolongada. A incidência anual de admissão no hospital é de 20%. Cerca de 50% dos pacientes necessitam de cirurgia dentro de 10 anos após o diagnóstico e o risco de recorrência pós-operatória é de 44-55% após 10 anos. A expectativa de vida é discretamente reduzida. O tratamento da doença de Crohn tem como objetivo alcançar a remissão clínica e endoscópica sustentada (cicatrização da mucosa) e  interromper o curso progressivo destrutivo da doença e suas complicações.

Uma das primeiras medidas nestes pacientes com DC é aconselhar a interrupção do tabagismo. O tabagismo promove a formação de fístulas e estenoses e piora da doença. Medicações aintidiarreicas podem ser usadas de forma cautelosa nestes pacientes e anti-inflamatórios não esteroidais devem ser evitados, pois causam importante exacerbaçãoo da doença.

O estabelecimento do fenótipo clínico e a atividade da doença é fundamental para o manejo. Existem vários índices de atividade para a DC, sendo descrito neste capítulo o CDAI (Crohn`s Disease Activity Index), que é sumarizado na tabela abaixo.

 

Tabela 1: Índice de atividade inflamatória na DC (CDAI)

 

Multiplicado por (peso)

1. Número de evacuações líquidas na última semana

2

2. Dor abdominal (ausente: 0 leve: 1 moderada: 2 grave: 3)

Considerar a soma dos dados individuais da última semana

5

3. Estado geral (ótimo: 0 bom: 1 regular: 2 mau: 3 péssimo: 4)

Considerar a soma dos dados individuais da última semana

7

4. No de sintomas/sinais associados (artrite ou artralgia; lesão de pele ou boca; irite ou uveite; fissura anal, fístula ou abscesso periretal; outras fístulas externas; febre)

20 cada (máx 120)

5. Consumo de antidiarréico (não: 0; sim: 1)

30

6. Massa abdominal (ausente: 0; duvidosa: 2; bem definida: 5)

10

7. Hematócrito (homens: 47-Ht; mulheres: 42-Ht)

6

8. Porcentagem de peso abaixo do ideal (homens: altura(m2)x25,5 = (Kg); mulheres: altura(m2)x22,5 = (Kg)

Diminuir em vez de somar se o peso do paciente for > que o esperado

1

Soma total (índice de atividade da DC):

< 150: remissão        150-250: leve                250-350: moderada                 >350: grave

 

 

Outra classificação importante é a da extensão da doença, sendo a mais utilizada a Classificação de Montreal que classifica os pacientes em:

 

 

Idade de diagnóstico (A)

A1 = 16 anos

 

A2   17 -40 anos

A3 = 40 anos

Localização (L)

L1 Íleon terminal L1 + L4 (é permitido coclassificação se outros locais envolvidos)

L2 Cólon L2 + L4

L3 Íleo-cólon L3 + L4

L4* Trato gastrointestinal superior ??

Comportamento (B)

B1¶ Não estenosante / não penetrante B1p §

B2 Estenosante B2p

B3 Penetrante B3p

* O modificador trato gastrointestinal superior (L4) permite a coclassificação da localização L4 com L1 a L3.

 

Dados clínicos unicamente obtidos através de anamnese e exame físico permitem classificar a doença de Crohn, bem como servir de guia para sua terapia. Desta forma, pode-se dividir a doença de Crohn em:

 

Doença leve a moderada

 

 

Pacientes ambulatoriais, capazes de tolerar alimentação via oral, sem manifestações de desidratação, toxicidade, desconforto abdominal, massa dolorosa, obstrução ou perda maior do que 10 % do peso.

 

Doença moderada a grave

 

 

Pacientes que falharam em responder ao tratamento, ou aqueles com sintomas mais proeminentes de febre, perda de peso, dor abdominal, náuseas ou vômitos intermitentes (sem achados de obstrução intestinal), ou anemia significante.

 

                               Doença grave-fulminante

 

 

Pacientes com sintomas persistentes a despeito da introdução de esteroides e/ou infliximab, ou indivíduos que se apresentam com febre, vômitos persistentes, evidências de obstrução intestinal, sinais de irritação peritoneal, caquexia ou evidencias de abscesso.

 

 

Paciente com doença moderada podem satisfatoriamente ser tratados ambulatorialmente, mas pacientes com doenças severas a internação pode ser necessária. A escolha do fármaco inicial é dirigido pelo fenótipo clínico, atividade da doença, comorbidades e outras características individuais do paciente e droga. Na maioria dos casos, um agente de ação rápida de curto prazo como (corticoesteroides ou anti-TNF) pode conseguir o controle rápido dos sintomas podendo ser combinado com tiopurinas ou metotrexato para a manutenção a longo prazo. A seleção deve ter como objetivo equilibrar eficácia com efeitos colaterais e complicações a longo prazo. A escolha inicial também deve levar em consideração o perfil individual de cada paciente. No entanto, a evidência para apoiar um modelo geral de tratamento para todos os pacientes com esta desordem é insuficiente.

Duas abordagens principais podem ser tentadas. A step-up therapy inicia com medicações menos potentes e monoterapia e vai aumentado as doses e potências das medicações até o controle adequado. Na top-down therapy inicia o tratamento com medicações mais potentes, como agentes biológicos precocemente mesmo antes da dependência à terapia com glicocorticoides e, posteriormente, , se possível, pode-se diminuir a intensidade do tratamento.

 

Doença leve a moderada

 

A terapia de indução para doença leve a moderada é ambulatorial. Os pacientes com comprometimento ileal, ileocolônica ou colônica podem se beneficiar com uso de aminossalicilatos orais. Sulfassalazina 4g/d é efetiva para doença colônica ativa, porém não é adequada nos pacientes com comprometimento ileal, sendo nestes preconizadas altas doses de mesalazina (4g/d) como terapia inicial.

Metronidazol 10-20 mg/Kg/dia embora efetivo, usualmente não é recomendado como de primeira linha, pelos efeitos colaterais, tendo papel em indivíduos selecionados com doença colônica ou resistente ao tratamento. Ciprofloxacina na dose de 1g/d é uma opção terapêutica nestes pacientes. Em geral, os antibióticos são indicados em pacientes sem resposta após 4-6 semanas com tratamento com sulfassalazina ou mesalazina, ou que não toleram estas medicações. Terapia tópica com mesalazina pode ser efetiva em DC leve à moderada de cólon esquerdo.

Em indivíduos que falharam com mesalazina, corticoide oral como prednisona 40 a 60 mg/d é apropriado, com 60 a 80% dos pacientes com resposta a estas medicações usualmente em 7-10 dias. Em pacientes com melhora com corticoides, a budesonida, que tem um metabolismo hepático de primeira passagem maior do que 90%, é uma boa opção para manutenção do tratamento.

Em pacientes com lesões orais o tratamento da doença intestinal costuma ser suficiente para melhora sintomática, mas uso de triamcinolona tópica pode apressar a melhora das lesões. A DC com sintomas gástricos tem melhora sintomática importante com o uso de bloqueadores de bombas de prótons.

 

Doença moderada a grave

 

Tais pacientes, além do tratamento com os aminossalicilatos descritos acima, são tratados com prednisona na dose de 40 a 60 mg/d ou budesonida 9mg/d, até a resolução dos sintomas (geralmente de 7 a 28 dias). Os esteroides devem ser reduzidos gradualmente de acordo com a gravidade e a resposta do paciente, geralmente ao longo de 8 semanas.

O uso de corticoides endovenosos (hidrocortisona 400mg/d ou metilprednisolona 60mg/d) são apropriados para pacientes com doença grave, com desdidratação que necessitam ser internados. Sendo recomendada a associação com metronidazol endovenoso.

Dietas elementares ou poliméricas são menos efetivas do que os corticoides, mas podem ser usadas para indução de remissão em pacientes selecionados que tenham contraindicação ao tratamento com corticoides ou queiram evitá-lo.

Infliximab 5mg/Kg é uma alternativa eficaz, sendo considerado nos pacientes com contraindicação aos corticosteroides, pacientes com doenças fistulizantes ou naqueles nos quais houve falha da terapêutica inicial implementada.

A cirurgia pode ser considerada em pacientes que falharam ao tratamento médico ou como tratamento primário quando doença limitada.

Em pacientes com doença refratária a azatioprina ou seu metabólito a 6-mercaptopurina é alternativa. A azatioprina é iniciada em dose de 50 mg ao dia e pode ser aumentada até 2,5 mg/Kg ou 200 mg ao dia e a dose máxima de 6-mercaptopurina é de 2 mg/Kg ao dia, desde que não haja supressãoo medular. A resposta a estas medicações costuma demorar 3 a 6 meses. O metotrexate é uma opção e pode ser utilizado em dose de 25 mg/semana, que pode ser diminuída para 15 mg por semana se resposta adequada, em pacientes em uso do metotrexate é recomendado uso de ácido fólico 1 mg/dia.

Entre as terapias biológicas, a com melhor evidência é o infliximab (já comentado) e adalimumab.Estas medicações podem ser combinadas com a azatiorpina e os estudos mostram que a terapia combinada é melhor do que a monoterapia com estas drogas isoladamente.

 

Doença Grave ou fulminante

 

São recomendações para estes pacientes:

 

-condução em regime de terapia intensiva;

-acompanhamento concomitante com equipe cirúrgica;

-correção de distúrbios hidroeletrolíticos;

-transfusões de sangue, se indicada;

-suspensão de medicações anticolinérgicas, antidiarreicas, AINHs e drogas opiiides, pelo risco de precipitação de dilatação colônica;

-descanso intestinal com pausa alimentar e sonda nasogástrica aberta;

-instituição de nutrição parenteral deve ser considerada;

-esteroides via parenteral (hidrocortisona 400mg/dia ou metilprednisolona 60mg/dia), após exclusão de processos infecciosos (por exemplo, abscessos intrabdominais);

-instituição de terapia antibiótica de largo espectro (exemplo : imipinem 1g EV a cada 6 horas ou a combinação de ciprofloxacina 400 mg EV a cada 12 horas e metronidazol 500 mg EV a cada 8 horas);

-cirurgia na doença refratária e em outras apropriadas indicações (exemplo: quadros oclusivos, drenagem de abscessos, doenças localizadas, etc).

 

 

São recomendações para o tratamento de manutenção da doença:

 

 

-interromper tabagismo (fator mais importante);

-corticoides não são efetivos, não sendo recomendados como terapia de manutenção da remissão;

-sulfassalazina não é recomendável como terapia de manutenção para doença de Crohn (ao contrário da RCUI);

-mesalazina tem benefícios limitados, sendo ineficaz em doses < 2g/d, e naqueles que necessitaram de corticoides para induzir remissão;

-AZA (1,5 a 2,5 mg/kg) e 6-MP (0,75 a 1,5 mg/kg) são eficientes, devendo se considerar seus potenciais de toxicidade;

-metrotrexate (15-25 mg IM semanal) é efetivo para aqueles que obtiveram remissão com esta droga, podendo ser utilizado também para os que falharam ou foram intolerantes a AZA e 6-MP;

-infliximab é efetivo na dose 5-10mg/kg a cada 8 semanas nos pacientes que responderam à terapia nas 12 semanas iniciais, por mais de 44 semanas.

 

Outros aspectos do tratamento:

 

O manejo da doença de Crohn fistulizante (B3 ou B3p) requer uma avaliação cuidadosa da localização da fístula, extensão e complicações potenciais (ou seja, a penetração de órgãos adjacentes ou abscessos). Se fístulas internas e fístulas perianais complicadas são suspeitas, exames de imagens,como RM ou ultrassom podem ajudar a orientar a terapia. Medidas que auxiliam seu manejo incluem:

-conduzir a doença perianal e fistulizante em concomitância ao tratamento da doença ativa em outros locais;

-metronidazol 400mg 3x/dia e/ou ciprofloxacin 500mg 2x/dia são tratamentos de primeira linha para fístula perianal simples;

-azatioprina (AZA) 1,5-2,5 mg/Kg/dia ou mercaptopurina (6-MP) 0,70-1,5 mg/Kg/dia são potencialmente eficazes na fístula perianal simples ou fístula enterocutânea, quando foram afastadas obstrução distal  ou abscesso;

-infliximab (3 infusões de 5mk/Kg em 0, 2 e 6 semanas) deve ser reservado para pacientes com fístula perianal ou enterocutânea que foram refratários a outro tratamento;

-cirurgias são reservadas para fístulas complexas ou persistentes, em combinação com o tratamento medicamentoso, e incluem os seguintes objetivos: drenagem de abscessos, colocação de setons, dilatação anal nas estenoses, retalhos de mucosa para fístulas perianais e retovaginais, além de fistulectomias.

 

 

 

Cirurgia e cuidados pós-operatórios

 

A cirurgia não cura a doença de Crohn e deve ser utilizada de forma restritiva, embora não deva ser considerada como o último recurso. Em algumas situações, tais como a doença sintomática ileocecal localizada, pode ser considerada como uma alternativa potencial para administração médica. As indicações específicas para a cirurgia incluem abscessos, fístulas perianais ou internas, complexos que não respondem ou resposta insuficiente à terapêutica médica, restrições anatômicas com sintomas de obstrução parcial ou completa do intestino, displasia de alto grau e câncer.

Tabagismo, um fenótipo penetrante (B3 ou B3p), e cirurgia do intestino delgado prévio aumentam a probabilidade de recidiva pós-operatória. Até agora, as tiopurinas são melhor estudadas para evitar a recidiva pós-cirúrgica, mas dados preliminares também existem para o infliximab e ensaios adicionais que investigam a eficácia de outros agentes biológicos para a prevenção de recorrência pós-operatória estão em curso.

 

 

Manejo de desordens comumente associadas com a doença de Crohn:

 

Anemia: a anemia crônica pode ser um sintoma de apresentação na doença de Crohn e na maioria das vezes não é causada pela perda de sangue intestinal, mas por metabolização do ferro. Reposição de ferro e transfusão são indicadas de forma semelhante a outras situações com anemia.

A substituição de ferro por via intravenosa combinada com eritropoietina é necessária e eficaz em alguns casos.

 

Artropatia e osteoporose:  doença articular periférica (pauciarticular e artrite poliarticular) e artropatia axial (espondilite e frequentement sacroileíte) podem preceder os sintomas intestinais na doença de Crohn. A artrite pauciarticular (oligoartrite) geralmente afeta menos de cinco grandes articulações (por exemplo, tornozelos, joelhos, quadris, punhos, cotovelos e ombros), correlaciona-se com a atividade da doença e responde à otimização dos medicamentos, enquanto a artrite poliarticular afeta mais articulações (principalmente pequenas articulações da mão) e não está relacionada com a atividade da doença. A artrite pauciarticular e poliarticular respondem à medicações anti-inflamatórias não esteroidais (preferencialmente inibidores de COX II) e fisioterapia, e espondilite anquilosante também responde à terapia anti-TNF. Os pacientes com a doença de Crohn estão em risco de osteoporose (por causa do uso de corticoesteroides e diminuição de vitamina e a absorção de minerais) e à perda óssea induzida por inflamação. Estes pacientes devem receber suplementação com cálcio e vitamina D, ou devem receber bisfosfonato antes do início de tratamento com corticoesteroides.

 

Pioderma gangrenoso e eritema nodoso: o pioderma gangrenoso e o eritema nodoso são frequentemente associados com a doença de Crohn. Biópsias geralmente não são recomendadas e podem induzir erupções adicionais em pioderma por causa da patergia. Elas precisam ser distinguidas da terapia associada com lesões acneiformes e lesões de pele psoriasiformes e infecções oportunistas.

Infecção e vacinação: quase todas as medicações para a doença de Crohn estão associadas com um risco aumentado de infecções. A prevenção desta complicação começa com a seleção de medicamentos apropriados para a situação clínica específica e rastreio de infecções ativas antes do início de fármacos imunossupressores. Especial atenção deve ser dada para a tuberculose, a hepatite infecciosa, o citomegalovírus, ou infecção por HIV, e infecção por Clostridium difficile. Outro aspecto importante é garantir um estado de imunização atualizado. Pacientes com doença de Crohn devem ser encorajados a completar suas vacinas antes da terapia de acordo com recomendações para pessoas com imunodeficiências primárias e secundárias.

 

Malignidade:  os pacientes com a doença de Crohn têm risco aumentado de desenvolver neoplasia de intestino delgado e colorretal precoce. O risco é maior com uma história familiar esporádica de câncer colorretal, inflamação descontrolada, cólon encurtado e pseudopólipos. Se mais do que um terço do cólon é afetado (L3) o risco de neoplasia fica ainda mais aumentado. Colonoscopia deve ser realizada de preferência em remissão a cada 1-2 anos e quando normal a cada 1-3 anos depois. Os pacientes com colangite esclerosante primária apresentam especialmente risco para o carcinoma colorretal do lado direito e devem ser submetidos a rastreamento de displasias. As tiopiurinas e os bloqueadores de TNF-alfa foram de forma independente associados com o desenvolvimento de linfomas de células B.

 

Referências

 

1-Baumgart DC, Sandborn WJ. Crohn´s Disease. The Lancet 2012; 380: 1590-1605.

2-Travis SP, Stange EF, Lémann M, et al. European evidence based consensus on the diagnosis and management of Crohn's disease: current management. Gut 2006; 55 Suppl 1:i16.

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