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Rastreamento de Neoplasias Malignas

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 05/03/2018

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As taxas de mortalidade por câncer continuam a diminuir nos EUA e na maior parte do mundo - resultado, em parte, da redução no consumo de tabaco, uma vez que o tabagismo é a causa evitável mais importante de câncer. O rastreamento de neoplasias malignas diz respeito aos exames clínico e complementares para o diagnóstico de câncer em pacientes assintomáticos.

Algumas medidas preventivas para o desenvolvimento de neoplasias têm benefício comprovado; a prevenção primária do câncer de pele pode ser realizada com a restrição da exposição à luz ultravioleta por meio do uso de roupas apropriadas e do uso de protetores solares. Nas duas últimas décadas, houve um aumento de três vezes na incidência de carcinoma de células epidermoides e um aumento de quatro vezes na de melanoma nos EUA.

Alguns autores acreditam que o rastreamento com exame físico pode ajudar a detectar o melanoma, o que poderia diminuir a mortalidade e as complicações. A recomendação de associações de dermatologia, em pacientes de alto risco, é que sejam investigadas, por meio de autoexame e do exame físico regular, lesões de pele potencialmente malignas.

As pessoas que se envolvem em exercício físico regular e evitam a obesidade têm taxas mais baixas de recidiva de câncer de mama e de colo. A prevenção de neoplasias induzidas pela atividade ocupacional envolve minimizar a exposição a substâncias cancerígenas, como amianto, radiação ionizante e compostos de benzeno.

A quimioprevenção tem sido amplamente estudada para a prevenção primária do câncer. É evidente o benefício do uso de tamoxifeno, raloxifeno e inibidores da aromatase para a prevenção do câncer de mama. A vacinação contra a hepatite B, por sua vez, pode prevenir o carcinoma hepatocelular (CHC), e os programas de rastreamento e vacinação podem ser custo-efetivos e úteis na prevenção de CHC na população de asiáticos e habitantes de ilhas do Pacífico.

Estudo têm demonstrado que o uso da vacina contra o papilomavírus humano (HPV) para prevenir câncer de colo cervical e, possivelmente, anal é benéfico. Além de prevenir o câncer anogenital, a vacina contra o HPV pode ter um papel na prevenção de câncer de cabeça e pescoço relacionado a esse vírus. O aconselhamento, em relação à perda de peso e à mudança de comportamento, é fundamental na prevenção de neoplasias, sendo recomendação geral.

O rastreamento para neoplasias malignas tem evidências de diminuir a mortalidade pelo câncer de mama, de colo e de colo uterino. Nas atuais recomendações de rastreamento de neoplasias malignas da US Preventive Services Task Force (USPSTF), está a mamografia a cada 2 anos para pacientes acima de 50 anos de idade. O exame clínico das mamas é indicado a partir dos 40 anos de idade pela American Cancer Society (ACS), mas o benefício do autoexame das mamas ainda é controverso - sendo indicado a partir dos 20 anos de idade; sem recomendações da USPSTF.

O Quadro 1 sumariza as recomendações da USPSTF para o câncer de mama.

 

Quadro1

 

RECOMENDAÇÕES DA US PREVENTIVE SERVICES TASK FORCE PARA O CÂNCER DE MAMA

Autoexame da mama

Não se deve ensinar o autoexame da mama.

Exame clínico da mama

Evidência insuficiente para recomendar a favor ou contra.

Mamografia

Deve ser realizada a mamografia bienal para mulheres de 50?74 anos de idade. A decisão de iniciar o rastreamento bienal antes dos 50 anos deve ser individualizada e colocada no contexto dos valores da paciente.

 

Uma revisão da Cochrane de 2011 estimou que o rastreamento com mamografia levou a uma redução de 15% na mortalidade do câncer da mama, mas resultou em 30% de diagnósticos inapropriados e tratamento excessivo. Hoje em dia, a forma apropriada e a frequência de rastreamento para o câncer de mama permanecem controversas, e as diretrizes de triagem variam.

Os médicos devem discutir os riscos e os benefícios com cada paciente e considerar as preferências individuais delas na decisão sobre quando começar a triagem. A mamografia digital é mais sensível em mulheres com mamas densas e mulheres mais jovens; entretanto, estudos que exploram resultados ainda não existem.

A RNM não é, atualmente, recomendada para a triagem geral; o seu impacto na mortalidade por câncer de mama é incerto, e seus benefícios em casos individuais é bem documentado. A ACS recomenda a RNM para as mulheres em alto risco (20 a 25% ou mais), incluindo aquelas com uma forte história familiar de câncer de mama ou ovário. O rastreamento, tanto com RNM quanto com mamografia, pode ser superior à mamografia isolada na exclusão de lesões cancerígenas em mulheres com predisposição hereditária ao câncer de mama.

Na última década, o aumento nas taxas de triagem para cânceres de mama, cervical e de colo foi significativo, mas a triagem geral para esses tipos de câncer ainda é considerada subótima. Intervenções, incluindo educação em grupo, educação individualizada, lembretes aos pacientes, redução de barreiras estruturais, redução de custos, entre outras medidas, são eficazes na promoção do rastreamento de câncer.

A triagem do câncer de próstata continua controversa, com discordância entre a USPSTF e as associações de urologia. A verdade é que nenhum estudo completo demonstrou se a detecção precoce do câncer de próstata e o tratamento após a detecção produzem benefícios suficientes para compensar os danos do tratamento, que inclui maior incidência de intervenções gerando impotência sexual e incontinência urinária.

O rastreamento do câncer de próstata tem sido advogado desde 1903, quando Hampton demonstrou que o exame digital poderia detectar a doença. O antígeno prostático específico (PSA) é produzido, quase que exclusivamente, por células epiteliais prostáticas. Uma revisão sistemática do Cochrane de 2013 revelou que a triagem do câncer de próstata com teste de PSA não diminuiu a mortalidade por todas as causas, e pode não diminuir a mortalidade específica do câncer de próstata.

Quaisquer benefícios, em termos de redução da mortalidade relacionada ao câncer de próstata, levariam mais de 10 anos para se tornarem evidentes. Homens com menos de 10 a 15 anos de expectativa de vida devem ser informados de que a triagem para o câncer de próstata tem benefício improvável. Em maio de 2012, a USPSTF recomendou a não realização da triagem baseada em PSA para o câncer de próstata; porém, ela poderia ser analisada em casos individuais, conforme a preferência pessoal do paciente.

A ACS recomenda que, a partir dos 50 anos de idade, o assunto seja discutido entre o médico e seu paciente; além disso, em pacientes negros com familiar com câncer de próstata antes dos 65 anos de idade, essa discussão deve ser realizada a partir dos 45 anos de idade. O rastreamento do câncer de próstata deve ser realizado com PSA, com ou sem exame digital associado. A USPSTF não faz recomendações específicas em relação ao exame digital para o rastreamento da doença.

Em relação à prevenção do câncer colorretal, sabe-se que a realização de exames anuais ou bienais de sangue oculto nas fezes reduz a mortalidade em 16 a 33%. Os exames imunoquímicos fecais são superiores às pesquisas de sangue oculto fecal com base em guáiaco na detecção de pólipos adenomatosos avançados e câncer colorretal; hoje em dia, eles têm a preferência em relação à realização da pesquisa de sangue oculto nas fezes.

Os pacientes também tendem a preferir a realização de exames imunoquímicos fecais em comparação com a pesquisa de sangue oculto nas fezes. O risco de morte por câncer do colo entre as pacientes submetidas a, pelo menos, um exame sigmoidoscópico é diminuído em 60 a 80% em comparação com o das pacientes não submetidas à sigmoidoscopia.

A colonoscopia também tem sido defendida como exame de rastreamento. É mais sensível do que a sigmoidoscopia flexível para detectar câncer e pólipos, mas seu valor na redução da mortalidade por câncer de colo não foi estudado diretamente. A colonoscopia virtual por tomografia computadorizada (TC) é uma opção não invasiva no rastreamento do câncer colorretal. Tem sido demonstrado que o exame apresenta um alto perfil de segurança e desempenho semelhante à colonoscopia.

O American College of Physicians (ACP) recomenda que os clínicos interrompam o rastreamento do câncer colorretal em indivíduos com idade superior a 75 anos ou com expectativa de vida inferior a 10 anos. A USPSTF, por sua vez, em relação ao câncer colorretal, recomenda: rastreamento utilizando pesquisa de sangue oculto nas fezes, sigmoidoscopia ou colonoscopia em adultos, dos 50 anos até os 75 anos de idade; não são recomendados o rastreamento de rotina em adultos com idades entre 76 a 85 anos, bem como a triagem em adultos maiores de 85 anos.

A ACS faz recomendações semelhantes. Para maiores detalhes, é indicada a consulta à revisão sobre o rastreamento de câncer colorretal que está disponível no site oficial da ACS. O benefício do rastreamento do câncer de colo de útero é bem determinado pela literatura. A USPSTF indica o rastreamento em mulheres com idades entre 21 e 65 anos com esfregaço de Papanicolau (citologia) a cada 3 anos ou, em mulheres com idade entre 30 a 65 anos que desejam intervalos mais longos, triagem com citologia e HPV a cada 5 anos.

A USPSTF não indica o rastreamento em mulheres com menos de 21 anos de idade e com risco médio acima de 65 anos com rastreio pré-adequado. O uso prévio da vacina contra HPV não tem impacto nos intervalos de triagem. Em 2012, a ACS, a Sociedade Americana de Colposcopia e Patologia Cervical e a Sociedade Americana de Patologia Clínica publicaram diretrizes atualizadas para o gerenciamento de resultados anormais.

As mulheres cujos exames cervicais de HPV são positivos, mas os resultados da citologia são negativos, devem repetir o teste em 12 meses ou submeter-se a testes específicos de genótipos de HPV para os tipos 16 ou 16/18. A colposcopia é recomendada em mulheres com resultado positivo para os tipos 16 ou 16/18.

As mulheres com células escamosas atípicas de significado indeterminado (Ascus) na citologia e um resultado negativo do teste HPV devem continuar o rastreamento de rotina de acordo com as diretrizes específicas. A ACS também defende o rastreamento a partir dos 21 anos, com citologia a cada 3 anos, e recomenda interromper o rastreamento após os 65 anos de idade se os exames forem sempre negativos.

O Quadro 2 contém as recomendações completas da USPSTF.

 

Quadro 2

 

RECOMENDAÇÕES COMPLETAS DA US PREVENTIVE SERVICES TASK FORCE PARA O CÂNCER DE COLO DO ÚTERO

                    Recomenda-se realizar o rastreamento para o câncer de colo do útero em mulheres com idade entre 21?65 anos com citologia (Papanicolau) a cada 3 anos ou em mulheres com idade entre 30?65 anos que desejam alargar o intervalo de triagem; rastreamento com uma combinação de citologia e pesquisa de HPV com testes a cada 5 anos.

                    Recomenda-se contra o rastreamento para o câncer de colo do útero em mulheres com menos de 21 anos.

                    Recomenda-se não realizar o rastreamento para o câncer de colo do útero em mulheres com mais de 65 anos de idade que não apresentem alto risco para a doença.

                    Recomenda-se contra o rastreamento para o câncer de colo do útero em mulheres que tiveram uma histerectomia com remoção do colo do útero e que não têm história de lesão pré-cancerosa de alto grau (NIC, grau 2 ou 3) ou câncer de colo do útero.

                    Recomenda-se não realizar a triagem para câncer cervical com HPV, isoladamente ou em combinação com citologia, em mulheres com menos de 30 anos.

HPV: papilomavírus humano; NIC: neoplasia intraepitelial cervical.

 

Recentemente, as evidências sugerem que o rastreamento para câncer de pulmão em pacientes de risco é benéfico. As evidências também sugerem que a TC de tórax é bem mais sensível que a radiografia de tórax na identificação de pequenos cânceres pulmonares assintomáticos; entretanto, existem controvérsias quanto à eficácia e ao custo-efetividade da triagem da TC com baixa dose de radiação em indivíduos de alto risco.

O National Lung Screening Trial (NLST), um estudo clínico randomizado, de mais de 53 mil pessoas com alto risco de câncer de pulmão, revelou uma redução relativa de 20% e uma redução absoluta de 6,7% na mortalidade por câncer de pulmão naqueles que foram selecionados com TC anual por 3 anos em comparação com aqueles que tiveram rastreamento apenas com radiografias de tórax. Houve um maior número de resultados falso-positivos no grupo TC em comparação com o grupo de radiografia.

O Multicentric Italian Lung Detection (MILD), um estudo randomizado de mais de 4 mil participantes, comparando a TC anual ou bienal de baixa dose com a observação, não revelou evidência de efeito protetor com triagem anual ou bienal de baixa dose. O USPSTF recomenda a triagem anual de câncer de pulmão com baixa dose de TC em fumantes atuais com idades entre 55 a 80 anos com um histórico de tabagismo de mais de 30 maços/ano ou fumantes que pararam nos últimos 15 anos.

O rastreamento deve parar uma vez que a pessoa não tenha fumado durante 15 anos ou diante de um problema de saúde que limite significativamente a expectativa de vida. A triagem não deve ser vista como uma alternativa à cessação do tabagismo. A ACS indica o rastreamento em pacientes entre 55 e 74 anos de idade com história de tabagismo de mais de 30 maços/ano que ainda fumam ou que pararam de fumar há menos de 30 anos. Em relação a outras neoplasias malignas como as do pâncreas, do estômago ou do endométrio, não existem evidências científicas para recomendar o rastreamento rotineiro.

 

Referências

 

1-Pignone M, Salazar R. Disease Prevention and Health Promotion in Current Diagnosis and Treatment 2016.

2-Brawley OW, Parnes HL. Cancer screening in Devitta, Hellman and Rosenberg in Cancer Principles and Practice of Oncology 2016.

 

 

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