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Gastroenterite Eosinofílica

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 16/07/2018

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A gastrenterite eosinofílica (GEE) faz parte de um grupo de doenças que inclui a gastrite eosinofílica, a enterite eosinofílica e a GEE. A gastrenterite eosinofílica representa um grupo de doença em que ocorre infiltração eosinofílica no estômago e duodeno; em alguns casos, a inflamação pode envolver esôfago e colo, em que uma causa de eosinofilia conhecida não esteja presente. Em contraste com o esôfago, o estômago e o intestino têm níveis prontamente detectáveis ?de eosinófilos em condições saudáveis, o que torna mais difícil o diagnóstico.

Ocorrem cerca de 20 a 30 casos de GEE a cada 100 mil pessoas/ano, em qualquer idade, mas tipicamente entre a terceira e a quinta décadas de vida, com predominância leve no sexo masculino. Causas secundárias de infiltração eosinofílica gástrica incluem infecções parasitárias e bacterianas do estômago, intestino irritável, distúrbios mieloproliferativos, poliarterite, vasculite alérgica, esclerodermia, lesão de drogas e hipersensibilidade de medicamentos.

A GEE pode ser primária com variantes atópicas, não atópicas e familiares, e as GEEs secundárias podem ocorrer por distúrbios eosinofílicos sistêmicos e transtornos não eosinofílicos. A gastrite eosinofílica primária, a enterite e a gastrenterite também foram chamadas de gastrenteropatia idiopática ou alérgica.

A GEE primária engloba múltiplas doenças subcategorizadas em três tipos conforme o envolvimento histológico: formas mucosas, musculares e serosas que serão discutidas nas manifestações clínicas. Deve-se observar que qualquer camada do trato gastrintestinal pode estar envolvida; assim, a biópsia endoscópica pode ser normal em pacientes com os subtipos musculares e/ou serosos.

 

Etiologia

 

Embora a gastrite e a enterite eosinofílica sejam de natureza idiopática, um mecanismo alérgico tem sido sugerido em, pelo menos, um subconjunto de pacientes. De fato, foi detectada imunoglobulina E (IgE) total elevada e IgE específica de alimentos nestes pacientes. A maioria dos pacientes com gastrite ou GEE têm testes cutâneos positivos para uma variedade de antígenos alimentares, mas não apresenta reações anafiláticas típicas. Em um estudo, 23% dos pacientes com GEE não possuíam eosinofilia periférica, mas até 50% dos pacientes com a forma mucosa apresentavam história de alergia ou intolerância alimentar.

 

Características Clínicas

 

Em geral, a GEE apresenta uma constelação de sintomas relacionados ao grau e área do trato gastrintestinal afetado. Mesmo pacientes com enterite eosinofílica isolada (por exemplo, duodenite) podem ter uma gama de sintomas gastrintestinais. Cerca de um terço dos pacientes apresentam sintomas alérgicos respiratórios e eczema.

A forma mucosa da GEE é a variante mais comum, com sintomas não específicos dependentes do local envolvida. Os sintomas incluem dor abdominal, náuseas, saciedade precoce, vômitos, diarreia e perda de peso de 2 a 5kg, geralmente. A dor abdominal pode simular apendicite aguda. Os pacientes com envolvimento intestinal difuso podem apresentar diarreia, má absorção, enteropatia perdedora de proteínas, perda de sangue em fezes, anemia ferropriva e diminuição da velocidade de crescimento em crianças.

A forma muscular tem lesões contendo agregados marcantes de linfócitos e eosinófilos cursando com espessamento de camada muscular e diminuição de motilidade. Os pacientes com envolvimento de esôfago podem cursar com pseudoacalasia e estenoses de esôfago e regurgitação de alimentos. A infiltração eosinofílica pode causar perfuração e obstrução de saída gástrica.

A eliminação da ingestão dietética de alimentos associados com a infiltração eosinofílica verificada por testes cutâneos (ou após a mensuração de níveis de IgE específicos de alérgenos) tem efeitos variáveis, mas a resolução completa é geralmente alcançada com dietas elementares baseadas em aminoácidos.

A forma subserosa da doença da GEE cursa com ascite exsudativa com contagens de eosinófilos periféricos superiores e outros sintomas que ocorrem na forma muscular da doença em comparação com as outras formas.

 

Exames Complementares

 

A avaliação para GEE começa com uma história abrangente e exame físico seguido de testes diagnósticos. A avaliação dos parasitas intestinais pelo exame de amostras de fezes, aspirados intestinais obtidos durante a colonoscopia ou títulos específicos de anticorpos de sangue deve ser realizada, especialmente quando os pacientes têm exposição de alto risco (por exemplo, em caso de viagens no exterior, estadia em uma fazenda, consumo de água) para descartar parasitoses intestinais como causa de eosinofilia.

Em pacientes em que se considera a realização de imunossupressão sistêmica para GEE, a infecção com Strongyloides stercoralis deve ser descartada porque essa infecção pode tornar-se fatal em caso de imunossupressão sistêmica. A avaliação dos níveis totais de IgE tem significância na estratificação de pacientes com variantes atópicas de GEE, e pode ocorrer esse aumento em pacientes com infecções parasitárias ocultas.

O Prick Test cutâneo a um painel de alérgenos alimentares e aeroalérgenos ajuda a identificar sensibilizações para alérgenos específicos. O teste de hipersensibilidade cutânea para antígenos específicos de alimentos pode ajudar na identificação adicional de variantes alérgicas da GEE.

A eosinofilia periférica ocorre na maioria dos pacientes, mas em 20% deles os níveis de eosinófilos podem ser normais; os níveis de eosinófilos costumam ser maiores em doença subserosa. Os pacientes com má absorção podem ter teste da D-xilose alterado, assim como outras alterações características de síndrome de má absorção como hipoalbuminemia e deficiência de ferro. Exames de imagem podem mostrar alterações como estenoses de esôfago, espessamento do antro gástrico e mucosa intestinal, mas os achados são inespecíficos e não diagnósticos.

Achados histopatológicos incluem a presença de eosinófilos elevados em amostras de biópsia da parede do trato gastrintestinal,infiltração de eosinófilos dentro de criptas intestinais e glândulas gástricas. Um estudo recente sugeriu que uma densidade de eosinófilos maior que 30 eosinófilos/campo em, pelo menos, 5 campos pode diferenciar a gastrite eosinofílica dos controles adultos normais. O diagnóstico é firmado com a demonstração de infiltração eosinofílica de estômago e intestino, sem envolvimento de outros órgãos, na ausência de outras causas de eosinofilia intestinal.

 

Tratamento

 

Existem poucas evidências sobre o manejo desses pacientes. A primeira medida é eliminação da ingestão dietética de alimentos implicados por testes cutâneos (ou após a medição de níveis de IgE específicos de alérgenos) ou, em caso de não realização de testes cutâneos, a eliminação de alimentos prováveis, como a chamada dieta de eliminação de seis alimentos empíricos.

Apesar dessas dietas, a resolução completa costuma ser alcançada somente com dietas elementares baseadas em aminoácidos. Uma vez que a remissão da doença foi obtida por modificação dietética, os grupos de alimentos específicos são reintroduzidos lentamente (em intervalos de 3 semanas para cada grupo de alimentos), e a endoscopia é realizada a cada 3 meses para identificar a remissão sustentada ou o surto de doença.

O manejo de GEE, além de uma dieta elementar em pacientes em que não houve resposta à dieta, podem ser utilizados os glicocorticóides sistêmicos e tópicos, e a maioria dos autores sugere o uso de prednisona, 20?40mg, por 2 a 6 semanas; em pacientes em que há uma resposta, a melhora dos sintomas costuma ocorrer em 2 semanas; pode-se considerar o uso de corticosteróides intravenosos naqueles que não responderem ao tratamento. Pode-se, ainda, considerar o uso de corticosteróides tópicos como a budesonida.

Em casos graves, que são refratários ou dependentes da terapia com glicocorticóides, a alimentação intravenosa ou a terapia imunossupressora/antimetabólitos orais com azatioprina ou 6-mercaptopurina são alternativas. Finalmente, mesmo que a GEE não esteja presente, a neutralização da acidez gástrica com bloqueadores de bomba de prótons pode melhorar os sintomas e o grau de patologia esofágica e gástrica.

Medicações como o cromoglicato, o montelucaste, o cetotifeno foram defendidos para o tratamento, mas geralmente o seu uso não costuma ser bem-sucedido no tratamento dos pacientes. O omalizumabe, que é um anticorpo monoclonal anti-IgE, diminui a eosinofilia tecidual, mas não existem evidências de benefício em desfechos clínicos.

 

Prognóstico

 

A história natural da gastrite e da enterite eosinofílica não foi bem documentada. Em pacientes com doença induzida por antígenos alimentares claros, níveis anormais de IgE circulante e eosinofilia frequentemente servem como marcadores para envolvimento tecidual.

Uma vez que essas doenças muitas vezes podem ser uma manifestação de outro processo de doença primária, recomenda-se a vigilância de rotina dos sistemas cardiopulmonares para o envolvimento eosinofílico. Quando a doença se apresenta na infância e a sensibilização específica aos alimentos pode ser identificada, existe uma alta probabilidade de remissão da doença pelo final da infância.

 

Referências

 

1-Rothenberg ME, Haberman Y. Eosinophilic disorders of the gastrointestinal tract in Sleisenger Gastrointestinal and Liver Disease 10th edition 2016.

2-Rothenberg ME. Eosinophilic gastrointestinal disorders (EGID). J Allergy ClinImmunol 2004; 113:11.

3-Spergel JM, Book WM, Mays E, et al. Variation in prevalence, diagnostic criteria, and initial management options for eosinophilic gastrointestinal diseases in the United States.J PediatrGastroenterolNutr 2011; 52:300.

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