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Doença de Wilson

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 28/01/2020

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Introdução e Epidemiologia

 

A doença de Wilson  (DW) resultade uma deficiência no transporte celular de cobre. O cobre é um metal essencial,que é um importante cofator para muitas reações enzimáticas. A dieta médiafornece quantidade substancial de cobre, tipicamente 1 a 2mg/dia, sendo que adose recomendada é de 0,8mg/dia. O excesso de cobre acaba sendo excretado.

O cobre é absorvido pelos enterócitos, principalmente no duodeno eno intestino delgado, e transportado na circulação portal, em associação com aalbumina e o aminoácido histidina para o fígado, onde é avidamente removido dacirculação, sendo esse transporte mediado pelo ATP7B.

O fígado utiliza alguma quantidade de cobre para as necessidadesmetabólicas, de síntese, e secreta a proteína ceruloplasmina contendo cobre eexcreta o excesso de cobre na bile. Processos que prejudicam a excreção biliarde cobre podem levar a aumentos do teor de cobre hepático; já as perdas renaiseliminam 10 a 15% das perdas diárias de cobre.

A DW, também conhecida como degeneração hepatolenticular, foidescrita pela primeira vez em 1912 por Kinnear Wilson como ?degeneraçãoprogressiva lenticular?; se tratava, na descrição original, de uma doençagenética com complicações neurológicas letais, transmissão familiar eacompanhada por doença hepática crônica, levando à cirrose.

O papel do cobre na patogênese da DW foi descoberto nas décadasseguintes, e foi determinado que o padrão de herança genética é autossômicorecessivo. Esses pacientes apresentam função ausente ou reduzida da proteínaATP7B, o que leva à diminuição da excreção de cobre na bile. Isso resulta naacumulação de cobre e lesão hepática por ele.

Eventualmente, o cobre é liberado na corrente sanguínea edepositado em outros órgãos, nomeadamente o cérebro, os rins e a córnea. Afalta de incorporação do cobre da ceruloplasmina é outra consequência da perdade proteína ATP7B funcional. Pacientes com cirrose, manifestações neurológicas,e anéis de Kayser-Fleischer são facilmente diagnosticados como tendo DW porquese assemelham à descrição clínica inicial da doença.

O paciente com doença hepática, que tem, pelo menos, 5 anos deidade, mas com menos de 40 anos, com uma diminuição da ceruloplasmina sérica e anéisde Kayser-Fleischer também são considerados como tendo DW. No entanto, cerca demetade dos pacientes que se apresentam com doença hepática não tem dois dessestrês critérios, o que representa um desafio na tentativa de estabelecer odiagnóstico.

 

Epidemiologia

 

A doença é encontrada universalmente, e se estima a prevalência de1 caso a cada 10 mil a 30 mil nascimentos e, aproximadamente, uma pessoa a cada90 tem copia anormal do gene ATP7b. Em algumas populações, a prevalência émuito maior, ocorrendo um caso a cada 15 nascimentos em uma pequena vila deCreta na Grécia, por exemplo. Um outro estudo encontrou uma prevalência do genealterado três vezes maior na população francesa. A doença tem ocorrênciauniversal com uma prevalência média 30 indivíduos afetados por milhão depessoas.

A forma de apresentação além de doença hepática pode ser como umadesordem progressiva neurológica (disfunção hepática sendo menos aparente ouocasionalmente ausente) ou como doença psiquiátrica. A DW se apresenta comodoença hepática mais frequentemente em crianças e em adultos mais jovens do quenos mais velhos. Os sintomas em qualquer idade são frequentementeinespecíficos.

 

Manifestações Clínicas

 

Os pacientes, na apresentação, podem ter desde anormalidadeshepáticas bioquímicas assintomáticas até cirrose descompensada; alguns podemter um curso rápido de doença clínica semelhante a uma hepatite viral aguda, eoutros podem apresentar características indistinguíveis de hepatite autoimune.

As manifestações são predominantemente hepáticas, neurológicas epsiquiátricas, com alta variabilidade de sintomas em diferentes séries comdoença hepática ocorrendo, por exemplo, em 18 a 84% dos pacientes emanifestações neurológicas em 18 a 73% dos casos; já as manifestaçõespsiquiátricas ocorrem de 10 a 100% dos casos. Os pacientes podem, ainda,apresentar um quadro de hemólise, que pode ser independente do aparecimento dealterações hepáticas ou neurológicas.

O diagnóstico, segundo as diretrizes norte-americanas, sugereconsiderar o diagnóstico em qualquer paciente com alterações hepáticas e idadeentre 3 e 55 anos, e que a idade não deve ser critério para exclusão dodiagnóstico; deve-se destacar que a grande maioria dos casos inicia asmanifestações entre 9 e 13 anos de idade.

Os pacientes podem apresentar esplenomegalia isoladamente devido àcirrose clinicamente inaparente com hipertensão portal. A DW pode, ainda, apresentar-secomo insuficiência hepática aguda com anemia hemolítica com teste de Coombsnegativo e insuficiência renal aguda.

Sinais e sintomas da doença hepática em pacientes com DW incluem:

·              Esteatose hepática assintomática

·              Dor abdominal

·              Hepatomegalia

·              Ascite com gradiente albumina sérico-ascítico aumentado

·              Sangramento gastrintestinal

·              Estigmas periféricos de doença hepática

·              Encefalopatia hepática

Em crianças, é frequentemente descrita a apresentação na forma deum quadro agudo similar a uma hepatite viral aguda, embora a elevação detransaminases seja menor (tipicamente, menores que 2.000U/L), e a DW éresponsável por cerca de 5% dos casos de insuficiência hepática fulminante nosEUA.

Ao longo dos anos, os avanços diagnósticos permitiram umaavaliação mais sistemática dos indivíduos suspeitos de ter DW antes do desenvolvimentode sintomas neurológicos. O curso da doença pode ter episódios transitórios deicterícia devido à hemólise.

A hemólise em baixo grau pode estar associada com doenças dofígado, enquanto a DW não é clinicamente evidente, sendo a hemólise uma dasmanifestações de apresentação em 11 a 28% dos pacientes em duas séries de casos;na maioria dos casos, esta não se encontra isoladamente, mas associada a outrasalterações.

As manifestações neurológicas da DW apresentam-se tipicamente deforma tardia em relação às manifestações hepáticas, na maioria das vezes naterceira década de vida, mas podem se apresentar na infância. No início, aapresentação é sutil, com alterações em pacientes pediátricos, incluindomudanças no comportamento, deterioração na realização de tarefas e trabalhosescolares ou incapacidade para realizar atividades que requerem uma coordenaçãoentre olhos e mão mais apurada.

A caligrafia pode deteriorar-se e os pacientes podem desenvolver achamada micrografia. Outros achados comuns em pacientes que apresentem doençasneurológicas incluem tremores similares ao encontrado no tremor essencial,falta de coordenação motora, disartria, distonia e espasticidade.

A disartria em particular é um dos sintomas descritos maisfrequentementes da DW, ocorrendo em 85 a 97% dos casos, e é uma das formas deacometimento típicas da doença; as outras formas são a distônica, com predomíniode tremores, pseudoesclerótica (tremores com ou sem disartria) e comparkinsonismo. Ataxia e alterações do equílibrio são descritas em 30 a 75% doscasos; tremores, em 22 a 55% dos casos; sintomas parkinsonianos em 19 a 62% doscasos.

Por causa da paralisia pseudobulbar, a disfagia também podeocorrer, com risco de aspiração se grave. A disautonomia pode estar presente. Acefaleia, com características de enxaquecas e insônia, pode ser relatada e podeser frequente. As manifestações psiquiátricas incluem depressão em 20 a 30% doscasos; outras incluem alterações de personalidade, ansiedade, irritabilidade,comportamento inapropriado, transtorno bipolar e até mesmo psicose franca.

Pacientes com DW podem apresentar manifestações extra-hepáticasimportantes, além de doença neurológica ou psiquiátrica, como anomalias renais,incluindo aminoaciduria e nefrolitíase, anormalidades esqueléticas como aosteoporose e artrite prematura, cardiomiopatia, que podem ser distinguidas daDW por outras características.

Os chamados anéis de Kayser-Fleischer estão presentes em 44 a 62%dos pacientes com doença hepática, principalmente no momento da diagnóstico, epodendo ocorrer no acometimento hepático agudo ou crônico. Em crianças comdoença hepática, os anéis de Kayser-Fleischer são geralmente ausentes.

Os anéis de Kayser-Fleischer são quase invariavelmente presentesem pacientes com quadro neurológico, mas, mesmo nesses casos, podem estarausentes em 5%; em qualquer paciente que se suspeita de DW, devem serprocurados os anéis de Kayser-Fleischer por examinador treinado com lapada defenda; a ausência de anéis de Kayser-Fleischer não exclui o diagnóstico da DW.

Outras alterações oftalmológicas podem ser encontradas, comocataratas, depósitos lenticulares de cobre. Essas manifestações só desaparecemcom o tratamento adequado ou o transplante hepático. Em pacientes que tiveramremissão desses sintomas com o tratamento, o reaparecimento da manifestaçãosugere má-aderência.

 

Exames Complementares

 

Alterações bioquímicas hepáticas como alterações de transaminasespodem ocorrer em uma idade muito precoce. Em muitos indivíduos, o grau de elevaçãodas aminotransferases pode ser leve e não reflete a gravidade da doençahepática. O teste de Coombs pode ser positivo; já a trombocitopenia ocorre empacientes com cirrose e esplenomegalia; a coagulopatia, por sua vez, aparece empacientes com cirrose estabelecida.

A imagem craniana também tem sua utilidade. Tanto a ressonâncianuclear magnética (RNM) do cérebro como a tomografia computadorizada (TC) podemdetectar anormalidades estruturais nos gânglios da base; os mais frequentementeencontrados são o aumento da densidade na TC e a hiperintensidade em T2 na RNM naregião dos gânglios da base.

Os exames diagnósticos específicos merecem uma consideração umpouco mais aprofundada, e serão discutidos cada um deles separadamente, bemcomo a sua utilização, para estabelecer o diagnóstico da DW.

A ceruloplasmina é uma proteína sintetizada principalmente nofígado e é um reagente de fase aguda, sendo, ainda, o maior transportador decobre no sangue, o que representa 90% do cobre que circula em indivíduos normais.As concentrações séricas de ceruloplasmina são elevadas por inflamação aguda e,em estados associados, hiperestrogenemia, tais como a gravidez, a suplementaçãode estrogênio e o uso de algumas pílulas anticoncepcionais orais.

A ceruloplasmina é diminuída em 85 a 90% dos pacientes com DW, maspode ser baixa também em outras condições com perda de proteína renal ouentérica marcada ou doença hepática terminal; a sua concentração sérica édecisiva para o diagnóstico de DW e deve ser combinada com os achados deconcentração sérica de cobre, que costuma ser baixa, excreção urinária decobre, que comumente está aumentada, e a presença ou não de anéis deKayser-Fleischer.

Um nível de ceruloplasmina sérica menor que 200mg/L (ou 20mg/dL),e o cobre sérico baixo é considerado consistente com o diagnóstico de DW, econsiderado diagnóstico se associado com a presença anéis de Kayser-Fleischer eexcreção de cobre urinário de 24 horas maior que 40mcg.

Caso a excreção de cobre urinário seja menor que esses valores, aconfirmação com biópsia hepática ou teste genético é necessária. Caso os anéisde Kayser-Fleischer estejam ausentes, são necessários, para o diagnóstico,valores de excreção urinária de cobre maiores que 100mcg; caso a excreção sejamenor que esses valores, é indicada a realização de biópsia hepática ou testegenético.

A concentração de cobre sérico é outro exame importante; em geral,suas concentrações diminuem proporcionalmente à diminuição dos níveis deceruloplasmina, apesar da sobrecarga tecidual de cobre; idealmente, deve-semensurar o cobre ligado à ceruloplasmina e o cobre não ligado à ceruloplasmina;uma diminuição dos níveis de ceruloplasmina associada ao aumento do cobre nãoligado à ceruloplasmina é bastante sugestivo do diagnóstico de DW.

A excreção urinária de cobre é outro exame útil para o diagnósticode DW e para o monitoramento do tratamento. A excreção urinária de 24 horas decobre reflete a quantidade de cobre não ligado à ceruloplasmina na circulação.O volume e a excreção de creatinina total na coleta de urina de 24 horas sãomedidos para avaliar se a amostra é completa. O nível convencional tomado comodiagnóstico da DW é maior que 100mcg em 24 horas, embora valores superiores a40mcg em 24 horas já sejam sugestivos do diagnóstico.

Excreção urinária de cobre com a administração de D-penicilaminapode ser um teste auxiliar de diagnóstico útil, pois a excreção urinária decobre pode ser influenciada por diversos fatores. Uma dose de 500mg deD-penicilamina é administrada oralmente no início e depois de 12 horas maistarde, durante coleta de urina de 24 horas, independente do peso corporal,quando ocorre excreção maior que 1.600mcg de cobre/24 horas, o diagnóstico deDW é provável, pois esse ponto de corte conseguiu, em estudos, excluir outrascausas de doença hepática como hepatites autoimunes, entre outras.

Algumas situações podem alterar os exames complementares nessespacientes. Em pacientes com lesão hepática grave, o cobre sérico pode estardentro da faixa normal, apesar de um nível de ceruloplasmina sérica diminuído.Em casos de insuficiência hepática aguda devido à DW, os níveis de cobre séricopodem ser marcadamente elevados devido à súbita liberação do metal em lojas detecido.

A concentração hepática parenquimatosa de cobre acima de 250mcg/gde peso seco representa a melhor evidência bioquímica para a DW. Valores acimade 70mcg/g são mais sensíveis, mas pouco específicos para o diagnóstico, porém valoresmenores que 70mcg/g são praticamente excludentes do diagnóstico. Para realizaresse exame, o ideal é que as espécimes de biópsia tenham, pelo menos, 1 a 2cmde comprimento.

Achados histológicos incluem esteatose leve e necrosehepatocelular focal. A biópsia hepática pode mostrar características histológicasclássicas de hepatite autoimune. A apoptose dos hepatócitos é umacaracterística proeminente com insuficiência hepática aguda devido à DW.

O exame oftalmológico com lâmpada de fenda é muito importante parao diagnóstico de DW, pois pode detectar a presença dos anéis deKayser-Fleischer; representa a deposição de cobre na membrana de Descemet nacórnea. Quando eles são visíveis por inspeção direta, eles aparecem como umabanda de pigmento dourado-acastanhada. Outro achado oftalmológicocaracterístico é a detecçãoo das chamadas caratas sunflower ou emgirassol.

A análise da mutação por sequenciamento do gene todo é possível, edeve ser realizada em indivíduos nos quais o diagnóstico é difícil deestabelecer por meio de testes clínicos e bioquímicos. A análise de haplótiposou o teste específico para mutações conhecidas podem ser usados para a triagemfamiliar de parentes de primeiro grau de pacientes com DW.

 

Diagnóstico

 

O diagnóstico depende normalmente das manifestações clínicas, e osachados laboratoriais devem ser interpretados conforme as circunstânciasclínicas de cada paciente. A DW, comumente, é diagnosticada entre 5 e 35 anos,mas cada vez mais ocorrem diagnósticos em crianças menores de 5 anos, sendoraro diagnóstico em menores de 2 anos. É controverso na literatura se deveexistir um limite máximo de idade para a consideração de DW como diagnósticodiferencial, mas a maioria dos médicos não considera o diagnóstico em pacientescom mais de 40 anos.

Em alguns pacientes, a associação de DW e hepatite autoimune nãopode ser excluída, e, em pacientes com hepatite autoimune sem resposta aotratamento, deve ser considerado investigar a DW. A maioria dos pacientes com aapresentação aguda da DW tem um padrão característico com os seguintes achados:

·              Anemia hemolítica intravascular aguda coombs negativa

·              Coagulopatia não responsiva a vitamina K

·              Insuficiência renal aguda progressiva

·              Aumentos modestos de transaminases de soro (tipicamente, até2.000UI/L)

·              Fosfatase alcalina sérica normal ou marcadamente subnormal(normalmente, <40UI/L)

·              Mulheres predominam com uma relação 2:1

 

Um alto nível de suspeição clínica é essencial para o diagnóstico;índices simples de achados laboratoriais não conseguem distinguir de formaconfiável pacientes com insuficiência hepática aguda devido à DW de outrassituações como hepatites virais agudas. As elevações relativamente modestas de aminotransferasevistas na maioria desses indivíduos, em comparação com insuficiência hepáticaaguda de outras etiologias, podem levar à suspeita.

A ceruloplasmina é geralmente reduzida, mas o valor preditivo desseteste em casos de insuficiência hepática aguda é pobre . A concentração séricade cobre soro e a excreção urinária de cobre são muito elevadas. O cobre séricoé, geralmente, maior que 200mcg/dL. Os anéis de Kayser-Fleischer podem seridentificados para apoiar o diagnóstico da DW, mas podem estar ausentes em 50%desses pacientes.

O diagnóstico precoce é extremamente importante, porque essespacientes necessitam de transplante hepático para sobreviver a longo prazo. Emalguns pacientes com insuficiência hepática aguda devido à DW, a aspartatoaminotransferase (AST) poderá ser mais elevada do que a alaninaaminotransferase (ALT), refletindo dano mitocondrial, mas esse achado não ésuficiente para sugerir o diagnóstico. O achado mais sugestivo nesse cenário éo baixo nível de atividade da fosfatase alcalina sérica e uma relação defosfatase alcalina /bilirrubina total (em miligramas por decilitro) <2,14.

É recomendado que sejam investigados para DW:

·              Pacientes na faixa etária pediátrica que apresentam um quadroclínico sugestivo de hepatite autoimune.

·              Pacientes adultos com hepatite autoimune que respondem mal aotratamento com corticosteroides.

·              Pacientes com esteatose hepática não alcoólica, no diagnósticodiferencial.

·              Pacientes com insuficiência hepática aguda com hemóliseintravascular Coombs negativo, elevações modestas das transaminases séricas, oufosfatase alcalina sérica baixa e proporção de fosfatase alcalina/bilirrubinadireta <2.

O diagnóstico é sugerido ou confirmado nas seguintes situações:

·              Pacientes com ceruloplasmina <20mcg/dL e baixa concentraçãosérica de cobre. Em caso de anéis de Kaiser-Fleischer presentes: diagnósticoconfirmado se excreção urinária de cobre >40mcg/24h; se excreção urinária decobre <40mcg/24h, considerar biópsia com quantificação de cobre ou testegenético. Em caso de anéis de Kaiser-Fleischer ausentes: diagnóstico confirmadose excreção urinária de cobre >40mcg/24h; se excreção urinária de cobre<100mcg/24h, considerar biópsia com quantificação de cobre ou testegenético.

·              Ceruloplasmina normal ou elevada com concentrações séricas decobre normais. Em caso de anéis de Kaiser-Fleischer presentes: caso existasuspeita, realizar biópsia com quantificação de cobre hepático ou testegenético. Em caso de anéis de Kaiser-Fleischer ausentes: diagnóstico excluídose excreção urinária de cobre <40mcg/24h; se excreção urinária de cobre>40mcg/24h, realizar biópsia com quantificação de cobre hepático ou testegenético.

 

Outra abordagem para o diagnóstico é a utilização de um escorediagnóstico específico, que pontua da seguinte forma:

·              Anel de Kayser-Fleischer: 2 pontos

·              Sintomas neuropsiquiátricos: 2 pontos

·              Anemia hemolítica com Coombs negativo: 1 ponto

·              Excreção de cobre 1 a 2 vezes o limite superior da normalidade: 1ponto

·              Excreção de cobre >2 vezes o limite superior da normalidade: 2pontos

·              Excreção de cobre normal, mas >5 vezes o limite superior danormalidade após 2 doses de 0,5g de D-penicilamina: 2 pontos

·              Cobre hepático normal: 1- ponto

·              Aumento de 1 a 5 vezes o limite superior da normalidade do cobrehepático: 1 ponto

·              Aumento >5 vezes o limite superior da normalidade do cobrehepático: 2 pontos

·              Hepatócitos positivos para rodanina: 1 ponto

·              Ceruloplasmina: 0 pontos

·              Ceruloplasmina de 10 a 20mg/dL: 1 ponto

·              Ceruloplasmina <10mg: 2 pontos

·              Mutação nos 2 cromossomos: 4 pontos

·              Mutação em 1 cromossomo: 1 ponto

 

Um escore maior ou igual a 4 torna a doença altamante provável;entre 2 e 3, a doença ainda é provável.

 

Triagem Familiar

 

Parentes de primeiro grau de qualquer paciente recém-diagnosticadocom DW deve ser testado para a presença da doença. A avaliação deve incluir:breve histórico relativo a icterícia, doença hepática, e achados neurológicos;exame físico neurológico e geral; cobre sérico, ceruloplasmina, testes defunção hepática, incluindo aminotransferases, albumina e bilirrubina conjugadae não conjugada; pesquisa de anéis de Kayser-Fleischer; e excreção de 24 horasde cobre urinário.

Indivíduos sem anéis de Kayser-Fleischer que têm ceruloplasminadiminuída e alteração da função hepática devem ser submetidos à biópsiahepática para confirmar o diagnóstico. Se estiver disponível, o teste molecularpara mutações ATP7B ou estudos de haplótipos deve ser obtido e pode serutilizado como triagem primária. O tratamento deve ser iniciado para todos osindivíduos com mais de 3 anos de idade identificados como pacientes de triagemfamiliar.

 

Tratamento

 

A penicilamina foi uma das primeiras medicações estudadas paratratamento de DW; anteriormente, não existia nenhum tratamento específico. Curiosamente,quando esses tratamentos tornaram-se disponíveis, foram reservados parapacientes sintomáticos porque não havia bons testes de diagnóstico para identificara doença pré-sintomática. Com a melhora do diagnóstico e o tratamento precoce,houve melhora prognóstica.

O desenvolvimento de agentes alternativos à penicilamina foiestimulado pela intolerância de alguns pacientes ao fármaco, que chega a 30%dos pacientes. O Trientine foi desenvolvido e introduzido especificamente parapacientes que desenvolveram reações adversas à penicilamina. Os agentes comzinco foram, por sua vez, testados separadamente. Hoje, a base do tratamentopara a DW continua sendo a terapia farmacológica ao longo da vida, com otransplante hepático reservado para casos graves ou resistentes.

O tratamento inicial recomendado de pacientes sintomáticos ou comdoença ativa é com agentes quelantes, embora existam alguns relatos que mostremque o tratamento primário com zinco pode ser adequado para alguns pacientes. Amaior experiência de tratamento em todo o mundo ainda é com a D-penicilamina; noentanto, há, agora, uma experiência maior com a trientina para a terapiaprimária.

Os dados existentes mostram a eficácia da trientina no tratamentode pacientes com doença neurológica descompensada ou doença hepática. A terapiacombinada, em que o zinco é utilizado em conjunção com um agente quelante, temuma base teórica no bloqueio da captação de cobre e para eliminar o excesso decobre. Existem alguns relatos do uso simultâneo de quelantes e zinco comoterapia primária, mas estudos são necessários para determinar se a eficácia émaior do que com quelante sozinho.

Uma vez que os sintomas da doença ou anormalidades bioquímicasestabilizaram, tipicamente em 2 a 6 meses após o início da terapia, doses demanutenção de quelantes de zinco podem ser utilizadas para o tratamento. Pacientesque se apresentam com outros sintomas podem ser tratados com manutenção.

Quando escolhida como terapia quelante inicial a D-penicilamina, oideal é iniciar com doses baixas de 250 a 500mg/dia, com incrementos de 250mg acada 4 a 7 dias até um máximo de 1.000 a 1.500mg/dia em 2 a 4 doses diarias. Adose de manutenção é, geralmente, 750-1.000mg/dia, administrada em 2 dosesdivididas. A posologia em crianças é de 20 mg/kg/dia, em 2 ou 3 doses diárias. Aadequação do tratamento é monitorada medindo-se a excreção urinária de cobre duranteo tratamento.

A trientina é uma indicação principalmente em pacientes que sãointolerantes à penicillamina ou têm características clínicas que indicamintolerância potencial, como história de doença renal, esplenomegaliacongestiva causando trombocitopenia grave ou tendência autoimune. A pioraneurológica após o início do tratamento com trientina foi relatada, mas parecemuito menos comum do que com penicilamina.

A trientina também demonstrou ser uma terapia inicial eficaz paradoentes, mesmo com doença hepática descompensada. As doses típicas são de 750 a1.500mg/dia, em 2 ou 3 doses diárias, com 750 ou 1.000mg, sendo a terapia demanutenção. Em crianças, a dose baseada no peso não é estabelecida, mas a dosegeralmente utilizada é de 20mg/kg/dia. A trientina deve ser administrada 1 horaantes ou 2 horas após as refeições, e o tratamento é monitorizado, com aexcreção urinária de 24 horas do cobre.

O zinco, por sua vez, interfere com a absorção do cobre no tratogastrintestinal , induzindo a ligação da metalotioneína com o cobre. Uma vezligado, o cobre não é absorvido, sendo excretado via fecal; dessa forma, ocorreum balanço negativo de cobre e redução dos níveis hepatocelulares dele. A doseusual é de 150mg/dia é administrada em 3 doses diárias. Para as criançasmenores, com menos de 50kg de peso corporal, a dose é de 75mg/dia em 3 dosesdivididas, e a dose não está bem definida para crianças com menos de 5 anos deidade.

Tomar zinco com alimentos interfere com a sua absorção. Aadequação do tratamento com zinco é julgada pela melhora clínica e bioquímica,e medindo a excreção urinária de cobre, o qual deve ser inferior a 75mcg/24h notratamento estável. O uso de antioxidantes, em particular a vitamina E, podeter um papel como tratamento adjuvante.

Alimentos com concentrações muito elevadas de cobre (marisco,frutos secos, chocolate, cogumelos e vísceras), em geral, devem ser evitadospelo menos durante o primeiro ano de tratamento. Dietas deficientes em cobrepodem atrasar o aparecimento da doença e controlar a progressão da doença. Ouso de purificadores de água para diminuir o teor de cobre dela também érecomendável.

O tratamento de pacientes assintomáticos ou daqueles em terapia demanutenção pode ser realizado com um agente quelante ou com zinco. Os pacientesque se apresentam com doença hepática crônica descompensada, tipicamente com hipoalbuminemia,coagulopatia proeminente, ascite, mas sem encefalopatia, recentemente têm sidotratados com quelante, além de zinco.

Os dois tipos de tratamento devem ser temporalmente dispersos aolongo do dia, em 4 doses, com, geralmente, 5 a 6 horas entre a administração decada medicação, a fim de evitar que se liguem a quelante de zinco e, assim,potencialmente cancelar a eficácia de qualquer modalidade. Um regime típico éde zinco (50mg elementar ou 25mg do elemento em crianças) administrado por viaoral, como a primeira e terceira doses, e trientine (500mg ou 10mg/kg emcrianças) administrado por via oral, como a segunda e quarta doses. Este éfundamentalmente um regime de indução intensiva.

Alguns pacientes podem falhar esse regime e necessitar detransplante; portanto, eles devem ser encaminhados para um centro detransplante prontamente. Já pacientes com insuficiência hepática aguda devido àDW necessitam de transplante hepático. Em mulheres grávidas, o tratamento deveser mantido durante toda a gestação. A ocorrência de defeitos de nascimento temsido observada com pouca frequência em filhos de pacientes tratados; noentanto, a raridade dessa doença tornou difícil determinar se ela é diferenteda frequência desses defeitos na população em geral.

A dosagem de sais de zinco é mantida sem alteração. No entanto, asdosagens dos agentes quelantes devem ser reduzidas para o mínimo necessáriodurante a gravidez, em especial para o último trimestre, para promover umamelhor cicatrização da ferida se a cesariana é realizada. Tal redução da dosepode ser na ordem de 25 a 50% da dose pré-gravidez. As pacientes devem sermonitoradas frequentemente durante a gravidez.

Mulheres que tomam D-penicilamina não devem amamentar porque a medicaçãoé excretada no leite materno e pode prejudicar o bebê. Pouco se sabe sobre asegurança de trietina e zinco no leite materno. O transplante hepático é a únicaopção eficaz para aqueles com DW que se apresentam com insuficiência hepáticaaguda, e é indicado para todos os pacientes com D com doença hepáticadescompensada que não respondem à terapia médica. A sobrevida pós 1 ano detransplante é de 80 a 85%. O transplante hepático não é recomendado como umtratamento primário para DW neurológica ou psiquiátrica sem doença hepáticadevido ao prognóstico ruim e à má aderência.

 

Referências

 

1-Socha P et al. Wilson?s Disease in children: A Position Paper by the HepatologyCommittee of the European Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatologyand Nutrition. JPGN vo 66: Feb 2018.

2-Roberts EA et al. American Associationof Studies of Liver Disease: Diagnosis and treatment off Wilson Disease anupdate. Hepatology 2008; 47: 2089

3-European Association for Study of LiverEASL. Clinical Practice Guidelines: Wilson?s Disease. J Hepatol 2012; 56: 671.

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