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Infecções bacterianas do sistema nervoso central - Jan V Hirschmann MD

Última revisão: 01/10/2014

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Jan V. Hirschmann, MD

Professor of Medicine, University of Washington School of Medicine, and Assistant Chief, Medical Service, Puget Sound Veterans Affairs Medical Center

 

 

Artigo original: Hirschmann JV. Bacterial infections of the central nervous system. ACP Medicine. 2006;1-13.

[The original English language work has been published by DECKER INTELLECTUAL PROPERTIES INC. Hamilton, Ontario, Canada. Copyright © 2011 Decker Intellectual Properties Inc. All Rights Reserved.]

Tradução: Soraya Imon de Oliveira.

Revisão técnica: Dr. Lucas Santos Zambon

 

Várias barreiras protegem o sistema nervoso central (SNC) contra as infecções bacterianas. Uma força considerável se faz necessária para romper o crânio e permitir a entrada de organismos no encéfalo ou a penetração de suas membranas. As zônulas de adesão (tight junctions) existentes entre as células da vasculatura cerebral formam a barreira hemato-encefálica, que limita o acesso de patógenos transmissíveis pelo sangue. As vértebras e o envoltório de dura-máter da medula espinal possuem defesas fortes contra as incursões de micróbios oriundos de áreas próximas.

Mesmo assim, bactérias ocasionalmente sobrepujam ou contornam estas barreiras e produzem infecções no SNC. Isto geralmente ocorre por 1 dentre 3 vias: (1) penetração resultante de traumatismo ou cirurgia; (2) migração a partir de um sítio adjacente de infecção ou colonização; ou (3) disseminação hematogênica a partir de outra localização, frequentemente distante. As principais infecções bacterianas então resultantes são: meningite, abscesso cerebral, abscesso epidural, empiema subdural e tromboflebite séptica de veias cerebrais.

 

Meningite bacteriana aguda

 

Epidemiologia e etiologia

 

Como a vacinação diminuiu de modo significativo a incidência de infecções por Haemophilus influenzae de tipo B durante a infância, a meningite bacteriana aguda, que no passado era mais comum em crianças, passou a ser uma doença predominantemente de adultos.1 A meningite bacteriana pode ocorrer em indivíduos aparentemente sadios, mas em geral afeta aqueles com distúrbios subjacentes significativos, como hipogamaglobulinemia, anemia falciforme, alcoolismo, cirrose e infecções concomitantes da orelha, seios paranasais, pulmões ou valvas cardíacas.2 Os pacientes infectados pelo HIV apresentam risco substancialmente aumentado de meningite bacteriana, em geral quando suas contagens de células T CD4+ estão abaixo de 200/mm3. O organismo mais comumente envolvido é Streptococcus pneumoniae, e a bacteremia quase sempre está presente.3 Pacientes submetidos à esplenectomia ou com função esplênica precária podem desenvolver uma sepse esmagadora, que muitas vezes inclui meningite, causada por bactérias encapsuladas, principalmente S. pneumoniae. As deficiências de alguns componentes do complemento aumentam a suscetibilidade a infecções por Neisseria meningitidis, enquanto o traumatismo craniano com rompimento da dura-máter pode acarretar meningite, geralmente por S. pneumoniae. A meningite que ocorre como complicação de neutropenia ou cirurgia de crânio é mais comumente causada por bacilos gram-negativos [Tabela 1]. Uma infecção no trato respiratório superior pode predispor à meningite, por permitir que as bactérias colonizadoras do trato respiratório (em especial N. meningitides) entrem na circulação sanguínea e invadam as meninges.

____________________________________________________________________

Tabela 1. Causas de meningite bacteriana em adultos1,2

Organismo

Frequência aproximada (%)

Streptococcus pneumoniae

40 a 60

Neisseria meningitidis

15 a 25

Listeria monocytogenes

10 a 15

Haemophilus influenzae

5 a 10

Outros

5 a 20

Cultura negativa

10 a 15

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S. pneumoniae causa cerca de 40 a 60% dos casos de meningite bacteriana, nos Estados Unidos. Estes casos ocorrem com frequência de forma secundária à pneumonia pneumocócica bacterêmica. Outros organismos importantes nos casos adquiridos na comunidade são N. meningitidis, sobretudo em adultos jovens; Listeria monocytogenes, especialmente em hospedeiros imunocomprometidos ou idosos; H. influenzae; e os estreptococos do grupo B (S. agalactiae). Na maioria das vezes, os organismos chegam às meninges por meio da bacteremia oriunda de um sítio mucoso ou de uma infecção distante. Ocasionalmente, as bactérias entram no espaço subaracnóideo vindas de focos infecciosos adjacentes ou via inoculação direta por traumatismo, cirurgia ou procedimentos médicos invasivos, como uma punção lombar.

 

Diagnóstico

 

Manifestações clínicas

 

A duração dos sintomas antes de o paciente buscar atendimento médico varia de menos de 24 horas a mais de 1 semana. Pode haver um pródromo semelhante a uma infecção viral do trato respiratório superior, que se caracteriza por dor de garganta, rinorreia e congestão nasal, por vezes acompanhados de mialgias. Os aspectos mais comuns da meningite bacteriana são cefaleia, febre, rigidez nucal e achados neurológicos. Menos da metade dos pacientes apresentam a clássica tríade de febre, rigidez nucal e alteração do estado mental. Entretanto, quase todos os pacientes apresentam pelo menos 2 dentre as manifestações de cefaleia, febre, rigidez nucal e estado mental alterado.4 A febre está presente em cerca de 95% dos pacientes e tipicamente dura 4 a 8 dias após o início de uma terapia apropriada.2,5,6 A rigidez cervical é evidente em cerca de 90% dos pacientes. Dois achados físicos que, assim como a rigidez nucal, surgem da irritação meníngea e resposta neuromuscular a esta são o sinal de Kernig (quando o quadril é flexionado a 90°, a tentativa de extensão do joelho encontra resistência a 135°) e o sinal de Brudzinski (a flexão passiva do pescoço produz flexão de joelho e quadril).7 As alterações mentais variam da letargia à confusão, estupor e coma, que ocorrem em cerca de 80% dos pacientes e com uma frequência maior em idosos. As convulsões, focais ou generalizadas, ocorrem em 10 a 30% dos pacientes, geralmente em 24 horas da admissão. Muitas destas convulsões são decorrentes da abstinência do álcool. Outros achados neurológicos, além das convulsões, desenvolvem-se em cerca de 30% dos pacientes e incluem paralisias do nervo craniano, afasia e hemiparesias, como consequência de vasculite induzida por infecção ou pressão exercida por exsudação purulenta em estruturas neurológicas. O papiledema ocorre apenas ocasionalmente, e sua ausência não exclui um possível aumento significativo da pressão intracraniana.

 

Achados laboratoriais

 

A maioria dos pacientes com meningite bacteriana aguda tem leucocitose, enquanto alguns apresentam hiponatremia, possivelmente em decorrência da secreção inadequada de hormônio antidiurético. As hemoculturas, que resultam positivas em cerca de 50 a 60% dos casos, são sempre indicadas. O procedimento diagnóstico mais importante é a punção lombar para obtenção de líquido cerebrospinal (LCS), com o intuito de determinar as contagens de leucócitos e diferencial, quantificar os níveis de proteína e glicose, além de realizar culturas e coloração de Gram.

Os clínicos comumente obtêm um exame de tomografia computadorizada (TC) antes de realizar a punção lombar, baseando-se em 2 crenças: a de que a herniação encefálica constitui um risco frequente na meningite; e a de que as varreduras de TC podem prever com acurácia o desenvolvimento desta condição. Todavia, ambas as crenças são equivocadas. A herniação ocorre em cerca de 1% dos pacientes com meningite bacteriana,2 às vezes na ausência de uma punção lombar precedente.8 As varreduras de TC frequentemente resultam normais em indivíduos que somente depois desenvolvem herniação encefálica. Além disso, a maioria dos pacientes que desenvolvem esta complicação apresentam achados neurológicos focais antes da realização da punção lombar, que sugerem que a herniação já começou: pupilas fixas e dilatadas; respiração de Cheyne-Stokes; postura descerebrada; hemiplegia; e coma.8 Além dos déficits neurológicos focais e níveis anormais de consciência, os achados que justificam a realização de um exame de TC antes da punção lombar incluem: imunocomprometimento; história de doença do SNC (p. ex., lesão em massa, acidente vascular encefálico ou infecção focal); papiledema (embora a presença de pulsações venosas seja sugestiva de que o paciente não apresenta pressão intracraniana aumentada); e ocorrência de convulsões em 1 semana antes da manifestação (alguns especialistas não realizam punção lombar em pacientes com convulsões prolongadas e chegam a retardar por 30 minutos a realização da punção lombar em pacientes que apresentam convulsões de curta duração).9 Na ausência destes achados em pacientes com suspeita de meningite bacteriana, os clínicos não devem retardar a punção lombar para realizar um exame de TC [Figura 1].

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Figura 1. Tratamento de pacientes adultos com suspeita de meningite bacteriana.9

LCS = líquido cerebrospinal; PL = punção lombar; SNC = sistema nervoso central; TC = tomografia computadorizada..

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Em cerca de 90% dos pacientes, a pressão de abertura é superior a 180 mmH2O; em 20% dos pacientes, esta pressão é superior a 400 mmH2O; e em cerca de 5% dos casos, está acima de 500 mmH2O. Os níveis de proteína no LCS excedem 40 mg/dL em cerca de 85% dos pacientes, enquanto os níveis de glicose estão abaixo de 40 mg/dL em aproximadamente 60% dos casos.2 Quando há desenvolvimento de meningite bacteriana em pacientes com diabetes e hiperglicemia, os níveis de glicose no LCS podem permanecer normais, contudo o valor da proporção de glicose entre LCS:sangue costuma ser inferior a 0,31 nestes indivíduos.10 A contagem de leucócitos no LCS é maior que 100/mm3 em cerca de 90% dos pacientes e excede 1.000/mm3 em 15 a 20% dos casos. Os neutrófilos quase sempre predominam, representando pelo menos 80% das células em 80 a 90% dos pacientes. Ocasionalmente, os linfócitos constituem a maioria, em especial diante de contagens de leucócitos muito baixas. Os linfócitos predominam em cerca de 25% dos pacientes com meningite causada por L. monocytogenes.11 Várias condições podem causar neutrofilia com níveis baixos de glicose no LCS e podem mimetizar uma meningite bacteriana aguda [Tabela 2].

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Tabela 2. Causas de neutrofilia com níveis baixos de glicose no LCS

 

Causa infecciosa

Causa não infecciosa

Comum

Meningite bacteriana

Incomum

Meningite viral* (apenas na fase bem inicial)

Certas infecções parameníngeas

    Empiema subdural* (habitualmente, produz um perfil de glicose linfocítico-normal)

   Abscesso cerebral precoce, no estágio de cerebrite bacteriana*

    Abscesso cerebral com vazamento ou ruptura para dentro do ventrículo

Infarto cerebral embólico* (endocardite bacteriana)

Meningoencefalite amébica

Meningite tuberculosa (apenas na fase bem inicial da doença e em um pequeno percentual de casos)

Leucoencefalite hemorrágica aguda

Meningite química

    Exógena (p. ex., meio de contraste, detergentes usados na limpeza de agulhas)

    Endógena (liberação no LCS de material oriundo de tumores: dermoides, craniofaringiomas)

Doenças incomuns*

    Fase inicial da meningite de Mollaret

    Síndrome de Behçet

Meningite da hipersensibilidade

    Fármaco-induzida* (sulfonamidas, tolmetina, ibuprofeno, isoniazida)

*Níveis de glicose habitualmente normais no LCS.

LCS = líquido cerebrospinal.

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A coloração de Gram resulta positiva em cerca de 60 a 90% dos pacientes, indicando a presença de uma concentração de bactérias superior a 105 organismos/mL. É possível que haja erros de interpretação, sobretudo quando pneumococos são confundidos com Listeria. Na meningite por Listeria, a coloração de Gram resulta positiva em apenas 30% dos casos.12

A cultura de LCS resulta positiva em cerca de 80% dos casos. Uma terapia antibiótica oral prévia exerce pouco efeito sobre a contagem de leucócitos sanguíneos, contagem celular diferencial, níveis de proteína ou níveis de glicose, embora diminua em cerca de 20% o número de resultados positivos de coloração de Gram, e em cerca de 30% o número de culturas positivas.13 A terapia parenteral provavelmente produz um efeito bem maior, sobretudo quando administrada com mais do que algumas horas de antecedência em relação à obtenção da punção lombar. Em pacientes com resultados negativos de coloração Gram e de culturas, os testes de aglutinação do látex com LCS são altamente específicos para H. influenzae de tipo B, meningococos e pneumococos, porém apresentam sensibilidade que varia de 50 a 80%.

 

Exames de imagem

 

As técnicas de imagem são desnecessárias na maioria dos casos de meningite bacteriana, a menos que haja suspeita de complicações. Os exames de TC ou imagem de ressonância nuclear magnética (RNM) podem mostrar um espaço subaracnóideo distendido. Entretanto, este achado frequentemente é difícil de interpretar em adultos, nos quais é comum encontrar certo grau de atrofia encefálica – sobretudo nos idosos. Decorridos vários dias da infecção, pode haver intensificação meníngea após a injeção de contraste, em consequência de inflamação de meninges e congestão vascular. As áreas de intensificação junto ao córtex cerebral comumente indicam áreas de infarto cerebral resultantes da obstrução de vasos inflamados. Pode haver edema cerebral, por causa da autorregulação cerebrovascular perturbada, tromboflebite sinusal dural, vazamento de líquido de vasos danificados ou edema citotóxico a partir de lesão celular cerebral. Ocasionalmente, há desenvolvimento de hidrocefalia comunicante ou não comunicante, porque a inflamação obstrui o fluxo normal de LCS, seja nas granulações da aracnoide (onde ocorre a absorção) ou nos sítios por onde o LCS sai dos ventrículos.

 

Tratamento

 

Antibióticos intravenosos (IV)

 

A manobra terapêutica mais importante é o rápido início de um curso de antibióticos intravenosos (IV) após a punção lombar, pois o atraso em iniciar o tratamento aumenta a mortalidade [Tabelas 3 e 4].14 Na rara situação em que a punção lombar é justificadamente adiada – quando, por exemplo, há sinais de herniação encefálica (ver anteriormente) – devem ser obtidas hemoculturas e iniciado um curso de antibióticos, mesmo que isto possa diminuir o rendimento de procedimentos subsequentes de cultura e coloração de Gram com LCS. O agente antimicrobiano escolhido deve ter ação bactericida contra os patógenos suspeitos, bem como atingir níveis satisfatórios no LCS. Em um estudo dinamarquês, ceftriaxona + penicilina foi considerada uma escolha apropriada para tratamento empírico em 97% dos casos de pacientes adultos com meningite bacteriana, na população estudada.15

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Tabela 3. Terapia antibiótica empírica para meningite purulenta em adultos9

Fator do paciente

Patógenos bacterianos comuns

Antibiótico

Idade de 2 a 50 anos

Neisseria meningitidis, Streptococcus pneumoniae

Vancomicina + cefalosporina de 3ª geração*; considerar a adição de rifampicina, se a dexametasona for administrada

Idade > 50 anos

S. pneumoniae, N. meningitidis, Listeria monocytogenes, bacilos gram-negativos aeróbios

Vancomicina + ampicilina+ cefalosporina de 3ª geração;* considerar a adição de rifampicina, se a dexametasona for administrada

Fratura craniana basilar

S. pneumoniae, Haemophilus influenzae, estreptococos beta-hemolíticos do grupo A

Vancomicina + cefalosporina de 3ª geração*

Traumatismo craniano perfurante

Staphylococcus aureus, estafilococos coagulase-negativos, em especial S. epidermidis; bacilos gram-negativos aeróbios, incluindo Pseudomonas aeruginosa

Vancomicina + cefepime, vancomicina + ceftazidima, ou vancomicina + meropenem

Pós-neurocirurgia

Bacilos gram-negativos aeróbios, incluindo P. aeruginosa; S. aureus;
estafilococos coagulase-negativos, em especial S. epidermidis

Vancomicina + cefepime, vancomicina + ceftazidima, ou vancomicina + meropenem

Derivação de LCS

Estafilococos coagulase-negativos, em especial S. epidermidis;

S. aureus; bacilos gram-negativos aeróbios, incluindo P. aeruginosa; Propionibacterium acnes

Vancomicina + cefepime, vancomicina + ceftazidima, ou vancomicina + meropenem

*Ceftriaxona ou cefotaxima.

LCS = líquido cerebrospinal.

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Tabela 4. Terapia antibiótica para meningite bacteriana em adultos9

Organismo

Antibiótico

Dosagem

Antibiótico alternativo

Streptococcus pneumoniae

Penicilina CIM < 0,1 mcg/mL

Penicilina CIM 0,1 a 1 mcg/mL

Penicilina CIM > 1 mcg/mL

Cefotaxima ou ceftriaxona CIM > 1 mcg/mL

 

 

Penicilina G

ou

Ampicilina

 

Ceftriaxona

 

 

 

Vancomicina

mais

cefalosporina de 3ª geração* Vancomicina

mais

cefalosporina de 3ª geração*

 

 

4 milhões de U, IV, a cada 4 horas

2 g, IV, a cada 4 horas

 

2 g, IV, a cada 12 horas

 

 

 

30 a 45 mg/kg, IV, a cada 8 a 12 horas§

 

 

 

30 a 45 mg/kg, IV, a cada 8 a 12 horas§

 

 

Cefalosporina de 3ª geração* ou cloranfenicol,

1 g, IV, a cada 6 horas

 

Cefepime, 2 g IV a cada 8 horas, ou meropenem, 2 g, IV, a cada 8 horas

 

Fluoroquinolona†

 

 

 

 

Fluoroquinolona†

Neisseria meningitidis Penicilina CIM < 0,1 mcg/mL

Penicilina CIM 0,1 a 1 mcg/mL

 

Penicilina G

ou

Ampicilina

Cefalosporina de 3ª geração*

 

4 milhões de U, IV, a cada 4 horas

 

2 g, IV, a cada 4 horas

Cefalosporina de 3ª geração* ou cloranfenicol,

1 g, IV, a cada 6 horas

Cloranfenicol, 1 g, IV, a cada 6 horas, fluoroquinolona,† meropenem, 2 g, IV, a cada 8 horas

Listeria monocytogenes

Ampicilina?? ou

Penicilina G??

2 g, IV, a cada 4 horas

4 milhões U, IV, a cada 4 horas

TMP-SMX: 10 a 20 mg/kg TMP, 50 a 100 mg/kg SMX, por dia. Em 2 a 4 doses divididas; ou meropenem, 2 g, IV, a cada 8 horas

Haemophilus influenzae

Betalactamase negativo

 

Betalactamase positivo

Ampicilina

Cefalosporina de 3ª geração*

2 g, IV, a cada 4 horas

Cefalosporina de 3ª geração;* cefepime, 2 g IV a cada 8 horas; cloranfenicol, 1 g, IV, a cada 6 horas; ou fluoroquinolona†

Cefepime, 2 g, IV, a cada 8 horas; cloranfenicol, 1 g, IV, a cada 6 horas; ou fluoroquinolona†

Streptococcus do grupo B (S. agalactiae)

Ampicilina?? ou

Penicilina G??

2 g, IV, a cada 4 horas

4 milhões U, IV, a cada 4 horas

Cefalosporina de 3ª geração*

Escherichia coli, Klebsiella, Proteus, e outros bacilos entéricos gram-negativos

Cefalosporina de 3ª geração*

 

Aztreonam, 2 g, a cada 6 a 8 horas; fluoroquinolona;† meropenem,

2 g, IV, a cada 8 horas; TMP-SMX: 10 a 20 mg/kg TMP, 50 a 100 mg/kg SMX, por dia, em 2 a 4 doses divididas; ou ampicilina, 2 g, IV, a cada 4 horas

Pseudomonas aeruginosa

Cefepime??

ou

Ceftazidima??

2 g, IV, a cada 8 horas
2 g, IV, a cada 8
horas

Aztreonam, 2 g, a cada 6 a 8 horas??; ciprofloxacina, 400 mg a cada 8 a 12 horas??; ou meropenem, 2 g, IV, a cada 8 horas??

Staphylococcus aureus Sensível à meticilina

Resistente à meticilina

 

Nafcilina
ou

Oxacilina

Vancomicina

1,5 a 2 g, IV, a cada 4 horas

1,5 a 2 g, IV, a cada 4 horas

30 a 45 mg/kg, IV, a cada 8 a 12 horas§

Vancomicina, 30 a 45 mg/kg, IV, a cada 8 a 12 horas,§ ou meropenem,

2 g IV a cada 8 horas

TMP-SMX: 10 a 20 mg/kg TMP, 50 a 100 mg/kg SMX, por dia, em 2 a 4 doses divididas; ou linezolida, 600 mg, IV, a cada 12 horas

Staphylococcus epidermidis

Vancomicina

30 a 45 mg/kg IV a cada 8 a 12 horas§

Linezolida, 600 mg IV a cada 12 horas

Espécies de Enterococcus suscetíveis à ampicilina 

Ampicilina
mais

Gentamicina

2 g, IV, a cada 4 horas

 

2 mg/kg na 1ª dose IV, seguida de 1,7 mg/kg, IV, a cada 8 horas, com função renal normal (ou 4 a 8 mg/dia, por via intratecal)

Resistente à ampicilina

 

 

 

 

 

Ampicilina e vancomicina resistente

Vancomicina mais

Gentamicina

 

 

 

 

Linezolida

30 a 45 mg/kg IV a cada 8 a 12 horas§

2 mg/kg na 1ª dose, IV, seguida de 1,7 mg/kg, IV, a cada 8 horas, com função renal normal (ou 4 a 8 mg/dia, por via intratecal)

600 mg, IV, a cada 12 horas

*Ceftriaxona, 2 g, IV, a cada 12 horas, ou cefotaxima, 2 g a cada 4 a 6 horas.

Gatifloxacina, 400 mg/dia, IV, ou moxifloxacina, 400 mg/dia, IV.

‡Considerar a adição de rifampicina, 600 mg/dia, se a CIM do ceftriaxona > 2 mcg/mL.

§O intervalo da dosagem deve ser ajustado para manter níveis séricos mínimos de 15 a 20 mcg/mL.

??Considerar a adição de aminoglicosídeo.

Considerar a adição de rifampicina, 600 mg/dia.

CIM = concentração inibitória mínima; IV = via intravenosa; SMX = sulfametoxazol; TMP = trimetoprima.

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Os achados fornecidos com a coloração de Gram do LCS podem ajudar a orientar a escolha do antibiótico. Entretanto, quando a coloração resulta negativa, a ceftriaxona (2 g/12 horas, IV ou 4 g/24 horas, IV) é uma escolha eficiente para pacientes adultos.15 A ceftriaxona proporciona cobertura contra meningococos, H. influenzae, estreptococos do grupo B e S. pneumoniae, incluindo muitas cepas resistentes à penicilina. Em um estudo dinamarquês, o uso combinado de ceftriaxona + penicilina foi uma escolha apropriada para fins de tratamento empírico em 97% dos casos de pacientes adultos com meningite bacteriana na população estudada.16

Diante da suspeita de altos níveis de resistência à penicilina, é prudente usar vancomicina (2 g/12 horas) até que se disponha dos resultados da cultura e do teste de suscetibilidade. Se a coloração do LCS pelo método de Gram resultar negativa ou diante de uma distinção incerta entre pneumococos e Listeria, o paciente também deve receber ampicilina a uma dosagem de 2 g/4 horas, para tratar uma possível infecção por L. monocytogenes.

Embora estudos controlados não tenham delineado a duração ideal da terapia antibiótica, a duração habitual é de 7 dias para os casos envolvendo H. influenzae e de 10 a 14 dias para as infecções produzidas pela maioria dos demais organismos. Para a doença meningocócica, o tratamento por 4 a 5 dias tem eficácia comprovada, e um estudo demonstrou que o tratamento por 3 dias com benzilpenicilina era efetivo.17

Repetir a punção lombar durante ou após a terapia em geral é desnecessário, a menos que o tratamento pareça estar falhando.

 

Corticosteroides sistêmicos

 

Em adultos com meningite pneumocócica aguda, está comprovado que o tratamento auxiliar com dexametasona diminui o risco de resultado desfavorável e a mortalidade, sem aumentar a probabilidade de sangramento gastrintestinal.18,19 Em consequência, as diretrizes estabelecidas pela Infectious Diseases Society of America recomendam que os adultos com suspeita de meningite ou meningite pneumocócica comprovada recebam terapia auxiliar à base de dexametasona.9 A dosagem é de 0,15 mg/kg/6 horas, durante 2 a 4 dias, com a 1ª dose administrada com uma antecedência de 10 a 20 minutos ou no máximo ao mesmo tempo que a 1ª dose de antibióticos. A dexametasona deve ser mantida somente se a coloração de Gram do LCS mostrar a presença de diplococos gram-positivos ou quando as hemoculturas ou culturas de LCS resultarem positivas para S. pneumoniae. É improvável que o tratamento com dexametasona melhore o resultado final alcançado por pacientes adultos previamente submetidos à terapia antimicrobiana e, por este motivo, não deve ser usada nesta circunstância.

 

Complicações

 

Os pacientes com meningite podem apresentar muitas complicações, tais como infecções nosocomiais secundárias, tromboembolia venosa sistêmica e efeitos adversos das medicações administradas. As complicações sistêmicas mais comuns decorrem da infecção inicial, todavia, e incluem choque séptico, coagulação intravascular disseminada e síndrome do sofrimento respiratório agudo.20 As complicações neurológicas mais frequentes, além das convulsões e da alteração do estado mental, são o edema cerebral, a hidrocefalia e complicações cerebrovasculares.21

Na meningite bacteriana, as artérias carótida interna, basilar e vertebral, bem como seus ramos, repousam em um exsudato subaracnóideo purulento que pode provocar inflamação e constrição vascular. As artérias menores podem apresentar irregularidades de parede vascular, obstrução, estreitamento ou ampliação. Pode haver trombose do seio sagital superior ou das veias corticais. Estas anormalidades podem produzir áreas discretas de dano cerebral – que são evidenciadas por achados neurológicos focais – ou aumento da pressão intracraniana causado por vazamentos a partir dos vasos cerebrais (edema vasogênico), inchaço de neurônios danificados (edema citotóxico) ou aumento do volume sanguíneo, que ocorre quando a trombose venosa sinusal impede a drenagem de sangue do encéfalo.

 

Prognóstico

 

A mortalidade associada à meningite é de cerca de 10% nas infecções meningocócicas e, tipicamente, de 20 a 30% na meningite causada por outros organismos. Os fatores associados a prognósticos mais precários incluem a infecção por S. pneumoniae, a idade avançada (> 60 anos), o aparecimento das convulsões durante as primeiras 24 horas após a infecção, hipotensão e coma ou obtundação no momento da internação.4,22 A maioria dos sobreviventes recupera-se completamente. Cerca de 30% dos pacientes com meningite pneumocócica apresentam sequelas moderadas a graves, incluindo demência, convulsões, perda da audição e distúrbios da marcha; cerca de 20% apresentam problemas leves, como tontura, leve comprometimento da memória, cefaleias e fonofobia.23

 

Meningite bacteriana em circunstâncias especiais

 

Meningite bacteriana pós-traumática

 

Epidemiologia e etiologia

 

A meningite bacteriana desenvolve-se em cerca de 1% dos indivíduos que recebem atendimento médico em decorrência de lesões cranianas cegas, mais comumente causadas por acidentes de automóvel.24 Os indivíduos que apresentam maior risco são aqueles em que a força do impacto fratura a base do crânio, rompendo a dura-máter, a aracnoide subjacente e os tecidos moles das adjacências. Contudo, o traumatismo não precisa ser sério: coma ou amnésia retrógrada estão ausentes ou são breves em 30 a 40% dos casos.

A causa mais comum de meningite pós-traumática é S. pneumoniae, que é responsável por cerca de 65% dos casos. Nos demais casos, as causas são principalmente outros estreptococos, H. influenzae, meningococos e Staphylococcus aureus. Os bacilos entéricos gram-negativos são causas raras, exceto em pacientes previamente submetidos à terapia antimicrobiana.

 

Patogênese

 

A fenda dural aberta pelo traumatismo craniano cego produz uma fístula entre o espaço subaracnóideo e a cavidade nasal, seios paranasais ou orelhas. O sítio mais comum destas comunicações anormais é a placa cribriforme. Entretanto, as rupturas são múltiplas em cerca de 40% dos casos. Quando estas fendas são amplas, tornam-se evidentes como rinorreia no LCS. Vazamentos menores podem permanecer sem serem identificados, enquanto a drenagem pode ser tardia ou intermitente diante da obstrução tecidual da laceração dural. Quando o traumatismo enfraquece, sem, contudo, romper a dura-máter, a rinorreia de LCS pode começar abruptamente, após a ocorrência de elevações súbitas da pressão cerebrospinal causadas por tosse, espirro ou tensão. Quando uma fístula dural ocorre na fossa média do crânio, em decorrência de um osso temporal fraturado, pode haver saída de LCS através do canal auditivo (se houver ruptura da membrana timpânica) ou drenagem para dentro da faringe via trompa de Eustáquio sem que isto seja detectado. As evidências de fratura craniana basilar podem surgir logo após a lesão, tais como contusão periorbital, anosmia, hemotímpano, drenagem hemorrágica da orelha ou sinal de Battle (equimoses atrás da orelha).

 

Diagnóstico

 

Manifestações clínicas. As manifestações clínicas habituais de meningite bacteriana, incluindo febre, cefaleia e rigidez cervical, estão presentes na meningite pós-traumática. Entretanto, a mortalidade é comparativamente baixa (10%), talvez pelo fato de a fístula permitir a drenagem de LCS (aliviando a hipertensão craniana) ou porque muitos pacientes que sofrem traumatismo craniano são jovens e saudáveis. O intervalo decorrido entre a lesão craniana cega e a meningite em geral é inferior a 1 mês, contudo a infecção pode ocorrer após vários anos. Ao avaliar os pacientes com meningite inexplicável, portanto, os clínicos devem fazer perguntas sobre a ocorrência de traumatismos cranianos significativos, mesmo que este traumatismo tenha ocorrido em um passado remoto.

O reconhecimento de otorreia ou rinorreia de LCS permite estabelecer o diagnóstico de fístula dupla. A secreção frequentemente aumenta com a movimentação súbita, abaixamento da cabeça, execução da manobra de Valsalva ou compressão da veia jugular. Diferente das secreções nasais normais, o LCS não é viscoso, não endurece no lenço ao secar, pode ter gosto salgado e apresenta uma concentração de glicose superior a 30 mg/dL na ausência de infecção. A forma mais sensível e específica de identificar o LCS é pela detecção de uma beta-2-transferrina encontrada apenas neste líquido corporal.25

Exames de imagem. Várias técnicas ajudam a localizar o vazamento de LCS. As varreduras de TC podem mostrar a localização da fístula ao deslocarem fraturas sinusais, fragmentos ósseos deslocados ou ar intracraniano (pneumoencéfalo). A albumina marcada com radionuclídeo e vários corantes injetados no espaço subaracnóideo podem vazar para dentro dos meatos nasais médio e superior, tornando-se detectáveis nas compressas de algodão colocadas nestes locais. A cisternografia de ressonância nuclear magnética, um procedimento não invasivo e rápido, parece ser altamente acurada para a detecção das fístulas.25 Esta tecnologia baseia-se no fato de que o LCS emite um sinal intenso nas imagens T2-ponderadas: a demonstração de um sinal intenso contínuo ao longo da placa cribriforme ou dos seios paranasais, que é semelhante ao sinal emitido pelo LCS nas cisternas basais, indica a existência de uma fístula dural.

 

Tratamento

 

Como muitas fístulas durais se resolvem espontaneamente, o reparo em geral é desnecessário, a menos que os problemas persistam por 2 a 3 semanas após a lesão. Os pacientes com fraturas faciais ou meningite são exceções. Indivíduos com sítios de fratura acessíveis pelo nariz tipicamente são submetidos ao fechamento transnasal com cola de fibrina, fáscia lata ou retalhos locais. De outro modo, o reparo intracraniano é necessário. Pode haver desenvolvimento de recidivas, caso a fístula dural permaneça sem correção. A combinação de vancomicina a uma cefalosporina de 3ª geração (p. ex., ceftriaxona ou cefotaxima) é efetiva como opção de antibiótico para meningite após o traumatismo craniano fechado, quando a coloração do LCS pelo método de Gram resulta negativa. Um estudo randomizado envolvendo pacientes com pneumocéfalo traumático agudo subsequente a uma lesão craniana leve constatou que a ceftriaxona foi inefetiva para prevenção da meningite nestes pacientes.26

 

Meningite bacteriana recorrente não causada por traumatismo

 

Embora uma fístula dural criada por um traumatismo craniano cego seja a causa mais comum de meningite bacteriana recorrente, vazamentos aparentemente espontâneos de LCS às vezes ocorrem. A maioria destes vazamentos provavelmente surge de um enfraquecimento congênito ou adquirido da dura-máter. Os defeitos do crânio ou do assoalho da fossa média do crânio constituem outras fontes em potencial de meningite recorrente, assim como as complicações ósseas das infecções crônicas da orelha. As  más-formações congênitas podem levar aos tratos sinusais dérmicos, frequentemente associados a tumores dermoides intradurais, que conectam a pele ao LCS. Ocorrem com frequência na espinha lombodorsal, mas podem estar presentes em qualquer local, ao longo da linha média. As anormalidades localizadas no sítio de saída cutâneo podem incluir pequenos tufos de pelo, um nevo ou uma covinha a partir da qual pode emanar uma drenagem purulenta. Outras condições associadas à meningite bacteriana recorrente são a hipogamaglobulinemia, asplenia e deficiências de certos componentes do complemento, que predispõem especialmente à meningite meningocócica [Tabela 5].

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Tabela 5. Causas de meningite recorrente

Meningite bacteriana*

   Defeitos anatômicos predisponentes

  Congênitos: meningomielocele, seios dermais

  Traumáticos: fraturas de crânio pela placa cribriforme ou crista petrosa

  Pós-operatórios: craniotomia, hipofisectomia transesfenoidal

  Tumores: invasão direta através da dura-máter

  Síndrome da cela vazia

   Infecções parameníngeas*

  Mastoidite, sinusite, osteomielite do crânio

   Defeitos imunológicos*

  Deficiências de imunoglobulina: congênitas ou adquiridas (p. ex., mieloma)

  Estado asplênico: esplenectomia ou asplenia funcional (p. ex., anemia falciforme)

  Deficiências de complemento: deficiência de C6, C7 ou C8

Meningite química endógena

   Tumores†

  Craniofaringioma, cisto epidermoide

Meningites recorrentes não bacterianas incomuns

   Meningite de Mollaret†

   Síndrome de Behçet†

   Hipersensibilidade farmacológica†

  Sulfonamidas, ibuprofeno

   Lúpus eritematoso sistêmico†

   Uveoencefalites‡ (síndrome de Vogt-Koyanagi, síndrome de Harada)

 

*Pleiocitose de LCS neutrofílica.

†Pleiocitose de LCS linfocítica ou neutrofílica.

‡Pleiocitose de LCS linfocítica. 

LCS = líquido cerebrospinal.

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Infecções de derivação do líquido cerebrospinal (LCS)   

 

As derivaçõess de LCS, usados para aliviar a hidrocefalia, geralmente consistem em um cateter ventricular; valva reguladora de pressão e reservatório, comumente colocados do lado de fora do crânio; e tubulação distal de drenagem do LCS, de forma mais frequente, para dentro do peritônio e, às vezes, para dentro do átrio direito, pleura ou outros sítios.

 

Etiologia

 

Os mecanismos de infecção de derivações de LCS incluem a implantação dos micróbios durante a inserção da derivação, entrada através de um rompimento da pele sobrejacente, disseminação hematogênica a partir de um sítio distante e disseminação retrógrada dos organismos a partir da terminação distal (no peritônio ou em outra cavidade corporal).27 A origem mais comum é a contaminação do dispositivo pela flora cutânea no momento da cirurgia. A maioria das infecções torna-se evidente após algumas semanas da inserção da derivação. A entrada de micróbios na derivação, a partir da pele sobrejacente, é provavelmente a próxima causa mais frequente de infecção. As infecções retrógrada e hematogênica parecem ser raras, exceto no caso das derivações ventrículo-atriais, em que a terminação distal permanece junto à circulação sanguínea.

A bacteriologia das infecções de derivações de LCS reflete a provável fonte cutânea de infecção, na maioria dos casos. Os isolados mais comuns são os estafilococos, com as espécies coagulase-negativas sendo encontradas em cerca de 50 a 60% dos casos e S. aureus causando aproximadamente 20% das infecções. Os estreptococos, anaeróbios, difterioides e as infecções polimicrobianas, principalmente a partir destas e outras espécies cutâneas, constituem a maioria dos demais casos. Cerca de 10% dos isolados são bacilos gram-negativos, e em torno de 5% são os mesmos organismos causadores de meningite adquirida na comunidade em paciente sem derivações: pneumococos, meningococos e H. influenzae.

 

Diagnóstico

 

Manifestações clínicas. As manifestações das infecções de derivações de LCS diferem dos achados habituais de meningite bacteriana e dependem do sítio envolvido. A febre está sempre presente. Quando há ventriculite, a rigidez nucal raramente se desenvolve, pois tipicamente não ocorre comunicação com o LCS infectado desde o ventrículo até as meninges. As alterações mentais, incluindo cefaleia, náusea, letargia e confusão, são as anormalidades mais comuns. Estas podem resultar de infecção no ventrículo ou de uma pressão intracraniana aumentada decorrente de obstrução da derivação em qualquer ponto, ao longo de seu curso. Evidências de infecção na região localizada sobre a derivação por vezes podem ser detectadas em função da ocorrência de deiscência da ferida, celulite ou drenagem purulenta. Quando a terminação distal repousa junto ao átrio, pode haver uma bacteremia que às vezes é complicada por endocardite. Na bacteremia crônica, geralmente causada por estafilococos coagulase-negativos, pode haver desenvolvimento de doença renal (conhecida como nefrite por  derivação) produzida pela deposição de imunocomplexos no rim. Quando a terminação distal repousa no peritônio, a infecção pode causar peritonite, manifestada por sensibilidade e dor abdominal, anorexia e febre. Com frequência, a infecção é mais insidiosa e há formação de cistos cada vez maiores em torno da extremidade do cateter, à medida que o peritônio inflamado falha em absorver o LCS.

Achados laboratoriais. A contagem de leucócitos periféricos costuma ser normal. As hemoculturas resultam caracteristicamente positivas em casos de pacientes com derivações ventrículo-atriais infectadas, mas costumam ser negativas quando a extremidade distal está em outra localização. A cultura do LCS obtido por aspiração com agulha do reservatório da derivação ou a cultura de qualquer líquido que tenha entrado em contato com a derivação são as melhores abordagens para delinear a causa. É comum o LCS apresentar pleiocitose, que costuma ser leve, bem como níveis altos de proteínas. Os níveis de glicose são tipicamente normais ou  pouco diminuídos. A coloração de Gram pode mostrar a ocorrência de bacteremia, mas costuma resultar negativa.

 

Tratamento

 

O tratamento das infecções de derivações geralmente envolve antibióticos sistêmicos, remoção da derivação e colocação de um dreno ventricular externo temporário para controlar a pressão intracraniana (e promover um canal para administração intraventricular de antibiótico). Os agentes antimicrobianos sistêmicos usados no tratamento da infecções de derivações são a nafcilina (para cepas suscetíveis de S. aureus) e a vancomicina (para S. aureus resistente à meticilina e estafilococos coagulase-negativos), frequentemente suplementada com rifampicina oral (600 mg/dia). A ceftriaxona é usada nas infecções por bacilos gram-negativos. A ceftazidima é apropriada para organismos resistentes à ceftriaxona, incluindo Pseudomonas aeruginosa. O tratamento empírico antibiótico das infecções de derivações de LCS é feito com vancomicina + cefepime, ceftazidima ou meropenem. Os antibióticos intraventriculares são empregados comumente em pacientes com ventriculite (em geral, 10 a 20 mg de vancomicina/dia para infecções por organismos gram-positivos e 4 a 8 mg de gentamicina/dia para infecções por bacilos gram-negativos). Uma vez resolvida a infecção (habitualmente, após vários dias), uma nova derivação pode ser inserido.

 

Meningite nosocomial e meningite após a neurocirurgia

 

Epidemiologia e etiologia

 

A meningite nosocomial é bastante rara, exceto em pacientes recém-submetidos a uma neurocirurgia. Nenhum caso foi demonstrado por um estudo envolvendo 51 pacientes internados, submetidos à punção lombar para exclusão da hipótese de meningite bacteriana, apesar da ocorrência de alterações do estado mental em 78%, febre em 47% e cefaleia ou sinais meníngeos em 22% dos indivíduos.28 Em contraste, 92% dos pacientes com meningite bacteriana adquirida na comunidade apresentaram cefaleia ou sinais meníngeos. A conclusão foi a de que a punção lombar pode ser retida com segurança na maioria dos pacientes internados que apresentam febre e alterações do estado mental. As exceções a esta regra são os pacientes com cefaleia ou rigidez nucal, bem como os pacientes recém-submetidos a uma neurocirurgia.

Mesmo após a neurocirurgia, a meningite bacteriana é pouquíssimo frequente, sobretudo após a cirurgia espinal ou craniotomia. Este tipo de meningite é menos raro (porém ainda incomum) após os procedimentos transesfenoidais. Durante a neurocirurgia, o mais comum é as bactérias entrarem no espaço subaracnóideo a partir de sítios adjacentes de colonização localizados na pele e nas membranas mucosas. As fontes ou causas menos frequentes de infecção incluem as soluções de irrigação ou instrumentos contaminados, organismos transmissíveis pelo ar, violações da técnica estéril e organismos oriundos de sítios de supuração adjacentes. As fontes pós-operatórias são as infecções de ferida no sítio cirúrgico, cateteres internos que permitem a entrada de organismos no ventrículo ou espaço subaracnóideo, e vazamentos de LCS. Uma causa bastante incomum é a disseminação hematogênica a partir de um sítio de infecção distante, como os pulmões ou o trato urinário.

Cerca de metade dos casos de meningite bacteriana subsequente à craniotomia ou cirurgia espinal ocorrem na 1ª semana de pós-operatório; cerca de 25% dos casos ocorrem na 2ª semana; e o restante ocorre após a 2ª semana. Após a cirurgia transesfenoidal, cerca de 85% dos casos ocorrem durante a 1ª semana. O aparecimento da meningite, todavia, pode ser inconspícuo, pois a cefaleia, a rigidez nucal e o comprometimento da consciência são comuns após a cirurgia craniana.

 

Diagnóstico

 

Manifestações clínicas. Quase todos os pacientes com meningite nosocomial ou pós-neurocirurgia apresentam febre, frequentemente acompanhada de piora do meningismo, deterioração do raciocínio e eritema ou purulência no sítio de incisão. A rinorreia de LCS pode surgir em pacientes com defeitos durais.

Achados laboratoriais. A contagem de leucócitos periféricos geralmente está elevada. Esta elevação é acompanhada de neutrofilia e aumento da concentração de bastonetes. As hemoculturas resultam positivas em cerca de 30% dos casos. O exame diagnóstico mais importante é a amostragem do LCS, em geral após a realização de um exame de TC para excluir a hipótese de abscessos cerebrais ou outros acúmulos de líquido. Na maioria dos casos de meningite pós-operatória, os níveis de proteína no LCS estão na faixa de 100 a 500 mg/dL, e a contagem de leucócitos passa de 1.000/mm3, com predominância de neutrófilos. Os níveis de glicose no LCS estão diminuídos em 85% dos casos. A coloração de Gram revela a bactéria causadora em 50 a 80% dos casos.

Os organismos infecciosos são principalmente bacilos gram-negativos, incluindo P. aeruginosa e espécies de Klebsiella e Enterobacter. Em pacientes com drenos ventriculares, predominam os estafilococos coagulase-negativos. As bactérias isoladas na meningite após a cirurgia transesfenoidal são mais diversas, refletindo vários organismos presentes na mucosa nasal – em especial, refletindo alterações decorrentes da internação e terapia antimicrobiana prévia. As causas incluem bacilos gram-negativos, estreptococos, estafilococos, difterioides, anaeróbios, espécies de Haemophilus e, às vezes, isolados polimicrobianos.

 

Diagnóstico diferencial

 

Um problema diagnóstico causador de confusão em pacientes neurocirúrgicos com resultado negativo na coloração de Gram é o fato de a meningite asséptica poder se desenvolver em vários dias após a cirurgia, provavelmente em resposta ao sangue contido no espaço subaracnóideo. Pode haver febre, rigidez nucal, náusea, vômito e alteração do raciocínio, sendo que os achados obtidos com a punção lombar são semelhantes aos de uma infecção bacteriana e incluem pleiocitose, predominância neutrofílica, níveis aumentados de proteína e, em alguns casos, níveis diminuídos de glicose. Entretanto, em um estudo, nenhum paciente com meningite química pós-neurocirurgia apresentou contagem de leucócitos no LCS acima de 7.500/mm3 ou um nível de glicose no LCS abaixo de 10 mg/dL.29

 

Tratamento

 

A terapia antimicrobiana deve ser orientada pelos resultados da cultura e da coloração de Gram do LCS. Para as infecções causadas por bacilos gram-negativos, a ceftazidima (2 g/8 horas) é o fármaco de escolha, a menos que o organismo seja comprovadamente suscetível à ceftriaxona. Com frequência, a ceftazidima é combinado à injeção intratecal ou intraventricular de gentamicina (4 a 8 mg/dia). Para as infecções causadas por organismos gram-positivos, um regime efetivo é o de vancomicina parenteral suplementada com rifampicina oral ou parenteral e vancomicina intratecal ou intraventricular (10 a 20 mg/dia). Quando a coloração de Gram resulta negativa, o uso combinado de ceftazidima e vancomicina é razoável, até os resultados da cultura serem disponibilizados.

Quando a distinção entre meningite bacteriana e asséptica é obscura, uma abordagem razoável consiste em iniciar uma terapia antimicrobiana empírica adequada. Se as culturas continuarem negativas, é apropriado suspender os antibióticos e administrar corticosteroides sistêmicos, que parecem ser úteis para esta forma de meningite química.30

 

Abscesso cerebral   

 

Epidemiologia e etiologia

 

Os abscessos cerebrais são cerca de 2 a 3 vezes mais frequentes entre os homens do que nas mulheres. Cerca de 50% destes abscessos surgem a partir de infecções adjacentes, como sinusite e otite média, com a chegada dos organismos ao cérebro por extensão direta ou disseminação retrograda através do sistema venoso. Os patógenos oriundos de áreas distantes de supuração podem atingir o cérebro por via hematogênica, através das artérias cerebrais. Ocasionalmente, os abscessos desenvolvem-se após um traumatismo perfurante ou cirurgia, com os organismos diretamente inoculados no tecido cerebral. Em cerca de 20 a 30% dos abscessos cerebrais, a fonte de origem é oculta.31

A otite média crônica é um fator predisponente comum, com a formação de abscessos sendo mais frequente no lobo temporal ou no cerebelo. É comum os abscessos secundários à sinusite frontal se desenvolverem no lobo frontal, enquanto os abscessos originários do seio esfenoidal estão tipicamente no lobo temporal. As infecções hematogênicas a partir de sítios distantes costumam ser múltiplas e tendem mais a causar supuração nos territórios supridos pela artéria cerebral média distal. Com frequência, estas infecções surgem quando organismos transmissíveis pelo sangue contornam os mecanismos de filtragem comuns do pulmão, em condições como a endocardite de lado esquerdo, infecções pulmonares e shunts pulmonares ou cardíacos de direita-esquerda. Em pacientes com shunts, uma hipoxemia concomitante e eritrocitose secundária podem causar danos cerebrais que predispõem estes indivíduos a infecções subsequentes. Os pacientes imunocomprometidos, sobretudo aqueles submetidos ao transplante de medula óssea ou transplante de órgão sólido, apresentam risco aumentado de desenvolvimento de abscessos cerebrais, geralmente via disseminação hematogênica.

Os abscessos cerebrais surgem como áreas de encefalite localizadas – todavia, pouco demarcadas – frequentemente denominadas cerebrites. Neste estágio, o tecido não está liquefeito, e a aspiração com agulha ou cirurgia são intervenções inúteis. No decorrer de alguns dias, há necrose acompanhada de formação de pus no centro da infecção. Uma cápsula de tecido fibroso desenvolve-se com o passar do tempo, delimitando a supuração. Entretanto, o pus pode romper esta cápsula e invadir o ventrículo ou tecido cerebral adjacente, formando abscessos-satélite.

Os organismos mais comumente isolados dos abscessos cerebrais são os estreptococos anaeróbios, microaerofílicos ou aeróbios, além de outras bactérias anaeróbias; estafilococos; e bacilos gram-negativos (especialmente, quando o abscesso surge a partir de uma infecção crônica da orelha). As associações comuns são Klebsiella pneumoniae e estreptococos viridans em abscessos cerebrais, a partir da disseminação hematogênica; S. aureus, K. pneumoniae e estreptococos viridans, em abscessos cerebrais pós-cirúrgicos; estreptococos viridans, a partir das infecções de sinusite paranasais; e as espécies de Proteus, nos abscessos cerebrais polimicrobianos de origem otogênica.32 K. pneumoniae é um patógeno especialmente comum em pacientes com diabetes.33

 

Diagnóstico

 

Manifestações clínicas

 

A maioria dos pacientes com abscesso cerebral apresenta sintomas por vários dias a semanas, antes de procurarem atendimento médico. A febre está presente em cerca de 40 a 50% dos casos. O sintoma mais comum é a cefaleia, que pode ser difusa ou localizada na área do abscesso. Outros achados frequentes são os estados mentais alterados, entre os quais a confusão, o comportamento aberrante e a sonolência; as convulsões focais ou generalizadas; e as anormalidades neurológicas específicas, dependendo do sítio de abscesso. Com o envolvimento do lobo temporal, pode haver aparecimento de sinais motores ou sensoriais contralaterais, afasia e uma quadrantanopia homônima superior. Nos abscessos cerebelares, a ataxia nos membros ipsilaterais, nistagmo, sinais de pressão intracraniana aumentada e marcha atáxica são característicos. É comum o envolvimento do lobo frontal resultar em hemiparesia, afasia e comprometimento do raciocínio, enquanto o principal achado associado aos abscessos de lobo occipital é a hemianopsia homônima. As manifestações típicas dos abscessos de lobo parietal incluem a hemianestesia, hemianopsia homônima, negligência de metade do corpo, alexia e comprometimento da percepção espacial. O papiledema é infrequente, independentemente da localização do abscesso.

 

Achados laboratoriais

 

A leucocitose ocorre em cerca de 50% dos pacientes. Uma velocidade de sedimentação eritrocitária aumentada é encontrada em cerca de 60% dos casos. As punções lombares não são recomendadas, a menos que haja uma forte suspeita de meningite, devido ao baixo risco de herniação encefálica e à baixa probabilidade de resultados positivos de cultura. O exame do LCS geralmente indica pleiocitose, com mistura de neutrófilos e linfócitos, níveis altos de proteína, níveis normais de glicose e coloração de Gram negativa. As hemoculturas são positivas em cerca de 10 a 20% dos pacientes.

 

Exames de imagem

 

Durante a fase de cerebrite, as varreduras de TC mostram a presença de anormalidades de baixa densidade com efeito de massa, por vezes acompanhadas de intensificação irregular. Ao exame de RNM, os achados característicos são as áreas de baixa densidade nas imagens T1-ponderadas e, nas imagens de densidade de prótons ou T2-ponderadas, áreas de alta intensidade circundadas por áreas de intensificação irregular com gadolínio. Em um abscesso maduro, a varredura de TC mostra a presença de uma lesão de baixa densidade com intensificação em anel uniforme e uma área circundante de baixa densidade, representando edema cerebral [Figura 2]. Nas imagens T1-ponderadas, o abscesso encapsulado aparece como uma lesão de baixa intensidade, arredondada e com efeito de massa, bem como uma área circundante de baixa densidade, correspondente a um edema. Na imagens de densidade de prótons e T2-ponderadas, o abscesso emite um sinal de alta intensidade no centro e no parênquima, em consequência a um inchaço cerebral adjacente. A intensificação anelar ocorre com o uso de gadolínio.

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Figura 2. (a) Varredura de TC de um paciente de 39 anos de idade, mostrando um amplo abscesso talâmico. A varredura plana mostra um abscesso e uma zona circundante do que pode ser uma vascularidade aumentada ou, na verdade, uma formação capsular (seta). (b) A administração IV de meio de contraste intensifica a definição da zona circundante (seta espessa). Uma ampla área de edema periabscesso (seta estreita) é igualmente evidente. O efeito de massa pode ser nitidamente observado na assimetria dos ventrículos.

IV = via intravenosa; TC = tomografia computadorizada.

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Tratamento e prognóstico

 

A maioria dos pacientes deve ser prontamente submetida à aspiração do pus com agulha orientada estereostática34 ou craniotomia com excisão do abscesso. Quando possível, os antimicrobianos devem ser suspendidos até a obtenção de uma amostra, a fim de evitar a diminuição do rendimento das culturas. A coloração de Gram e a cultura determinam a escolha antibiótica. Uma terapia antibiótica empírica apropriada que possa ser usada até a disponibilização dos resultados microbiológicos inclui o uso de agentes efetivos contra organismos anaeróbios, estreptococos, estafilococos e bacilos gram-negativos. Um regime eficiente consiste na combinação de ceftriaxona e metronidazol.35 Os pacientes com edema cerebral significativo devem receber dexametasona. Alguns pacientes podem responder ao uso isolado da terapia antibiótica – especialmente aqueles que apresentam apenas cerebrite, aqueles com numerosos abscessos inacessíveis à drenagem, ou, ainda, aqueles com abscessos pequenos e função neurológica estável.

A mortalidade pode variar de 5 a 25%. Os fatores associados a um prognóstico desfavorável incluem uma baixa pontuação na escala do coma de Glasgow, imunodeficiência ou presença de doença subjacente.36 Muitos pacientes apresentam problemas neurológicos residuais, mais comumente as convulsões focais.

 

Abscesso epidural espinal

 

Patogênese e fisiopatologia

 

O espaço epidural – uma área posterolateral à medula espinal, que contém gordura e vasos sanguíneos – potencialmente pode se estender anteriormente ao ponto em que a dura-máter adere aos corpos vertebrais posteriores. A maioria dos abscessos epidurais ocorre em localizações médio-torácicas e lombares, onde o espaço existente é mais amplo. Os abscessos cervicais são menos comuns, em parte porque o espaço epidural é muito pequeno nesta área. Como não há barreiras anatômicas que impeçam a extensão superior e inferior, os abscessos tipicamente envolvem vários segmentos vertebrais adjacentes (em média, 4 segmentos).37

Os organismos podem chegar ao espaço epidural a partir de uma infecção adjacente, em especial, da osteomielite vertebral, mas também de abscessos retrofaríngeos, psoas, perivertebrais ou perinéfricos. Todas estas infecções são predominantemente anteriores à medula espinal. Os micróbios também entram no espaço epidural em consequência de traumatismos penetrantes, cirurgia e cateterismo epidural para administração de analgésicos. A disseminação hematogênica pode ocorrer a partir de focos distantes de infecção, incluindo a pele e o tecido mole, o trato urinário, valvas cardíacas e o trato respiratório. Os pacientes com bacteremias frequentes ou prolongadas, como os usuários de drogas IV e pacientes de hemodiálise, apresentam risco aumentado.38 Diabetes melito, alcoolismo e doença subjacente na área espinal afetada constituem outros fatores predisponentes. Muitos pacientes relatam traumatismo recente perto da localização afetada, sugerindo hemorragia no sítio com subsequente superinfecção bacterêmica. Com frequência, a fonte de infecção é inaparente. Os homens são mais frequentemente afetados do que as mulheres, por motivos desconhecidos.

Pus e tecido de granulação no espaço epidural podem danificar a medula espinal, em parte por compressão, que pode impedir o fluxo arterial e causar isquemia. Inflamação e pressão aumentada também podem provocar tromboflebite ou trombose venosa, que podem levar ao edema de medula e infarto.

 

Etiologia

 

S. aureus é o isolado mais comum do abscesso epidural espinal. Os demais isolados são, na maioria, estreptococos e bacilos gram-negativos. Em geral, apenas uma única espécie de organismo é responsável, contudo as infecções polimicrobianas ocorrem em cerca de 5 a 10% dos casos. Nos Estados Unidos, Mycobacterium tuberculosis é causa ocasional de abscesso epidural. Nestes casos, a infecção costuma surgir de uma osteomielite vertebral adjacente. Os pacientes podem sentir lombalgia durante algum tempo (semanas a meses), antes do aparecimento dos sintomas neurológicos. A maioria destes pacientes não apresenta evidência de tuberculose pulmonar no momento da infecção epidural.

 

Diagnóstico

 

Manifestações clínicas

 

O sintoma mais comum de abscesso epidural espinal é a lombalgia sobre a área infectada. Trata-se de um sintoma tipicamente persistente, que não pode ser aliviado com alteração da posição nem repouso no leito. Uma sensibilidade localizada frequentemente está presente, enquanto a febre é comum, mas não invariável. Com o tempo, os pacientes podem desenvolver dor radicular, sobretudo ao longo da via do nível afetado da medula espinal. O estágio seguinte é marcado, em geral, por enfraquecimento muscular, tipicamente paraparesia com envolvimento torácico ou quadriparesia com infecção cervical. Neste estágio, os achados de doença neuronal motora superior costumam predominar. Tais achados incluem espasticidade, hiperreflexia e respostas plantares extensoras. Pode haver perda sensorial bilateral e comprometimento da função da bexiga e do intestino. Sem tratamento, há desenvolvimento de paralisia, por vezes de forma abrupta, que em geral é irreversível.

 

Achados laboratoriais

 

A leucocitose é comum em pacientes com abscesso epidural, porém as contagens de leucócitos podem ser normais, sobretudo em pacientes com sintomas prolongados. A velocidade de sedimentação eritrocitária geralmente está elevada. Uma punção lombar em geral não é recomendada, exceto quando necessária para fins de mielografia. Entretanto, quando uma punção lombar é realizada, a amostra tipicamente apresenta uma pleiocitose de algumas centenas de células, comumente com mistura de linfócitos e neutrófilos. Os níveis de glicose são normais. Os níveis de proteína em geral estão altos, às vezes em mais de 1 g/L, quando o canal espinal está totalmente bloqueado. A coloração de Gram e a cultura de LCS geralmente resultam normais. A realização de hemoculturas, que comumente resultam positivas no abscesso epidural, é justificada em todos os casos suspeitos.

 

Exames de imagem

 

Quando o abscesso surge da osteomielite vertebral, as chapas planas da coluna espinal podem mostrar a ocorrência de erosão nas margens corticais das vértebras, espaços discais intervertebrais estreitados ou obstruídos, e destruição óssea. Os mielogramas exibem evidências de bloqueio da circulação do LCS ao nível do abscesso epidural, contudo raramente se fazem necessários quando há disponibilidade de varreduras de TC ou RNM. As varreduras de TC são eficientes para a detecção de osteomielite vertebral. Os achados característicos incluem o estreitamento dos espaços discais intervertebrais, placas terminais vertebrais erodidas e destruição óssea dos corpos vertebrais. O abscesso epidural é visto como uma massa epidural focal de baixa densidade, que pode ser melhor delineada por mielografia com TC. Entretanto, a melhor modalidade de exame por imagem é a RNM, que fornece uma imagem de baixa intensidade ou isointensa em varreduras T1-ponderadas (em comparação à imagem da medula espinal) e um sinal intenso nas varreduras de densidade de prótons ou T2-ponderadas. Os abscessos epidurais tipicamente aparecem intensificados com gadolínio. A demonstração da extensão da massa é simples ao exame de RNM, tanto em corte longitudinal como no corte transversal, e a osteomielite vertebral pode ser facilmente visualizada como áreas de alta intensidade nas imagens T2-ponderadas.

 

Tratamento

 

Neurocirurgia

 

O elemento mais importante da terapia é a neurocirurgia urgente para remoção de pus e tecido de granulação – que, em vez de material purulento, é, em alguns casos, o principal ou o único achado. As laminectomias descompressoras são realizadas para abscessos epidurais posteriores, enquanto as abordagens anteriores mais complexas com fusão de enxerto ósseo para estabelecimento da estabilidade espinal podem ser necessárias nos casos de coleções ventrais. Ocasionalmente, os pacientes com achados neurológicos mínimos ou inexistentes respondem à terapia antimicrobiana isolada.39 Entretanto, até mesmos estes pacientes responsivos podem ser beneficiados pela cirurgia, quando os procedimentos de imagem mostram evidências significativas de compressão da medula espinal. Nestes pacientes, o organismo deve ser identificado por hemocultura ou aspiração de abscesso, e os clínicos devem ter em mente que o declínio neurológico pode ocorrer de forma abrupta.39

 

Terapia antimicrobiana

 

A terapia antimicrobiana isolada também pode ser apropriada para pacientes de alto risco cirúrgico que apresentam problemas médicos concomitantes; para aqueles com envolvimento espinal muito extensivo; e para indivíduos com paralisia há mais de 48 horas, após a qual uma recuperação neurológica significativa é altamente improvável.

Se o organismo infeccioso é desconhecido, a terapia antibiótica empírica deve incluir um agente efetivo contra bacilos gram-negativos (p. ex., gentamicina ou cefalosporina de 3ª geração) combinado a um agente efetivo contra S. aureus (p. ex., penicilina penicilinase-resistente, como nafcilina).

Diante da possibilidade de infecção por S. aureus meticilina-resistente, recomenda-se o uso de vancomicina. Os resultados da avaliação microbiológica de amostras cirúrgicas ou hemoculturas podem, então, determinar a escolha apropriada. Em geral, o tratamento é mantido por 3 a 4 semanas na ausência de osteomielite vertebral e continuado por 6 a 8 semanas na presença da condição. Os pacientes com abscessos epidurais tuberculosos devem receber quimioterapia antituberculose por pelo menos 6 meses.

 

Prognóstico

 

O prognóstico do abscesso epidural espinal depende de vários fatores, dos quais o mais importante é a extensão da deficiência neurológica no momento da cirurgia. Resultados desfavoráveis são comuns quando o paciente apresenta paresia ou, especialmente, paralisia. Outros aspectos prognósticos desfavoráveis são a idade avançada (> 60 anos), compressão significativa do saco tecal ao exame de neuroimagem e duração maior dos sintomas.40 Cerca de 40% dos pacientes se recuperam totalmente; 25% apresentam enfraquecimento residual; 20% apresentam paralisia permanente; e 15% morrem.

 

Empiema subdural

 

Patogênese e fisiopatologia

 

Um empiema subdural consiste em um acúmulo de pus entre a dura-máter e a aracnoide subjacente. Como este espaço não contém septações, exceto no local onde os grânulos aracnoides repousam junto à dura-máter, o material purulento é facilmente espalhado sobre a superfície do encéfalo. A maioria dos casos ocorre como complicações da sinusite em crianças maiores e adultos jovens, sobretudo do sexo masculino, que representam cerca de 75% dos casos.41 Quase sempre há envolvimento do seio frontal, geralmente acompanhado do envolvimento de pelo menos um dos seios paranasais. Outra causa é a infecção da orelha, seja otite média ou mastoidite. Nestes casos, a localização do empiema pode ser abaixo do tentório.

Nestas infecções, os patógenos provavelmente atingem o espaço subdural através do sangue que drena dos sítios infectados pelos seios venosos na dura-máter. A subsequente tromboflebite séptica destes vasos dissemina os organismos para dentro do espaço subdural. A extensão direta a partir de focos infecciosos adjacentes pela erosão dos ossos do seio ou da orelha é outra possibilidade. Outras possíveis fontes de organismos causadores de empiema subdural são a infecção bacterêmica de um hematoma subdural preexistente e a inoculação direta de micróbios na área a partir de um traumatismo craniano perfurante ou cirurgia intracraniana.

Depois que o espaço subdural é infectado, pode haver um amplo espalhamento do pus sobre as convexidades do cérebro ipsilateral. O pus pode, ainda, seguir pela foice que separa os 2 hemisférios. As manifestações clínicas surgem da pressão exercida sobre a porção do encéfalo subjacente, efeitos sistêmicos da infecção e tromboflebite séptica que se dissemina para as veias corticais e subcorticais, produzindo infarto ou infecção cerebral.

 

Etiologia

 

Na maioria dos casos, apenas uma espécie de organismo é isolada do pus, contudo as infecções polimicrobianas também são possíveis. Os patógenos habituais são os estreptococos aeróbios ou anaeróbios, além de outros organismos anaeróbios, especialmente nas infecções oriundas da sinusite. Os estafilococos e bacilos gram-negativos são causas comuns nas infecções que ocorrem no pós-operatório. Cerca de 20% das culturas resultam negativas, possivelmente por causa do uso de técnicas microbiológicas inadequadas (em especial, de isolamento de bactérias anaeróbias) ou terapia antimicrobiana prévia.

 

Diagnóstico

 

Manifestações clínicas

 

Muitos pacientes já tiveram sinusite ou uma doença inespecífica no trato respiratório superior. Em alguns pacientes, contudo, os sintomas de empiema subdural surgem abruptamente. Os aspectos mais comuns são a febre, a rigidez nucal e a cefaleia, que podem ser difusas ou localizadas na área de empiema ou sinusite subjacente. As anormalidades neurológicas geralmente estão presentes, incluindo hemiparesias, convulsões, afasia, hemianestesia, hemianopsia e alterações do raciocínio, como confusão, sonolência, desorientação e até coma. Pode haver papiledema, indicando uma pressão intracraniana aumentada, que também pode causar paralisia do III e VI nervos cranianos. Pode haver desenvolvimento de sensibilidade sinusal e edema periorbital, refletindo a sinusite subjacente. Com o empiema infratetorial, que geralmente tem origem em infecções óticas negligenciadas, os aspectos clínicos incluem rigidez nucal, alteração da consciência, sinais de pressão intracraniana aumentada, otorreia e febre.42 De forma típica, os pacientes deterioram rapidamente.

A ocorrência de febre, cefaleia, rigidez nucal e sinais neurológicos focais, especialmente em um menino adolescente ou homem jovem com sinusite, deve ser considerada fortemente sugestiva da presença de empiema subdural e requer a imediata solicitação de exames de neuroimagem por TC ou, de preferência, RNM.

 

Achados laboratoriais

 

É comum haver leucocitose periférica. A punção lombar é recomendável devido ao risco de herniação cerebral por aumento da pressão intracraniana, mas com frequência é realizada porque os aspectos clínicos são sugestivos de meningite bacteriana aguda. Felizmente, as complicações sérias são raras. A pressão de abertura é alta, e uma pleiocitose de no máximo várias centenas de leucócitos é detectada. Comumente, existe uma mistura de neutrófilos e linfócitos, sendo que qualquer destes tipos celulares pode predominar, embora em geral ambos estejam presentes nas mesmas concentrações. Os níveis de proteína estão tipicamente aumentados, porém os níveis de glicose quase sempre permanecem normais. Tanto a coloração de Gram como a cultura resultam caracteristicamente negativas.

 

Exames de imagem

 

As varreduras de TC mostram a presença de empiema, o qual é visto como coleções de baixa densidade sobre um dos hemisférios e no espaço inter-hemisférico, com um rim de intensificação por contraste [Figura 3]. A RNM, todavia, é uma técnica mais sensível e acurada de exame de imagem, que mostra o empiema como massas isodensas em imagens T1-ponderadas e como emissão de sinal intenso em imagens de densidade de prótons ou T2-ponderadas. O rim de intensificação pode ser produzido com gadolínio.41 Estas técnicas de imagem também podem mostrar complicações concomitantes, que são relativamente comuns e incluem o abscesso cerebral, abscesso epidural craniano, tromboflebite cortical e infarto venoso.

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Figura 3. Varredura de TC de um paciente de 17 anos de idade com empiema subdural, mostrando 2 loculações (setas) que estão restritas à área inter-hemisférica. Margens intensificadas por contraste cercam as 2 loculações.

TC = tomografia computadorizada.

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Diagnóstico diferencial

 

O diagnóstico diferencial para empiema subdural inclui a meningite bacteriana, o abscesso bacteriano, o abscesso cerebral e a encefalite. A distinção clínica entre estas infecções pode ser difícil. Contudo, os achados focais são incomuns na meningite, e o achado de rigidez cervical é incomum em pacientes com abscesso cerebral e encefalite.

 

Tratamento

 

A terapia mais importante consiste na remoção do pus subdural mediante uso de múltiplos buracos com broca ou craniotomia. Não está claro qual método é melhor, sendo que a escolha pode depender da localização da infecção e da condição neurológica do paciente. Seja qual for o procedimento, mas, em especial com a abertura de furos com broca, frequentemente se torna necessária a realização de múltiplas operações por causa da drenagem inadequada do pus. A terapia antibiótica, em geral mantida por 3 a 4 semanas após a cirurgia, pode ser determinada pelos resultados da coloração de Gram e cultura de pus. A combinação de ceftriaxona e metronidazol constitui um regime empírico razoável para uso até a disponibilização dos resultados da coloração de Gram e da cultura.

 

Prognóstico

 

O prognóstico depende bastante do estado de consciência do paciente no momento da cirurgia, com resultados piores sendo alcançados com níveis decrescentes de consciência. A mortalidade geral é de aproximadamente 15%. Sequelas neurológicas significativas, como anormalidades da fala e hemiparesia, ocorrem em cerca de 15 a 20% dos sobreviventes. Cerca de 30% dos pacientes que sobrevivem sofrem convulsões. Estes problemas podem emergir bem depois da cirurgia.

 

Tromboflebite das principais veias cerebrais

 

Os seios durais drenam sangue do encéfalo para dentro das veias jugulares. Estes seios não possuem valvas e, desta forma, permitem o fluxo para qualquer direção, de acordo com o gradiente de pressão prevalente. A tromboflebite séptica nestes vasos, que pode resultar de supuração intracraniana ou disseminação da infecção a partir das veias extracranianas, causa aumento da pressão intracraniana, edema cerebral focal ou infarto cerebral. Em geral, o sítio de início da infecção é clinicamente evidente na orelha média, mastoide, seios paranasais ou pele facial. Os seios cavernoso, lateral e superior sagital são os vasos mais comumente envolvidos.43

 

Tromboflebite do seio cavernoso

 

A tromboflebite do seio cavernoso desenvolve-se com maior frequência a partir de infecções nos seios paranasais ou na pele da face, especialmente no terço medial próximo dos olhos e do nariz. A maioria dos casos é causada por S. aureus.44 Outros patógenos causadores são os estreptococos, bacilos gram-negativos e anaeróbios.

O sintoma mais inicial costuma ser a cefaleia, que com frequência precede em vários dias o aparecimento da febre e outros achados. A dor tipicamente envolve áreas inervadas pelas divisões oftálmicas e maxilares do nervo trigêmeo, que atravessam o seio cavernoso. A hiperestesia ou a sensibilidade diminuída podem ser demonstráveis nos dermátomos servidos por estes nervos. Outros achados focais podem surgir das veias oftálmicas obstruídas: quimose unilateral, proptose e edema ipsilateral de pálpebra, nariz e testa. Com o tempo, os achados passam a ser bilaterais, à medida que a flebite se estende para o seio cavernoso do lado oposto. A compressão dos nervos cranianos III, IV e VI, que percorrem o seio cavernoso, acarreta vários graus de oftalmoplegia. As pupilas podem dilatar e falhar em reagir à luz. As veias da retina ficam congestionadas, a acuidade visual pode diminuir, e o paciente pode apresentar hemorragias e papiledema. Letargia e coma, então, podem se seguir, refletindo uma pressão intracraniana aumentada e dano neuronal. Ocasionalmente, há desenvolvimento de bacteremia com focos metastáticos de infecção.

 

Tromboflebite do seio lateral

 

A tromboflebite do seio lateral é quase sempre uma complicação da mastoidite. Os anaeróbios, estafilococos e bacilos gram-negativos, sobretudo os organismos de Proteus, são os isolados mais comuns.

O curso clínico costuma ser subagudo, com sintomas que duram várias semanas. Dor de ouvido e drenagem frequentemente são os primeiros sintomas. Uma forte cefaleia unilateral persistente, seguida de náusea e vômito, indica o desenvolvimento de tromboflebite do seio lateral. Febre, calafrios e manifestações de pressão intracraniana aumentada, incluindo confusão e papiledema, comumente estão presentes. A sensibilidade pós-auricular, congestão venosa e edema representam o envolvimento da veia emissária mastoidea. Pode haver extensão para dentro da veia jugular.

É comum o exame otoscópico revelar uma membrana timpânica perfurada ou inflamada. Os achados neurológicos focais geralmente estão ausentes, com exceção da paralisia do VI nervo craniano, refletindo a compressão do seio petroso inferior.

 

Tromboflebite do seio sagital superior

 

A tromboflebite do seio sagital superior agrava a meningite bacteriana, sinusite paranasal, osteomielite contígua e infecção dural. Os organismos mais comuns são S. pneumoniae, outros estreptococos e bacilos gram-negativos. A trombose apenas da parte anterior do seio frequentemente é assintomática, contudo o envolvimento posterior causa aumento da pressão intracraniana. A manifestação predominante é a cefaleia aguda, muitas vezes com náusea e vômito, seguida, após alguns dias, de confusão e eventual coma. As convulsões focais ou generalizadas são comuns, e a maioria dos pacientes apresenta febre. A extensão da tromboflebite para as veias corticais pode causar infarto do córtex subjacente, produzindo manifestações neurológicas como convulsões focais e hemiparesia.

 

Diagnóstico

 

Havendo tromboflebite séptica em qualquer uma das veias cerebrais, o exame do LCS pode fornecer resultados normais ou achados consistentes com a existência de um foco parameníngeo de infecção: níveis proteicos aumentados, níveis normais de glicose e pleiocitose mista de neutrófilos e linfócitos, que raramente excede algumas centenas de células. A pressão de abertura aumentada também é comum em todos os tipos.

As chapas planas do crânio raramente são úteis, exceto nos casos de trombose sinusal lateral séptica, quando quase sempre mostram a ocorrência de mastoidite. Certos achados fornecidos pela varredura de TC sugerem a ocorrência de trombose venosa cerebral, porém a RNM proporciona um exame significativamente mais eficiente. As veias cerebrais com trombose aguda não apresentam vazio de fluxo. São isointensas nas imagens T1-ponderadas e hipointensas nas imagens T2-ponderadas. Na trombose subaguda, a metemoglobina presente nas veias produz áreas de alta intensidade em ambas as imagens.

 

Tratamento

 

O tratamento da tromboflebite da veia cerebral inclui uma terapia antibiótica apropriada. Para cada um destes distúrbios, quando os organismos infecciosos são desconhecidos, um regime antibiótico empírico eficiente consiste na combinação de ceftriaxona e metronidazol. Na trombose do seio cavernoso com proeminência de S. aureus, é possível adicionar a vancomicina se houver probabilidade de infecção por cepas resistentes à meticilina.

Ocasionalmente, o tratamento da tromboflebite de veia cerebral inclui cirurgia das áreas de purulência de onde surgiu a infecção. Quando a causa subjacente é a sinusite paranasal, pode ser necessário drenar os seios infectados para obter uma resposta clínica satisfatória. Na tromboflebite do seio lateral, é comum realizar a mastoidectomia radical e exploração sobre o seio lateral, com o objetivo de remover o material purulento.

Outro tratamento médico pode incluir manitol e dexametasona para a tromboflebite sagital superior, a fim de ajudar a aliviar o grave edema cerebral. O papel da anticoagulação na tromboflebite da veia cerebral ainda é indefinido, mas parece ser valioso no tratamento da trombose do seio cavernoso45 e potencialmente perigoso na tromboflebite do seio lateral e sagital superior, devido aos frequentes infartos corticais venosos hemorrágicos concomitantes que esta intervenção pode exacerbar.

 

Prognóstico

 

A tromboflebite séptica dos seios cavernoso e sagital superior impõe uma alta mortalidade, mesmo com uma terapia apropriada. Entretanto, a maioria dos pacientes com envolvimento do seio lateral apresenta um prognóstico favorável.

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O autor não possui relações comerciais com os fabricantes de produtos ou prestadores de serviços mencionados neste capítulo.

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