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Ressuscitação Pré-hospitalar com Solução Hipertônica após TCE Grave

Autor:

Antonio Paulo Nassar Junior

Especialista em Terapia Intensiva pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). Médico Intensivista do Hospital São Camilo. Médico Pesquisador do HC-FMUSP.

Última revisão: 29/11/2010

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Ressuscitação Pré-hospitalar com Solução Hipertônica após Traumatismo Cranioencefálico Grave1 [Link para Abstract]

 

Fator de Impacto da Revista (JAMA): 31.718

 

Contexto Clínico

O traumatismo cranioencenfálico (TCE) é a principal causa de morte em traumas fechados e associa-se a um grave comprometimento funcional nos sobreviventes. O trauma inicial é responsável pela lesão primária (p. ex. hematomas), mas o comprometimento posterior da perfusão cerebral por edema causa a lesão secundária, que pode agravar ainda mais o prognóstico do paciente. O tratamento dos pacientes com TCE objetiva, então, a prevenção e/ou minimização das lesões secundárias2. Soluções hipertônicas têm-se mostrado eficazes na redução da pressão intracraniana (PIC) e aumento da pressão de perfusão cerebral (PPC)3,4, mas estudos clínicos com desfechos importantes como funcionalidade estão ausentes. Um estudo prévio mostrou que em pacientes com TCE grave e hipotensão à avaliação inicial o uso de solução hipertônica não se associou a um melhor prognóstico neurológico quando comparado ao uso de solução de Ringer Lactato5. Os autores deste grande estudo propuseram-se a avaliar o impacto da solução salina hipertônica administrada no atendimento pré-hospitalar no prognóstico neurológico de pacientes com TCE grave.

 

O Estudo

Foi realizado em estudo prospectivo, randomizado, que comparou a eficácia de um bolus de 250 ml de solução salina a 7,5% (solução hipertônica), solução salina a 7,5% e dextran 70 a 6% (solução hipertônica/dextran) e solução salina a 0,9% (solução salina) como fluido inicial em pacientes com suspeita de TCE grave em ambiente pré-hospitalar.

Foram incluídos pacientes com trauma fechado, mais de 15 anos, TCE grave (Glasgow < 9), sem hipotensão (PAS < 70 mmHg ou PAS entre 71 e 90 mmHg e FC < 108 bpm). Foram excluídos pacientes com gravidez conhecida ou suspeita, menores de 15 anos, reanimação cardiopulmonar, administração de mais de 2.000 ml de solução cristalóide ou qualquer colóide/derivado se sangue, hipotermia grave (< 28°C), afogamento, asfixia, queimaduras de mais de 20% da área corporal total, lesão penetrante, incapacidade de obter acesso venoso, mais de 4 horas entre o chamado e a intervenção e prisioneiros.

O desfecho primário analisado foi o estado neurológico em 6 meses baseado na escala de prognóstico de Glasgow extendida (Extended Glasgow Outcome Score - GOSE). A escala foi dicotomizada entre bom (boa recuperação ou incapacidade leve – GOSE > 4) e mau prognóstico (incapacidade grave, estado vegetativo ou morte – GOSE = 4). Outros desfechos analisados foram a sobrevida em 28 dias e hospitalar.

 

Resultados

Foram incluídos 1.282 pacientes e, destes, 1087 (85%) tinham a avaliação neurológica completa em 6 meses. O estudo foi interrompido por futilidade após a segunda análise interina antes de se atingir a amostra prevista.

Os três grupos não tiveram diferenças quanto aos dados iniciais e nem quanto à proporção daqueles que tiveram a PIC medida (29,2; 27,3 e 26,6%, respectivamente nos grupos hipertônica/dextran, hipertônica e salina). A PIC inicial nestes três grupos também foi semelhante, bem como a PIC máxima e o tempo em que ela ficou maior que 25 mmHg nas primeiras 12h de tratamento na UTI.

O desfecho primário (incapacidade grave, estado vegetativo ou morte em 6 meses) não foi diferente entre os grupos (53,7; 54,3 e 51,5%, respectivamente nos grupos hipertônica/dextran, hipertônica e salina; p=0,67). A mortalidade em 28 dias também não teve diferenças (74,3; 75,7 e 75,1%; p=0,84). Não houve diferenças também quanto a disfunções orgânicas, duração da internação na UTI e no hospital.

 

Aplicações para a Prática Clínica

Este é o maior estudo já realizado sobre o uso de solução hipertônica em TCE e seus resultados podem parecer desanimadores, já que não houve nenhuma melhora no prognóstico neurológico destes pacientes em 6 meses. O estudo tem pontos importantes, como sua grande amostra, seus critérios amplos de inclusão (o que facilita a validade externa) e a análise de subgrupos que pôde sugerir se a ausência de benefício foi justamente pela heterogeneidade da amostra (e concluiu-se que não, já que nenhum subgrupo mostrou benefício). No entanto, a inclusão de pacientes com Glasgow < 9 como prováveis portadores de hipertensão intracraniana pode não ter sido uma boa escolha. Afinal, estes pacientes poderiam ter causas metabólicas (como uso de álcool, comum em trauma) para explicar o rebaixamento do nível de consciência ou poderia ter sofrido lesão axonal difusa, que também se associaria a uma menor pontuação na escala de Glasgow. De qualquer modo, o uso da solução hipertônica em pacientes com hipertensão intracraniana confirmada ou provável (sinais de edema à TC associada a Glasgow < 9) ainda não está bem estabelecido e pode ser uma medida a ser considerada em casos refratários. Por ora, baseado neste importante estudo, o uso de solução hipertônica em pacientes com TCE grave no ambiente pré-hospitalar não é recomendado.

 

Referências

1.    Bulger EM, May S, Brasel KJ, Schreiber M, Kerby JD, Tisherman SA, et al. Out-of-hospital hypertonic resuscitation following severe traumatic brain injury: a randomized controlled trial. JAMA. 2010 Oct 6; 304(13):1455-64.

2.    Guidelines for the management of severe traumatic brain injury. J Neurotrauma. 2007;24 Suppl 1:S1-106.

3.    Battison C, Andrews PJ, Graham C, Petty T. Randomized, controlled trial on the effect of a 20% mannitol solution and a 7.5% saline/6% dextran solution on increased intracranial pressure after brain injury. Crit Care Med. 2005 Jan;33(1):196-202; discussion 57-8.

4.    Francony G, Fauvage B, Falcon D, Canet C, Dilou H, Lavagne P, et al. Equimolar doses of mannitol and hypertonic saline in the treatment of increased intracranial pressure. Crit Care Med. 2008 Mar;36(3):795-800.

5.    Cooper DJ, Myles PS, McDermott FT, Murray LJ, Laidlaw J, Cooper G, et al. Prehospital hypertonic saline resuscitation of patients with hypotension and severe traumatic brain injury: a randomized controlled trial. JAMA. 2004 Mar 17;291(11):1350-7.

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