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Regionalização de procedimentos cirúrgicos diminui mortalidade

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 09/11/2011

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Especialidades / Área de atuação: Segurança do Paciente & Qualidade Assistencial

 

Resumo

Este estudo mostra os benefícios, em termos de mortalidade, quando cirurgias de alta complexidade são concentradas em hospitais com alto volume desses procedimentos.

 

Contexto clínico

Estudos mostram quemelhores taxas de mortalidade para pacientes cirúrgicos quando seus procedimentos são feitos em hospitais com grande volume de cirurgias, o que induz a se pensar em volumes cirúrgicos mínimos para que um hospital possa ter qualidade no que diz respeito a uma cirurgia em particular.

Entretanto, não se sabe se essa informação levou a uma mudança no comportamento dos encaminhamentos de pacientes para locais de referência em cirurgias de grande complexidade, e se isso realmente gerou impacto de mortalidade.

 

O estudo

Este estudo de coorte foi realizado nos EUA, por meio de uma análise retrospectiva de 3,2 milhões de pacientes do Medicare que, entre 1999 e 2008, foram internados para realizar um de oito procedimentos de alta complexidade, a saber: esofagectomia, pancreatectomia, ressecção pulmonar, cistectomia, reparo de aneurisma de aorta abdominal, revascularização do miocárdio, endarterectomia de carótida e troca de válvula aórtica.

A mortalidade cirúrgica foi definida como morte antes da alta ou em até 30 dias após a cirurgia. Esta mortalidade foi comparada entre os anos de 1999 e 2008. Para se ter dados mais fidedignos foram determinadas as Mortalidades Ajustadas pelo Risco, que é uma forma de ajustar as taxas de mortalidade em função de características dos doentes como idade, sexo, raça, tipo de internação (eletiva, urgência, emergência), comorbidades e situação socioeconômica.

Com exceção das revascularizações do miocárdio e das endarterectomias de carótida, todos os hospitais de grande volume das cirurgias estudadas aumentou seu volume de procedimentos.

A mortalidade ajustada pelo risco caiu para todos os oito procedimentos (com P < 0,001) no período estudado. Como a mortalidade esperada não variou ao longo dos anos, não se pode atribuir as quedas de mortalidade a uma mudança de perfil dos pacientes. As quedas de mortalidade foram especificamente de:

 

         esofagectomia: 11%;

         pancreatectomia: 19%;

         ressecção pulmonar: 16%;

         cistectomia: 14%;

         troca de válvula aórtica: 13%;

         revascularização do miocárdio: 21%;

         reparo de aneurisma de aorta abdominal: 36%;

         endarterectomia: 8%.

 

Aplicações para a prática clínica

A análise mostra que o volume de procedimentos de alta complexidade aumentou em hospitais de referência, principalmente para os que fazem cirurgias oncológicas. Isso não ocorreu apenas pelo aumento geral da demanda, mas porque de fato esses procedimentos passaram a ser feitos em um menor número de hospitais, conforme os resultados deste estudo.

A mortalidade ajustada caiu para todos os procedimentos, com quedas que variaram de 8 a 36%. Claro que estas quedas de mortalidade não devem se explicar apenas pela concentração de procedimentos em hospitais de referências, mas por uma série de outros fatores conjugados. Por exemplo, no caso do reparo do aneurisma de aorta abdominal, houve um importante aumento no uso de endopróteses no lugar de cirurgias abertas. Entretanto, exatamente pela constatação de queda de mortalidade em oito procedimentos tão diferentes, mostra que algo em comum gerou essa melhoria. Exclusivamente nos últimos anos do estudo, algumas coisas que podem ter contribuído para isso são a melhoria de aspectos de segurança do paciente com o uso do checklist para cirurgias seguras da OMS e a melhor condução dos casos nas unidades de terapia intensiva, também incentivadas por políticas de qualidade e segurança. Outro aspecto é a cultura de pagamento por desempenho (pay-for-performance), existente nos EUA e que aumenta a adesão de hospitais a práticas baseadas em evidências. Ainda assim, isso não explica, por si , toda a melhoria que um estudo de 10 anos mostra. Isso nos leva a crer que a maior especialização dos hospitais e de seus cirurgiões levou a este impacto de queda de mortalidade.

É bem sabido que quanto mais se pratica uma habilidade motora, mais o desempenho desta atividade melhora, e isso é especialmente verdade na área médica quando pensamos em procedimentos cirúrgicos. Outro aspecto que ressaltar deve ser ressaltado, e que não se aplica ao cirurgião, é que todos os profissionais de um hospital, e mesmo seus processos de trabalho, têm maior chance de gerar bons resultados assistenciais quanto mais especializados e individualizados eles forem. Isso, de forma alguma, é uma apologia à superespecialização de profissionais da área da saúde, mas, sim, um conceito de que quando se trata de alta complexidade, quanto mais focado a um grupo específico de doenças ou pacientes um hospital é, maior a chance deste hospital ter bons resultados. Não adianta um hospital querer fazer um pouco de tudo quando se trata de pacientes complexos. É o inverso da saúde primária. Nesta, quanto mais abrangente, melhor. É uma discussão que corrobora a lógica que o sistema de saúde deveria, em tese, ter, ou seja: tratar o que é simples e comum na atenção primária, e o que é complexo e incomum em serviços terciários pequenos e especializados ao máximo.

 

Bibliografia

1.   Finks JF, Osborne NH, Birkmeyer JD. Trends in hospital volume and operative mortality for high-risk surgery. N Engl J Med. 2011 Jun 2;364(22):2128-37. [link para o artigo] (Fator de Impacto: 53,484).

2.   Committee on Quality of Health Care in America and the National Cancer Policy Board. Interpreting the volume–outcome relationship in the context of health care quality. Washington, DC: Institute of Medicine; 2000.

3.   Birkmeyer JD, Siewers AE, Finlayson EV, Stukel TA, Lucas FL, Batista I, et al. Hospital volume and surgical mortality in the United States. N Engl J Med. 2002 Apr 11;346(15):1128-37.

4.   Dudley RA, Johansen KL, Brand R, Rennie DJ, Milstein A. Selective referral to high-volume hospitals: estimating potentially avoidable deaths. JAMA. 2000 Mar 1;283(9):1159-66.

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