FECHAR
Feed

Já é assinante?

Entrar
Índice

Caso Clínico – Qual o diagnóstico neste caso de diarreia crônica?

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 05/11/2014

Comentários de assinantes: 0

Especialidades: Gastroenterologia/Radiologia/Medicina de Emergência

 

Quadro Clínico

       Paciente do sexo feminino, 23 anos, procura atendimento de pronto-socorro por quadro de diarreia há cinco semanas, sendo que alguns episódios são associados à presença de sangue e muco. Sem antecedentes pessoais. Teve passagem em outros serviços, tomou alguns antibióticos no período, porém não teve nenhuma melhora.

        Ao exame físico na chegada estava em Glasgow 15, FC 98bpm, PA 110x68mmHg, FR 20cpm, SatO2 96% em ar ambiente, afebril, acianótica, enchimento capilar normal, ausculta pulmonar e cardíaca sem alterações, exame abdominal com dor à palpação difusa, sem visceromegalias, sem massas palpáveis e com sinais de peritonite.

 

Foram colhidos alguns exames, a saber:

Ureia: 11mg/dL; Cr: 0,4mg/dL;

Na:135mEq/L; K: 3,8mEq/L;

Hb 13g/dL (padrão normo/normo), leucócitos 9050, e plaquetas 421 mil;

VHS: 71mm; PCR: 169mg/L.

 

Foi também realizada tomografia de abdômen e pelve com contraste venoso iodado. Abaixo temos imagens da tomografia:

 

Imagem 1. Tomografia com contraste de abdômen e pelve

 

 

Imagem 2. Tomografia com contraste de abdômen e pelve

 

Diagnóstico e Discussão

Achados da Tomografia:

- Sinais de doença inflamatória em atividade, não estenosante, no cólon e no reto, caracterizados por leve espessamento parietal, hiper-realce mucoso e redução das haustrações;

- Sistema portal pérvio;

- Linfonodos mesentéricos, periaórticos e ilíacos comuns aumentados em número e alguns em dimensões, de até 2,0 cm, provavelmente reacionais;

- Ausência de líquido livre, pneumoperitônio, coleções ou fístulas.

 

        Esta paciente foi diagnostica como tendo retocolite ulcerativa após uma biópsia de mucosa do reto.  A retocolite ulcerativa é uma doença caracterizada por episódios recorrentes de inflamação que é limitada à mucosa colônica. Normalmente envolve o reto e pode se estender ao restante do cólon.

        Colite é a manifestação clínica mais comum, ocorrendo diarreia que geralmente é associada a sangue, sendo outros sintomas comuns à presença de cólicas, tenesmo e incontinência. Quando a doença é mais distal, pode ocorrer constipação alternada com evacuações com sangue e muco. Sintomas gerais podem acompanhar o quadro, como febre, fadiga e perda ponderal.

 

        Manifestações extraintestinais podem ocorrer em até 25% dos pacientes ao longo da vida, e é comum que 10% tenha alguma manifestação extraintestinal durante o quadro inicial. As manifestações extraintestinais mais comuns são:

 

- Musculoesqueléticas: artrite (sacroileíte, esqueleto axial), osteopatia hipertrófica, osteoporose, osteomalácia

- Pele e boca: eritema nodoso, pioderma gangrenoso, úlceras aftosas, erupção vesico-pustular, vasculite necrotizante, acrodermatite enteropática, glossite, vitiligo, psoríase, epidermólise bolhosa adquirida;

- Hepatobiliar: colangite esclerosante primária, carcinoma de duto biliar, colelitíase, hepatite autoimune, fibrose portal;

- Ocular: uveíte, escleromalácia, úlcera de córnea.

 

        Do ponto de vista de imagens, a paciente apresentava achados extremamente compatíveis com doença inflamatória intestinal, mais especificamente com retocolite. Os achados radiológicos mais importantes são os que se observam no exame de enema opaco, seja o aspecto de “papel rasgado” na crise aguda e de “tubo rígido”, ou seja, tubular, verificado na fase crônica da doença. Nessa fase, ainda pode aparecer a imagem de microcólon, traduzindo um longo prazo de ulcerações e cicatrizações, provocando a retração do órgão.

        Porém, o diagnóstico depende do quadro clínico de diarreia por mais de quatro semanas associado à evidência de inflamação visualizada por método endoscópico e biópsia.  O papel da biópsia é detectar alterações crônicas compatíveis e descartar outras causas de colite. Em pacientes agudamente descompensados, deve-se evitar colonoscopia pelo risco de induzir megacólon tóxico. Uma retossigmoidoscopia flexível é a melhor opção nessa fase. Os achados característicos à biópsia são na maioria das vezes, depleção de células caliciformes e abscessos de criptas. Os abscessos das criptas degeneram o epitélio glandular e comprometem a submucosa, podendo formas também "lesões em túnel".

 

Bibliografia

Yamada. Textbook of Gastroenterology, 4, Vol 2.

 

Langholz E, Munkholm P, Nielsen OH, et al. Incidence and prevalence of ulcerative colitis in Copenhagen county from 1962 to 1987. Scand J Gastroenterol 1991; 26:1247.

 

Monsén U, Sorstad J, Hellers G, Johansson C. Extracolonic diagnoses in ulcerative colitis: an epidemiological study. Am J Gastroenterol 1990; 85:711.

 

Prantera C, Davoli M, Lorenzetti R, et al. Clinical and laboratory indicators of extent of ulcerative colitis. Serum C-reactive protein helps the most. J Clin Gastroenterol 1988; 10:41.

 

Mowat C, Cole A, Windsor A, et al. Guidelines for the management of inflammatory bowel disease in adults. Gut 2011; 60:571.

 

Ferrante M, Henckaerts L, Joossens M, et al. New serological markers in inflammatory bowel disease are associated with complicated disease behaviour. Gut 2007; 56:1394.

 

Ruemmele FM, Targan SR, Levy G, et al. Diagnostic accuracy of serological assays in pediatric inflammatory bowel disease. Gastroenterology 1998; 115:822.

 

Sandborn WJ, Loftus EV Jr, Colombel JF, et al. Evaluation of serologic disease markers in a population-based cohort of patients with ulcerative colitis and Crohn's disease. Inflamm Bowel Dis 2001; 7:192.

 

Nikolaus S, Schreiber S. Diagnostics of inflammatory bowel disease. Gastroenterology 2007; 133:1670.

 

Jenkins D, Balsitis M, Gallivan S, et al. Guidelines for the initial biopsy diagnosis of suspected chronic idiopathic inflammatory bowel disease. The British Society of Gastroenterology Initiative. J Clin Pathol 1997; 50:93.

 

Davies NM. Toxicity of nonsteroidal anti-inflammatory drugs in the large intestine. Dis Colon Rectum 1995; 38:1311.

 

Langholz E, Munkholm P, Davidsen M, Binder V. Course of ulcerative colitis: analysis of changes in disease activity over years. Gastroenterology 1994; 107:3.

 

Solberg IC, Lygren I, Jahnsen J, et al. Clinical course during the first 10 years of ulcerative colitis: results from a population-based inception cohort (IBSEN Study). Scand J Gastroenterol 2009; 44:431.

 

Höie O, Wolters F, Riis L, et al. Ulcerative colitis: patient characteristics may predict 10-yr disease recurrence in a European-wide population-based cohort. Am J Gastroenterol 2007; 102:1692.

 

Ha CY, Newberry RD, Stone CD, Ciorba MA. Patients with late-adult-onset ulcerative colitis have better outcomes than those with early onset disease. Clin Gastroenterol Hepatol 2010; 8:682.

 

Sinclair TS, Brunt PW, Mowat NA. Nonspecific proctocolitis in northeastern Scotland: a community study. Gastroenterology 1983; 85:1.

 

Langholz E, Munkholm P, Davidsen M, et al. Changes in extent of ulcerative colitis: a study on the course and prognostic factors. Scand J Gastroenterol 1996; 31:260.

 

Ayres RC, Gillen CD, Walmsley RS, Allan RN. Progression of ulcerative proctosigmoiditis: incidence and factors influencing progression. Eur J Gastroenterol Hepatol 1996; 8:555.

 

Allison J, Herrinton LJ, Liu L, et al. Natural history of severe ulcerative colitis in a community-based health plan. Clin Gastroenterol Hepatol 2008; 6:999.

 

Mutinga ML, Odze RD, Wang HH, et al. The clinical significance of right-sided colonic inflammation in patients with left-sided chronic ulcerative colitis. Inflamm Bowel Dis 2004; 10:215.

 

Conecte-se

Feed

Sobre o MedicinaNET

O MedicinaNET é o maior portal médico em português. Reúne recursos indispensáveis e conteúdos de ponta contextualizados à realidade brasileira, sendo a melhor ferramenta de consulta para tomada de decisões rápidas e eficazes.

Medicinanet Informações de Medicina S/A

Cnpj: 11.012.848/0001-57

info@medicinanet.com.br


MedicinaNET - Todos os direitos reservados.

Termos de Uso do Portal

×
×

Em função da pandemia do Coronavírus informamos que não estaremos prestando atendimento telefônico temporariamente. Permanecemos com suporte aos nossos inscritos através do e-mail info@medicinanet.com.br.