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Caso Clínico – Complicação pós-amputação

Autor:

Lucas Santos Zambon

Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.

Última revisão: 10/04/2015

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Quadro Clínico

         Paciente do sexo masculino, 37 anos, diabético insulino-dependente, mau aderente ao tratamento com hemoglobina glicada de 13%, há um mês foi submetido à amputação transmetatársica do pé esquerdo, e procura pronto-socorro com história de febre há 15 dias e saída de secreção purulenta pela ferida operatória.

         Na entrada o paciente encontrava-se consciente e orientado (Glasgow 15), corado, hidratado, eupneico, acinótico e anictérico. Ausculta cardíaca e pulmonar normais, propedêutica abdominal sem alterações. Em extremidades, diminuição de pulsos poplíteos bilateralmente, e membro inferior esquerdo com ferida operatória no pé com saída de secreção purulenta e celulite no entorno. O paciente foi internado e foi optado por realizar investigação adicional com exame de imagem para definir se havia infecção em tecidos mais profundos. Foi optado por realizar ressonância nuclear magnética do pé esquerdo, que podemos ver na imagem 1.

 

Imagem 1 – Ressonância Magnética do Pé

 

Diagnóstico e Discussão

         A descrição da ressonância é esta a seguir:

         Principal achado: osteomielite difusa dos ossos do médio pé acometendo os cotos metatarsais, os cuneiformes, o cuboide e o navicular. Associa-se a acentuado edema e realce dos planos musculoadiposos adjacentes, com algumas pequenas coleções laminares, destacando-se a maior com 1,5 x 1,0 x 1,0 cm na face plantar lateral subjacente ao calcâneo. Algumas destas coleções apresentam trajeto para a pele, observando-se ponto de fistulização para a face anterior distal do pé e para a face lateral do tornozelo;

         Outros achados: osteíte reacional da porção anteroinferior do calcâneo, sem sinais de osteomielite local. Demais estruturas ósseas com morfologia e sinal preservados; mínimo derrame articular tibiotalar. Tenossinovite dos fibulares (infectada?) - uma das fístulas para a pele acima descritas, que se direciona para a face lateral do tornozelo, parece ter origem na sua bainha. A tenossinovite se estende proximalmente até a transição miotendínea, e é parcialmente avaliada neste estudo; tendinopatia do segmento retromaleolar do fibular curto com pequena lesão parcial.

         Como vemos, este paciente acabou por receber o diagnóstico de osteomielite no coto de amputação. Em casos como este de paciente diabético, é fundamental complementar o diagnóstico clínico de infecções distais de partes moles com exame de imagem. Não é incomum acharmos infecções mais profundas como osteomielite, miosites ou fasciítes.

         A escolha do exame de imagem deve ser feita com cautela. Realizar apenas uma radiografia é temerário, pois o exame tem apenas 14% de sensibilidade para diagnóstico de osteomielite, além de não avaliar partes moles. Os achados de osteólise e nova formação periostal podem aparecer apenas após duas semanas de infecção, e a radiografia acaba sendo mais útil em casos crônicos, onde é possível observar erosão cortical, reação periostal e esclerose.

         Daí a importância de realizar um exame como a ressonância magnética, que devido à grande sensibilidade (a maior entre as opções, com 90%, além de ter especificidade de cerca de 80%), consegue detectar osteomielite com apenas 3 a 5 dias do início da infecção. Por conta da sensibilidade, a ressonância tem inclusive um grande valor preditivo negativo para osteomielite, sendo possível descartar este diagnóstico se a história evolutiva do paciente já tem mais de uma semana. Em casos como este, em que o paciente que é diabético, e com infecção no pé, é o exame de escolha a ser feito. Obviamente, por não ser um exame altamente específico, vale lembrar que é necessário fazer o diferencial, sendo que os outros diagnósticos a serem considerados são: contusão/fratura, artropatia de Charcot, osteonecrose, artrite adjacente ou neoplasia.

         Tomografia computadorizada só deve ser feita se não for possível realizar a ressonância, tendo uma menor sensibilidade que esta. Exames de medicina nuclear podem ser úteis, mas os resultados sempre devem ser interpretados com cautela, sendo mais úteis em infecções agudas do que em crônicas. O exame de escolha é a cintilografia óssea de três fases, ou com gálio, ou com leucócitos marcados. Na cintilografia de três fases, o grande achado é a persistência de captação na terceira fase, o que diferencia de uma celulite que só capta nas primeiras duas. Deve-se sempre acoplar a interpretação à radiografia simples. Em casos onde a radiografia é normal, a cintilografia de três fases tem sensibilidade e especificidade de 95%. A cintilografia com gálio é boa para descartar osteomielite quando é negativa, mas ocorrem muitos falso-positivos. A maior limitação dos estudos de medicina nuclear é a presença de outra patologia óssea que não seja infecciosa, e podem ocorrer falso-negativos em áreas de isquemia óssea, algo que pode ocorrer no curso da osteomielite.

 

Bibliografia

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Gold RH, Hawkins RA, Katz RD. Bacterial osteomyelitis: findings on plain radiography, CT, MR, and scintigraphy. AJR Am J Roentgenol 1991; 157:365.

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