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Medicina Pré-Hospitalar

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 17/04/2017

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Medicina Pré-Hospitalar

 

O conceito de Medicina Pré-Hospitalar iniciou com a necessidade de transportar soldados feridos em campos de batalha até unidades médicas, sendo o primeiro serviço do gênero criado em 1865, em Cincinnati, Ohio, utilizando ambulâncias. Os serviços de emergência foram se desenvolvendo nos EUA na década de 1950, como uma tentativa de aprimorar os cuidados aos pacientes em um período de tempo o mais breve possível.

O atendimento pré-hospitalar (APH) deve oferecer o manejo personalizado para cada circunstância específica. Como o cuidado hospitalar, o APH depende do processo patológico (por exemplo, emergências médicas ou traumáticas) e dos fatores constitucionais do paciente (como idade e comorbidades). Em adição às medidas clínicas de manejo, é necessário otimizar a logística e a segurança do atendimento, levando em conta as considerações específicas para o local. Os locais de APH podem ser os mais diversos: urbanos, remotos, confinados, pós-situação de violência, desastre natural ou causado pelo homem.

O APH avançado começa com um sistema de regulação que otimiza a utilização dos recursos relativamente escassos de tratamento avançado para o evento raro (trauma grave ou evento médico com risco de vida). Uma das funções mais importantes do diretor dos serviços de emergência é desenvolver protocolos assistenciais, bem como criar fluxos de atendimento.

Além disso, se o APH deve envolver a intervenção na cena do evento ou realizar a simples transferência para um hospital é motivo de controvérsias. Essa divisão simplista está desaparecendo com a crescente compreensão de que existe uma série de intervenções significativas e urgentes que podem, e devem, ser realizadas com segurança e eficácia antes da chegada ao hospital, e as quais podem interromper processos patológicos e melhorar o desfecho do paciente.

Algumas intervenções podem ser realizadas durante a transferência para o hospital. De 15-32% das mortes por trauma em países de alta renda podem ser prevenidas com um bom APH. A integração subsequente de cuidados durante todo o percurso do paciente, o aviso pré-alerta e o rastreamento rápido, intervenções precoces significativas no departamento de emergência, salas de cirurgias e em outros lugares, são cruciais para maximizar a sobrevida do paciente.

O desenvolvimento de cuidados pré-hospitalares tem importantes diferenças internacionalmente. Nos EUA, o APH tem sido fornecido sobretudo por equipes de emergencistas, com frequência compostas de paramédicos. No Reino Unido, as organizações voluntárias, como a Associação Britânica de Atendimento Imediato, têm prestado apoio suplementar médico quando necessário.

Os médicos envolvidos nesse atendimento têm, em geral, uma formação de clínica geral; no entanto, o desenvolvimento da medicina de emergência e cuidados intensivos como especialidades próprias têm feito com que as emergências médicas e traumáticas agudas sejam colocadas sobre a responsabilidade desses profissionais. Estudos têm demonstrado que esses profissionais tem uma boa relação custo-benefício no cuidado dos pacientes.

Os EUA têm mantido um modelo predominantemente paramédico, enquanto os países da Europa, da Ásia e da Oceania (Bélgica, Bulgária, Croácia, República Tcheca, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Itália, Lituânia, Países Baixos, Noruega, Polônia, Portugal, Romênia, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Suécia, Austrália, Nova Zelândia, Japão, Rússia e China) têm adotado um sistema com o médico complementar ou modelo médico-paramédico para APH avançado.

Em alguns países (por exemplo, Holanda, Eslováquia e República Tcheca), os enfermeiros fazem parte de equipes pré-hospitalares. Na Noruega e na Finlândia, um time de resposta médico está disponível em nível nacional. No Reino Unido e na Austrália, a formação pré-hospitalar foi formalizada com o desenvolvimento da medicina de emergência pré-hospitalar como uma subespecialidade médica disponível para os formandos de medicina de emergência e anestesiologistas. Nos EUA, os serviços médicos de emergência tornaram a Medicina Pré-Hospitalar uma subespecialidade médica formal para médicos de todas as especialidades em 2010.

A otimização desses serviços dependem do tipo de formação e das habilidades dos paramédicos. As habilidades e a autonomia dos paramédicos variam em todo o mundo; em alguns países, é permitido aos paramédicos realizar intubação traqueal, inclusive utilizando medicações sedativas. Na equipe médico-paramédica, comum nos sistemas médicos de helicóptero de emergência do Reino Unido e da Austrália, cada membro apresenta habilidades específicas e não há uma cultura de médicos instruindo paramédicos.

Os benefícios desse sistema de atendimento médico-paramédico, em comparação com o atendimento paramédico exclusivamente, é controverso. Vários estudos têm demonstrado maior sobrevida com sistemas com base em helicóptero, muitos dos quais envolvem médicos assistentes. Apesar da ausência de estudos randomizados, a presença de médicos bem treinados em APH permite que técnicas tradicionalmente realizadas no ambiente intra-hospitalar possam ser realizadas de forma precoce e mais perto do local do incidente.

Na Holanda, os serviços médicos de emergência com helicóptero podem proporcionar um tratamento adicional acima da resposta do serviço de emergência padrão em 45% dos pacientes. Em Londres, a toracotomia pré-hospitalar é um procedimento de rotina para pacientes com trauma torácico penetrante em parada cardíaca, com 15% tendo uma bom desfecho neurológico. Nos EUA, o procedimento não tem muitos relatos de sucesso. Além das considerações relacionadas aos pacientes e à doença, que influenciam as decisões intra-hospitalares, fatores como ambiente, recursos, bem como fatores logísticos, também afetam a gestão pré-hospitalar.

 

Fatores que afetam o atendimento pré-hospitalar

 

O APH é feito por equipes com uma gama de habilidades que vão desde a capacidade de resgate até habilidades clínicas. O APH requer coordenação de pessoal e de comunicação rápida entre as diferentes equipes médicas e até centros de coordenação. O número de pessoal necessário e o nível de competência necessária são fatores importantes. A segurança do pessoal, a presença de equipes de backup (com médicos ou paramédicos) ou os recursos de salvamento e manejo da fadiga em missões prolongadas também devem ser planejados.

Uma das primeiras medidas a serem adotadas é o treinamento de triagem para situações com vítimas individuais ou múltiplas vítimas, com medidas para estabilização e adequação de transporte adequado para pacientes atendidos no sistema pré-hospitalar.

O Quadro 1 mostra exemplos de intervenções pré-hospitalares que foram introduzidas ou tiveram avanço nos últimos 30 anos.

 

Quadro 1

INTERVENÇÕES PRÉ-HOSPITALARES DESENVOLVIDAS NOS ÚLTIMOS 30 ANOS

               anestesia de emergência

               estabelecimento de via aérea cirúrgica

               sedação para procedimentos

               ventilação não invasiva

               toracostomia cirúrgica

               manejo inicial de fraturas com profilaxia com antibióticos

               acesso interósseo

               uso de medicamentos hemostáticos

               oclusão de balão endovascular de ressuscitação da aorta

               uso de oxigenação por membrana extracorpórea

               trombólise para infarto e AVC

               RCP de qualidade

               RCP mecânica

               realização de US de emergência

               reversão de intoxicações e sangramentos, como a reversão do efeito da warfarina

               uso de antídotos para casos de envenenamentos e intoxicações

AVC: acidente vascular cerebral; RCP: ressuscitação cardiopulmonar; US: ultrassonografia.

 

É necessário lembrar a importância de se considerar a segurança do pessoal e da equipe médica. Diferentemente do hospital, os pacientes podem ser encontrados em condições as mais diversas (em montanha, em comboios, em perigos físicos, em temperaturas extremas, em condições meteorológicas adversas, nas marés, sob baixa iluminação, entre outras). Embora existam princípios de segurança genéricos (por exemplo, o uso equipamento de proteção individual [EPI]), o treinamento específico do serviço de princípios de segurança é vital, sendo o treinamento continuado da equipe essencial.

Os serviços pré-hospitalares devem conter medidas como, por exemplo: fechar estradas em caso de acidentes; certificar-se de que os motores estão desligados e as chaves, fora da ignição; colocar traves de mão nos veículos; certificar-se de calçar os carros; para emergências ferroviárias, garantir que todos os trens (incluindo linhas adjacentes) estejam parados. Em acidentes envolvendo corrente elétrica, a eletricidade deve ser desligada, bem como deve-se verificar se não existe curto-circuito; antes de iniciar o atendimento, deve-se garantir a segurança pessoal e, posteriormente, colocar o paciente em ambiente seguro. Em situações de violência urbana (por exemplo, armas de fogo ou trauma com arma branca), deve-se assegurar o contato inicial com o serviço de polícia antes de entrar em cena.

O uso de EPIs específicos (como coletes balísticos ou arma branca) é fundamental, com vigilância no ambiente. Deve-se verificar se existe risco de quedas e altura; limitar a exposição; usar equipamentos de prevenção de quedas, garantir todo o pessoal e equipamentos com âncoras fixas ou de pontos; em acidentes sobre a água, coletes salva-vidas seguros e plano de backup para salvamento na água são essenciais.

Edifícios danificados, incidentes de aviação, resgate em montanha, e muitos outros tipos de incidentes apresentam riscos específicos que devem ser considerados. Em APH militar, o campo de batalha é o ambiente mais hostil, e a abordagem militar é pragmática. Cuidados de primeiros socorros em campo de batalha são ensinados a todos os soldados, marinheiros e aviadores. Cuidado sob fogo permite intervenções muito limitadas, tais como rolar o paciente para permitir a drenagem postural das vias aéreas, enquanto que a prioridade continua a ser sair do campo de tiroteio e mover a vítima para uma área mais segura. Uma avaliação metódica do paciente com intervenções que salvam vidas e a comunicação padronizada devem ser realizadas para garantir a evacuação de vítimas.

Outras preocupações são a preparação e a manutenção dos equipamentos para o avançado APH; o foco em logística é bastante diferente da assistência médico-hospitalar. O equipamento tem de ser adaptado e racionado para os serviços específicos necessários. A verificação regular de todos os equipamentos e veículos de transporte (na maioria dos serviços, no início de cada turno) também é essencial.

As patologias médicas, cirúrgicas e traumáticas agudas têm um curso dependente do tempo; assim, intervenções precoces simples com transferência imediata para cuidados especializados podem ter um efeito maior do que intervenções tardias potencialmente maiores. Esses fatores temporais poderiam ter um efeito mais significativo do que novas medicações ou intervenções, assim como o início da ressuscitação cardiopulmonar (RCP) de alta qualidade e de desfibrilação cardíaca precoce tem maior impacto que o uso de medicações como inibidores da glicoproteína Iib, que podem ser realizados em centros médicos especializados.

A reanimação pode ser iniciada por transeuntes; a intervenção de serviços médicos de emergência é normalmente necessária para o manejo avançado das vias aéreas. O tratamento de causas reversíveis de parada cardiorrespiratória, como redução da hemorragia com curativos oclusivos ou uso de talas nos membros, pode ser realizado. O manejo mais rápido avançado das vias aéreas é associado a menor perda neuronal e cardíaca.

Os benefícios da trombólise precoce para acidente vascular cerebral (AVC) resultaram no desenvolvimento de ambulâncias pré-hospitalares, na realização de tomografia computadorizada (TC) pré-hospitalar e em serviços de trombólise pré-hospitalar em Berlim e em partes da Noruega. Em cenários militares, a hemorragia catastrófica é a maior causa evitável de morte – sendo maior, inclusive, do que a perda de vias aéreas. Portanto, as prioridades no campo de batalha são realinhadas de tal modo que o controle de hemorragia catastrófica com torniquetes e curativos hemostáticos seja realizado antes das intervenções em vias aéreas e respiratórias.

Muitas intervenções podem ocorrer em APH. No hospital, muitos dos procedimentos seriam realizados por especialistas treinados (por exemplo, intubação por anestesistas ou médicos de emergência; toracotomia por cirurgiões cardiotorácicos). Em APH, um emergencista é necessário para realizar esses procedimentos com segurança. A modificação dessas intervenções podem ser necessárias no ambiente pré-hospitalar; as equipes devem ser treinadas com revisão dos componentes básicos. A realização de simulação repetida tem sido uma técnica eficaz.

No manejor dos pacientes, devem ser antecipados os riscos relacionados ao transporte. Assim, muitas vezes, uma entubação orotraqueal (EOT) pode ser realizada no indivíduo em condições limítrofes, em que poderia ser adiada devido à possibilidade de deterioração clínica durante o transporte, quando pode ser mais difícil a realização do procedimento.

As diretrizes pré-hospitalares sugerem que os pacientes com traumatismo cranioencefálico (TCE) sejam entubados se a sua pontuação na Escala de Coma de Glasgow (ECG) for <8, sem evidência de alto nível para apoiar essa recomendação; entretanto, em pacientes agitados e com risco considerável de vômito e aspiração, e lesão cerebral, ou na necessidade de se manter o paciente imóvel para realizar TC, é indicada a EOT se a pontuação na ECG for >8.

A intubação pré-hospitalar é um tema controverso, com vários estudos mostrando que, em sistemas de medicina de emergência com pouco treinamento, houve taxas de sucesso baixas e um elevado número de complicações. Estudos da Europa, do Reino Unido e da Austrália mostraram que serviços com equipe altamente treinada e bem estruturada, com realização de indução de sequência rápida de rotina, são, pelo menos, eficazes e seguros em realizar um procedimento hospitalar, e podem melhorar o prognóstico da lesão cerebral traumática (LCT).

A toracotomia pré-hospitalar também foi avaliada em estudos, e, em situações como no caso de pneumotórax hipertensivo, a realização precoce tem influência direta no prognóstico. Em um estudo retrospectivo, 18% dos pacientes submetidos à toracotomia pré-hospitalar sobreviveram até a alta, com boa evolução neurológica. A toracotomia pré-hospitalar é um exemplo de procedimento que deve ser simplificado para realização no ambiente pré-hospitalar. Isso pode ser feito com escalpe e tesoura.

Após toracotomias bilaterais no 5º espaço intercostal, anterior à linha axilar (que pode tratar um pneumotórax hipertensivo se essa é a causa da parada cardíaca), uma incisão na pele é realizada juntando as duas toracotomias ao longo do 5º espaço intercostal. Uma incisão torácica pode ser realizada para atravessar o esterno. Pode ser necessário realizar a abertura do pericárdio para resolver um tamponamento cardíaco. Para ser proficiente nesse procedimento, é necessário treinamento repetido e continuado.

O Quadro 2 apresenta os fatores que melhoram os desfechos em procedimentos como EOT.

 

Quadro 2

FATORES QUE MELHORAM OS DESFECHOS EM PROCEDIMENTOS COMO ENTUBAÇÃO OROTRAQUEAL

               verificação dos kits antes da expedição

               familiaridade do pessoal da equipe com os equipamentos

               formação abrangente com base em simulação

               padronização das medicações para uso, sobretudo com efeitos cardiovasculares mínimos

               otimização para o sucesso da primeira tentativa de EOT (posicionamento do paciente no chão, com melhores acesso e visualização possíveis pela equipe; preparo dos equipamentos essenciais; desenvolvimento de um plano de via aérea difícil)

               verificação pré-procedimento, com uso universal de capnografia

EOT: entubação orotraqueal.

 

As hemorragias e a LCT constituem os dois maiores contribuintes para a morte por trauma. O manejo de hemorragia externa é uma prioridade. O princípio fundamental no manejo dos pacientes, nesse caso, é a oclusão do fico de sangramento. O uso de torniquetes em membros é efetivo, e o sangramento em regiões como virilha, axila e pescoço pode ser controlado com agentes hemostáticos, como o ácido trannexâmico, que costuma ser indicado em pacientes com pressão arterial sistólica (PAS) <75mmHg. A estabilização dos ossos longos e o fechamento das fraturas da pelve são urgentes nesses casos.

Para hemorragias graves (por exemplo, uma fratura pélvica), as novas técnicas de oclusão aórtica (por exemplo, reanimação com oclusão do balão endovascular da aorta) estão sendo avaliadas; elas requerem ultrassonografia (US) e habilidades para colocação de cateter venoso central (CVC) e só podem ser realizadas por equipes altamente treinadas. Diversas outras intervenções, talvez mais simples, também estão sendo investigadas.

A reanimação com altos volumes de solução cristaloide foi substituída por hipotensão permissiva reduzindo a quantidade de reposição de fluidos. De qualquer forma, a obtenção de dois acessos venosos calibrosos é recomendada. A reposição de derivados do sangue, plasma, pode ser realizada no ambiente pré-hospitalar.

Para ser praticada com segurança, a realização de auditorias, a coleta de amostra pré-transfusão e a substituição requerem um sistema altamente organizado. É importante realizar a imobilização cervical por meio de critérios clínicos e a imobilização cervical com colocação de barreiras para movimentos laterais da cabeça. O manejo da dor também é fundamental, e não deve ser adiado para ser realizado em ambiente hospitalar.

O uso de ambulâncias com TC móveis permite que os pacientes sejam submetidos a TC do crânio para excluir um AVC hemorrágico (com imagens retransmitidas para um radiologista no hospital), podendo-se antecipar o início de trombólise na ambulância enquanto se aguarda a transferência do paciente para o hospital. Essa abordagem minimiza o tempo para a realização de intervenção.

Da mesma forma, em pacientes que tiveram uma LCT e estão recebendo medicações anticoagulantes, a realização da dosagem de coeficiente internacional normatizado (INR) pode ser realizada, bem como complexo protrombínico pode ser administrado, minimizando o crescimento do coágulo, o efeito de massa e a lesão cerebral.

A Medicina Pré-Hospitalar de emergência também pode fazer o cuidado avançado para emergências médicas dependentes do tempo, tais como asma aguda grave, estado de mal epilético (EME), parada cardíaca ou arritmia, envenenamento e intoxicações e hipotermia. O envio de equipes pré-hospitalares para emergências médicas é complexo, sendo de maior valor em locais remotos onde o serviço tem o valor de acelerar a transferência do paciente para o hospital.

O APH pode ser fornecido por transeuntes ou pela equipe dos serviços de emergência, tais como os serviços de polícia ou de bombeiros, porém é comumente efetuado por serviços de ambulância. Esses serviços especializados de ambulância lidam com situações ameaçadoras à vida e emergências médicas em uma base diária; assim, é fundamental desenvolver e manter as habilidades avançadas de uma maneira que não seria possível para os serviços de ambulância tradicionais.

No Reino Unido, a formação da maioria dos serviços médicos de helicóptero de emergência envolve simulações de alta fidelidade e de baixa fidelidade, observações de procedimentos pelos membros iniciantes da equipe, bem como administração e harmonização da equipe para expedições. Cada missão deve ser avaliada de maneira formal. Os serviços médicos de emergência em helicóptero costumam adotar técnicas de manejo dos recursos da tripulação da aviação, como listas de verificação pré-procedimento e cartões de ação na emergência. Tais sistemas visam minimizar erros e maximizar o conhecimento da situação.

No hospital, as decisões podem ser feitas com a avaliação de uma equipe de pessoas, o que, normalmente, não é possível no APH, e com menor quantidade de informação; sendo assim, auditorias regulares, com avaliações da morbidade e mortalidade, são importantes, com a realização de simulações para formação sobre as decisões clínicas em diferentes cenários, com vistas a melhorar o desempenho e o prognóstico. As dificuldades observadas podem ser usadas para refinar protocolos e fornecer uma memória de aprendizagem institucional.

Minimizar os tempos de chegada das equipes para atendimento de emergências que são dependentes do tempo e despachar o serviço correto para incidentes específicos, como parada cardíaca e AVC, são medidas vitais, mas têm sido pouco adotadas. Despachar um serviço especializado quando ele não é necessário pode impedir que esse mesmo serviço deixe de ir a um evento simultâneo em que ele é necessário. Para a parada cardíaca fora do hospital (PCFH), uma RCP assistida por telefone é uma estratégia. Em alguns centros de regulação, os médicos pré-hospitalares podem fornecer assistência on-line para equipes remotas em casos complexos.

Nas cidades, o objetivo principal é entregar a tripulação APH ao cenário. O paciente pode ser transferido por via rodoviária ou aérea. Em locais remotos, a transferência aérea é uma parte integrante do serviço. O uso de helicópteros permite o rápido acesso a regiões remotas e a chegada de equipes médicas de forma rápida em áreas urbanas, onde o congestionamento do tráfego causaria atraso. O avião mais adequado deve ser escolhido para um ambiente específico (considerando especificações como, por exemplo, tamanho, alcance, altura do disco e rotor de cauda).

Os helicópteros com pequeno diâmetro do rotor são mais apropriados para o pouso em áreas urbanas. Voos de helicóptero noturnos carregam riscos, mas a tecnologia apropriada (como o uso de óculos de visão noturna adicionados e melhorados, bem como a utilização de pilotos automáticos) permite bons desfechos. Os veículos de resposta rápida podem fornecer backups de helicóptero de serviços de emergência em que as considerações de tempo proíbem operações seguras, sobretudo em distâncias curtas. Nas Forças Armadas, helicópteros maiores permitem que o paciente receba tratamento durante o voo em vez de apenas se realizar a transferência.

A maioria dos serviços de helicóptero de emergência australianos, incluindo vários serviços de busca e salvamento pelo mundo, é capaz de acessar os pacientes em ambientes difíceis usando-se operações de guincho de helicóptero ou de longa linha. É extremamente importante o manejo do cenário de atendimento. Na chegada a um incidente, o médico pré-hospitalar tem a responsabilidade de garantir a segurança não só do paciente, mas também dos seus colegas e membros dos serviços de emergência, e ao público. O princípio fundamental é avaliar o risco e gerenciar a cena, visando a maior segurança possível. Especificidades variam com a natureza do ambiente e do incidente.

A transferência de pacientes para o centro mais adequado para o seu tratamento sem a necessidade de transferência secundária baseia-se na capacidade de diagnosticar as condições dos pacientes. Muitos países têm unidades de atendimento de AVC, unidades de pacientes cardiológicos, unidades de queimados e os principais centros de trauma. Idealmente, eles devem ser localizados no mesmo local. Manejo de pacientes com uma lesão cerebral em um centro neurológico especializado diminui a mortalidade para quase metade, em comparação com o cuidado em centros não especializados. Referenciar o paciente certo no lugar certo é vital, e mesmo que isso implique em pequenos atrasos na chegada ao hospital, esse procedimento está associado à melhora de desfecho dos pacientes.

Em acidentes de grande porte, são necessários a organização específica e o desenvolvimento e a criação de infraestruturas como uma estação central com as responsabilidades iniciais da equipe, com o objetivo principal de salvar vidas e aliviar o sofrimento. Em um acidente grave, o médico pode ter muitos papéis: apoio de serviço de ambulância para tomar decisão médica e desenvolvimento de infraestrutura; triagem de pacientes em áreas de compensação de vítimas para a prestação de cuidados médicos de alto nível no lado de pacientes como parte de uma equipe de cuidados. Todas as funções exigem muito pré-planejamento e treinamento.

Vários fatores tornam cada episódio de APH único, e pode ocorrer sobrecarga de informação. Deve-se considerar a limitação humana intrínseca na capacidade de processar várias demandas simultâneas. Em tais circunstâncias, a audição costuma ser uma das primeiras modalidades a serem ignoradas. Uniformizar procedimentos de modo a limitar a necessidade de comandos de voz é uma parte importante no treinamento de APH. As habilidades de manejo de recursos da tripulação também são essenciais. As equipes devem ser treinadas para minimizar o erro humano na sequência de acidentes.

Foram criados critérios para utilização de transporte aéreo para atendimento. Em Londres, por exemplo, são utilizados quando ocorre:

               queda de mais de dois andares de um edifício;

               vítima arrastada debaixo de um trem ou presa sob um veículo;

               vítima lançada a partir de um veículo;

               morte de outro ocupante do veículo;

               amputação proximal de pulso ou tornozelo.

O APH exige certas características como habilidade para liderar e coordenar os cuidados em uma situação de emergência em rápida mudança, muitas vezes em um ambiente difícil e com recursos limitados. A capacidade de identificar rapidamente as principais metas de reanimação e realizar as intervenções necessárias, muitas vezes com equipes não horizontais, é a chave para um bom departamento de emergência.

Embora os procedimentos operacionais padrão sejam utilizados pela maioria dos serviços de APH, sobretudo para procedimentos de alto risco, a amplitude de cenários clínicos que podem ocorrer em APH requer clínicos para a compreensão dos processos fisiopatológicos e adaptação dos procedimentos operacionais padrão para cada caso.

A utilização de testes point-of-care significa que exames como a dosagem de troponinas, gasometria, exames hematológicos, testes de coagulação e medidas avançadas de patologia química podem ser obtidos antes da transferência do paciente. Os exames com US portátil permitem aos médicos diagnosticar com precisão situações potencialmente graves. Atualmente, situações como a LCT, hematoma extradural e lesão axonal difusa são manejadas da mesma forma antes do hospital.

Diversos currículos de Medicina Pré-Hospitalar foram desenvolvidos no mundo. Com o reconhecimento recente, no Brasil, da especialidade de emergências, o treinamento pré-hospitalar será obrigatório àqueles que realizarem residência da medicina de emergência.

A disciplina de Emergências Clínicas da Universidade de São Paulo propõe um currículo de Medicina Pré-Hospitalar que inclui as seguintes habilidades e conhecimentos:

 

Metas:

I) aprender a organização e a estrutura dos serviços de emergência;

II) aprender métodos educacionais para paramédicos e socorristas;

III) compreender os princípios de operacionalização dos serviços de emergência;

IV) compreender os princípios básicos do manuseio de desastres;

V) compreender os princípios da triagem pré-hospitalar e despacho;

VI) aprender os princípios de pesquisa em APH;

VII) compreender as características médico-legais do APH.

 

Objetivos:

· participar ativamente do APH;

· descrever os componentes locais e sociais do APH;

· demonstrar habilidade em usar todos os elementos de comunicação do APH;

· demonstrar habilidade em prover educação para os membros atuantes do APH;

· demonstrar familiaridade com a metodologia de pesquisa em APH e o manuseio de desastres;

· discutir as características médico-legais do APH;

· participar de programas de qualidade em APH;

· participar em transporte terrestre e aeromédico de pacientes;

· discutir o desenvolvimento de protocolos em APH;

· discutir o conceito básico de múltiplas vítimas;

· discutir o conceito básico do manuseio de desastres;

· discutir o processo de notificação em todos os níveis quando do manejo em desastres;

· descrever os ambientes encontrados no APH e o comportamento diante deles.

 

Referências

 

1-Wilson MH, et al. Pre-hospital emergency medicine. Lancet 2015; 386: 2526-2534.

2- Van Schuppen H, Bierens J. Understanding the prehospital physician controversy. Step 2: analysis of on-scene treatment by ambulance nurses and helicopter emergency medical service physicians. Eur J Emerg Med 2014 publicada setembro 2014.

3- American College of Surgeons Committee on Trauma. Prehospital trauma care. In: Resources for Optimal Care of the Injured Patient. American College of Surgeons, Chicago, IL 2006.

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