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Neuropatia Autonômica Diabética

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 01/10/2021

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A neuropatia autonômica diabética (NAD) é uma forma comume debilitante de neuropatia que pode envolver múltiplos órgãos. A NAD pode serdetectada na maioria dos pacientes com diabetes com testes neurofisiológicos,mas é classificada como subclínica ou clínica, dependendo da presença ou daausência de sintomas. Um amplo espectro de manifestações que afetam muitossistemas de órgãos diferentes pode ocorrer, incluindo os sistemascardiovascular, gastrintestinal, geniturinário, pupilar, sudomotor eneuroendócrino.

 

Controle Glicêmico e Redução de Fatores de Risco

 

A terapia para NAD pode ser difícil. Portanto, édesejável prevenir essa complicação ou, uma vez estabelecida, retardar aprogressão da doença. O controle glicêmico inadequado e os fatores de riscovascular parecem estar associados ao desenvolvimento de neuropatia diabética. Essaobservação é corroborada pelos resultados do estudo EURODIAB, que descobriu quea incidência de neuropatia estava associada a controle glicêmicoinsatisfatório, níveis elevados de triglicérides, índice de massa corporalelevado, tabagismo e hipertensão. No entanto, os efeitos desses fatores derisco na progressão da NAD são menos claros.

Os resultados de um grande estudo observacionalprospectivo sugerem que a incidência de NAD está diminuindo no diabetes tipo 1,potencialmente refletindo melhora no controle dos fatores de risco. Além disso,os resultados de estudos randomizados sugerem que a terapia intensiva reduz oinício e a progressão da neuropatia autonômica:

 

- No estudo Diabetes Control and Complications Trial(DCCT), a terapia intensiva com insulina em indivíduos com diabetes tipo 1reduziu a incidência de neuropatia autonômica cardiovascular (NAC) em 53%, e obenefício da terapia intensiva anterior persistiu por até 14 anos.

- Em indivíduos com diabetes tipo 2, a eficácia potencialda terapia intensiva combinada em pacientes com diabetes tipo 2 e microalbuminúriafoi examinada no estudo Steno-2. A terapia intensiva reduziu a incidência de doençamicrovascular e macrovascular e a progressão para NAD. Esse benefício foisustentado em uma média de 13,3 anos. Em contraste, não houve desaceleração daprogressão da neuropatia periférica.

 

Embora ocontrole excessivo da pressão arterial e dos níveis de glicemia deva serevitado devido ao risco de hipoglicemia e hipotensão, deve-se tentar realizar omelhor controle glicêmico possível para evitar progressão da doença. No estudoACCORD, o controle glicêmico resultou em reduções modestas nos sintomas deneuropatia, mas em nenhuma redução significativa no risco do desenvolvimento deneuropatia após cinco anos. Controle adequado da dislipidemia também podemelhorar discretamente a neuropatia diabética.

Em alguns casos, a melhora rápida no controle glicêmicoem pacientes com hiperglicemia crônica pode estar associada ao desenvolvimentode complicações microvasculares do diabetes, incluindo neuropatia autonômica eperiférica. Descrita como neuropatia induzida pelo tratamento do diabetes, agravidade da neuropatia foi associada à magnitude da mudança na hemoglobinaglicada (HbA1C) ao longo de três meses. O risco de complicações neuropáticasfoi de aproximadamente 10% se a hemoglobina A1C diminuiu em mais de 3 pontospercentuais em três meses e excedeu 50% se a hemoglobina A1C diminuiu em 5 oumais pontos em três meses. Esses achados sugerem que, em indivíduos comhiperglicemia crônica, o alcance de uma meta de hemoglobina A1C (como sugeridopelos ensaios DCCT e Steno-2) deve ocorrer gradualmente e não deve exceder umaalteração de 3 pontos na hemoglobina A1C em três meses. Esse achado é maiscomum em pessoas com diabetes tipo 1, provavelmente devido à rápida mudança nocontrole glicêmico que pode ocorrer com o uso de insulina. Com base nos dadoslimitados disponíveis, hiperglicemia crônica por um ano ou mais pode sernecessária para evitar neuropatia associada ao tratamento do diabetes.

O desenvolvimento paralelo de retinopatia e neuropatia nocontrole glicêmico agudo sugere um processo microvascular inflamatório. Umaexplicação alternativa é que o agravamento da neuropatia é um epifenômenoassociado, mas não causado por controle glicêmico excessivamente rápido. Estudosprospectivos controlados seriam úteis para resolver a relação entre o controleglicêmico e o desenvolvimento de neuropatia.

 

Neuropatia Autonômica Cardiovascular

 

A NAC é definida como o comprometimento do controleautonômico do sistema cardiovascular. Está associada a várias anormalidades nafunção cardiovascular autonômica. São manifestações características:

- hipotensãopostural: definida por queda postural de 20 e 10 mmHg, respectivamente, daspressões sistólica e diastólica do paciente;

- aumento de frequênciacardíaca;

- diminuiçãoda variação da frequência cardíaca com o exercício.

 

Alguns testesfuncionais podem ser realizados nesses pacientes, como o tilt table testpara pacientes com importante hipotensão postural sintomática. Os pacientespodem ainda apresentar hipoaldosteronismo hiporreninêmico com hipercalemia. Testes de reflexo cardiovascular podemdetectar doença subclínica, que pode ter implicações prognósticas.Clinicamente, o comprometimento da função autonômica está associado ataquicardia de repouso, intolerância ao exercício, hipotensão ortostática,síncope, instabilidade cardiovascular intraoperatória, infarto do miocárdio silencioso,isquemia e aumento da mortalidade.

A prevalência de NAC varia consideravelmente, o quereflete os testes utilizados, os critérios diagnósticos e a população estudada.O estudo ADDITION relatou incidência anual de NAC de 1,8% em indivíduos comdiabetes bem controlado.

A manifestação clínica mais precoce da NAC pode ser taquicardiaem repouso. O aumento da frequência cardíaca em repouso é devido à atividadenervosa simpática cardíaca sem oposição. Conforme a neuropatia autonômicaprogride, a frequência cardíaca diminui gradualmente e, em casos avançados, semanifestará como frequência cardíaca fixa. A intolerância ao exercício ocorregeralmente devido ao aumento deficiente do débito cardíaco resultante damodulação simpática inadequada. Pode ocorrer taquicardia sinusal persistente, epode não haver variação na frequência cardíaca durante atividades quenormalmente aumentam a variabilidade da frequência cardíaca, como respiraçãoprofunda e a manobra de Valsalva.

Um interesse considerável centrou-se no papel daatividade elétrica miocárdica anormal na arritmogênese, incluindo, por exemplo,prolongamento QT e repolarização ventricular alterada. No estudo decomplicações em pacientes com diabetes tipo 1 do EURODIAB, a prevalência deprolongamento do intervalo QT foi de 16%.

A denervação cardíaca pode ocorrer em pacientesdiabéticos com neuropatia autonômica avançada. É caracterizada por frequênciacardíaca fixa, de 80 a 90 batimentos por minuto, e está associada a infarto domiocárdio indolor e morte súbita.

A hipotensão ortostática é definida como queda na pressãoarterial de = 20 mmHg sistólica ou = 10 mmHg diastólica dentro de 3 minutosapós passar de uma posição supina para um teste de inclinação vertical ouposição em pé. A hipotensão ortostática resulta de uma combinação de denervaçãosimpática cardiovascular central e periférica, refletindo a falha davasoconstrição nos leitos vasculares esplâncnicos e periféricos. Em sua formaincapacitante mais grave, a hipotensão ortostática pode causar quedassignificativas na pressão arterial, resultando em síncope. Dados retrospectivossugerem que a presença de hipotensão ortostática está associada a complicaçõesmicrovasculares e macrovasculares do diabetes. A presença de hipotensãoortostática em pacientes com diabetes está associada a aumento significativo namortalidade em 10 anos, mas felizmente a hipotensão ortostática nesses pacientesé relativamente rara, com a maioria dos pacientes apresentando sintomas maisleves, passíveis de intervenções terapêuticas. São características desses pacientes:

 

- Perda da variação diurna da pressão arterial, comhipertensão supina ocorrendo à noite. Isso também pode ocorrer em menor grau empacientes diabéticos sem neuropatia. Além disso, o monitoramento ambulatorialda pressão arterial de 24 horas detectou hipertensão em mais de 50% dosindivíduos com diabetes tipo 2 e NAC.

- É possível que a variabilidade diária dos sintomaspossa ser exacerbada pela terapia com insulina, que pode provocar hipotensão empacientes diabéticos e não diabéticos com insuficiência autonômica, embora arelevância clínica disso para a maioria dos pacientes com diabetes não seja conhecida.

- Hipotensão pós-prandial é uma situação em que aspressões sanguíneas sistólica supina e em pé podem cair profundamente após asrefeições. O mecanismo de hipotensão pós-prandial na NAD não é claro. Tanto acompensação simpática inadequada para o acúmulo de sangue induzido pelarefeição na circulação esplâncnica quanto a ação dos peptídeos intestinaisvasodilatadores podem contribuir. O hematócrito também deve ser verificado, umavez que a anemia pode resultar de deficiência de eritropoietina secundária àdenervação renal, que pode exacerbar os sintomas ortostáticos.

 

Taquicardia postural sem queda na pressão arterial poderesultar em sintomas posturais significativos de tontura, pré-síncope. Embora asíndrome de taquicardia postural seja uma doença heterogênea, seu diagnósticonão deve ser feito em pacientes com diabetes; um diagnóstico mais adequadoseria NAD. A taquicardia postural é tipicamente observada em pacientes comdiabetes que apresentam alta frequência cardíaca em repouso devido à neuropatiacardíaca vagal com atividade nervosa simpática cardíaca sem oposição.

Duas metanálises em pacientes diabéticos descobriram quea NAC está associada a aumento de mortalidade. Em uma metanálise, a mortalidadede indivíduos sem neuropatia autonômica ao longo de 5,5 anos foi de aproximadamente5%, mas aumentou para 27% com testes de reflexo cardiovascular anormais. Noestudo ACCORD, ao longo de um acompanhamento médio de 3,5 anos, os indivíduoscom NAC no início do estudo tiveram mortalidade geral e taxas de mortalidadecardiovascular que foram aproximadamente 1,6 a 2,1 e 1,9 a 3,0 vezes maiores,respectivamente, em comparação com aqueles sem NAC, mesmo após ajuste parafatores de risco cardiovascular basais.

Estudos longitudinais em pacientes com NAD encontraramtaxas de mortalidade ao longo de cinco anos variando entre 16 e 53% (média deaproximadamente 30%). Embora a maioria das mortes resulte de doença macrovasculare microvascular associada, a parada cardiorrespiratória secundária à denervaçãoautonômica tem sido implicada em alguns pacientes diabéticos. No estudoEURODIAB, com mais de 2.700 indivíduos com diabetes tipo 1, foi relatada taxade mortalidade anual de 5 por 1.000 pessoas-ano, com neuropatia periférica(razão de risco padronizada: 1,88) e neuropatia autonômica (razão de risco: 2,40)sendo os marcadores de risco mais importantes para mortalidade.

Existem vários mecanismos potenciais pelos quais a NAD podeaumentar as taxas de mortalidade. Em primeiro lugar, vários estudos relatarampercepção diminuída de isquemia cardíaca em indivíduos com diabetes. Em segundolugar, há redução da resposta cardiovascular a estressores fisiológicos, comocirurgia ou infecção. Existe associação entre NAD e arritmias cardíacas devidoa alterações no intervalo QT. As alterações no equilíbrio entre os sistemassimpático e parassimpático também podem ser pró-arritmogênicas. Por fim, otecido miocárdico desnervado que tem áreas focais de reinervação podeapresentar risco aumentado de arritmia. Segundos dados dos estudos DCCT e DCCT/EDIC,pacientes com diabetes tipo 1 diagnosticados com NAC tiveram incidência maiorde eventos cardiovasculares em um período de 20 anos.

Estudos que relataram as taxas de mortalidade mais altasenvolveram tipicamente pacientes sintomáticos com anormalidades do sistemanervoso autônomo. A hipotensão postural parece predizer pior prognóstico.

A presença de NAC está associada a desfechos cardíacosadversos e isquemia silenciosa, com pacientes com NAC apresentando frequência significativamentemaior de isquemia miocárdica silenciosa do que pacientes sem NAC. A presença deNAC aparentemente está associada a piores desfechos renais e cerebrovasculares,conforme sugerido por alguns estudos. Em um estudo que incluiu 1.523 pacientescom diabetes acompanhados por 16 anos, tanto frequência cardíaca mais alta emrepouso quanto variabilidade mais baixa da frequência cardíaca foram associadasa risco aumentado de desenvolver doença renal em estágio final.

Há evidências de que a apneia do sono pode contribuirpara o aumento da mortalidade, complicando a NAD. Em indivíduos obesos, a NAD estáassociada a risco aumentado de apneia obstrutiva do sono em comparação comoutros indivíduos obesos com ou sem diabetes.

 

Exames Complementares

 

A neuropatia autonômica subclínica é frequentementeencontrada em associação com polineuropatia simétrica distal. As medidasconvencionais da função autonômica usam métodos indiretos baseados nos reflexoscardiovasculares, que podem detectar anormalidades precoces na integridadeparassimpática, mas são relativamente insensíveis aos déficits adrenérgicossimpáticos.

A seleção de testes para avaliar a função autonômicatornou-se padronizada e deve incluir medidas de função parassimpática,simpática adrenérgica e simpática colinérgica. Não há evidências de que algumteste tenha superioridade diagnóstica, embora seja raro que um único teste sejaadministrado.

Um diagnóstico confiável de NAC requer anormalidades emmais de um teste, que avalia diferentes membros do arco reflexo. A avaliaçãodireta da integridade simpática cardíaca é possível com análogos radiomarcadosde norepinefrina, que são ativamente captados pelos terminais nervosossimpáticos do coração. O uso de cintilografia com 123-I-metaiodobenzilguanidina(MIBG, iobenguane I-123) ou 11-C-hidroxiefedrina permite a avaliação nãoinvasiva do padrão de inervação simpática do coração. Esses testes têm utilidadeclínica limitada porque são caros e não estão amplamente disponíveis. Noentanto, fornecem informações úteis devido à sua maior sensibilidade paradetectar graus mais sutis de NAD do que é possível pelo teste de reflexo cardiovascular.

 

Tratamento

 

O tratamento visa principalmente prevenir a progressão dadoença. Os medicamentos que podem causar ou agravar a neuropatia devem serinterrompidos, se possível. Os fatores de risco modificáveis ??incluemhiperglicemia, tabagismo, hipertensão e hiperlipidemia. Há evidências de que osindivíduos que têm como alvo fatores de risco modificáveis ??apresentamprogressão mínima da doença em um período de três anos. Uma nota de advertênciavem dos resultados do estudo ACCORD, no qual o controle glicêmico intensivo foiassociado ao aumento da mortalidade no diabetes tipo 2.

Intervenções adicionais devem incluir um programa paraaumentar a aptidão cardiovascular geral e controle de peso. No entanto, umestudo de estresse cardíaco é sugerido antes que esse programa seja iniciado.Em indivíduos com diabetes tipo 2, há um efeito positivo da perda de peso nafunção autonômica, embora não esteja claro se isso se traduz em um resultadoautonômico clinicamente significativo.

Além da prevenção da progressão da doença, os pacientescom sintomas associados à NAD podem requerer intervenção terapêutica adicional.Naqueles pacientes com disfunção adrenérgica simpática e tontura posturalassociada, a avaliação inicial deve incluir revisão detalhada e remoção dequaisquer medicamentos que possam piorar a hipotensão ortostática. A ingestãode líquidos deve ser aumentada, e a ingestão de sal, liberalizada.

A terapia farmacológica inclui:

- Aumentar o volume plasmático com o agentemineralocorticoide fludrocortisona (0,1 a 0,4 mg/dia) e uma dieta rica em sal. Esseregime pode ser útil em casos mais graves, mas pode causar hipertensão ou edemaperiférico. Doses mais altas de fludrocortisona aumentam o risco de efeitos colateraissem evidência de melhora adicional dos sintomas, portanto não são recomendadas.

- A midodrina, um agonista alfa-adrenérgico, tem sidousada para aumentar a pressão arterial e reduzir os sintomas de hipotensãoortostática. Esse medicamento pode causar hipertensão supina severa, portantoos pacientes não devem usá-lo até 6 horas antes de se deitarem.

- A droxidopa, um pró-fármaco de norepinefrinaadministrado por via oral, recebeu aprovação nos Estados Unidos para sintomasassociados à hipotensão ortostática neurogênica. Há pouca experiência publicadacom o uso de droxidopa em pacientes com NAD e hipotensão ortostática.

- O octreotide (50 mcg 3 vezes ao dia, por viasubcutânea), um análogo da somatostatina, pode ser útil em pacientes diabéticoscom sintomas refratários e sintomáticos de hipotensão postural ou pós-prandial.Ele aumenta agudamente a pressão arterial apenas em pacientes com insuficiênciaautonômica, mas tende a ser mal tolerado porque pode exacerbar a disfunçãointestinal e causar flutuações no controle glicêmico.

- O tratamento da anemia (incluindo o uso criterioso deeritropoietina), se presente, também pode ser útil.

- Fazer mudanças na postura lentamente, ou seja, ficar depé lentamente.

- Elevar a cabeceira da cama em 10 a 20 graus.

- Enrijecer as pernas cruzando-as enquanto estiverativamente em pé sobre as duas pernas. Esse procedimento aumentou o débitocardíaco em 16% e a pressão arterial sistêmica em 13%. Portanto, pode minimizaros sintomas posturais.

- Realizar dorsiflexão dos pés ou exercícios de preensãomanual antes de ficar de pé.

 

Medidas destinadas a aumentar o tônus ??vascularperiférico (como meias e macacões de gravidade) são frequentemente tentadas. Elaspodem, entretanto, ser ineficazes, uma vez que o acúmulo de sangueprovavelmente ocorre no grande leito vascular esplâncnico. Além disso, indivíduoscom neuropatia periférica diabética podem evoluir com úlceras de pressão.

A hipertensão supina (geralmente à noite) écaracterística da neuropatia autonômica e pode refletir um desequilíbriosimpático/parassimpático. Pacientes ocasionais apresentam hipertensão supina gravecombinada com hipotensão ortostática. Por questões de segurança, o tratamentoda hipotensão com expansão de volume (por exemplo, fludrocortisona) eestimulação simpática (por exemplo, midodrina) geralmente tem precedência. Noentanto, essa abordagem pode piorar a hipertensão supina. Para minimizar ahipotensão diurna, agentes anti-hipertensivos de curta ação, como captopril ouhidralazina, podem ser administrados antes de dormir, mas os pacientes precisamter cuidado ao sairem da cama à noite.

 

Sistema Sudomotor Periférico e Neuropatia Vasomotora

 

O sistema colinérgico simpático periférico regula afunção do suor e a termorregulação. Na neuropatia periférica, pode ocorrer perdada função do suor na distribuição de meias e luvas. Clinicamente, isso costuma semanifestar como hiperidrose proximal compensatória. A perda progressiva dafunção sudomotora pode resultar em comprometimento termorregulatório ehipertermia. A disfunção do nervo autonômico periférico pode se manifestar comoalterações na textura da pele, prurido, edema, proeminência venosa, formação decalos, perda de unhas e anormalidades na sudorese dos pés. A associação entre adenervação autonômica periférica e os efeitos resultantes na vasculaturaperiférica foi reconhecida já em 1941, quando foi observado que os pacientesdiabéticos com neuropatia tinham reflexos vasomotores periféricos semelhantesaos dos pacientes não diabéticos após simpatectomia. Essa perda de inervaçãovascular simpática resulta em alto fluxo sanguíneo periférico através de shuntsarteriovenosos e controle vascular de reflexo local anormal.

A neuropatia autonômica periférica pode ser um fator contribuintepara o desenvolvimento de ulceração do pé. Acredita-se que a neuropatiaautonômica periférica contribua para várias outras anormalidades:

- sintomas como dor, pulsação, aperto, cãibras, pele secae prurido;

- edema periférico, que geralmente está associado aulceração do pé e cicatrização deficiente de feridas;

- o desenvolvimento da artropatia de Charcot(neuroartropatia) ? nessa condição, as fraturas podem ocorrer espontaneamenteou com estresse mínimo e são acompanhadas de desorganização óssea progressivacom risco aumentado de ulceração secundária.

 

O exame quantitativo do reflexo do axônio sudomotor(QSART) pode ser usado para a detecção de denervação simpática periféricaprecoce. A avaliação da biópsia de pele tem sido cada vez mais utilizada. Alémdisso, a avaliação da densidade das fibras nervosas das glândulas sudoríparasfoi estudada como um marcador de neuropatia sudomotora. Apesar da crescenteaceitação como um marcador útil de neuropatia de pequenas fibras, o papelclínico da avaliação das fibras nervosas intraepidérmicas da pele para aquantificação da NAD permanece obscura.

A medição das respostas vasculares no pé é um métodoalternativo para detectar a denervação simpática periférica. A vasoconstriçãoinduzida por calor (em vez da vasodilatação normal) reflete a denervaçãovascular e está presente apenas nos pacientes com neuropatia autonômica esomática. Acredita-se que o comprometimento da dilatação do reflexo axônicolocal reflita a depleção de neuropeptídeos vasoativos locais. Embora aneuropatia autonômica periférica se correlacione mal com a disfunção do nervomotor, a velocidade de condução do nervo motor é diminuída em pacientes comoutras evidências de danos às fibras pequenas, particularmente perda desensação térmica.

A terapia da neuropatia autonômica periférica centra-seprincipalmente no cuidado dos pés. Modificações no estilo de vida, como resfriarroupas e evitar ambientes quentes, podem melhorar os sintomas.

 

Neuropatia Autonômica Gastrintestinal

 

As principais manifestações gastrintestinais da NAD incluemdoença do refluxo gastresofágico (DRGE), gastroparesia e diarreia crônica. Agastroparesia é uma síndrome de esvaziamento gástrico retardado na ausência deobstrução mecânica com sintomas de náusea, vômito, saciedade precoce, distensãoabdominal e/ou dor abdominal superior. O esvaziamento gástrico para líquidos esólidos geralmente não se torna mais demorado no diabetes tipo 2 de longoprazo, e o esvaziamento gástrico anormalmente lento de sólidos pode melhorar.

A verdadeira prevalência de gastroparesia em pacientescom diabetes é desconhecida, e as estimativas de prevalência têm variadoamplamente. Embora nos primeiros estudos em centros médicos terciários até 60%dos pacientes com diabetes melito tipo 1 de longa data e sintomas gastrintestinaisapresentassem gastroparesia diabética, esses estudos antecederam o uso detratamento intensivo com insulina. Em um estudo de base populacional, aincidência de 10 anos de gastroparesia sintomática em pacientes com diabetestipo 1 e tipo 2 foi de 5% e 1%, respectivamente. Os fatores de risco paragastroparesia em pacientes com diabetes incluem a presença de complicações demicroangiopatia, neuropatia, nefropatia, sexo feminino, obesidade, controleglicêmico deficiente, duração do diabetes por mais de 10 anos e presença deoutras complicações diabéticas.

O efeito da hiperglicemia aguda no esvaziamento gástricoem pacientes com diabetes tipo 2 não foi bem estudado, embora tanto oesvaziamento de líquidos quanto a fase de latência para sólidos pareçam estarrelacionados à concentração de glicose no sangue. A desaceleração doesvaziamento gástrico associada à elevação da concentração de glicose pareceser um fator importante. A hiperglicemia aguda também afeta a sensibilidade dotrato gastrintestinal. No esôfago, o limiar de percepção da distensão do balãoé reduzido por elevações agudas da concentração de glicose no sangue, mesmodentro da faixa fisiológica.

A gastroparesia diabética geralmente é suspeitada empacientes com náuseas, vômitos, dor abdominal, saciedade precoce, plenitudepós-prandial, distensão abdominal ou controle glicêmico deficiente, apesar dotratamento. O diagnóstico é estabelecido pela evidência de esvaziamentogástrico retardado na cintilografia na ausência de lesão estrutural obstrutivano estômago ou intestino delgado por endoscopia ou imagem.

A gastroparesia diabética não é progressiva, e otratamento é direcionado ao alívio dos sintomas. O tratamento primário dagastroparesia inclui melhora do controle glicêmico, modificação da dieta,administração de agentes antieméticos e procinéticos, tratamento endoscópico e,por fim, cirurgia em pacientes sintomáticos. As terapias baseadas em incretinas,como pramlintida e análogos do GLP-1 (por exemplo, exenatida), que retardam oesvaziamento gástrico, devem ser descontinuadas antes de instituir o tratamentomédico para gastroparesia.

A DRGE pode ser causada por neuropatia autonômica, comdiminuição da pressão do esfincter esofágico inferior (EEI), aumento dorelaxamento transitório do EEI devido à hiperglicemia, função de depuraçãoprejudicada do esôfago tubular ou esvaziamento gástrico retardado. Os sintomasmais comuns da DRGE são azia (pirose) e regurgitação. Outras manifestaçõesextraesofágicas da DRGE incluem broncoespasmo, laringite e tosse crônica.Disfagia para líquidos e/ou sólidos raramente é observada no diabetes melito.

Os sintomas de gastroparesia incluem náusea, vômito,saciedade precoce, distensão abdominal e/ou dor abdominal superior. Pacientescom gastroparesia diabética também podem apresentar sintomas que não estãodiretamente relacionados à gastroparesia, mas são decorrentes de complicaçõesdo controle glicêmico deficiente. O diagnóstico de gastroparesia diabética é estabelecidopela evidência de esvaziamento gástrico retardado na cintilografia na ausênciade lesão estrutural obstrutiva no estômago ou no intestino delgado porendoscopia ou imagem. Diferentemente de outros sintomas de neuropatiaautonômica, a gastroparesia pode mostrar alguma melhora com controle glicêmicoestável. Como já comentado, o tratamento primário da gastroparesia diabéticainclui melhora do controle glicêmico, modificação da dieta e administração deagentes antieméticos e procinéticos em pacientes sintomáticos. O uso daeritromicina em dose de 250 mg a cada 6 horas pode acelerar o esvaziamentogástrico ao ligar-se a receptores de motilina no trato gastrintestinal.

Diarreia, e raramente esteatorreia, podem ocorrer empacientes diabéticos, particularmente naqueles com doença avançada. Apatogênese da diarreia não é clara, mas vários mecanismos subjacentes podemestar envolvidos. A diarreia é aquosa e indolor, ocorre à noite e pode estarassociada a incontinência fecal.

A neuropatia autonômica intestinal também pode alterardiretamente o transporte de água na mucosa e os fluxos de íons, resultando nasecreção de fluido intestinal. O supercrescimento bacteriano no intestino delgado(SIBO) pode ocorrer pela motilidade anormal do intestino delgado. A diarreia ea absorção deficiente de nutrientes no SIBO resultam de má digestão no lúmenintestinal ou de má absorção ao nível da membrana das microvilosidadesintestinais devido a danos nos enterócitos.

Medicamentos como metformina, inibidor dealfa-glucosidase, agonista do peptídeo semelhante ao glucagon (GLP)-1 einibidores da dipeptidil peptidase-4 (DPP4), além de adoçantes artificiais,podem causar diarreia em pacientes com diabetes melito. Outras causas raras dediarreia incluem insuficiência pancreática exócrina e doença celíaca, sendo a últimamais comum no diabetes tipo 1.

O manejo da diarreia pelo diabetes inclui medidas geraiscomo hidratação e correção da deficiência de eletrólitos e nutrientes,tratamento sintomático da diarreia com antidiarreicos e tratamento da causasubjacente (por exemplo, crescimento bacteriano no intestino delgado). Osagentes antidiarreicos podem ser usados ??para controlar os sintomas dadiarreia inibindo o peristaltismo, prolongando o tempo de trânsito e reduzindoo volume fecal (por exemplo, loperamida 2 a 4 mg 4 vezes ao dia, codeína 30 mg 4vezes ao dia ou difenoxilato 5 mg 4 vezes ao dia).

A clonidina diminui o trânsito intestinal e a secreção dointestino delgado, mas seu uso é limitado devido a efeitos adversos (porexemplo, hipotensão ortostática, esvaziamento gástrico retardado). O ocreotide(50 a 75 mcg por via subcutânea 2 a 3 vezes ao dia) pode ser usado em pacientescom diarreia diabética, mas há pouca evidência. Seu uso pode ser complicado porepisódios recorrentes de hipoglicemia que podem estar relacionados à secreçãoreduzida de hormônios contrarregulatórios. Além disso, o octreotide pode inibira secreção pancreática exócrina e, portanto, agravar a esteatorreia.

 

Neuropatia Autônoma Geniturinária

 

A neuropatia autonômica geniturinária diabética éresponsável por várias síndromes, incluindo disfunção da bexiga, ejaculaçãoretrógrada, disfunção erétil e dispareunia (devido à diminuição da lubrificaçãovaginal). Os sintomas podem estar presentes em até 50% dos indivíduos comdiabetes. A disfunção erétil está associada ao desenvolvimento de doençascardiovasculares. A disfunção da bexiga diabética inicialmente se apresentacomo diminuição na capacidade de sentir a bexiga cheia, secundária à perda dainervação aferente autonômica. Essa anormalidade leva a micção infrequente,enquanto o envolvimento dos nervos eferentes da bexiga resulta em esvaziamentoincompleto. Essas anormalidades podem resultar em infecções recorrentes dotrato urinário e incontinência por transbordamento com gotejamento e fluxourinário insuficiente. A incontinência urinária é mais comum no diabetes tipo1. Os sintomas do trato urinário inferior estavam presentes em aproximadamente20% dos homens com diabetes tipo 1 em período de acompanhamento de 10 anos. Namesma coorte, 38% das mulheres relataram incontinência urinária.

A disfunção sexual é mais comum em mulheres com diabetesem comparação com mulheres sem diabetes. No entanto, a evidência de diabetescomo um fator de risco independente para disfunção sexual em mulheres éambígua; depressão e ansiedade parecem ser preditores mais importantes dedisfunção sexual.  

Nos homens, a ejaculação retrógrada reflete a perda dofechamento coordenado do esfincter uretral interno com o relaxamento do esfincteruretral externo durante a ejaculação. Pode se manifestar como urina turva apóso coito devido à presença de esperma. A impotência secundária à neuropatiaautonômica geralmente ocorre com outras manifestações sistêmicas de neuropatiasomática ou autonômica.

A disfunção da bexiga diabética deve ser avaliadainicialmente pela presença de resíduo pós-miccional e posteriormente avaliadapor teste urodinâmico completo, se necessário. O tratamento inicial consiste naremoção de medicamentos que prejudicam a atividade detrusora (agentesanticolinérgicos, antidepressivos tricíclicos e antagonistas dos canais de cálcio)ou agentes que aumentam o tônus ??do esfincter uretral (agonistas do adrenorreceptoralfa-1). O tratamento consiste inicialmente em um cronograma de micçãovoluntária, frequentemente associado à manobra de Crede. Os casos maisavançados requerem cateterismo intermitente.

As múltiplas etiologias potenciais da impotência erétiltornam difícil tratar cada paciente com um protocolo padrão. Deve-se tentarestabelecer o diagnóstico. As causas potenciais incluem consumo de álcool,disfunção endócrina, depressão, distúrbio funcional (psicogênico), doençavascular, medicamentos (iatrogênico) e neuropatia autonômica.

Os inibidores da fosfodiesterase-5 (PDE-5) são a terapiade primeira linha para a disfunção erétil em homens com diabetes. Os inibidoresPDE-5 são contraindicados a pacientes em tratamento com nitratos para doençascardíacas.

O manejo da disfunção sexual feminina deve ser adaptadoàs preocupações sexuais específicas e aos fatores físicos, psicológicos e derelacionamento subjacentes.

 

Outras Manifestações

 

Vários outros sintomas podem ocorrer na NAD, entre osquais:

- Anormalidades pupilares podem resultar em falha naadaptação da visão ao escuro e dificuldades na direção noturna.

- Alterações nas respostas neuroendócrinas atribuídas à NADincluem redução na secreção de glucagon e epinefrina em resposta à hipoglicemia,aumentando, assim, a probabilidade de episódios de hipoglicemia, tambémconhecidos como insuficiência autonômica associada à hipoglicemia. Em pacientescom NAD, a diminuição das respostas contrarregulatórias das catecolaminas podeaumentar o risco de hipoglicemia grave.

 

Triagem

 

A American Diabetes Association recomenda a triagem para NADno momento do diagnóstico de diabetes tipo 2 e cinco anos após o diagnóstico dediabetes tipo 1. A triagem deve incluir história e exame físico para sinais dedisfunção autonômica:

-Testes de variabilidade da frequência cardíaca podem serindicados, incluindo relação expiração-inspiração, resposta à manobra deValsalva e resposta ao levantar-se.

-Se a triagem inicial for negativa, história e examefísico para sinais de disfunção autonômica devem ser repetidos anualmente.

 

A identificação de NAD subclínica é útil paraestratificação de risco e para a individualização de alvos glicêmicos,lipídicos e de pressão arterial.

 

Bibliografia

 

1-VinikAI, Maser RE, Mitchell BD, Freeman R. Diabetic autonomic neuropathy. DiabetesCare 2003; 26:1553.

2-TesfayeS, Chaturvedi N, Eaton SE, et al. Vascularrisk factors and diabetic neuropathy. N Engl J Med 2005; 352:341.

3-Gibbons CH, Freeman R.Treatment-induced neuropathy of diabetes: an acute, iatrogenic complication ofdiabetes. Brain 2015; 138:43.

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