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Morte Encefálica

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 25/01/2022

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Manejo de Pacientes Potenciais Doadores com Morte Encefálica

 

A doaçãode órgãos para transplante é um processo complexo liderado por vários profissionaisde saúde responsáveis ??por uma sequência de ações e procedimentos que começamcom a identificação de um potencial doador de órgãos e terminam com a obtençãode órgãos para distribuição e doação. O manejo adequado dos doadores de órgãosé essencial para o sucesso desse processo com adequado suporte cardiovascular,endócrino e metabólico, com a manutenção da perfusão adequada de órgãos.

O processode doação de órgãos inclui a identificação do doador potencial, o diagnóstico damorte encefálica, o apoio familiar, a avaliação dos critérios de elegibilidadedo doador, o manejo clínico do potencial doador de órgãos e a obtenção e a distribuiçãode órgãos. Os doadores são pacientes com potencial significativo para evoluçãocom instabilidade clínica, assim a aplicação de potenciais estratégias e manejode doadores visando à estabilização hemodinâmica para evitar a perda de órgãosdevido a hipoperfusão ou perda de doadores devido a parada cardíaca.

Ospacientes precisam ser monitorados adequadamente do ponto de vista cardiovascular,da temperatura e da pressão arterial. O suporte ventilatório e a manutenção da temperaturacorporal normal e das funções endócrino-metabólicas contribuem para melhorar osdesfechos clínicos em receptores de transplante. Iremos discutir os diferentessuportes de órgãos com base nas diretrizes brasileiras de manejo de pacientescom morte encefálica.

 

Suporte Ventilatório

 

Osobjetivos da ventilação mecânica são manter a oxigenação adequada e proteger ospulmões de lesões associadas à ventilação mecânica. Assim, as diretrizesbrasileiras recomendam o uso de ventilação com a estratégia de proteçãopulmonar em todos os doadores potenciais.

Pacientescom função pulmonar normal ou quase normal (PaO2/FiO2 = 300) podem deteriorardevido a complicações comuns em situações críticas, como contusão pulmonar,lesão pulmonar após transfusão de sangue, pneumonia, atelectasia e lesõesiatrogênicas relacionadas à ventilação mecânica. Além disso, cerca de 30 a 45%dos potenciais doadores desenvolvem síndrome de desconforto respiratório agudo(SDRA), e apenas 15 a 20% dos pulmões são adequados para transplante no final doprocesso de avaliação. A estratégia de ventilação protetora de pulmão emdoadores potenciais com pulmões normais e o teste de apneia realizado compressão da via aérea positiva contínua (CPAP) têm sido associados a aumento na elegibilidadepara doação de pulmão.

Aestratégia de ventilação protetora para pessoas com pulmões saudáveis

consistena combinação de um volume corrente baixo de 6 a 8 mL/kg de peso ideal emcontraste com a ventilação mecânica tradicional de 8 a 15 mL/kg de peso. A PEEPinicial recomendada nesses pacientes é de 8 a 10 cm H2O. Deve-se tentar oxigenaçãosanguínea adequada, ajustando-se FiO2 e PEEP para obter SaO2 > 90%. Paraevitar atelectasia, em pacientes nos quais ainda não foi realizado o teste deapneia, este deve ser realizado com 10 cm H2O de CPAP usando um sistema decircuito fechado em potenciais doadores com pulmões preservados que sãocandidatos à obtenção de pulmão, ou mesmo quando a insuficiência respiratóriahipoxêmica está presente. Recomenda-se ainda manter pressão de platô entre 25 e30 cm H2O para reduzir lesão pulmonar.

Asdiretrizes brasileiras sugerem ainda não usar manobras de recrutamento alveolarrotineiramente em doadores potenciais. Embora as manobras de recrutamentoalveolar tenham sido sugeridas para a ventilação de potenciais doadores deórgãos com lesão pulmonar aguda (PaO2/FiO2 < 300), e essas manobras possam reduzira hipoxemia após o teste de apneia, elas também podem contribuir para aumentandoa viabilidade dos enxertos pulmonares. Um estudo randomizado mostrou resultadosdesfavoráveis em pacientes criticamente doentes. Além disso, nenhum estudo randomizadodemonstrou sua eficácia na população de potenciais doadores. Em casos dehipoxemia refratária à proteção pulmonar, são indicadas estratégias deventilação, mas as manobras não devem ser realizadas rotineiramente. Seu usonão é indicado em doadores potenciais estáveis hemodinamicamente.

 

Suporte Circulatório

 

O alvo nessespacientes é manter pressão arterial mínima entre 60 e 65 mmHg, que, em estudos,foi associada a menor incidência de parada cardíaca em doadores potenciais. Ahipotensão potencial do doador é associada a maior incidência de disfunção doenxerto hepático pós-operatória e maior tempo de internação nos potenciaisreceptores de transplante hepático.

Recomenda-serealizar a expansão volêmica inicial em potenciais doadores hemodinamicamenteinstáveis com hipovolemia e avaliar sua responsividade volêmica. Nesse caso,pode-se avaliar o volume intravascular por meio das pressões de enchimento ventricularou variação de pressão de pulso respiratória (delta-PP), o que, em estudos,mostrou que em pacientes instáveis está associada a recuperação mais rápida dafunção do enxerto renal e redução dos níveis circulantes de citocinasinflamatórias. Um ensaio randomizado não detectou diferença entre o manejovolêmico ou dirigido pelo delta-VPP e índice cardíaco. Em contrapartida, houvetendência de aumento no número de órgãos transplantados por doador entrepotenciais instáveis que foram responsivos a fluidos. Por sua vez, evitar asobrecarga de volume parece ser benéfico. Essa abordagem está associada a maiornúmero de órgãos transplantados por doador e maior número de pulmõestransplantados sem reduzir o número de outros órgãos doados ou prejudicar asobrevivência em receptores de transplante de coração, fígado, pâncreas ou rim.

A soluçãode reposição volêmica ideal nesses pacientes ainda não está determinada, mas,na presença de acidose hiperclorêmica, preferem-se soluções como o ringer-lactato.Caso exista hipernatremia, alguns autores recomendam o uso de soluçõeshipotônicas. A hipovolemia é muito frequente em potenciais doadores de órgãos edeve ser considerada quando a hipotensão é presente. A infusão inicial decristaloides (por exemplo, 30 mL/kg) pode melhorar a perfusão tecidual. Asobrecarga volêmica deve ser evitada. A avaliação da capacidade de respostavolêmica com variáveis estáticas ??(por exemplo, pressão venosa central ? PVC)e/ou parâmetros dinâmicos (por exemplo, delta-PP) pode ser usada ??para guiar areposição volêmica, ajudando a prevenir a sobrecarga de volume.

Empacientes não responsivos à reposição volêmica, pode ser necessário o uso dedrogas vasopressoras para alcançar níveis adequados de pressão arterial.Tradicionalmente, a dopamina era a droga vasopressora mais utilizada nessespacientes, mas atualmente a norepinefrina tem sido mais utilizada. Os estudosnão mostraram diferença em desfechos clínicos em estudos comparando norepinefrinae dopamina. Ruptura da atividade vagal secundária à morte encefálica poderesultar em bradicardia refratária à atropina. Nesses casos, podem serutilizadas drogas adrenérgicas sugeridas como agentes cronotrópicos positivospara tratar bradicardia em potenciais doadores, como a dopamina, a epinefrina ea fenilefrina. Considerando a predominância da ação da noradrenalina nosreceptores alfa-1 adrenérgicos, sua infusão geralmente ocorre sem aumentosignificativo em frequência cardíaca. Portanto, dopamina ou epinefrina podemser mais apropriadas em pacientes com hipotensão devido a um efeitocronotrópico positivo.

Um estudode coorte com 93 pacientes que passaram por transplante cardíaco mostrou que opré-tratamento com baixas doses de dopamina (4 µg/kg/min) em doadores decoração foi associado com maior sobrevida do enxerto três anos após otransplante (87,0% vs. 67,8%, p < 0,03). Um estudo controlado randomizadocom 264 doadores de órgãos relatou que a administração de baixa dose dedopamina reduziu a necessidade de hemodiálise nos receptores de órgãos, mas semnenhum benefício para a sobrevivência do enxerto renal após três anos. Em umseguimento de cinco anos, os pesquisadores não conseguiram mostrar vantagemsignificativa da administração de dopamina em doadores potenciais para asobrevivência do enxerto renal a longo prazo, embora o tempo de infusão dedopamina e a falha do enxerto estivessem relacionados à exposição. O mesmogrupo relatou que a dopamina em baixas doses não afetou negativamente osdesfechos de curto ou longo prazo após transplante hepático. O potencial efeitoarritmogênico da dopamina pode implicar maior risco de perda de doadores empotencial devido a parada cardíaca antes da obtenção de órgãos. A obtenção dePAM = 65 mmHg como pressão arterial alvo contribui para a perfusão adequada deórgãos que se destinam a ser preservados para transplante.

Em muitospacientes, pode ocorrer compressão da hipófise por herniações cerebrais, o que podecausar diabetes insípido (DI) central; nesse caso, tanto a vasopressina como adesmopressina podem ser benéficas. Recomenda-se combinar vasopressina (VPA) emdoadores em potencial recebendo norepinefrina ou dopamina para controlar apressão arterial. O uso de VPA em potenciais doadores com morte encefálicacontribui para reduzir a necessidade de vasopressores adrenérgicos e estáassociado a menor incidência de deterioração cardiovascular e cardíaca, além decontribuir para o controle da hiperosmolaridade plasmática. A infusão de VPApermite, em alguns casos, a descontinuação completa dos vasopressoresadrenérgicos sem causar efeitos adversos na função de órgãos transplantados. Porfim, a infusão de VPA parece estar associada a maior número de doadores commenor taxa de perda de enxerto devido a disfunção orgânica.

Aadministração de um VPA de 1 UI em bólus seguida de infusão de 0,5 UI/h a 2,4UI/h ajuda a manter a pressão arterial em doadores em potencial, comnecessidade de vasopressores, e contribui para o controle da poliúria e da normovolemiana presença de DI. O VPA deve ser iniciado ao mesmo tempo da infusão devasopressor adrenérgico. A desmopressina é um análogo da vasopressina com maiorefeito antidiuréticoe com efeito vasopressor substancialmente menor. Portanto,esse agente é usado para pacientes com DI que não são hipotensos. Parapacientes com hipernatremia (sódio sérico > 145 a 150 mmol/L) e débitourinário > 2,5 a 3,0 mL/kg/h, uma dose inicial de 1 a 4 microgramas éadministrada por via intravenosa. O débito urinário, a osmolalidade urinária eo sódio sérico são monitorados, e a dose é ajustada para atingir volumeurinário < 4 mL/kg/h. Uma dose típica é de 1 a 2 microgramas por viaintravenosa a cada 6 horas. A desmopressina pode ser usada concomitantementecom AVP em pacientes com hipernatremia e hipotensão graves.

A análisedo banco de dados de um estudo clínico randomizado que avaliou 487 receptoresde enxerto renal mostrou melhor controle da produção diária de urina e menor necessidadede volume no grupo que recebeu DDAVP. O DDAVP foi associado com melhora da sobrevidado enxerto renal (85,4% vs. 73,6%, p = 0,003) após dois anos, sem diferenças emrelação a rejeição aguda ou tardia. O DDAVP atua exclusivamente nos receptoresV2 e é indicado para controlar a poliúria (débito urinário > 4 mL/kg/h) emdoadores potenciais com DI que mantêm a pressão arterial adequada sem vasopressoresadrenérgicos. O VPA é preferido para controlar a poliúria em doadores empotencial com DI que precisam de vasopressores adrenérgicos. A combinação de VPAe DDAVP pode ser considerada em casos refratários. Apesar de a via intranasal serviável, DDAVP deve ser utilizado preferencialmente por via intravenosa, em umadose de 1 a 2 µg a cada 2 a 4 horas, até que débito urinário < 4 mL/kg/htenha sido alcançado.

A morteencefálica frequentemente resulta em crise hipertensiva inicial seguida porhipotensão. A crise hipertensiva (também conhecida como tempestade autonômica)é atribuída a uma descarga simpática maciça após a morte cerebral. Parapacientes que manifestam os efeitos cardiovasculares da tempestade autonômica(por exemplo, taquicardia, aumento do consumo de oxigênio pelo miocárdio,hipertensão), qualquer intervenção deve ser facilmente reversível, pois essafase tende a ser seguida por hipotensão. Antagonistas beta-adrenérgicos, comoesmolol, podem melhorar os efeitos cardiovasculares e preservar a funçãomiocárdica.

 

Suporte Endocrinológico

 

Osglicocorticoides podem diminuir o estado inflamatório em pacientes com morteencefálica e podem ainda resolver a insuficiência adrenal associada a doençagrave. As diretrizes brasileiras recomendam o uso de corticosteroides em baixasdoses em potenciais doadores recebendo norepinefrina ou dopamina para controlara pressão arterial. Um pequeno estudo retrospectivo relatou que a administraçãode 15 mg/kg de metilprednisolona foi associada a PaO2 mais alta e a maiornúmero de pulmões transplantados. Por sua vez, um estudo que comparou 15 mg/kgde metilprednisolona com 300 mg de hidrocortisona não encontrou diferença naoxigenação e no estado hemodinâmico do potencial doador ou em número de órgãostransplantados. Um pequeno estudo controlado randomizado mostrou que uma únicadose de 15 mg/kg/dia de metilprednisolona administrada ao potencial doador deórgãos pode afetar negativamente a função do enxerto, aumentando aantigenicidade antes do transplante. Esse efeito negativo não foi notado entredoadores com morte cerebral que receberam 15 mg/kg/dia de metilprednisolona seguidade 100 mg a cada 2 horas até a captação de órgãos. Onze estudos controladosrandomizados analisados ??em uma revisão sistemática não mostraram benefíciocom o uso de corticosteroides em altas doses no manejo de potenciais doadores. Outroestudo multicêntrico mostrou menores necessidades de doses e da duração dainfusão de vasopressores em pacientes em uso de glicocorticoides. Apesar dasevidências conflitantes, o uso de corticosteroides é de baixo custo e riscopara doadores em potencial, que podem ter um efeito positivo nos resultadoshemodinâmicos; portanto, seu uso está indicado nesses pacientes. A evidênciaatual não sugere benefícios ventilatórios ou hemodinâmicos associados à terapiacom corticosteroides em altas doses em comparação com baixas doses (ou seja,100 mg a cada 8 horas). Doses mais altas devem ser evitadas.

O papeldos hormônios tireoidianos nesses pacientes é incerto. Uma diretriz sugere seuuso em pacientes doadores com fração de ejeção < 45% e instabilidadehemodinâmica. As diretrizes brasileiras não recomendam usar hormônios tireoidianosrotineiramente em doadores potenciais.

Administraçãode hormônios tireoidianos em doadores em potencial não mostrou nenhumbenefício, nem com redução no uso de vasopressores ou aumento na obtenção deórgãos para transplante. Estudos observacionais sugeriram aumento na obtençãode coração viáveis, o que não foi confirmado em ensaios clínicos randomizados. Amorte encefálica está associada a queda nos níveis de hormônio tireoidiano, o quepode contribuir para instabilidade hemodinâmica; no entanto, não há evidências paraapoiar o uso de hormônios da tireoide em doadores em potencial, dados os seuscustos e riscos.

Sugere-serealizar o controle glicêmico em doadores potenciais. Quatro estudosobservacionais avaliaram o efeito da hiperglicemia do doador potencial sobre a funçãopancreática pós-transplante. Um estudo mostrou correlação entre a glicemia dodoador imediatamente antes da recuperação do órgão e a hemoglobina glicosilada (HbA1C)um ano após o transplante, e outro estudo encontrou a associação entrehiperglicemia e perda do enxerto. Dois estudos não mostraram associação entre aglicemia de um doador potencial e a função pós-transplante do enxertopancreático. Um estudo observacional encontrou associação entre controle glicêmicoe níveis de creatinina do doador potencial antes da recuperação de órgãos. Noentanto, não há evidências de que a hiperglicemia esteja associada à disfunçãodo enxerto hepático. Um estudo com 1.611 doadores em potencial relatou que glicemia< 180 mg/dL foi um preditor independente de mais órgãos podendo sertransplantados. Recomenda-se manter glicemia-alvo entre 120 e 180 mg/dL, com monitoraçãoda glicemia em todos os doadores potenciais pelo menos a cada 6 horas. Ainfusão de insulina intravenosa pode ser usada para esse objetivo.

 

Manutenção do Equilíbrio Hidroeletrolítico

 

Sugere-semanter os níveis de sódio sérico abaixo de 155 mEq/dL em doadores potenciais. Emum estudo, a hipernatremia foi associada a mais casos de perda precoce doenxerto. Mudanças na natremia podem refletir manejo volêmico inadequado,especialmente na presença de DI, um dos motivos para sua correção. Ahipernatremia é frequentemente associada à hipovolemia e deve ser controladacom expansão volêmica, com reposição de fluidos hipotônicos e controle de poliúriacom VPA ou DDAVP. O sódio sérico deve ser monitorado, com níveis alvo < 155mg/dL. Recomenda-se ainda manter os níveis de potássio sérico entre 3,5 e 5,5mEq/L em doadores potenciais.

Não existemestudos que avaliaram diretamente o efeito da hipercalemia ou da hipocalemia emdoadores potenciais. Apesar da ausência de estudos avaliando diretamente osefeitos dos níveis do potássio sérico de doadores potenciais, pode ser também umfator determinante no potencial de repouso de células eletricamente sensíveis.Mudanças nos níveis de potássio estão relacionados a arritmias cardíacas epodem comprometer o manejo de doadores potenciais. Os níveis de potássio devemser monitorados, e as medidas de correção habituais devem ser implementadas,visando níveis séricos entre 3,5 e 5,5 mEq/L.

Recomenda-seainda manter os níveis de magnésio sérico acima de 1,6 mEq/L em doadorespotenciais. Dois estudos observacionais e um estudo randomizado identificaram associaçãoentre hipomagnesemia e maior mortalidade em pacientes gravemente doentes, alémde maior probabilidade de prolongamento do intervalo QT. A hipomagnesemia épotencialmente arritmogênica e associada a não recuperação da função renal empacientes com lesão renal aguda. Também está associada a problemas cardíacoscomo arritmias e pior prognóstico em pacientes graves. Os níveis de magnésiodevem ser monitorados, e sulfato de magnésio deve ser administrado, como decostume, visando níveis séricos acima de 1,6 mEq/L. Embora não haja evidênciassobre suporte nutricional, diferentes diretrizes recomendam continuar o suportenutricional do doador. Os possíveis benefícios incluem aumento das reservas deglicogênio hepático, o que poderia influenciar positivamente o enxerto hepáticoe a manutenção do trofismo da mucosa intestinal, reduzindo o potencial decomplicações. Para indivíduos com morte encefálica que requerem cuidados de UTIpor períodos prolongados (por exemplo, morte encefálica em gestantes;prolongamento do processo da decisão da família pela doação), é razoável que ogasto de energia seja estimado como 15 a 30% menor comparado ao de outros pacientescriticamente doentes. Assim, em pacientes já recebendo suporte nutricionalcompleto, a ingestão de energia pode ser reduzida uma vez estabelecida a morteencefálica. Não parece apropriado começar alimentação enteral quando os órgãosprovavelmente serão captados dentro de um curto período ou na presença dequalquer uma das contraindicações habituais para iniciar alimentação enteral (porexemplo, obstrução do trato gastrintestinal, íleo, vômito/aspiração de conteúdogástrico, instabilidade hemodinâmica grave e altas doses de vasopressores).

 

Uso de Antibióticos

 

Asdiretrizes brasileiras recomendam o uso de antibióticos em doadores potenciais cominfecção ou sepse. Diferentes estudos observacionais avaliaram a transmissão deinfecção bacteriana em órgãos doados com infecção comprovada por cultura. Os microrganismosmais comuns observados foram  Staphylococcusaureus, Streptococcus sp., Klebsiella sp. e Acinetobacter baumannii.A transmissão bacteriana raramente é observada, desde que os doadores comevidências de infecção recebam terapia antibiótica apropriada. A duração daterapia antibiótica do doador variou de 24 a 96 horas em diferentes estudos. Diferentesautores relataram manter os mesmos antibióticos administrados aos doadores nosreceptores de transplante, por períodos que variam de 7 a 14 dias. A presençade infecção do doador não teve nenhum impacto na sobrevivência de enxertos ou dosreceptores de transplante.

O risco detransmissão de infecção bacteriana de doadores de órgãos para receptores ébaixa, e a infecção de doadores não parece afetar negativamente os desfechos.Os riscos são menores com a terapia antibiótica apropriada no doador por pelomenos 24 horas, seguida pela manutenção do antibiótico no receptor por 7 a 14dias.

 

Hipotermia Terapêutica

 

Asdiretrizes brasileiras sugerem manter a temperatura corporal acima de 35°C emdoadores potenciais hemodinamicamente instáveis e induzir hipotermia moderada(34-35°C) em doadores potenciais sem instabilidade hemodinâmica. A hipotermialeve (34-35°C) comparada com o manejo habitual (36,5-37,5°C) foi avaliada em370 doadores potenciais sem instabilidade hemodinâmica. O principal resultadofoi redução na função retardada do enxerto renal entre os receptores. Não houvediferença no número de órgãos transplantados por doador, eventos adversos ouparada cardíaca. Duas coortes retrospectivas demonstraram que a hipotermiaespontânea do doador foi associada a níveis mais baixos de creatinina antes dacaptação de órgãos sem efeito na sobrevivência do enxerto renal e com cursoclínico desfavorável após o transplante cardíaco.

Ahipotermia é uma intervenção de baixo custo associada a melhor função doenxerto renal, mas pode aumentar o risco de parada cardíaca em doadores potenciais.O risco parece ser baixo em doadores potenciais hemodinamicamente estáveis, nosquais o uso de hipotermia pode ser justificado pela melhora da viabilidade doenxerto. Na presença de instabilidade hemodinâmica, a normotermia deve sermantida em doadores potenciais para reduzir o risco de parada cardíaca.

 

Suporte Hematológico

 

Asdiretrizes brasileiras sugerem a transfusão de concentrado de hemácias em doadorespotenciais com níveis de hemoglobina < 7 g/dL. A anemia pode comprometer otransporte de oxigênio aos órgãos que se objetiva preservar para o transplante.No entanto, não temos conhecimento da concentração de hemoglobina necessáriapara contribuir para o transporte adequado de oxigênio em doadores.Considerando o alto custo e a escassez frequente de hemoderivados paratransfusão, a decisão de transfundir não deve ser diferente da prática habitualem outros pacientes criticamente doentes.

 

Bibliografia

 

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2-Wood KE, Becker BN, McCartney JG, et al. Care of thepotential organ donor. N Engl J Med 2004; 351:2730.

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