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sífilis

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 27/06/2012

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Quadro clínico

Homem de 28 anos de idade, com lesão genital indolor papular há 10 dias, sem outras queixas. Qual é o diagnóstico diferencial?

Pacientes com lesão genital devem ser avaliados para doenças sexualmente transmissíveis que tendem a ocorrer juntas. Como é uma lesão ulcerada genital única indolor, a nossa principal hipótese diagnóstica é sífilis primária.

 

Comentários

A sífilis primária é a lesão inicial da infecção pelo Treponema pallidum, usualmente na forma de úlcera indolor, também denominada de cancro. Já a sífilis secundária ocorre pela disseminação da infecção manifestando-se com exantema maculopapular pruriginoso difuso, que envolve classicamente palmas das mãos e solas dos pés, ou com lesão achatada também denominada de condiloma lata.

Em relação ao tempo de infecção, a sífilis pode ser considerada precoce (estágios da sífilis que ocorrem durante o 1º ano da infecção) ou latente (paciente com exame positivo para sífilis, mas que se mantém assintomático e com exame físico normal). A forma latente pode ainda ser dividida em precoce e tardia, sendo o marcador temporal desta divisão o período de 1 ano. Alguns autores preconizam dividir ainda o grupo de pacientes com sífilis latente como apresentando altos ou baixos títulos sorológicos.

 

Epidemiologia e transmissão

Os casos de sífilis diminuíram muito nos EUA até a década de 1990, mas a partir de 2000 ocorreu um aumento progressivo, com 4,6 casos a cada 100.000 habitantes ao ano (antes eram 2,1). Nos EUA, ocorre ainda principalmente em negros e a maioria dos casos ocorre na região Sul dos EUA. O CDC estima que, em 2004, mais de 60% dos casos tenham ocorrido em homossexuais masculinos; neste grupo, se o paciente é HIV positivo, o risco é cerca de 70 a 80 vezes maior de apresentar a infecção. Os pacientes com HIV positivo representam 25% dos casos nos EUA.

O período de incubação dura, em média, 21 dias, variando de 3 a 90 dias, e a transmissão é direta. O Treponema pallidum, que é uma espiroqueta, penetra em pele erodida ou mucosa e se dissemina pelos vasos linfáticos e pela corrente sanguínea, podendo envolver praticamente todos os sistemas e órgãos. Outras formas de transmissão são materno-fetal e por transfusões sanguíneas.

O Ministério da Saúde classifica a sífilis da seguinte maneira:

 

      sífilis adquirida recente (menos de 1 ano de evolução): primária, secundária e latente recente;

      sífilis adquirida tardia (mais de 1 ano de evolução): latente tardia e terciária;

      sífilis congênita recente (casos diagnosticados até o 2º ano de vida);

      sífilis congênita tardia (casos diagnosticados após o 2º ano de vida).

 

Manifestações clínicas

Sífilis primária

Em 1 semana a 3 meses após a inoculação, forma-se um cancro no local da porta de entrada. Esse cancro ou pápula costuma ser indolor e ulcera depois, formando a lesão típica do cancro, com dimensões de 1 a 2 cm com margens elevadas e indurada. Pode haver dor à palpação desta lesão, que é rósea, de fundo limpo, sem fenômenos inflamatórios, com bordas infiltradas e duras. É acompanhada invariavelmente de adenopatia regional não supurativa, móvel, indolor e múltipla, a denominada adenopatia satélite. Esta adenopatia não é acompanhada de fenômenos inflamatórios na pele suprajacente aos linfonodos acometidos.

Estas lesões, também chamadas de cancro duro, tendem à cura espontânea, sem deixar cicatrizes.

O diagnóstico diferencial principal é com o cancroide que, ao contrário, apresenta lesão dolorosa, exsudativa, de bordas irregulares e base necrótica, que pode sangrar com facilidade. Tanto o cancro da sífilis como do cancroide podem ter linfonodos, mas neste último, a supuração dos gânglios pode ocorrer.

Apesar de a genitália ser o local mais comum da lesão, outros também podem ser acometidos, como faringe posterior, ânus e vagina. As lesões cicatrizam espontaneamente em 3 a 6 semanas.

 

Sífilis secundária

Algumas semanas a meses após a lesão inicial, em geral 6 a 8 semanas após o aparecimento do cancro duro, pode ocorrer o secundarismo luético em cerca de 25% dos pacientes. Trata-se de doença sistêmica que eventualmente aparece em paciente sem história de lesão primária. Podem ocorrer diversos sintomas, como o rash. Trata-se de um exantema maculopapular pruriginoso difuso, com máculas ovaladas ou arredondadas, isoladas e/ou confluentes, também denominadas roséolas, levemente descamativas, que acometem todo o tegumento, particularmente as regiões palmoplantares (roséola sifilítica); estas lesões também são denominadas sifilides papulosas. As máculas classicamente envolvem as palmas das mãos e plantas dos pés, localização extremamente sugestiva de sífilis secundária. Este exantema costuma ser simétrico, às vezes envolvendo tronco e membros inferiores inteiramente. O rash pode tomar várias formas, exceto lesões vesiculares. As lesões mucosas podem ocorrer na cavidade oral, especialmente em língua e face interna dos lábios. Essas lesões são ricas em treponemas e muito contagiosas, podem ocorrer ainda lesões elevadas em platô, de superfície lisa, nas mucosas (placas mucosas).

Outra lesão cutânea que pode ocorrer é o condiloma lata ou plano, que é uma lesão papilomatosa cinza encontrada nas regiões intertriginosas. Como a região anal é extremamente úmida, as lesões sofrem maceração de sua superfície, com formação de pápulas hipertróficas também ricas em treponemas.

Os sintomas sistêmicos incluem febre baixa, mal-estar, anorexia, mialgias e perda de peso. Linfadenomegalia costuma ocorrer na forma de micropoliadenopatia generalizada não inflamatória e indolor com os linfonodos apresentando consistência de borracha; na maioria dos casos, há envolvimento das cadeias cervical posterior, axilar e inguinais. O achado de linfonodos epitrocleares é sugestivo do diagnóstico.

Alopecia também pode ocorrer, em geral em forma de placas principalmente no couro cabeludo, a chamada alopecia em clareira, envolvendo sobrancelhas e região da barba; é reversível com o tratamento.

Lesões viscerais ocorrem em cerca de 2% dos pacientes com sífilis secundária, com comprometimento gástrico simulando linfoma com infiltração extensa, hepatites e, sobretudo, colestase evidenciada por aumento de enzimas canaliculares. Outra manifestação possível é a síndrome nefrótica, principalmente na forma de glomerulonefrite membranosa e glomerulonefrite por imunocomplexos, eventualmente com crescentes, mas tendem a ser transitórias ou melhoram com o tratamento da sífilis. Ainda podem ocorrer miosites, sinovites, osteítes, periostites, neurite de auditivo, labirintite sifilítica, anormalidades oculares como uveíte anterior ou posterior frequentemente granulomatosa e com coriorretinite multifocal; pode ainda ocorrer necrose retinal e neurite óptica. As uveítes podem ocorrer ainda na sífilis terciária. Eventualmente, alterações liquóricas podem ocorrer nos estágios iniciais da doença.

 

Sífilis latente (recente e tardia)

É a forma da sífilis adquirida na qual não se observam sinais e sintomas clínicos e, portanto, tem o seu diagnóstico feito por meio de testes sorológicos. Sua duração é variável e seu curso pode ser interrompido por sinais e sintomas da forma secundária ou terciária.

 

Sífilis tardia

Surge após períodos extremamente variados de latência, podendo ocorrer em até 25 a 40% dos pacientes. Clinicamente, o quadro dermatológico se caracteriza por lesões nodulares, nódulo-ulceradas e gomas, isto é, lesões granulomatosas que podem ocorrer em pele, ossos e órgãos internos. Quando ocorrem nas mucosas, as lesões podem produzir alterações na língua, constituindo a glossite intersticial crônica, podendo ainda provocar perfurações no palato e, destruição do septo nasal cartilaginoso e de áreas ósseas adjacentes. As lesões ainda podem ser serpiginosas, mas têm se tornado menos frequentes com o uso da penicilina.

A sífilis cardiovascular representa uma incidência de 10%. Suas principais manifestações são insuficiência aórtica, aneurismas de aorta torácica e abdominal, que raramente evoluem com dissecção, e estenose do óstio da coronária, resultando em quadros de angina. O aparecimento é tipicamente insidioso e ocorre de 15 a 30 anos apos a infecção inicial do paciente.

A neurossífilis representa uma incidência de 8%, podendo ser assintomática ou apresentar quadros de meningite sifilítica aguda, encefalomalacia manifestando-se afasias e hemiplegias, tabes dorsalis e demência paralítica. A neurossífilis precoce não apresenta sinais de doença e o diagnóstico se baseia no líquido cefalorraquidiano com pleiocitose e VDRL positivo. Os pacientes podem apresentar meningite sintomática com sintomas clássicos de irritação meníngea, podendo ainda apresentar lesões isquêmicas em coluna vertebral. Outra forma de acometimento é a sífilis neurovascular, com aparecimento de arterite que pode apresentar-se como AVC isquêmico. Pacientes com formas tardias de neurossífilis podem apresentar quadro demencial progressivo associado ao aparecimento de paresias, disartria, tremores e, em alguns casos, pupilas de Argyl-Robertson, mais comuns na tabes dorsalis.

A tabes dorsalis é uma doença que acomete a coluna posterior da medula e as raízes dorsais. Ocorre em média após 20 anos da infecção inicial, embora alguns casos ocorram em poucos anos. Os pacientes apresentam quadro de ataxia e dores lancinantes de curta duração. As pupilas de Argyl-Robertson não respondem à luz, são pequenas, contraem normalmente, dilatam parcialmente com colírios midriáticos e não dilatam com estímulos dolorosos. Esses pacientes ainda apresentam diminuição de reflexos em membros inferiores, alteração de sensações vibratórias e da propriocepção.

As principais manifestações da neurossífilis são:

 

      mudanças de personalidade, labilidade emocional, descuido com aparência;

      delírio, ilusões;

      alteração de memória e raciocínio;

      fala embotada;

      pupilas pequenas e não reativas à luz (pupilas de Argyl-Robinson);

      visão tubular com perda de visão periférica com destruição do nervo óptico;

      reflexos hiperativos;

      perda de expressão facial por envolvimento dos pares cranianos VII e VIII;

      em caso de envolvimento do corno posterior da medula (tabes dorsalis): marcha com base alargada, marcha talonante, parestesias, incontinência vesical e intestinal, perda de sensibilidade posicional e vibratória, impotência.

 

Diagnóstico e exames complementares

O diagnóstico costuma ser indireto, pois raramente há visualização por campo escuro. A seguir, os exames serão especificados.

 

Exame de campo escuro ou pesquisa direta

Este exame exige técnica específica de coleta para microscopia em campo escuro. Indicado para material de lesão ulcerada suspeita, material do condiloma plano e das placas mucosas da fase secundária. A sensibilidade é de 70 a 95%, mas é um exame pouco utilizado atualmente.

 

Pesquisa direta com material corado

É realizada pordois métodos: impregnação pela prata de Fontana e por Giemsa. Essa pesquisa também pode aumentar o desempenho do exame em campo escuro.

 

Provas sorológicas

Testes antigênicos não treponêmicos

Os testes não treponêmicos são baseados na presença de reatividade do soro a um antígeno cardiolipina-lecitina. O principal deles o VDRL.

 

Provas de floculação (VDRL)

O teste mensura anticorpos IgG e IgM. O VDRL (Venereal Disease Research Laboratory) e a reação de Wasserman ou sua variante RPR (Rapid Plasm Reagin) são exames qualitativos e quantitativos importantes para o diagnóstico e o seguimento pós-terapêutico, devendo ser solicitados sempre que se suspeitar do diagnóstico de sífilis, podendo ser utilizado em qualquer fase, para todos os pacientes portadores de DST e na rotina do pré-natal. O VDRL torna-se reativo a partir da 2ª semana após o aparecimento do cancro (sífilis primária) e, via de regra, está mais elevado na fase secundária da doença. Os títulos começam a diminuir a partir do 1º ano de evolução da doença. Instituído o tratamento correto, espera-se uma queda para 1/4 dos valores iniciais em 6 meses, e a maioria dos casos apresenta negativação entre 9 e 12 meses, podendo, permanecer ainda com títulos baixos por longos períodos ou até por toda a vida; é o que se denomina "memória" ou "cicatriz" sorológica.

Assim, títulos baixos podem significar doença recente ou muito antiga, tratada ou não. A anamnese, o exame físico e a repetição periódica dos testes não treponêmicos (dois títulos baixos em intervalo de 30 dias excluem sífilis recente) ou a realização de provas de sorologia treponêmica qualitativas ajudam a esclarecer dúvidas. As provas treponêmicas, se negativas, excluem sífilis em atividade; se positivas, a dúvida pode permanecer, sendo recomendável, então, repetir o tratamento.

Pacientes com 3 dosagens com títulos sucessivamente baixos (menores ou iguais a 1/8), sem qualquer indício de reinfecção, provavelmente apresentam "memória" sorológica. O paciente pode receber alta e deve ser avisado que, por muito tempo ou até por toda a vida, apresentará sorologia não treponêmica reativa.

 

Provas de fixação de complemento (Wasserman)

Possui as mesmas características do VDRL. Reações falso-positivas podem ocorrer nas seguintes situações:

 

      infecções virais e vacinações;

      hanseníase;

      malária;

      calazar;

      tripanossomíases;

      doenças autoimunes (lúpus eritematoso, dermatomiosite etc.).

 

Reações falso-positivas no líquido cefalorraquidiano podem ocorrer em:

 

      neurotuberculose;

      hemangiomas meníngeos;

      tumores cerebrais.

 

Testes treponêmicos

Servem para confirmação do diagnóstico:

 

      TPI (prova de imobilização do treponema);

      RPCF (prova de fixação de complemento com proteína de Reiter);

      FTA-ABS (Fluorescent Treponema Antigen Absorvent);

      MHA-PP (micro-hemaglutinação para Treponema pallidum): apresenta sensibilidade semelhante ao FTA-ABS, mas sua execução é tecnicamente mais simples.

 

Os testes treponêmicos feitos por imunofluorescência, como o FTA-ABS e o MHATP, são qualitativos e importantes para confirmar a infecção. Em geral, tornam-se reativos a partir do 15º dia da infecção. Os anticorpos treponêmicos tendem a permanecer no soro por mais tempo que os anticorpos não treponêmicos ou lipídicos, e a diminuição de títulos, quando respondem à terapêutica, é muito mais lenta, de modo que não servem para o acompanhamento. Podem ocorrer resultados falso-positivos em algumas situações, como: hanseníase, malária, mononucleose, leptospirose e lúpus eritematoso sistêmico.

 

Diagnóstico de neurossífilis

O primeiro passo é confirmar se o paciente tem sífilis ou não, pela presença de testes não treponêmicos e treponêmicos positivos, que ocorrem em virtualmente todos os casos de neurossífilis recente, mas podem ser negativos em tabes dorsalis e outras formas tardias. O diagnóstico pode ser confirmado com a punção liquórica, com o VDRL no líquido cefalorraquidiano sendo considerado o teste padrão-ouro, embora seja um exame ainda imperfeito, pois não é muito sensível e pode apresentar falso-positivos em pacientes que sangram com a punção. Já o FTA-ABS é muito sensível, mas pouco específico e pode ser usado como exame confirmatório.

 

Diagnóstico diferencial da sífilis adquirida

Sífilis primária

      lesões de herpes simples genital;

      cancro mole;

      lesões iniciais do linfogranuloma venéreo;

      donovanose;

      leishmaniose tegumentar americana;

      síndrome de Behçet.

 

Sífilis secundária

      exantemas por drogas e por infecções virais (rubéola e sarampo);

      pitiríase rósea de Gibert;

      formas de psoríase e líquen plano;

      linfomas;

      hanseníase;

      sarcoidose;

      líquen plano oral;

      leucoplasias;

      condiloma acuminado;

      alopecia areata/tricotilomania.

 

Tratamento da sífilis adquirida

Sífilis recente (primária; secundária e latente recente)

      Penicilina benzatina 2.400.000 UI intramuscular profunda (2 doses, com intervalo de 1 semana entre elas, uma em cada glúteo).

 

Nos casos de alergia à penicilina, os esquemas alternativos recomendados são:

 

      doxiciclina: 100 mg via oral, a cada 12 horas, por 15 dias;

      tetraciclinas: 500 mg via oral, a cada 6 horas, por 15 dias;

      eritromicina: 500 mg via oral, a cada 6 horas, por 15 dias;

      ceftriaxona: 250 mg/dia, intramuscular, por 10 dias.

 

Sífilis tardia (latente tardia, cutânea e cardiovascular)

      Penicilina benzatina 7.200.000 UI intramuscular profunda, administrada em 3 doses de 2.400.000 UI/semana.

 

Nos casos de alergia à penicilina:

 

      doxiciclina: 100 mg via oral, a cada 12 horas, por 4 semanas;

      tetraciclina: 500 mg via oral, a cada 6 horas, por 4 semanas;

      eritromicina: 500 mg via oral, a cada 6 horas, por 4 semanas.

 

Neurossífilis

      Penicilina cristalina aquosa: 12 a 24 milhões U endovenosa, a cada 4 horas, por 10 a 14 dias.

 

Deve-se acrescentar que, após a dose terapêutica inicial, em alguns casos, pode surgir a reação febril de Jarisch-Herxheimer, com exacerbação das lesões cutâneas, geralmente exigindo apenas cuidados sintomáticos; ocorre involução espontânea em 12 a 48 horas. Essa reação não justifica a interrupção do esquema terapêutico, pois ela não significa hipersensibilidade à droga, porém, todo paciente com sífilis submetido à terapêutica penicilínica deve ser alertado quanto à possibilidade de desenvolver tal reação.

 

Observação: em mulheres grávidas alérgicas, a melhor conduta é fazer a dessensibilização, pois o único tratamento que sabidamente evita infecção congênita é o uso da penicilina.

 

A infecção pelo T. palidum torna o exame sorológico específico (FTA-Abs e MHA-TP) positivo por toda a vida. Uma resposta considerada adequada sãotítulos 3 a 4 vezes menores em 3 meses ou quase negativos em 1 ano.

Portanto, este paciente apresenta sífilis primária provável. O tratamento será realizado com penicilina benzatina 2.400.000 U intramuscular em 2 doses, com intervalo de 7 dias.

 

Medicamentos

Penicilinas naturais

A benzilpenicilina G possui 3 apresentações: cristalina, procaína e benzatina.

 

Indicações, posologia, modo de uso, formas de apresentação e classificação na gestação

O espectro de ação inclui bactérias gram-positivas não produtoras de penicilinase (estreptococos, corinebactérias), cocos gram-negativos (Neisseria meningitidis), bactérias anaeróbias (exceto Bacteroides fragilis) e espiroquetas. Por causa da instabilidade em pH ácido, não há apresentação oral destes compostos.

A penicilina cristalina (sódica/potássica) é administrada por via parenteral (endovenosa), possui meia-vida de aproximadamente 30 minutos, índice de ligação proteica em torno de 50%, com excreção renal (70%) e hepática (25%). Do total da dose administrada, 5 a 10% ultrapassa a barreira hematoliquórica, com elevação de tal índice na presença de meninges inflamadas. O intervalo de administração de 4 horas entre as doses deve ser respeitado, uma vez que o nível sérico diminui consideravelmente após tal período.

A penicilina cristalina, por períodos e doses variáveis de acordo com a gravidade da doença, está indicada no tratamento de meningite por Neisseria meningitidis e Streptococcus pneumoniae, difteria, sífilis (forma neurológica), infecções por anaeróbios (exceto Bacteroides fragilis), leptospirose (Leptospira interrogans), actinomicose (Actinomyces israelli) e infecções estreptocócicas (incluindo erisipela, endocardites e pneumonias).

Na suspeita de infecção pneumocócica grave, deve-se aguardar o perfil de sensibilidade do Streptococcus pneumoniae antes da introdução da penicilina. A associação com aminoglicosídeos pode ser benéfica em endocardites.

 

      Dose habitual: 6 milhões a 24 milhões UI/dia, divididos a cada 4 horas, com ajuste necessário para insuficiência renal e hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentações comerciais: penicilina G potássica e a Megapen®, ambas com 1 milhão, 5 milhões e 10 milhões U.

 

A penicilina procaína, administrada por via intramuscular, possui meia-vida mais longa e nível sérico moderado, utilizando-se o intervalo de 12 horas entre as aplicações (penicilina de depósito). A concentração sérica máxima é alcançada em 1 a 3 horas após a administração.

A penicilina procaína está indicada no tratamento das infecções de pequena ou média gravidade, como faringoamigdalite estreptocócica, erisipela e gonorreia. Outra possibilidade de uso é a complementação ambulatorial após início do uso da penicilina cristalina.

 

      Dose habitual: 400.000 UI intramuscular, a cada 12 horas, com ajuste necessário para função renal; em caso de insuficiência renal, também ajustar para função hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentações comerciais: penicilina G procaína, Despacilina®, Wycilin® todas com 400.000 U.

 

A penicilina benzatina também é considerada uma penicilina de depósito, com meia-vida mais longa e nível sérico mais baixo que a forma procaína. A concentração sérica máxima é obtida 8 horas após a administração da droga (exclusivamente intramuscular). As indicações clínicas estão vinculadas ao tratamento e à prevenção de agentes microbianos sensíveis a concentrações séricas baixas de penicilina G: faringoamigdalite estreptocócica, profilaxia para febre reumática (a cada 21 dias) e sífilis (excluindo a forma neurológica).

 

      Dose habitual: 1.200.000 UI (esquemas variados), com ajuste necessário para função renal; em caso de insuficiência renal, também ajustar para função hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentações comerciais: penicilina G benzatina, Ampiretard® e Benzetacil® com 600.000 e 1.200.000 U.

 

A penicilina V (fenoximetilpenicilina) é uma penicilina que apresenta como principal característica a absorção oral. A meia-vida da droga é de 60 minutos, com índice de ligação às proteínas plasmáticas em torno de 80%, eliminação predominantemente renal e baixa concentração liquórica. A penicilina V está indicada nas infecções de pequena ou média gravidade (semelhante à penicilina procaína) e profilaxia de febre reumática.

 

      Dose habitual: 20 a 40 mg/kg/dia, divididos a cada 4 a 6 horas, com ajuste necessário para função renal; em caso de insuficiência renal, também ajustar para função hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentações comerciais: penicilina V, Meracilina®, Oracilina®, Pen-Ve-Oral® comprimidos com 500.000 U, suspensão com 400.000 U/ 5 mL.

 

Penicilinas semissintéticas

Oxacilina

A oxacilina pertence à família das isoxazolilpenicilinas, derivado semissintético das penicilinas. A oxacilina pode ser utilizada na forma oral e parenteral, com meia-vida de 30 a 60 minutos e eliminação renal. Em pacientes com meninges normais, a concentração liquórica é inadequada, aumentando-se de forma significativa na vigência de meningite. A principal característica da droga é a resistência à ação das penicilinases produzidas por Staphylococcus aureus. A administração deve ser feita em intervalos de 4 horas. A meticilina é uma droga do mesmo grupo, porém não é utilizada clinicamente.

As indicações clínicas limitam-se ao tratamento de infecções ocasionadas por Staphylococcus aureus sensíveis à oxacilina, como celulite, furunculose, endocardite, pneumonias e osteomielite. Apesar do aumento de cepas de Staphylococcus aureus resistentes à oxacilina, principalmente em ambiente hospitalar, a oxacilina continua sendo a droga de escolha para cepas sensíveis, independentemente da gravidade da doença.

 

      Dose habitual: 100 a 200 mg/kg/dia, a cada 4 horas. Trabalho recente em pacientes adultos demonstrou que doses menores que 4 g/dia implicam piora de prognóstico; ajuste de dose em insuficiência hepática no caso de concomitância com insuficiência renal.

      Gestação: classe B.

      Apresentações comerciais: oxacilina e Stafilicin-N® frasco-ampola com 500 mg.

 

Aminopenicilinas (ampicilina/amoxicilina)

A ampicilina apresenta estabilidade para utilização oral ou parenteral. A meia-vida da droga é de 50 a 60 minutos, com eliminação renal (predominante) e hepática. Há grande concentração na bile e a passagem para o líquido cefalorraquidiano em meninges inflamadas situa-se em torno de 5 a 10% da concentração sérica, considerada baixa.

Com relação ao espectro de ação, a ampicilina é efetiva contra muitas bactérias aeróbias gram-positivas (Streptococcus pyogenes, Streptococcus pneumoniae, Streptococcus viridans, Enterococcus faecalis, Listeria monocytogenes), bactérias anaeróbias gram-positivas (Clostridium spp, Peptostreptococcus spp e Actinomyces israelli), determinadas bactérias aeróbias gram-negativas (Escherichia coli, Proteus mirabilis, Haemophilus influenzae, Salmonella typhi e não-typhi, Neisseria meningitidis) e bactérias anaeróbias gram-negativas (Bacteroides spp, exceto Bacteroides fragilis, Fusobacterium spp).

Em comparação com a benzilpenicilina, há maior atividade contra Haemophilus influenzae, Enterococcus faecalis e Salmonella spp, apesar das taxas variáveis de resistência. Por outro lado, perde-se atividade em relação ao Streptococcus pyogenes, Streptococcus pneumoniae, Neisseria meningitidis, Neisseria gonorrhoeae e Clostridium spp.

As indicações clínicas principais envolvem o tratamento de infecções de vias aéreas superiores (sinusite, otite, faringoamigdalite), infeções pulmonares, infecções urinárias, salmoneloses e meningites por Listeria monocytogenes e Streptococcus agalactiae. Nas meningites por Streptococcus pneumoniae, Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae, a observação do padrão de sensibilidade da cepa é fundamental para a utilização da ampicilina.

 

      Dose habitual: 2 a 4 g/dia, a cada 6 horas, via oral; 100 a 200 mg/kg/dia EV com ajuste necessário para função renal; em caso de insuficiência renal, também ajustar para função hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentações comerciais: Ampicilinz®, Amplicil®, Ampifar®, Ampicilase®, Amplitor®, Binotal® e Cileten® em comprimidos de 250 e 500 mg, frasco-ampola com 250 mg, 500 mg e 1 g, suspensão com 125 e 250 mg/5 mL.

 

A amoxicilina tem características semelhantes à ampicilina com relação à composição química e espectro de ação. Apresenta absorção oral mais efetiva, levando à permanência de concentrações séricas 2 vezes maior que a ampicilina.

A meia-vida da droga é de 1 hora, com índice de ligação às proteínas plasmáticas de 17% e eliminação renal. A concentração da droga no líquido cefalorraquidiano é muito variável em pacientes com meningite, não se devendo utilizá-la nestas circunstâncias. A única apresentação da droga é oral.

Com relação ao espectro antimicrobiano, a amoxicilina é mais ativa contra Salmonella typhi e menos ativa contra Shiguella spp. As indicações terapêuticas incluem o tratamento do Helicobacter pylori (droga adjuvante) e doença de Lyme.

 

      Dose habitual: 1,5 a 3 g/dia divididos a cada 8 horas, com ajuste necessário para função renal; em caso de insuficiência renal, também ajustar para função hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentações comerciais: Amoxacilina®, Amoxil®, Hiconcil®, Cibramox®, entre outros, em comprimidos de 250 e 500 mg, suspensão 125 e 250 mg/5 mL.

 

Carboxipenicilinas (carbenicilina/ticarcilina)

As carboxipenicilinas são derivados carboxílicos da penicilina G, destacando-se principalmente pela atividade contra Pseudomonas aeruginosa. Há sinergismo de ação com aminoglicosídeos.

A carbenicilina é disponível em apresentação endovenosa. O índice de ligação às proteínas plasmáticas situa-se em torno de 50%, com eliminação renal da droga. Em meninges inflamadas, há concentração de aproximadamente 30 a 50% da concentração sérica. O espectro de ação abrange cocos gram-positivos e gram-negativos, porém com menor eficácia que as aminopenicilinas. A atividade contra Pseudomonas aeruginosa, Proteus indol positivo e cepas de Enterobacter, Acinetobacter, Serratia e Bacteroides fragilis justifica a sua utilização como opção em infecções hospitalares por tais agentes.

 

      Dose habitual: 200 a 800 mg/kg/dia, divididos a cada 4 horas, com ajuste necessário para função renal; em caso de insuficiência renal, também ajustar para função hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentação comercial: Carbenicilina® frasco-ampola com 1 g e 5 g.

 

A ticarcilina é um derivado da carbenicilina introduzido na prática médica em 1970, com propriedades estruturais, farmacocinéticas e antimicrobianas semelhantes à carbenicilina. Entretanto, possui atividade contra Pseudomonas aeruginosa 2 vezes maior que a droga precursora. A ticarcilina não apresenta atividade sobre enterococos, Klebsiella spp e Serratia spp.

 

      Dose habitual: 400 a 600 mg/kg/dia, dose dividida a cada 4 ou 6 horas, com ajuste necessário para função renal; em caso de insuficiência renal, também ajustar para função hepática.

      Gestação: classe B.

      Apresentação comercial: Timetin® frasco-ampola com 3 g.

 

Ureidopenicilinas (piperacilina)

A piperacilina é um derivado semissintético piperazínico da ampicilina. Apresenta maior atividade antimicrobiana do que a carbenicilina sobre as enterobactérias e Pseudomonas aeruginosa. A droga é administrada por via endovenosa, com índice de ligação às proteínas plasmáticas em torno de 20 a 40%. A penetração liquórica é insuficiente, com eliminação renal da droga. As indicações incluem infecções por Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella spp e Proteus indol positivo.

 

      Dose habitual: 200 a 300 mg/kg/dia a cada 4 ou 6 horas.

      Gestação: B.

      Apresentações comerciais: Tazocin frasco-ampola com 2,25 e 4,5 g.

      Insuficiência renal: ajuste necessário.

      Insuficiência hepática: ajuste necessário.

 

Efeitos adversos

Náuseas, vômitos e diarreia são os efeitos colaterais mais relatados com as penicilinas. Reações de hipersensibilidade são descritas principalmente com penicilina benzatina e cristalina. Existem relatos de anemia hemolítica com as penicilinas e hipopotassemia com alcalose metabólica com o uso da carbenicilina.

 

Monitoração

Sem recomendações específicas de monitoração.

 

Interações medicamentosas

Probenecida e sulfimpirazona podem diminuir a excreção das penicilinas.

 

Referências

1.   Manual de controle de doenças sexualmente transmissíveis (DST). 4. ed. Série Manuais nº 68. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.

Comentários

Por: Caroline Bastos Scorsato em 10/12/2013 às 19:16:42

"Ótimo, objetivo, direto, leitura agradável"

Por: JOCEILSON CRUZ em 10/05/2013 às 12:43:32

"Material completo. Estou satisfeito e indico aos colegas."

Por: thais em 15/11/2012 às 11:11:34

"texto claro, sem rodeios. Ótimo."

Por: Eli Aguiar em 23/06/2012 às 16:02:42

"excelente essa revisão.Parabens!"

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