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Pneumonia adquirida na comunidade

Autor:

Rodrigo Antonio Brandão Neto

Médico Assistente da Disciplina de Emergências Clínicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Última revisão: 07/06/2016

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Pneumonia historicamente é uma entidade nosológica comum e importante causa de mortalidade no mundo, sendo historicamente referida como o “assassino esquecido”. As pneumonias são definidas como doenças inflamatórias das vias aéreas inferiores causadas por agentes infecciosos, como vírus, bactérias e fungos. A Organização Mundial da Saúde estima que a infecção do trato respiratório inferior é a mais comum causa infecciosa de morte no mundo (a terceira causa geral mais comum), com quase 3,5 milhões de mortes anuais, juntamente com a influenza a pneumonia representa a nona principal causa de morte nos Estados Unidos, resultando em cerca de 50.000 mortes em 2010. Este número é provavelmente subestimado, uma vez que muitas mortes por sepse e mortes atribuídas a outras condições (como neoplasias e doença de Alzheimer), nas quais a quais pneumonia é o evento terminal, não são notificadas.

Pneumonia adquirida na comunidade, que necessita de hospitalização, está associada com excesso de mortalidade ao longo dos anos subsequentes entre os sobreviventes, aumentando inclusive mortalidade cardiovascular, esse aumento de morbidade e mortalidade parece ocorrer mesmo em jovens sem comorbidades.

 

Epidemiologia e definições

Para a pneumonia ser considerada comunitária, os pacientes não podem ter sido hospitalizados recentemente e não terem a exposição regular ao sistema de saúde, ou que aparece com até 48 horas da internação hospitalar. Pacientes portadores de pneumonia que estiveram hospitalizados por dois ou mais dias nos últimos três meses, provenientes de asilos ou de casas de saúde; aqueles que receberam antibióticos por via endovenosa, quimioterapia, ou tratamento de escaras no ultimo mês ou que estejam em tratamento em clínicas de diálise constituem um grupo especial que está incluído mais apropriadamente na classificação da pneumonia adquirida em hospital ou de pneumonia associadas aos cuidados de saúde.

No Brasil, a pneumonia adquirida na comunidade (PAC) representa cerca de de 10 a 13% das internações hospitalares do país com mais de 1 milhão de casos internados ao ano em estatísticas recentes. As doenças respiratórias são a quinta maior causa de óbitos nesse país, sendo a pneumonia a segunda maior causa de morte nesse subgrupo, representando mais de 35 mil mortes no ano de 2005.

 

Manifestações clínicas e diagnóstico

O diagnóstico de pneumonia adquirida na comunidade não é difícil em pacientes que não têm doença cardiopulmonar subjacente. A tríade que evidência infecção inclui  a presença de febre ou calafrios e leucocitose, sinais ou sintomas respiratórios (tosse, aumento da produção de expectoração, falta de ar, dor no peito, ou exame pulmonar anormal), e infiltrados radiográficos novos. Em pacientes com câncer de pulmão, fibrose pulmonar ou outra doença pulmonar infiltrativa crônica, ou insuficiência cardíaca congestiva, o diagnóstico de PAC pode ser difícil. As apresentações atípicas também complicam o diagnóstico. A confusão mental, por exemplo, pode ser o único sintoma de apresentação em pacientes idosos.

O diagnóstico deve ser considerado em todos os pacientes com sintomas respiratórios. O exame físico pode ser normal em pacientes com pneumonia. Alguns achados clínicos aumentam a probabilidade de a pneumonia estar presente e esses achados incluem:  febre persistente, frequência respiratória > 25 rpm, presença de expectoração, frequência cardíaca > 100bpm, estertores, diminuição dos sons respiratórios, mialgia e sudorese noturna.

A maior parte dos pacientes apresenta um quadro sugestivo de infecção de vias aéreas superiores. Ao contrário da maioria dos quadros de IVAS nos pacientes com pneumonia, esse quadro tende a durar mais, principalmente a febre e sensação de mal-estar geral. A pneumonia pneumocócica clássica tem uma apresentação aguda com dor torácica pleurítica, febre, expectoração avermelhada e quadro séptico, esta é uma forma relativamente rara de manifestação da pneumonia.

Os achados de consolidação como creptações, diminuição de murmúrio vesicular, sopro tubário, entre outros, apesar de clássicos na literatura são dificilmente encontrados.

Os infiltrados radiológicos podem ser sutis e passam despercebidos em até 15% dos casos, e dois radiologistas verificando a mesma radiografia de tórax discordam em cerca de 10% dos casos. Por esse motivo, em pacientes com dúvida diagnóstica pode ser necessário realizar tomografia de tórax sem contraste, em pacientes imunossuprimidos com sintomas respiratórios e radiografia de tórax normal a tomografia de tórax também pode ser indicada.

Em pacientes com infiltrados que sugerem pneumonia é sempre importante considerar outros diagnósticos alternativos, muitas vezes o desaparecimento da imagem de pneumonia ocorre semanas após o final da antibióticoterapia de forma que é necessário, caso esta ainda persista, para avaliar possíveis diagnósticos diferenciais, esses diagnósticos incluem:

 

1-Radiografia de tórax anormal:

-Insuficiência cardíaca com síndrome viral associada;

-Pneumonite por aspiração;

-Infarto pulmonar pot tromboembolismo;

-Exacerbação aguda de fibrose pulmonar;

-Exacerbação aguda de bronquiectasias;

-Pneumonia eosinofílica aguda;

-Pneumonite de hipersensibilidade;

-Vasculite pulmonar;

-Lesão pulmonar induzida por cocaína ("pulmão de crack");

-Pneumonia organizada criptogênica ( antes BOOP);

-Neoplasias.

 

2-Radiografia de tórax normal:

-Exacerbação aguda de DPOC;

-Gripe;

-Bronquite aguda;

-Pertussis;

-Asma com síndrome viral associada.

 

Exames complementares

O  primeiro exame a ser solicitado nesses pacientes é a radiografia de tórax, que é indicada em todos os pacientes com suspeita de pneumonia, servindo tanto para o diagnóstico, mas também para extratificação de risco da pneumonia verificando se o paciente apresenta derrame pleural ou acometimento multilobar. Outros exames dependem da gravidade do paciente e se a possibilidade de internação hospitalar está sendo contemplada.

Uma estratégia para decidir quando solicitar exames complementares é verificar se esses pacientes apresentam fatores modificadores da doença, como o citados nos escores PSI e CURB-65 que iremos discutir a seguir. Esses exames incluem hemograma, ureia, creatinina, sódio, potássio e glicemia. A verificação de saturação de oxigênio é indicada em todos os pacientes, e se desconforto respiratório estiver presente, gasometria arterial deve ser realizada. Outros exames são realizados conforme a circunstância clínica, incluindo provas inflamatórias, como PCR.

A extensão dos exames necessários para se identificar o micro-organismo causador de PAC é controversa, pois os regimes de antibióticos recomendados são eficazes para a maioria dos pacientes, os testes diagnósticos raramente vão alterar a terapia. Em pacientes em que foi decidido por internação testes etiológicos podem ser considerados.

Esses exames podem incluir obtenção de gram do escarro, cultura do escarro, hemoculturas, ensaios para a legionella e pesquisa de antígenos urinários, e ensaios de PCR para Mycoplasma pneumoniae, Chlamydia  pneumoniae, e pesquisa de vírus respiratórios.

Uma dosagem baixa de procalcitonina sérica (<0.1 ng por litro) pode contribuir para apoiar a decisão de não iniciar ou descontinuar antibióticos e estudos mostram menor tempo de uso de antibióticos sem prejdicar desfechos clínicos, de forma que seu uso racional pode ser útil no manejo dos pacientes com PAC, mas para o diagnóstico de pneumonia o exame não foi completamente validado.

O escarro pode pode fornecer informações imediatas sobre possíveis organismos causadores. Resultados sobre Gram do coloração e cultura de escarro são positivos em mais de 80% dos casos de pneumonia pneumocócica e seus resultados podem ajudar a direcionar a terapia. O escarro só é possível de ser analisado , quando a amostra for de boa qualidade (> 10 células inflamatórias por célula epitelial).

As hemoculturas são outro exame importante e são positivas em até 20 a 25% de pacientes internados com pneumonia pneumocócica desde que colhidas antes da introdução da antibióticoterapia, mas a positividade é significativamente menor em pneumonias causadas por H. influenzae ou P. aeruginosa e apenas raramente em casos provocados pela Moraxella catarrhalis. Em pneumonias causadas por S.aureus adquirido por via hematogênica, as hemoculturas são frequentemente positivas, embora em apenas cerca de 25% dos casos em que a inalação ou aspiração é responsável pela PAC.

A pesquisa de antígeno urinário para Legionella é positiva em cerca de 74% dos pacientes com pneumonia causada por Legionella pneumophila com sensibilidade aumentada em casos mais graves.

A pesquisa de vírus respiratórios é um exame que deve ser considerado em épocas de epidemias de influenza, podendo ser considerada em pacientes com coriza e sintomas respiratórios altos e infiltrado bilateral.

A tabela 1 sumariza os exames indicados, e em que circunstâncias, conforme as indicações das diretrizes norte-americanas de pneumonia, indicações parecidas com as recomendadas pelo consenso brasileiro de pneumonia.

 

Tabela 1: Exames sugeridos pela ATS e pela IDSA para investigação etiológica de pneumonia

 

Indicações

Hemocultura

Cultura de escarro

Pesquisa de antígeno para Legionella na urina

Pesquisa de antígeno para pneumococo na urina

Outros

Paciente em UTI

Sim

Sim

Sim

Sim

Sim

Falha com antibiótico ambulatorial

 

Sim

Sim

Sim

 

Infiltrados cavitários

Sim

Sim

 

 

Sim

Leucopenia

Sim

 

 

Sim

 

Etilismo

Sim

Sim

Sim

Sim

 

Doença hepática severa

Sim

 

 

Sim

 

DPOC ou pneumopatia estrutural

 

Sim

 

 

 

Asplenia

Sim

 

 

Sim

 

Viagem recente (2 semanas)

 

 

Sim

 

 

Pesquisa de Legionella positiva na urina

 

Sim

 

 

 

Pesquisa de pneumococo positiva na urina

Sim

Sim

 

 

 

Derrame pleural

Sim

Sim

Sim

Sim

Sim

 

Extratificação de risco

Uma das mais importantes decisões a serem tomadas em pacientes com pneumonia é em que local o paciente será tratado, se ambulatorialmente ou internado no hospital, e em pacientes internados se irão ser alocados em enfermarias ou unidades de terapia intensiva. Entre 40% e 60% dos pacientes que se apresentam ao departamento de emergência com pneumonia adquirida na comunidade são internados, esta decisão em geral é dependente do julgamento clínico, mas algumas ferramentas como os escores de risco Pneumonia Severity Index (PSI) e o CURB-65, foram desenvolvidas especificamente para tomar decisões de admissão, e o PSI em um estudo foi superior ao médico assistente em predizer a evolução do paciente. O PSI em comparação com o CURB-65 resulta em menos admissões de pacientes com doença leve, sem piorar desfechos adversos. No entanto, o cálculo do escore PSI é complexo, exigindo instrumentos de apoio à decisão.

O CURB-65 é uma pontuação mais simples, que atribui 1 ponto para cada variável que inclui confusão, uremia (ureia >=60 mg/dl), frequência respiratória >=30 respirações por minuto, pressão arterial sistólica <90 mm Hg ou pressão arterial diastólica <=60 mm Hg, e idade >=65 anos, com uma pontuação igual ou superior a 2 sendo indicativa da necessidade de internação hospitalar e escores =3 fazendo considerar a possibilidade de internação em unidade de terapia intensiva. Existe, ainda, a versão simplificada do CURB-65, o CRB-65, no qual se exclui a ureia para a avaliação final. Nesse caso, o paciente que não pontua (mortalidade de 1,2%) é candidato a tratamento ambulatorial; para aquele que pontua 1 ou 2 (mortalidade de 8,15%) avalia-se a internação hospitalar; e aquele com 3 ou 4 pontos (mortalidade de 31%) necessita de hospitalização urgente.

O escore PSI foi validado em um estudo observacional, prospectivo e multicêntrico, no qual se seguiram 1.343 pacientes internados e 944 ambulatoriais com seguimento por 30 dias e identificou os fatores associados com a necessidade de internação em UTI, o escore PSI é sumarizado na tabela 2 e 3.

 

Tabela 2: Escore PSI

 

Características

Pontos

Fatores Demográficos:

Idade homem

Idade mulher

Residente em casa de repouso

Comorbidades

Câncer

Doença hepática

Insuficiência cardíaca congestiva

Doença cérebro vascular

Insuficiência renal

Exame físico

Estado mental alterado

Frequência respiratória > 30/minuto

PA sistólica < 90 mmHg

Temperatura < 35oC ou > 40oC

Pulso > 125/minuto

 

No  anos

No  anos - 10

No  anos + 10

 

+ 30

+ 20

+ 10

+ 10

+ 10

 

+ 20

+ 20

+ 20

+ 15

+ 10

Laboratório e Radiografia:

pH < 7.35

Ureia > 30 mg/dL

Sódio < 130 mEq/ L

Glicemia > 250 mg/ dL

Hematócrito < 30%

PaO2 < 60 mmHg ou saturação O2 < 90%

Derrame pleural

 

+ 30

+ 20

+ 20

+ 10

+ 10

+ 10

+ 10

 

Tabela 3: Classificação de risco baseado no escore PSI

 

Escala de risco

Pontos

Mortalidade

Local de tratamento

PORT  I

Ausência de preditores

0,1-0,4%

Ambulatorial

PORT  II

< 71 pontos

0,6-0,7%

Ambulatorial

PORT  III

 

71- 90 pontos

 

0,9 - 2,8%

24 a 48 h no PS e alta hospitalar se estável

PORT  IV

91-130 pontos

 

8,2 - 9,3%

Internado

PORT  V

> 130 pontos

 

27,0 – 31,1%

Internado (considerar UTI)

 

Embora ambos os escores sejam válidos para a análise de grupos de admissões de melhoria da qualidade ou pesquisa em pneumonia adquirida na comunidade, decisões individuais que são incompatíveis com a pontuação são feitas muitas vezes por razões objetivas, como hipoxemia e, as vezes, por questões subjetivas como questões sociais e de compreeensão do paciente de forma que apesar dos escores de pneumonia serem importantes ferramentas, a decisão sobre internação hospitalar acaba sendo uma decisão eminentemente médica.

A segunda decisão é em relação ao local de internação, se em enfermarias ou UTI, em pacientes com instabilidade hemodinâmica esta decisão pode ser relativamente lógica, mas em pacientes estáveis esta é uma das decisões com maior efeito potencial sobre a mortalidade. Estudos mostram, por exemplo, que pacientes transferidos para a UTI dentro de 48 horas  têm uma mortalidade mais elevada do que aqueles com um óbvia necessidade de cuidados na UTI na admissão hospitalar (ventilação mecânica ou hipotensão exigindo vasopressores) no momento da admissão. Assim a importãncia de instrumentos que mensurem a probabilidade de evolução com necessidade de recursos de terapia intensiva. Um desses instrumentos é o escore SMART-COP que foi projetado para prever quais pacientes necessitam de internação em UTI, foi originalmente relatado ter sensibilidade de 92%, quando comparado com 74% para o PSI e 39% para CURB-65 para predizer necessidade de ventilação invasiva ou não invasiva ou droga vasopressora. A tabela abaixo sumariza o escore SMART-COP. Um escore maior que 3 pontos prediz a necessidade de recursos de terapia intensiva.

 

Tabela 4: Escore SMART-COP

 

Critérios

Pontuação

PAS < 90 mmHg

2

PO2 < 60 mmHg

2

Ph> 7,35

2

Infiltrados multilobares

1

Albumina < 3,5g/dl

1

FR> 30 i.r.m

1

FC> 124 b.p.m

1

Confusão mental

1

 

O principal critério utilizado pela literatura para avaliar alocação de pacientes na UTI são os critérios da IDSA-ATS, que são as associação americanas de infectologia e pneumologia. Em estatísticas norte-americanas cerca de 5 a 20% das admissões hospitalares por pneumonia necessitam de UTI e com a limitada capacidade do PSI e CURB-65 em predizer internações em UTI, os critérios IDSA-ATS acabam sendo uma alternativa,  a presença de qualquer um dos critérios maiores ou a presença de três ou mais de nove critério menores justifica a consideração de internação em UTI. Os critérios são os seguintes:

 

Critérios maiores:

-Choque séptico com necessidade de vasopressores

-Necessidade de ventilação mecânica invasiva

 

Critérios menores:

-Frequência respiratória >= 30 ipm

-Relação PaO2/FiO2 <= 250

-Infiltrados multilobares

-Confusão/desorientação

-Ureia >= 43 mg/dL

-Leucopenia (leucograma < 4000 células/mm3)

-Trombocitopenia (plaquetometria < 100.000/mm3)

-Hipotermia (temperatura central < 36oC)

-Hipotensão que requer ressuscitação volêmica agressiva

 

Outros escores para predizer deterioração clínica também foram desenvolvidos e validados. Para cada uma destes, a probabilidade de a necessidade de ventilação invasiva, ou terapia vasopressora, aumenta com o maior número de critérios atendidos ou pontos computados. Essas pontuações têm muitas variáveis em comum e utilizam uma pontuação limiar semelhante (aproximadamente 3) para considerar a internação na UTI. E se seguidas rigidamente, provavelmente  resultarão em aumento substâncial de intenações em UTI provavelmente desnecessárias em resultado, mas o seu uso no departamento de emergência poderia servir para chamar atenção para os pacientes que têm alta pontuações, para necessidade de monitorização um pouco mais rígida. Um estudo de qualidade mostrou que o aumento da atenção no departamento de emergência para pacientes com três ou mais critérios menores IDSA-ATS resultou numa diminuição da mortalidade e menos transferências da enfermaria para UTI sem aumentar substancialmente internações em UTI. Intervenções úteis nesses pacientes incluem reposição volêmica agressiva,  rápida iniciação de antibióticos apropriados, gasometria arterial em pacientes com hipoxemia limítrofe ou dosagem de lactato em pacientes com hipotensão limítrofe, e tratamento de doenças coexistentes (como tratamento com broncodilatadores em pacientes com asma e DPOC); reavaliação após essas intervenções pode esclarecer a trajetória do paciente.

O escore REA-ICU (Risk of Early Admission to Intensive Care Unit)  também foi desenvolvido para avaliar a indicação de internação em UTI, esse critério estratifica os pacientes em quatro grupos, com risco de admissão em UTI variando de 0,7 – 31%, e evidencia área abaixo da curva ROC (Receiver Operating Characteristics) de 0,81. As tabelas abaixo sumarizam o escore. Outros escores como o CURXO são muito parecidos com os escores já discutidos e não serão comentados.

 

Tabela 5: Escore REA-ICU

 

Características

ODDS Ratio

Pontos

Sexo masculino

1,47

1

Uma ou mais comorbidades

1,57

1

Frequência respiratória >= 30 ipm

1,70

1

Leucograma < 3000/mm3 ou >= 20000/mm3

1,71

1

Frequência cardíaca >= 125 bpm

1,73

1

Idade > 80 anos

1,76

1

Infiltrados multilobares ou derrame pleural

2,19

2

SatO2<90% ou PaO2 < 60 mmHg

2,35

2

pH arterial < 7,35

2,49

2

BUN >= 11 mmol/L

2,56

2

Sódio < 130 mEq/L

2,88

3

 

Tabela 6: Classificação escore REA-ICU

 

Classificação

Pontuação

Risco de UTI = 3 dias

I

= 3

1,3

II

4 – 6

7,1

III

7 – 8

12,2

IV

= 9

32,4

 

Tratamento

Após a alocação do tratamento e exames, a próxima decisão importante em pacientes com pneumonia é a escolha da antibioticoterapia. Numerosos antibióticos são aprovados para o tratamento da PAC e a chave para o tratamento adequado é uma cobertura adequada de Streptococcus pneumoniae e patógenos atípicos de comunidade (micoplasma, Chlamydophila, e legionella). Infelizmente, na população brasileira existem poucos estudos etiológicos sobre pneumonia, embora um estudo da década de 1990 sugira  que a proporção de agentes atípicos nas pneumonias em nossa população chegue  a 30-40%. Para pacientes ambulatoriais, a cobertura dos agentes atípicos é mais importante, especialmente para jovens adultos, para quem a imunidade da vacinação generalizada de bebês e crianças com uma vacina pneumocócica conjugada diminuiu as taxas de pneumonia pneumocócica.

Outros fatores influenciam a escolha da antibióticoterapia como uso recente de antibióticos e custo. Macrolídeos, doxiciclina e fluoroquinolonas são os mais adequados agentes para os patógenos bacterianos atípicos, porém um estudo brasileiro sugere que a resistência do pneumococo à doxiciclina chegue a 40%. Para os pacientes internados, as diretrizes da ATS-IDSA recomendam o tratamento de primeira linha com uma fluoroquinolona respiratória (Moxifloxacina a uma dose de 400 mg por dia ou a levofloxacina, a uma dose de 750 mg por dia) ou uma combinação de cefalosporina e um macrólideo.

Tratamento antibiótico alternativo deve basear-se na presença de múltiplos fatores de risco, se pneumonia associada a cuidados de saúde é uma possibilidade, os riscos específicos do paciente (por exemplo, doença pulmonar estrutural), ou síndromes características de agentes específicos (por exemplo, manifestações típicas de síndome mediada por toxina, por Staphylococcus aureus).

Os pacientes com três ou mais critérios menores para pneumonia adquirida na comunidade grave (por exemplo, alteração da função renal, confusão mental e uma elevada frequência respiratória) devem receber intervenção extensa na emergência e serem considerados para a admissão na unidade de terapia intensiva. Nesse caso, reposição volêmica agressiva e antibióticoterapia precoce (em menos de 1 hora da chegada do paciente ao serviço de emergência) podem ter benefícios em relação à mortalidade e aos desfechos clínicos.

A terapia inicial deve contemplar os agentes etiológicos mais prováveis, os estudos não mostram vantagens com terapia combinada de antibióticos em relação à monoterapia, exceto em pacientes graves ou com doença pneumocóccica invasiva (pneumococo isolado em hemocultura, líquor ou líquido pleural).

Várias opções são possíveis para o tratamento inicial de pneumonia, em pacientes que podem ser tratados ambulatorialmente. As diretrizes brasileiras de pneumonia recomendam o uso de macrolídeos para o tratamento de pneumonia ambulatorial, estudos recentes mostram que monoterapia com beta-lactâmicos foi similar aos macrolídeos para tratamento inicial de pneumonia, mas são associados a uma internação a mais a cada 20 pacientes tratados. Assim opções poderiam ser o uso de azitromicina ou claritromicina e alternativamente usando beta-lacâmicos a amoxacilina-clavulonato ou cefalosporina de segunda geração como a cefuroxima. A doxiciclina não é uma boa alternativa na nossa população, pois o pneumococo parece ser resistente  à doxiciclina frequentemente na nossa população.

Em pacientes em que foi decidido o tratamento ambulatorial, mas que apresentam fatores modificadores de doença como cirrose, DPOC, idade maior que 65 anos e outros fatores considerados no escore PSI, ou que usaram antibióticoterapia há menos de três meses, as diretrizes brasileiras recomendam o uso de quinolona respiratória ou a combinação de macrolídeo com beta-lactâmico.

Em pacientes internados não considerados graves, a monoterapia pode ser suficiente para o tratamento adequado e as diretrizes brasileiras recomendam o uso de quinolona respiratória ou a combinação clássica de cefalosporina de terceira geração como a ceftriaxona com macrolídeo, em pacientes de maior gravidade, terapia combinada sempre é recomendada e adaptada conforme as circunstâncias clínicas de cada paciente. Nas diretrizes nacionais, as pneumonias graves com necessidade de terapia intensiva deveriam ser tratadas com combinação de cefalosporina de terceira geração e um segundo antibiótico que seria ou macrolídeo ou quinolona respiratória com preferência para quinolona respiratória, se risco de infecção por pseudomonas.

Evidência observacional sugere que a combinação de macrólideo com beta-lactâmico para tratamento empírico de pneumonias pode ser associada com melhores desfechos, o que poderia ter relação com outras funções do macrolídeo como imunomodulação e diminuição de atividade inflamatória.

A administração da primeira dose de antibiótico dentro de 6 horas após a apresentação parece ser útil. Esse ponto de corte foi modificado a partir de uma análise retrospectiva de dados do Medicare nos EUA, que mostrou que um intervalo de mais de 4 horas entre a apresentação inicial e a primeira dose de antibiótico foi associada com o aumento da mortalidade intra-hospitalar. No entanto, os esforços para diminuir o tempo para a primeira administração de terapia com antibióticos conduziram a um aumento do uso inapropriado de antibióticos em pacientes que não têm pneumonia adquirida na comunidade, com consequências adversas, tais como colite por Clostridium difficile e não resultaram em diminuição de mortalidade. Um menor tempo de administração do antibiótico pode ser simplesmente um marcador de múltiplas intervenções ou fatores que influenciam os cuidados para o paciente que poderiam ter influência sobre a evolução do paciente. As atuais diretrizes IDSA-ATS não recomendam um tempo específico para a administração da primeira dose de antibiótico, mas em vez disso encorajam o tratamento logo que o diagnóstico é realizado. Uma exceção é feita para os pacientes em choque; em que antibióticos devem ser administrados dentro da primeira hora após o início da hipotensão. Um estudo observacional envolvendo pacientes com choque séptico mostrou  uma diminuição nas taxas de sobrevivência de 8% por cada hora de atraso.

A duração atualmente recomendada de antibióticoterapia  para pneumonia adquirida na comunidade é de 5-7 dias. Não há evidência de que cursos prolongados de antibiótico levem a melhores resultados, mesmo em pacientes gravemente doentes, a menos que eles sejam imunocomprometidos. Em pacientes com pneumonia pneumocóccica está validado em estudos o uso de antibióticos até 72 horas após a resolução da febre, mas a decisão do tempo de antibióticoterapia deve ser adaptada para as circunstâncias individuais do paciente.

Embora as recomendações discutidas até agora se apliquem à maioria dos pacientes com PAC, os médicos precisam identificar pacientes que têm risco aumentado de bactérias resistentes a estes regimes de antibióticos empíricos. Mais comumemente entre estes estão os pacientes com fatores de risco para pneumonia associada a cuidados de saúde (Tabela 6). Esta forma de pneumonia pode com maior frequência ter agentes etiológicos resistentes a estes antibióticos e muitas vezes semelhantes aos das pneumonias nosocomiais. Os critérios mais adequados para identificar pacientes que devem receber terapia de amplo espectro empírica inicial não são claros.

Um recente estudo prospectivo, multicêntrico, identificou seis fatores de risco para a pneumonia causada por patógenos resistente aos esquemas antibióticos habituais de internamento recomendada pela IDSA-ATS guidelines. Esses fatores de risco específicos de pneumonia são consistentes com os citados em outros estudos que indicam que o uso recente de antibióticos ou de hospitalização e estado funcional pobres são os mais importantes preditores de patógenos resistentes. Os dados disponíveis sugerem que a incidência de patógenos multirresistentes geralmente não é significativamente aumentada se três ou mais fatores de risco não são presentes. No entanto, os agentes meticilino-resistentes (MRSA) são uma exceção: a presença de um fator de risco específico de MRSA (infecção prévia por MRSA ou colonização, hemodiálise a longo prazo, ou insuficiência cardíaca) e outro fator de risco específico para pneumonia pode justificar  cobertura para agentes MRSA. A importância de distinguir entre pneumonia associada aos cuidados de saúde e PAC comum depende da prevalência local de patógenos resistentes aos antibióticos, que varia marcadamente em diferentes localizações sendo importante o conhecimento dos dados epidemiológicos locais.

 

Tabela 7. Características clínicas sugestivas PAC com MRSA

 

-Infiltrado cavitários ou necrose

-Aumentando rapidamente derrame pleural

-Hemoptise pura

-Influenza concomitante

-Neutropenia

-Exantema eritematoso

-Pústulas na pele

-Paciente jovem, previamente saudável

-Pneumonia grave durante os meses de verão

 

 

Tabela 8. Critérios para Pneumonia Associada aos cuidados de Saúde.

 

-Hospitalização por >=2 dias durante os 90 dias anteriores

-Residência num lar de idosos ou instalações de cuidados extendidos

-O uso a longo prazo da terapia endovenosa em casa, incluindo antibióticos

-Hemodiálise durante os últimos 30 dias

-Início de tratamento de feridas

-Membro da família com patógeno multirresistente

-Doença imunossupressora ou terapia imunosupressora

-Uso de antibióticos durante os 90 dias anteriores

-Incapacidade de deambulação e alimentação por tubo ou uso de agentes supressores de ácido gástrico

 

Em estudos de dados de centros terciários, pacientes com pneumonias associadas aos cuidados de saúde com cultura positiva foram mais propensos do que os pacientes que não atendem à definição de pneumonia associada aos cuidados com a saúde para ter patógenos resistentes e recebem com mais frequencia antibioticoterapia inapropriada com aumento da mortalidade entre esses pacientes. Terapia de amplo espectro empírica com dupla cobertura para Pseudomonas aeruginosa e  cobertura de rotina para MRSA é recomendada para pacientes com fatores de risco para pneumonia associada a cuidados de saúde. No entanto, existe um crescente reconhecimento de que o uso de todos esses fatores de risco como indicações para terapia de amplo espectro pode levar a tratamento excessivo de muitos pacientes. Os critérios adequados para terapia de amplo espectro inicial terapia permanecem controversos. Outro grupo de pacientes de risco para patógenos resistentes ao antibióticos usuais para pneumonia adquirida na comunidade são aqueles com doença pulmonar estrutural (Bronquiectasias ou DPOC grave) que tenham recebido vários cursos de antibióticos ambulatoriais; com uso de corticoesteroides em dose maior ou igual a 10 mg de prednisona por mais de um mês.  A frequência de infecção por P. aeruginosa é particularmente aumentada nessa população.

Pacientes com sintomas de síndrome tóxica por estafilococo e com fatores de risco para agentes MRSA devem ter tratamento com antibiótico que tenha ação contra a exotoxina considerado, como a linezolida ou a clindamicina.

 

Referências

1-Wunderink RG, Waterer GW. Community-Acquired Pneumonia. New Eng J Med 2014; 370: 543-551.

 

2-The top 10 causes of death. Geneva: World Health Organization, 2013 (http:// www.who.int/mediacentre/factsheets/ fs310/en/index.html).

 

3-Mandell LA, Wunderink RG, Anzueto A, et al. Infectious Diseases Society of America/American Thoracic Society con- sensus guidelines on the management of community-acquired pneumonia in adults. Clin Infect Dis 2007;44:Suppl 2:S27-S72.

 

4-Fine MJ, Auble TE, Yealy DM, et al. A prediction rule to identify low-risk pa- tients with community-acquired pneumo- nia. N Engl J Med 1997;336:243-50.

 

5-Charles PG, Wolfe R, Whitby M, et al. SMART-COP: a tool for predicting the need for intensive respiratory or vasopres- sor support in community-acquired pneu- monia. Clin Infect Dis 2008;47:375-84.

 

6-Renaud B, Labarère J, Coma E, et al. Risk stratification of early admission to the intensive care unit of patients with no major criteria of severe community-acquired pneumonia: development of an interna- tional prediction rule. Crit Care 2009; 13:R54.

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